O Aprendiz De Assassino - Saga - Robin Hobb

27.02.2021 Views

manter a mente lúcida. Breu tinha me dado uma poção para limpar a cabeça dos vapores dovinho, mas não sabia de nenhuma para o fumo. Além disso, não estava habituado ao fumo.Encontrei um canto mais desanuviado e fiquei parado ali, parecendo enlevado pela canção domenestrel, mas na realidade observando Majestoso por cima do ombro.Majestoso sentava-se a uma mesa, flanqueado por dois queimadores de fumo feitos debronze. Augusto, muito reservado, sentava-se a uma certa distância dele. De tempos emtempos conversavam, Augusto sério e o príncipe desdenhoso. Não estava suficientementeperto para ouvir o que diziam, mas percebi o meu nome e “Talento” nos lábios de Augusto. ViKettricken se aproximar de Majestoso, e notei que ela evitava ficar diretamente em frente àcorrente de fumo. Majestoso falou com ela durante muito tempo, sorridente e lânguido, eestendeu o braço uma vez para tocar na mão dela e nos anéis de prata que usava. Parecia serum daqueles que o fumo tornava falante e exibido. Ela vacilava como um pássaro num ramo,ora aproximando-se dele e rindo, ora ficando mais longe e tornando-se mais formal. EntãoRurisk veio colocar-se atrás da irmã. Falou brevemente com Majestoso e a seguir tomou obraço de Kettricken e a levou. Severino apareceu e reabasteceu os queimadores de Majestoso.Majestoso lhe deu um sorriso idiota de agradecimento e disse qualquer coisa, indicando todoo salão com um aceno de mão. Severino riu e saiu. Pouco depois, Garrano e Bulho chegarampara falar com Majestoso. Augusto levantou-se e retirou-se, indignado. Majestoso lançou-lheum olhar furioso e mandou Garrano trazê-lo de volta. Augusto veio, mas não cortesmente.Majestoso o recriminou e Augusto fez cara feia, mas por fim baixou os olhos e concordou.Desejei desesperadamente estar perto o suficiente para ouvir o que era dito. Algo, senti,estava acontecendo. Talvez não tivesse nada a ver comigo e a minha tarefa. Mas, de algumamaneira, eu duvidava disso.Revi a minha pouco abundante coleção de fatos, tendo certeza de que o significado de algoestava me escapando. Mas também me perguntei se não estava enganando a mim mesmo.Talvez estivesse exagerando na reação a tudo. Talvez a forma mais segura de agir fossesimplesmente fazer o que Majestoso tinha me dito e deixá-lo assumir a responsabilidade. Outalvez devesse poupar tempo e cortar a minha própria garganta.Podia, claro, ir falar diretamente com Rurisk, dizer-lhe que, apesar dos meus melhoresesforços, Majestoso ainda o queria ver morto, e implorar por asilo político. Afinal, quem nãoconsideraria interessante um assassino treinado que já tinha traído um senhor?Poderia dizer a Majestoso que ia matar Rurisk e simplesmente não fazer. Penseicuidadosamente nessa opção.Poderia dizer a Majestoso que ia matar Rurisk e matar Majestoso em vez disso. O fumo,disse a mim mesmo. Apenas o fumo faz uma ideia dessas soar tão sensata.Poderia ir falar com Bronco e dizer-lhe que eu era, na verdade, um assassino e pedir a eleque me aconselhasse sobre a minha situação.Podia pegar a égua da Princesa e fugir para as montanhas.– Então, você está se divertindo? – perguntou-me Jonqui, pegando-me pelo braço.Percebi que eu estava olhando fixamente um homem que fazia malabarismos com facas etochas.– Lembrarei por muito tempo desta experiência – disse-lhe.E então sugeri um passeio ao ar fresco dos jardins.Mais tarde, nessa noite, compareci aos aposentos de Majestoso. Desta vez, era Bulho que

estava à porta, sorrindo agradavelmente.– Boa noite – ele me cumprimentou, e eu entrei como se fosse na caverna de um carcaju.Mas o ar dentro do quarto estava azul de fumo, e essa parecia ser a fonte da boa disposição deBulho. Majestoso me deixou esperando outra vez e, embora eu encostasse o queixo no peito erespirasse superficialmente, sabia que o fumo estava me afetando. Controle, lembrei para mimmesmo, e tentei não sentir a vertigem. Contorci-me no assento várias vezes e por fim recorri acobrir abertamente a boca e o nariz com a mão. Esse recurso teve pouco sucesso em filtrar ofumo.Olhei para cima quando o painel do quarto de dentro deslizou para o lado, mas era apenasSeverino. Olhou de relance para Bulho e veio sentar-se ao meu lado. Depois de um momentode silêncio, perguntei:– Majestoso vai me receber agora?Severino abanou a cabeça.– Ele está com uma... companhia. Mas confiou a mim toda a informação de que vocênecessita – abriu a mão sobre o banco entre nós para me mostrar um saco branco minúsculo. –Ele conseguiu isso para você. Ele tem certeza de que você estará de acordo. Um pouco disto,misturado com o vinho, causará a morte, mas não imediata. Não haverá sequer sintomas demorte durante várias semanas, e então virá como uma letargia que aumenta gradualmente. Ohomem não sofre – acrescentou, como se isso fosse a minha principal preocupação.Puxei na memória.– É goma de Quex?Tinha ouvido falar desse veneno, mas nunca o tinha visto. Se Majestoso tinha uma fonte,Breu com certeza ia querer saber.– Não sei o nome, nem isso importa. Apenas isto: o Príncipe Majestoso diz que você faráuso dele esta noite. Você terá de criar uma oportunidade.– O que ele espera de mim? Que eu vá até os aposentos do príncipe, bata à porta e entrecom um vinho envenenado nas mãos? Não é um pouco óbvio demais?– Feito dessa forma, claro que sim. Mas, com certeza, o seu treinamento te deu maissofisticação do que isso, não é?– O meu treinamento me diz que essas coisas não devem ser discutidas com um camareiro.Devo ouvir de Majestoso, ou não farei nada.Severino suspirou.– O meu mestre previu isso. Aqui está a mensagem dele. Pelo alfinete que você carrega epela insígnia no seu peito, ele te ordena. Se recusar, você estará recusando o seu rei. Terácometido traição, e ele garantirá que você seja enforcado por isso.– Mas eu...– Pegue isso e vá. Quanto mais esperar, mais tarde será, e mais estranha parecerá a suavisita aos aposentos dele.Severino levantou-se abruptamente e me deixou ali. Bulho estava sentado como um saponum canto, observando-me e sorrindo. Teria de matar os dois antes de voltar a Torre doCervo, para preservar a minha utilidade como assassino. Perguntei-me se eles sabiam disso.Retribuí o sorriso de Bulho, sentindo o fumo no fundo da garganta. Peguei o veneno e parti.Uma vez na base da escadaria de Majestoso, encostei-me à parede, onde havia maissombras, e escalei tão rápido quanto pude um dos apoios do apartamento de Majestoso.

