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O Aprendiz De Assassino - Saga - Robin Hobb

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Majestoso me lançava olhares furiosos, cheios de sangue. Com um aceno de mão, ordenou que

eu desaparecesse dali. Fiz que sim com um rápido movimento de cabeça, mas corri primeiro à

mesa. Enfiei uma maçã em cada bolso e quando eu pegava uma torta quase inteira, o rei

subitamente se virou e gesticulou para mim. O bobo imitou-lhe o gesto. Fiquei imóvel.

– Olhe para ele – o velho rei ordenou. Majestoso lançou-me outro olhar furioso, mas não

ousei mover uma palha. – O que você vai fazer com ele?

Majestoso parecia perplexo.

– Ele? É o Fitz. O bastardo de Cavalaria. Vagando sorrateiramente e afanando coisas por

aí, para variar.

– Bobo. – O Rei Sagaz sorriu, mas os seus olhos continuaram firmes. O Bobo, pensando que

o rei se referia a ele, sorriu docemente. – Seus ouvidos estão tampados com cera? Não ouve

nada do que eu digo? Não te perguntei o que acha dele, mas sim o que vai fazer com ele! Aí

está ele, jovem, forte e engenhoso. Os traços do rosto dele são tão reais quanto os do seu,

embora tenha nascido no berço errado. Portanto, o que você vai fazer com ele? Vai fazer dele

uma ferramenta? Uma arma? Um companheiro? Um inimigo? Ou vai deixá-lo andando por aí,

até que outro o pegue e o use contra você?

Majestoso me olhou com o rabo do olho, depois, passando por mim, olhou em volta e, não

encontrando mais ninguém no salão, voltou a me encarar com um olhar intrigado. Sem se

desgrudar de mim, um cachorro gemeu, lembrando-me que estávamos dividindo a comida.

Adverti-o para que se calasse.

– O bastardo? É apenas uma criança.

O velho rei suspirou.

– Hoje. Agora, neste exato momento, é uma criança. Mas da próxima vez que passar por

ele, será um jovem ou, pior, um homem, e aí já vai ser tarde demais para fazer alguma coisa

com ele. Porém, se pegar esse menino agora, Majestoso, e moldá-lo, você vai comandar a sua

lealdade daqui a uma década. Em vez de um bastardo descontente que pode resolver se tornar

um candidato ao trono, será um homem de confiança, unido à família quer pelo espírito, quer

pelo sangue. Um bastardo, Majestoso, é uma coisa única. Coloque no dedo dele um anel com a

marca da realeza e mande-o para longe, e terá criado um diplomata que nenhum líder

estrangeiro ousará ignorar. Ele pode ser enviado com segurança a lugares onde um príncipe de

sangue não pode se arriscar. Imagine os possíveis usos para alguém que é, mas não é, da

linhagem real. Trocas de reféns. Alianças matrimoniais. Trabalhos secretos. A diplomacia da

navalha.

Os olhos de Majestoso se arregalaram ao ouvir as últimas palavras do rei. Por alguns

instantes, todos respiramos em silêncio, olhando-nos uns aos outros. Quando Majestoso falou,

a voz soou como se houvesse pão seco preso em sua garganta.

– Você fala essas coisas na frente do garoto. De usá-lo como uma ferramenta, como uma

arma. Você pensa que ele não vai se lembrar dessas palavras quando for adulto?

O Rei Sagaz gargalhou, e o som ecoou nas paredes de pedra do Grande Salão.

– Se lembrará dessas palavras? Mas é claro que sim. Conto com isso. Olhe para os olhos

dele, Majestoso. Há inteligência ali e possivelmente há potencial para o Talento. Eu seria um

idiota se mentisse para ele. Seria mais estúpido ainda se começasse a treiná-lo e a educá-lo

sem lhe dar qualquer explicação. Pois isso deixaria a mente dele lavrada e descansada para

quaisquer sementes que os outros pudessem plantar nela. Não é mesmo, garoto?

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