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O Aprendiz De Assassino - Saga - Robin Hobb

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prova de que ele afinal não era o homem que aparentava ser. Veracidade, este sim, era um

homem entre os homens, um rei que o povo podia contemplar e reconhecer como realeza.

Servia ao lado dos seus homens e, se de vez em quando se embriagava, ou se em certas

ocasiões tivesse sido menos discreto, bem, o fato é que ele confessava sempre o que fazia, tão

honesto quanto o seu nome. O povo podia compreender um homem assim e segui-lo.

Isso tudo eu escutava avidamente, embora em silêncio, enquanto vários tecidos eram

colocados sobre mim, discutidos e selecionados. Pude entender de maneira bem mais

profunda as razões pelas quais as crianças da torre me deixavam brincando sozinho. Se as

mulheres pensaram que eu poderia ser afetado por aquela conversa, não mostraram nenhum

sinal disso. O único comentário que me lembro de ouvir Dona Despachada fazer

especificamente para mim foi que eu devia ser mais cuidadoso para lavar o pescoço. Então,

Dona Despachada me enxotou para fora do quarto como se eu fosse uma galinha irritante, e eu

finalmente me pus a caminho da cozinha em busca de alguma comida.

Naquela tarde voltei ao pátio de Hode, e treinei até ter certeza de que o bastão tinha

misteriosamente dobrado de peso. Em seguida, fui comer, deitar, levantar de manhãzinha outra

vez, e voltar aos cuidados de Bronco. A aprendizagem toda ocupava meus dias inteiros, e

qualquer tempo livre que tivesse era absorvido por tarefas ligadas a essa aprendizagem, como

cuidar do equipamento de montaria com Bronco, ou varrer a armaria e deixá-la em ordem para

Hode. Alguns dias depois, encontrei não um nem dois, mas três trajes completos, incluindo

meias, colocados sobre a minha cama. Dois eram razoavelmente normais, num marrom

familiar que todas as crianças da minha idade pareciam vestir; mas um era feito de um tecido

azul muito fino, e no peito tinha sido bordada a cabeça de um cervo, em fio de prata. Bronco e

os outros homens de arma traziam como emblema um cervo saltando. As únicas vezes que eu

tinha visto aquela cabeça de cervo foram nos gibões de Majestoso e Veracidade. Por isso,

olhei para ela por algum tempo, interrogando-me sobre o seu significado, mas curioso também

em relação ao corte costurado em vermelho que atropelava o desenho na diagonal.

– Quer dizer que você é um bastardo – disse-me Bronco, sem rodeios, quando eu lhe

perguntei sobre aquilo. – De sangue atestadamente real, mas, mesmo assim, um bastardo. É

tudo. É apenas um jeito rápido de mostrar que você tem sangue real, mas que não é da

linhagem verdadeira. Se não gosta disso, pode mudá-lo. Tenho certeza de que o rei te

concederia um nome e um brasão que fossem só seus.

– Um nome?

– Certamente. É um pedido simples. Bastardos são raros nas casas nobres, e em especial na

casa do rei, mas não são coisa de que nunca se tenha ouvido falar antes.

Sob o pretexto de me ensinar a maneira certa de cuidar de uma sela, íamos andando pelo

depósito de acessórios de montaria, inspecionando todo o equipamento velho e em desuso.

Guardar e restaurar equipamentos velhos era uma das manias mais estranhas de Bronco.

– Invente um nome e um brasão para você e então vá pedir ao rei...

– Que nome?

– Ora, um nome de que goste. Esta parece estar arruinada; alguém a largou aqui molhada, e

apodreceu. Mas vamos ver o que podemos fazer com isso.

– Não iria parecer verdadeiro.

– O quê? – estendeu-me um braço segurando um monte de couro fedorento. Eu o peguei.

– Um nome que eu mesmo me desse. Não ia parecer que fosse meu de verdade.

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