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– Oh, Eda, – murmurou entre os dentes, num tom entre prece e praga. – Eu adivinhei, eu
suspeitei, quando vi os dois correndo juntos daquela maneira, mas malditos sejam os olhos de
El, eu não queria estar certo. Não queria estar certo. Nunca na vida bati num cachorro com
esta coisa maldita. O Narigudo não tinha nenhum motivo para ter medo. A menos que você
estivesse compartilhando a mente com ele.
Qualquer que tivesse sido o perigo, percebi que havia passado. Eu me abaixei para me
sentar ao lado de Narigudo, que rastejou para o meu colo e começou a tocar meu rosto
ansiosamente com o nariz. Tentei acalmá-lo, sugerindo que esperássemos para ver o que
aconteceria a seguir. Garoto e cachorro, sentamo-nos, observando a quietude de Bronco.
Quando ele finalmente levantou a cabeça, fiquei impressionado ao ver que ele parecia estar
chorando. “Como a minha mãe”, eu me lembro em pensamento, mas estranhamente não consigo
me recordar de uma imagem dela chorando. Apenas o rosto sofrido de Bronco.
– Fitz. Garoto. Venha cá – disse suavemente, e desta vez havia qualquer coisa na sua voz
que não podia ser desobedecida. Eu me levantei e fui até ele, com Narigudo grudado em mim.
– Não – disse ele ao cachorro e apontou para um lugar ao lado das suas botas; mas a mim, ele
me levantou e me sentou no banco ao seu lado.
– Fitz – começou e fez uma pausa. Inspirou profundamente e recomeçou. – Fitz, é errado. É
ruim, muito ruim o que você tem feito com este cachorro. É antinatural. É pior que roubar ou
mentir. Faz de um homem menos que um homem. Você compreende?
Olhei para ele com cara de nada. Ele suspirou e tentou outra vez.
– Rapaz, você tem sangue real. Bastardo ou não, você é filho de Cavalaria, da antiga
linhagem. E isso que você tem feito é errado. Não é digno de você. Compreende?
Abanei a cabeça em silêncio.
– Aí está, viu só? Você não está mais falando. Agora fale comigo. Quem te ensinou a fazer
isso?
– Fazer o quê? – senti a voz trêmula e desafinada.
Os olhos de Bronco se arregalaram. Percebi o esforço que fazia para se controlar.
– Sabe o que eu quero dizer. Quem te ensinou a ficar com o cão, com a mente dele, a ver as
coisas com ele, a deixá-lo ver com você, a dizerem coisas um ao outro?
Refleti sobre isso por alguns momentos. Sim, era isso que estava acontecendo.
– Ninguém – respondi, por fim. – Simplesmente aconteceu. Passamos muito tempo juntos –
acrescentei, pensando que aquele fato ajudaria a explicar o que tinha acontecido.
Bronco me olhou firme e sério.
– Você não fala como uma criança – observou de repente. – Mas ouvi dizer que era assim
que acontecia com os que tinham a antiga Manha. Que desde o princípio não eram
verdadeiramente crianças. Sabiam sempre demais e, à medida que se tornavam mais velhos,
sabiam ainda mais. Era por isso que nunca era considerado um crime, nos velhos tempos,
caçá-los e queimá-los. Compreende o que estou te dizendo, Fitz?
Abanei a cabeça e, quando ele franziu as sobrancelhas ao meu silêncio, eu me apressei em
acrescentar:
– Mas estou tentando. O que é a antiga Manha?
Bronco pareceu incrédulo e depois desconfiado.
– Garoto! – ameaçou-me, mas eu apenas olhei para ele. Um momento depois aceitou a
minha ignorância.