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– Não me traga nada. Não me faça nenhum favor. Tome o seu próprio rumo e seja o que
você quiser. Não quero ter mais nada a ver com você.
Falava para a parede. Na sua voz não havia nenhum sinal de piedade por nenhum de nós.
Olhei brevemente para trás ao deixar a enfermaria. Bronco não tinha se mexido, mas até as
suas costas pareciam mais velhas e menores.
Foi assim o meu retorno a Torre do Cervo. Era uma criatura diferente da criança
desamparada que tinha saído dali. Fizeram pouca festa por eu não estar morto, como havia
sido suposto. Não dei oportunidade a ninguém para fazer isso. Da cama de Bronco fui
diretamente para o meu quarto. Tomei banho e troquei de roupa. Dormi, mas não bem. Durante
o resto da Festa da Primavera, comi à noite, sozinho na cozinha. Escrevi um bilhete para o Rei
Sagaz, sugerindo que os Salteadores poderiam estar usando regularmente os poços de água em
Forja. Não me deu nenhuma resposta, e fiquei contente com isso. Não procurei entrar em
contato com mais ninguém.
Com muita pompa e cerimônia, Galeno apresentou o seu círculo completo ao rei. Um outro
além de mim tinha fracassado. Eu me envergonho agora por não conseguir lembrar o seu nome,
e, se alguma vez soube o que aconteceu com ele, já me esqueci. Como Galeno, suponho que o
deixei de lado, considerando-o insignificante.
Galeno falou comigo apenas uma vez até o fim daquele verão, e indi-retamente. Passamos
um pelo outro no terraço, pouco depois da Festa da Primavera. Ele ia andando e conversando
com Majestoso. Quando passaram por mim, olhou-me por cima da cabeça de Majestoso e
disse em tom de piada:
– Mais vidas que um gato.
Parei e olhei para eles até que ambos fossem forçados a olhar para mim. Fiz Galeno encarar
os meus olhos; então sorri e assenti com a cabeça. Nunca confrontei Galeno sobre a sua
tentativa de me enviar direto para a morte. Depois disso, parecia nunca me ver; seus olhos
passavam deslizando sobre mim, e ele deixava o ambiente assim que eu entrava.
Parecia que eu tinha perdido tudo ao perder Ferreirinho. Ou talvez, na minha amargura, eu
tenha me empenhado em destruir o pouco que me restava. Perambulei amuado pela torre
durante semanas, insultando qualquer um que fosse suficientemente tolo para falar comigo. O
Bobo me evitava. Breu não me chamava. Vi Paciência três vezes. Das duas primeiras, fui até
ela porque me chamou. Fiz apenas o mínimo esforço para ser educado. Da terceira vez,
aborrecido com a tagarelice dela sobre as mudas de rosas, levantei-me e saí sem dizer nada.
Não voltou a me chamar.
Mas chegou um momento em que senti que precisava me aproximar de alguém. Ferreirinho
tinha deixado um grande vazio na minha vida. E não tinha esperado que o meu exílio do
estábulo fosse ser tão devastador quanto. Encontros ocasionais com Bronco eram
incrivelmente desconfortáveis, visto que ambos aprendemos dolorosamente a fingir que não
nos víamos.
Queria desesperadamente ir até Moli, para lhe contar as minhas desgraças, tudo o que tinha
acontecido comigo desde que tinha chegado pela primeira vez a Torre do Cervo. Imaginava
em detalhes como nos sentaríamos na praia enquanto eu falava, e como, quando eu terminasse,
ela não me julgaria ou tentaria me oferecer conselhos, mas apenas seguraria a minha mão na
sua e ficaria quieta a meu lado. Finalmente ela saberia tudo, e não teria mais de esconder tanta
coisa dela. Não ousei imaginar nada além daquilo. Desejava desesperadamente fazer isso, e