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caminhada de volta a Torre do Cervo. Apenas um tolo imaginaria que os Forjados ainda
representavam algum tipo de problema. O inverno com certeza tinha acabado com eles, ou os
tinha deixado muito esfomeados e enfraquecidos para ameaçarem quem quer que fosse. Eu não
dava nenhuma credibilidade aos relatos que as pessoas faziam deles, de que se juntavam em
grupos de degoladores e ladrões. Não estava assustado. Queria apenas ver onde eu estava. Se
Galeno quisesse me contactar de verdade, o lugar onde eu estava não deveria ser um
impedimento. Ele tinha nos assegurado inúmeras vezes que era a pessoa que ele sondava, e
não o lugar. Da mesma forma que ele podia me encontrar na praia, podia no topo do monte.
No fim da tarde, eu estava no topo das falésias rochosas, olhando o mar. Podia ver a Ilha da
Armação e um nevoeiro depois dela que devia ser a Ilha do Linho. Estava a norte de Forja. A
estrada costeira que levava para casa era pela direita, atravessando as ruínas dessa vila. Não
era um pensamento reconfortante.
O que fazer, agora?
Ao cair da noite, estava de volta ao topo do meu monte, deitado entre duas rochas grandes.
Tinha percebido que era um lugar tão bom para esperar quanto outro qualquer. Apesar das
minhas dúvidas, ia continuar esperando onde eu tinha sido deixado até que o tempo para o
contato tivesse terminado. Comi pão e peixe salgado e bebi água comedidamente. A minha
muda de roupas incluía uma segunda capa. Eu me envolvi nela e expulsei todos os
pensamentos de fazer uma fogueira. Por menor que fosse, teria sido um chamariz para quem
quer que passasse ao lado do monte, pela estrada de terra batida.
Acho que não existe nada mais cruelmente entediante que o nervosismo ininterrupto. Tentei
meditar e abrir-me para o Talento de Galeno, constantemente tremendo de frio e recusando-me
a admitir que estava com medo. A criança em mim continuava a imaginar figuras sombrias e
esfarrapadas rastejando silenciosamente pelo monte acima e em volta de mim, gente Forjada
que me espancaria e mataria para obter a capa que eu usava e a comida que eu trazia na bolsa.
Tinha preparado um cajado ao fazer o caminho de volta à encosta do monte, e eu o segurava
com as duas mãos, mas me parecia uma arma fraca. Às vezes cochilava, apesar dos meus
medos, mas os sonhos que vinham eram sempre de Galeno se regozijando com o meu fracasso,
enquanto Forjados me encurralavam, e acordava sempre num sobressalto, inspecionando
freneticamente o espaço em volta de mim, para ver se os pesadelos tinham se tornado
realidade.
Assisti ao nascer do sol através das árvores e tirei cochilos irregulares a manhã toda. A
tarde me trouxe uma espécie de paz desgastada. Eu me distraí sondando ao redor a vida
selvagem do monte. Ratos e pássaros eram pouco mais do que brilhantes faíscas de fome na
minha mente, e os coelhos pouco mais do que isso, mas havia uma raposa no cio à procura de
companheiro e, mais longe, um cervo batia a pele aveludada nos seus cornos com tanto
propósito quanto um ferreiro na bigorna. O pôr do sol foi muito longo. Surpreendeu-me como
foi difícil aceitar, à medida que a noite caía, que eu não tinha sentido nada, nem a mais leve
pressão do Talento. Ou ele não tinha me chamado, ou eu não tinha ouvido. Comi pão e peixe
no escuro e disse a mim mesmo que aquilo não importava. Por algum tempo, tentei me encher
de raiva, mas o meu desespero era uma coisa muito viscosa e escura para as chamas da ira
conseguirem vingar sobre ele. Tive certeza de que Galeno tinha me enganado, mas nunca seria
capaz de provar isso, nem sequer a mim mesmo. Eu teria sempre de imaginar se o seu
desprezo por mim era justificado. Na escuridão total, apoiei as costas numa rocha, o cajado