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A maioria das pessoas que passavam continuou indo e vindo, sem deixar mais que um olhar
curioso ao garotinho de seis anos sentado contra o muro, mas a pergunta do homem do barril
era evidentemente de grande interesse, porque mais do que umas poucas cabeças se viraram, e
vários comerciantes que acabavam de sair da cozinha se aproximaram para ouvir a resposta.
Resposta essa que eu não tinha. Minha mãe era a minha mãe e o que quer que eu soubesse
sobre ela começava já a se desvanecer da minha memória. Portanto, não respondi, e apenas
olhei para ele.
– Ei! Qual é o seu nome então, menino? – e virando-se para o seu público, falou em
segredo: – Ouvi dizer que ele não tem nome. Nenhum grandioso nome real para moldá-lo, nem
mesmo um nomezinho qualquer para insultá-lo. É verdade isso, garoto? Ou tem um nome?
O grupo de espectadores crescia. Alguns mostravam compaixão nos olhos, mas ninguém
interferiu. Um pouco do que eu estava sentindo passou para o Narigudo, que se deixou cair de
lado e mostrou a barriga em súplica enquanto batia a cauda, naquele velho sinal canino que
quer dizer: “Sou apenas um cãozinho. Não posso me defender. Tenha piedade”. Tivessem eles
sido cães, teriam me farejado, afastando-se a seguir, mas os humanos não têm dessas cortesias
inatas. E assim, quando não respondi, o homem aproximou-se mais, deu um passo à frente, e
repetiu:
– Você tem nome, garoto?
Levantei-me lentamente, e o muro, que tinha sido quente contra as minhas costas apenas um
momento atrás, era agora uma barreira gelada que impedia minha retirada. Aos meus pés,
Narigudo contorceu-se de costas na poeira e soltou um gemido suplicante.
– Não – eu disse suavemente, e quando o homem começou a se debruçar para ouvir as
minhas palavras, gritei: – Não! – e o repeli, enquanto me movia de lado pelo muro, como um
caranguejo.
Vi-o cambalear um passo para trás, largando o seu barril, que caiu na rua pavimentada e
rachou-se. Ninguém na multidão conseguiu compreender o que tinha acabado de acontecer. Eu,
com certeza, não. A maior parte das pessoas riu ao ver um homem-feito encolher-se de medo
diante de uma criança. Nesse momento minha reputação de temperamento e atitude tornou-se
conhecida porque, antes que a noite caísse, a história do bastardo confrontando seu
atormentador já tinha se espalhado por toda a cidade. Narigudo levantou-se e fugiu comigo. Vi
de relance a cara de Garrano, tensa e confusa quando emergiu da cozinha, tortas nas mãos, e
viu Narigudo e eu fugindo. Se fosse Bronco, eu provavelmente teria parado e lhe confiado a
minha segurança. Mas não era, e por isso eu corri, deixando Narigudo tomar a liderança.
Fugimos em meio ao bando de criados, apenas mais um garotinho e o seu cão correndo pelo
pátio, e Narigudo levou-me para o que ele obviamente considerava o lugar mais seguro do
mundo. Longe da cozinha e da torre central, Raposa havia cavado um buraco no chão, no canto
de uma construção anexa que parecia prestes a desmoronar, onde sacos de ervilhas e feijões
eram armazenados. Aqui tinha nascido Narigudo, totalmente contra a vontade de Bronco, e
aqui Raposa tinha conseguido manter sua cria escondida durante pelo menos três dias. O
próprio Bronco a tinha encontrado aqui. O cheiro dele era o primeiro cheiro humano de que
Narigudo conseguia se lembrar. O buraco que dava acesso ao espaço debaixo da construção
era extremamente apertado, mas, uma vez lá dentro, o esconderijo era quente, seco e mal
iluminado. Narigudo aconchegou-se a mim, e eu pus o braço em volta dele. Escondidos ali, os
nossos corações logo acalmaram os batimentos descontrolados, e de inquietos passamos a um