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era carregada pelo vento. Logo fiquei ensopado. Tentei sincronizar os movimentos com o
bater das ondas, para esconder os meus pequenos sons nos seus. As pedras estavam cheias de
cracas, e a areia entrava nos cortes que elas faziam em minhas mãos e joelhos. O cajado tinha
se tornado um fardo incrível, mas me recusava a abandonar a minha única arma. Muito depois
de já não poder ver ou ouvir os salteadores, continuava, sem ousar me levantar, rastejando e
me movendo de uma pedra a um pedaço de madeira. Por fim, aventurei-me a subir até a
estrada e continuei rastejando sobre ela. Quando alcancei a sombra de um armazém em ruínas,
eu me levantei, abraçado à parede, e perscrutei a escuridão ao meu redor.
Tudo estava silencioso. Ousei dar dois passos rumo à estrada, mas mesmo ali não podia ver
nem o barco nem as sentinelas. Talvez isso quisesse dizer que eles também não podiam me
ver. Inspirei fundo para me acalmar. Sondei em busca de Ferreirinho da mesma forma que
alguns homens apalpam os bolsos para ter certeza de que as suas moedas estão seguras.
Encontrei-o, fraco e quieto, a sua mente como uma poça silenciosa. “Estou a caminho”,
sussurrei, com medo de agitá-lo. E me coloquei outra vez na estrada.
O vento era impiedoso, e as minhas roupas molhadas de água salgada colavam-se no meu
corpo e esfolavam a minha pele. Estava esfomeado, com frio e cansado. Meus sapatos úmidos
estavam em petição de miséria. Mas não me passava pela cabeça parar. Corri como um lobo,
os olhos continuamente mudando de foco, os ouvidos em estado de alerta para qualquer som.
Num momento, a estrada estava vazia e escura atrás de mim. No momento seguinte, a
escuridão tinha se transformado em homens. Dois diante de mim e, quando me virei, um atrás.
O bater das ondas tinha acobertado o som dos seus passos, e a lua esquiva não tinha me
oferecido mais do que vislumbres deles enquanto fechavam o cerco à minha volta. Coloquei
as costas contra a parede sólida de um armazém, coloquei o meu cajado em posição de ataque
e esperei.
Observei-os vir, silenciosos e furtivos. Aquela atitude me intrigou. Por que razão não
haviam gritado pelos outros, por que razão a tripulação toda do navio não tinha vindo
observar a minha captura? Mas esses homens observavam tanto uns aos outros como me
observavam. Não caçavam como um bando, mas cada um esperava que os outros morressem
na tentativa de me matar e deixassem os restos para ele. Não eram Salteadores, eram
Forjados.
Uma frieza terrível irrompeu em mim. O menor ruído de uma briga traria os Salteadores,
disso eu estava seguro. Portanto, se os Forjados não acabassem comigo, os Salteadores
dariam um jeito nisso. Mas quando todos os caminhos levam à morte certa, não há qualquer
razão para desatar a correr por qualquer um deles. Resolvi tratar dos problemas à medida que
viessem. Eram três.
Um tinha uma faca. Mas eu tinha um cajado e treino no seu uso. Eram magros, esfarrapados,
pelo menos tão esfomeados quanto eu, e igualmente congelados. Um, penso, era a mulher da
noite anterior. À medida que se aproximavam de mim, muito silenciosos, suspeitei que
estivessem cientes da presença dos salteadores e que estes os atemorizassem tanto quanto a
mim. Não era bom considerar o desespero que os incitaria a me atacar nessas condições. Mas
no meu fôlego seguinte lembrei que os Forjados provavelmente não sentiam nem desespero,
nem nenhuma outra coisa. Talvez estivessem entorpecidos demais para perceberem o perigo.
Todo o conhecimento secreto e misterioso que Breu tinha me transmitido e todas as
estratégias brutais e elegantes para lutar com dois ou mais oponentes de Hode foram levados