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– Mas nem isso tudo serviu para fazer você parar. Você acreditou que eu era capaz de matar
um animal em que você usasse a Manha, mas isso não te impediu de continuar usando.
– Não vejo as coisas da mesma forma que você – comecei, mas ele abanou a cabeça.
– Estamos melhor longe um do outro, garoto. É melhor para nós dois. Não pode haver
desentendimentos quando não há nenhuma espécie de entendimento. Não poderei nunca
aprovar ou sequer ignorar o que você faz. Nunca. Venha falar comigo quando puder dizer que
não voltará a fazer isso. Acreditarei na sua palavra, pois você nunca quebrou uma promessa
que me fez. Mas, até lá, estamos melhor longe um do outro.
Deixou-me plantado diante do cercado e voltou para buscar os outros cavalos. Fiquei ali
durante muito tempo, sentindo-me enjoado e cansado, e não apenas por causa do veneno de
Kettricken. Mas voltei ao palácio, passeei pelo salão, falei com algumas pessoas, comi e até
suportei silenciosamente os sorrisos zombeteiros e triunfantes que Garrano lançou para mim.
O dia pareceu mais longo do que quaisquer outros dois dias juntos da minha vida anterior.
Se não fosse pelo estômago ardendo e borbulhando, eu o teria achado empolgante e
interessante. A tarde e o início da noite foram dedicados a torneios amigáveis de arco e
flecha, luta livre e maratonas. Jovens e velhos, homens e mulheres, todos participavam desses
torneios e parecia haver uma tradição montanhesa de que quem os ganhasse numa ocasião tão
auspiciosa desfrutaria de boa sorte o ano inteiro. Depois disso, houve mais comida, cantos e
danças, e um espetáculo semelhante a um teatro de marionetes, mas feito com sombras sobre
uma tela de seda. No momento em que as pessoas começaram a se retirar, eu estava mais do
que pronto para me enfiar na cama. Foi um alívio fechar o painel do quarto e me encontrar
finalmente sozinho. Estava no meio do processo de me ver livre daquela camisa irritante,
enquanto refletia no quão estranho aquele dia tinha sido, quando alguém bateu à minha porta.
Antes que eu pudesse falar alguma coisa, Severino deslizou o painel e esgueirou-se para
dentro do quarto.
– Majestoso exige a sua presença – disse-me.
– Agora? – perguntei.
– Por que outra razão ele me enviaria aqui agora? – Severino perguntou.
Cansado, voltei a vestir a camisa e o acompanhei para fora do quarto. Os aposentos de
Majestoso ficavam num nível mais alto no palácio. Não era realmente um segundo andar, mas
mais um terraço de madeira construído em um dos lados do Grande Salão. As paredes eram
painéis, e havia uma espécie de varanda de onde ele podia ver lá embaixo, antes de descer.
Esses quartos eram muito mais ricamente decorados. Alguns dos adornos eram obviamente
Chyurda, pássaros em cores vivas pintados em painéis de seda e estatuetas talhadas em âmbar.
Mas muitas das tapeçarias, estátuas e penduricalhos pareciam coisas que Majestoso tinha
adquirido para seu próprio prazer e conforto. Fiquei esperando na antessala enquanto ele
terminava o banho. No momento em que ele apareceu lentamente, vestindo uma camisola, eu
mal podia manter os olhos abertos.
– E então? – ele me perguntou.
Olhei para ele sem expressão.
– Você me chamou – eu o lembrei.
– Sim, realmente. Eu gostaria de saber por que isso foi necessário. Pensei que você tivesse
recebido treinamento para esse tipo de coisa. Quanto tempo você ia ficar à espera antes de vir
me apresentar um relatório?