27.02.2021 Views

O Aprendiz De Assassino - Saga - Robin Hobb

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

o autocontrole. Naquele instante, os pequenos sons que mesmo uma embarcação furtiva tem de

fazer chegaram até mim, suaves, mas distintos, através da água. Um homem pigarreou, um

remo chacoalhou na toleteira, algo pesado bateu no convés. Esperei por um grito ou comando

que revelasse que eu tinha sido visto, mas não aconteceu nada. Ergui a cabeça cautelosamente,

olhando através das raízes esbranquiçadas de um dos troncos de madeira flutuantes. Tudo

estava quieto, com exceção do navio que ia se aproximando à medida que os remadores o

traziam para o porto. Os remos se erguiam e caíam num movimento único, quase silencioso.

Pouco depois, pude ouvi-los falando numa língua parecida com a nossa, mas pronunciada

de uma forma tão áspera que podia apenas discernir o significado de algumas palavras com

grande dificuldade. Um homem saltou para fora do barco com uma corda na mão e patinhou

até a margem. Prendeu o navio à costa, a não mais que uma distância de dois navios do lugar

onde eu me escondia entre os rochedos e os pedaços de madeira. Outros dois saltaram para

fora, com facas nas mãos, e escalaram o quebra-mar. Correram pela estrada em direções

opostas, para assumir posições de sentinela. Um se colocou quase diretamente acima de mim.

Fiquei bem encolhido e quieto. Agarrei-me mentalmente a Ferreirinho na mente, da mesma

forma que uma criança se agarra a um brinquedo favorito como proteção contra pesadelos.

Precisava voltar para casa e para ele; portanto, não podia ser descoberto. O conhecimento de

que eu tinha de fazer a primeira dessas coisas, de alguma maneira, fazia a segunda parecer

mais possível.

Os homens saíam apressadamente do navio. Tudo neles indicava familiaridade. Não

conseguia compreender por que eles tinham aportado aqui até que os vi descarregar tonéis de

água vazios. Os tonéis foram transportados ocos, rolando pela estrada sobre o quebra-mar, e

lembrei-me do poço pelo qual tinha passado antes. A parte da minha mente que pertencia a

Breu notou o quão bem conheciam Forja, para aportar quase exatamente em frente àquele

poço. Não era a primeira vez que esse navio tinha parado aqui para se abastecer de água.

“Envenene o poço antes de partir”, sugeriu para mim aquele pedacinho da minha cabeça. Mas

eu não tinha as provisões necessárias para nada do gênero, nem coragem para fazer o que quer

que fosse, a não ser me manter escondido.

Outros tripulantes emergiram e começaram a andar, esticando as pernas. Ouvi uma

discussão entre uma mulher e um homem. Este desejava permissão para acender uma fogueira

com um pouco da madeira flutuante encostada nos quebra-mares e assar carne. Ela o proibiu,

dizendo que não estavam suficientemente longe ainda, e que o fogo seria visível demais.

Compreendi que tinham executado um ataque recentemente, para ter carne fresca, e não muito

longe daqui. Ela lhe deu permissão para outra coisa que não consegui entender muito bem, até

que os vi descarregar dois barris cheios. Outro homem veio à costa com uma peça inteira de

presunto no ombro, e a jogou sobre um dos tonéis colocados em pé. Desembainhou uma faca e

começou a cortar pedaços de presunto, enquanto um dos seus companheiros abria o outro

barril. Iam ficar por um tempo. E se decidissem fazer uma fogueira, ou se ficassem até o

amanhecer, a sombra do meu tronco de madeira não me serviria de esconderijo. Tinha de sair

dali depressa.

Através de ninhos de pulga-do-mar e montes disformes de algas, por baixo e entre troncos e

pedras, fui me arrastando através da areia e do saibro. Juro que todas as raízes pontudas se

engancharam em mim e que todas as placas soltas de pedra bloquearam o meu caminho. A

maré tinha mudado. As ondas batiam barulhentas contra as rochas, e a espuma de água salgada

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!