O Aprendiz De Assassino - Saga - Robin Hobb

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rei tem uma lâmina valiosa ao seu propósito. Daqui a um dia, vou espalhar vocês pelo reino,como sementes ao vento. Preparei as coisas de modo que vocês sejam levados, por cavalosrápidos, aos seus destinos. E então cada um de vocês será deixado sozinho. Nenhum de vocêssaberá onde os outros estão.Fez uma pausa. Acho que para deixar que cada um de nós sentisse a tensão vibrando noambiente. Sabia que todos os outros vibravam em uníssono, partilhando a emoção, quase umaúnica mente, enquanto recebiam a sua instrução. Suspeitei que ouviam muito mais do quemeras palavras dos lábios de Galeno. Sentia-me um estrangeiro ali, ouvindo palavras numidioma que não conseguia compreender. Com certeza eu falharia.– Dois dias depois de serem deixados, serão chamados. Por mim. Eu os informarei comquem deverão entrar em contato e onde. Cada um receberá a informação de que necessita parafazer o seu caminho de volta para cá. Se tiverem aprendido, e aprendido bem, o meu círculoestará presente aqui na Noite de Primavera, pronto para ser apresentado ao rei.De novo fez uma pausa.– Não pensem, contudo, que tudo o que devem fazer é encontrar o caminho de volta a Torredo Cervo na ocasião da Noite de Primavera. Quero que vocês se tornem um círculo, e nãopombos-correios. A forma como vierem e em que companhia estiverem mostrarão se vocêsdominam o seu Talento. Estejam prontos para partir amanhã de manhã.Então nos mandou embora, um a um, mais uma vez dando um toque do Talento em cadaaluno, e uma palavra de elogio, com exceção de mim. Fiquei quieto diante dele, enquantoabria a mente o quanto podia, tão vulnerável quanto ousava estar, e contudo o toque doTalento era menos do que o do vento. Ele me encarou de cima enquanto eu o olhava por baixo,e não precisei do Talento para sentir que ele me odiava e desprezava. Fez um som de escárnioe olhou para o lado, liberando-me. Comecei a me afastar:– Muito melhor – disse ele, na sua peculiar voz cavernosa. – Teria sido muito melhor sevocê tivesse se jogado do muro naquela noite, bastardo. Muito melhor. Bronco pensou que eutinha te maltratado. Eu estava apenas te oferecendo uma escapatória, a coisa mais próxima deum caminho honrado que você alguma vez será capaz de achar. Vá embora e morra, garoto, oupelo menos vá embora. Você mancha o nome do seu pai por existir. Por Eda, não sei comovocê veio ao mundo. Que um homem como o seu pai pudesse descer tanto o nível a ponto dese deitar com uma coisa qualquer e deixar que você viesse ao mundo, isso vai além da minhacapacidade de imaginação.Como sempre, havia um tom de fanatismo na voz dele quando falava de Cavalaria, e os seusolhos se tornaram quase vazios com aquela idolatria cega por ele. Quase com a mente ausente,ele se virou e partiu. Chegou ao topo das escadas e deu meia-volta outra vez, muitolentamente.– Tenho de perguntar – disse ele, e o veneno na sua voz estava sedento de ódio. – Você é ocatamito dele, não é? É por isso que ele te deixa sugar a força dele? É por isso que ele é tãopossessivo em relação a você?– Catamito? – repeti, não conhecendo aquela palavra.Ele sorriu, fazendo o rosto cadavérico se parecer ainda mais com uma cabeça de caveira.– Você pensou que eu não iria descobri-lo? Pensou que poderia utilizar a força dele noteste? Não poderá. Esteja ciente disso, bastardo, não poderá.Virou-se e desceu as escadas, deixando-me ali sozinho no terraço. Não tinha ideia do que

as últimas palavras dele queriam dizer; mas a força do seu ódio tinha me deixado enjoado efraco, como se ele tivesse colocado um veneno no meu sangue. Aquilo me fez lembrar daúltima vez que ele tinha me deixado sozinho no topo daquela torre. Senti-me compelido aandar até o limiar e olhar para baixo. Aquele canto da torre não ficava em frente ao mar, mashavia muitas rochas pontiagudas lá embaixo. Ninguém sobreviveria a uma queda daquelas. Sepudesse tomar uma decisão firme que durasse apenas um segundo, eu me livraria de tudoaquilo. E seja lá o que Bronco ou Breu ou quem quer que fosse pudesse pensar, eu não teria deme preocupar mais com isso.Ouvi o eco distante de um ganido.– Já vou, Ferreirinho – balbuciei, e virei de costas para o precipício.

as últimas palavras dele queriam dizer; mas a força do seu ódio tinha me deixado enjoado e

fraco, como se ele tivesse colocado um veneno no meu sangue. Aquilo me fez lembrar da

última vez que ele tinha me deixado sozinho no topo daquela torre. Senti-me compelido a

andar até o limiar e olhar para baixo. Aquele canto da torre não ficava em frente ao mar, mas

havia muitas rochas pontiagudas lá embaixo. Ninguém sobreviveria a uma queda daquelas. Se

pudesse tomar uma decisão firme que durasse apenas um segundo, eu me livraria de tudo

aquilo. E seja lá o que Bronco ou Breu ou quem quer que fosse pudesse pensar, eu não teria de

me preocupar mais com isso.

Ouvi o eco distante de um ganido.

– Já vou, Ferreirinho – balbuciei, e virei de costas para o precipício.

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