manter a mente lúcida. Breu tinha me dado uma poção para limpar a cabeça dos vapores do

vinho, mas não sabia de nenhuma para o fumo. Além disso, não estava habituado ao fumo.

Encontrei um canto mais desanuviado e fiquei parado ali, parecendo enlevado pela canção do

menestrel, mas na realidade observando Majestoso por cima do ombro.

Majestoso sentava-se a uma mesa, flanqueado por dois queimadores de fumo feitos de

bronze. Augusto, muito reservado, sentava-se a uma certa distância dele. De tempos em

tempos conversavam, Augusto sério e o príncipe desdenhoso. Não estava suficientemente

perto para ouvir o que diziam, mas percebi o meu nome e “Talento” nos lábios de Augusto. Vi

Kettricken se aproximar de Majestoso, e notei que ela evitava ficar diretamente em frente à

corrente de fumo. Majestoso falou com ela durante muito tempo, sorridente e lânguido, e

estendeu o braço uma vez para tocar na mão dela e nos anéis de prata que usava. Parecia ser

um daqueles que o fumo tornava falante e exibido. Ela vacilava como um pássaro num ramo,

ora aproximando-se dele e rindo, ora ficando mais longe e tornando-se mais formal. Então

Rurisk veio colocar-se atrás da irmã. Falou brevemente com Majestoso e a seguir tomou o

braço de Kettricken e a levou. Severino apareceu e reabasteceu os queimadores de Majestoso.

Majestoso lhe deu um sorriso idiota de agradecimento e disse qualquer coisa, indicando todo

o salão com um aceno de mão. Severino riu e saiu. Pouco depois, Garrano e Bulho chegaram

para falar com Majestoso. Augusto levantou-se e retirou-se, indignado. Majestoso lançou-lhe

um olhar furioso e mandou Garrano trazê-lo de volta. Augusto veio, mas não cortesmente.

Majestoso o recriminou e Augusto fez cara feia, mas por fim baixou os olhos e concordou.

Desejei desesperadamente estar perto o suficiente para ouvir o que era dito. Algo, senti,

estava acontecendo. Talvez não tivesse nada a ver comigo e a minha tarefa. Mas, de alguma

maneira, eu duvidava disso.

Revi a minha pouco abundante coleção de fatos, tendo certeza de que o significado de algo

estava me escapando. Mas também me perguntei se não estava enganando a mim mesmo.

Talvez estivesse exagerando na reação a tudo. Talvez a forma mais segura de agir fosse

simplesmente fazer o que Majestoso tinha me dito e deixá-lo assumir a responsabilidade. Ou

talvez devesse poupar tempo e cortar a minha própria garganta.

Podia, claro, ir falar diretamente com Rurisk, dizer-lhe que, apesar dos meus melhores

esforços, Majestoso ainda o queria ver morto, e implorar por asilo político. Afinal, quem não

consideraria interessante um assassino treinado que já tinha traído um senhor?

Poderia dizer a Majestoso que ia matar Rurisk e simplesmente não fazer. Pensei

cuidadosamente nessa opção.

Poderia dizer a Majestoso que ia matar Rurisk e matar Majestoso em vez disso. O fumo,

disse a mim mesmo. Apenas o fumo faz uma ideia dessas soar tão sensata.

Poderia ir falar com Bronco e dizer-lhe que eu era, na verdade, um assassino e pedir a ele

que me aconselhasse sobre a minha situação.

Podia pegar a égua da Princesa e fugir para as montanhas.

– Então, você está se divertindo? – perguntou-me Jonqui, pegando-me pelo braço.

Percebi que eu estava olhando fixamente um homem que fazia malabarismos com facas e

tochas.

– Lembrarei por muito tempo desta experiência – disse-lhe.

E então sugeri um passeio ao ar fresco dos jardins.

Mais tarde, nessa noite, compareci aos aposentos de Majestoso. Desta vez, era Bulho que

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