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decidir a me pedir que te ensinasse. E depois demorou ainda mais até que eu concordasse em
te ensinar. Mas tudo isso está resolvido agora. Quanto ao que eu vou te ensinar, bem...
Levantou-se e caminhou em direção à lareira. Inclinou a cabeça enquanto fitava as chamas
e, em seguida, curvou-se para pegar num carvão e remexer as brasas, avivando a fogueira.
– É assassinato, mais ou menos. A fina arte do assassinato diplomático. Matar pessoas. Ou
cegá-las, ensurdecê-las, debilitá-las, paralisá-las, provocar nelas tosses debilitantes ou
impotência; ou senilidade precoce, ou loucura ou... mas não interessa. Tudo isso é o meu
ofício. E será o seu se concordar, agora mesmo, desde o princípio, que eu vou te ensinar a
matar pessoas. A serviço do seu rei. E não da forma vistosa que Hode está te ensinando, não
no campo de batalha, onde os outros te veem e te incentivam. Não. Vou te ensinar maneiras
sórdidas, discretas e delicadas de matar pessoas. E pode ser que venha a desenvolver um
gosto por tais artes, mas também pode ser que não. Isso vai depender de você, e não é algo
sobre o qual eu tenha algum controle. Mas te garanto que saberá como fazê-lo. E te garanto
também outra coisa, uma coisa que estipulei como condição ao Rei Sagaz antes de aceitar te
ensinar: que saberá o que é isso que eu estou te ensinando, como eu nunca soube quando tinha
a sua idade. Portanto, devo te ensinar a ser um assassino. Tudo bem para você, garoto?
Indiquei que sim com a cabeça outra vez, inseguro, mas não sabendo se tinha outra escolha.
Ele me olhou de esguelha.
– Você sabe falar, não sabe? Não é mudo, além de bastardo, ou é?
Engoli em seco.
– Não, senhor. Eu sei falar.
– Bem, então faça o favor de falar. Não fique aí fazendo que sim com a cabeça. Diga-me o
que é que pensa de tudo isso. De quem eu sou e do que acabei de te propor que façamos.
Convidado a falar, continuei calado. Fitei a cara dele, cheia de marcas, e a pele fina das
mãos e senti o brilho dos seus olhos verdes sobre mim. Movi a língua no interior da boca, mas
encontrei apenas silêncio. A atitude dele me convidava a falar, mas o seu rosto era mais
aterrorizante do que qualquer coisa que eu tivesse alguma vez imaginado.
– Garoto – disse, e a gentileza na voz dele me surpreendeu de tal forma que forçou os meus
olhos a fitarem os dele. – Posso te ensinar mesmo que me odeie, mesmo que despreze as
lições que te dou. Posso te ensinar se estiver aborrecido, se for preguiçoso ou estúpido. Mas
não posso te ensinar se tiver medo de falar comigo. Pelo menos, não da forma que eu quero te
ensinar. E não posso te ensinar se você decidir que isso é algo que não quer aprender. Mas
você tem de me dizer isso. Você aprendeu a proteger tão bem os seus pensamentos que quase
tem medo de deixá-los serem conhecidos por você mesmo. Mas tente dizê-los em voz alta,
agora, para mim. Você não será punido.
– Não gosto muito disso – balbuciei de repente. – A ideia de matar gente.
– Ah! – exclamou e fez uma pausa. – Nem eu gostei, quando tive de fazer isso. Nem gosto
ainda – suspirou fundo. – Cada vez que a situação surgir, é você quem vai decidir. A primeira
vez é a mais difícil. Mas fique sabendo, desde já, que essa decisão está a muitos anos de
distância. E, entretanto, você tem muito o que aprender – ele hesitou. – E tem mais, garoto. E
deve lembrar-se disso em todas as situações, não só nesta. Aprender nunca é errado. Mesmo
aprender como matar não é errado. Ou certo. É apenas uma coisa, aprender algo que eu posso
te ensinar. É isso. Por enquanto, pense que pode aprender como fazer, e decida mais tarde se
quer realmente fazer isso.