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O Aprendiz De Assassino - Saga - Robin Hobb

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mais velas hoje à noite, e o que é que eu vou vender?

– As três dúzias que eu preparei esta manhã. Foi apenas para essa quantidade que você me

deixou pavio, velho bêbado! – Moli tinha se levantado e o confrontava bravamente, apesar

dos olhos cheios de lágrimas. – O que é que eu ia fazer? Queimar todo o combustível para

manter o sebo mole e aí, quando finalmente me desse mais pavios, não teria como aquecer a

caldeira?

O vento soprou forte, fazendo o homem cambalear. Veio junto uma baforada do seu cheiro.

Suor e cerveja, informou-me Narigudo sabiamente. Por um momento o homem pareceu

arrependido, mas então as dores da barriga e da cabeça latejante o endureceram. Abaixou-se

de repente e apanhou um galho esbranquiçado de madeira trazido pelo mar.

– Não fale assim comigo, sua fedelha insolente! Fica andando por aí com vagabundos,

fazendo sabe-se lá o quê! Roubando das grelhas de defumação outra vez, aposto, e me

envergonhando mais ainda! Você se atreve a fugir e por isso vai apanhar o dobro quando eu te

pegar!

Ela deve ter acreditado nele, pois apenas se encolheu enquanto ele avançava, primeiro

levantando os braços magros para proteger a cabeça e, depois, parecendo pensar melhor

nisso, escondendo apenas o rosto com as mãos. Eu fiquei ali, petrificado de horror, enquanto

Narigudo gania com o meu terror e fazia xixi nos meus pés. Ouvi o silvo da vara descendo.

Meu coração pulou para fora do meu peito, e eu empurrei o homem, uma força abrupta

saltando estranhamente da minha barriga.

Ele caiu, como tinha caído o homem do barril no dia anterior. Mas este homem tombou

agarrando-se ao peito, a sua arma de madeira rodopiando para longe, inofensivamente.

Estendeu-se na areia, um espasmo percorreu seu corpo todo e ficou quieto.

No instante seguinte, Moli abriu os olhos, encolhendo-se do golpe que ainda esperava. Viu

o pai inerte na praia rochosa e o espanto deixou seu rosto inexpressivo. Ela pulou na direção

dele, gritando:

– Papai, papai, você está bem? Por favor, não morra, desculpe-me por ser uma menina tão

má! Não morra, eu vou ser boazinha, eu prometo que vou ser boazinha.

Ignorando os joelhos ensanguentados, ajoelhou-se ao lado do pai, virando o rosto dele para

que não respirasse na areia, tentando em vão fazê-lo sentar-se.

– Ele ia te matar – eu disse a ela, tentando compreender a situação.

– Não. Ele me bate um pouco, quando eu sou má, mas nunca me mataria. E quando está

sóbrio e não está doente, chora e implora para que eu não seja má e que não o irrite. Devia ter

mais cuidado para não deixá-lo irritado. Oh, Novato, acho que ele está morto.

Eu próprio não tinha certeza, mas, naquele momento, ele soltou um gemido horrível e

entreabriu os olhos. O ataque que o tinha feito cair parecia ter passado. Confuso, aceitou as

autoacusações de Moli e a sua ajuda ansiosa, e até o meu auxílio relutante. Escorou-se em nós

dois, enquanto serpenteávamos o nosso caminho pela praia rochosa de chão irregular.

Narigudo nos seguia, ladrando e correndo em círculos à nossa volta.

As poucas pessoas que nos viram passar não prestaram atenção em nós. Imaginei que a

visão de Moli ajudando o pai de volta para casa não era estranha a nenhum deles. Ajudei-os

até a porta da pequena mercearia, com Moli pedindo desculpas em meio a soluços, a cada

passo do caminho. Deixei-os ali, e Narigudo e eu achamos o nosso caminho pelas ruas

tortuosas e uma estrada muito inclinada em direção à torre, observando a cada passo as

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