27.02.2021 Views

O Aprendiz De Assassino - Saga - Robin Hobb

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

as prateleiras cheias de coisas na loja, para mostrar a ela o seu descontentamento por ela ter

sido negligente. Esboçou um estranho sorrisinho enquanto me dizia isso, como se o

comportamento dele se tornasse menos horrível caso conseguíssemos achá-lo divertido. Não

consegui sorrir, e ela desviou o olhar.

Ajudei-a a vestir a capa e partimos, subindo pela colina em direção contrária ao vento. De

repente, aquela situação me pareceu uma metáfora de toda a minha vida. À porta da loja, ela

me surpreendeu ao me dar um abraço e um beijo no canto do queixo, um abraço tão breve que

foi quase como se alguém esbarrasse em mim no mercado.

– Novato... – disse ela, e então: – Muito obrigada. Por compreender.

Então desapareceu para dentro da loja e fechou a porta atrás de si, deixando-me gelado e

perplexo. Tinha me agradecido por compreendê-la num momento em que eu me sentia mais

isolado do que nunca, dela e de todas as outras pessoas. Durante a subida de volta à torre,

Ferreirinho foi tagarelando sobre todos os perfumes que tinha cheirado nela e de como ela o

tinha coçado exatamente no lugar aonde ele nunca conseguia chegar, em frente às orelhas, e do

biscoito doce que ela tinha lhe dado para comer na casa de chá.

No meio da tarde, voltamos ao estábulo. Fiz alguns trabalhos e, em seguida, voltei ao quarto

de Bronco, onde Ferreirinho e eu adormecemos. Acordei com Bronco em pé ao meu lado, a

sobrancelha ligeiramente franzida.

– De pé, vamos dar uma olhada em você – ordenou.

Levantei-me devagar e fiquei imóvel enquanto ele examinava os meus ferimentos com as

mãos hábeis. Ficou contente com o estado da minha mão e me disse que não precisava mais

deixá-la imobilizada a partir de agora, mas que era para manter as ataduras em torno das

costelas e voltar toda noite para ajustá-las.

– E quanto ao resto das feridas, mantenha-as limpas e secas, e não coce as crostas. Se

alguma delas começar a inflamar, venha me ver.

Encheu um pequeno pote com um unguento que aliviava as dores musculares e o deu para

mim; deduzi que ele esperava que eu partisse.

Fiquei parado segurando o pequeno pote de medicamento. Uma tristeza terrível me invadiu,

e contudo não conseguia encontrar palavras para expressá-la. Bronco olhou para mim, franziu

a sobrancelha e virou as costas.

– Agora pare com isso – ele me ordenou, zangado.

– O quê? – perguntei.

– Às vezes você olha para mim com os olhos do meu senhor – disse com tranquilidade e,

em seguida, assumindo um tom tão severo quanto antes: – E, bem, você ia fazer o quê?

Esconder-se no estábulo para o resto da vida? Não. Você tem de voltar. Tem de voltar,

levantar a cabeça e fazer as suas refeições entre as pessoas da torre, dormir no seu próprio

quarto e viver a sua própria vida. Sim, e terminar essas suas malditas lições do Talento.

As primeiras ordens pareciam difíceis, mas a última, esta eu sabia bem que era impossível.

– Não posso – disse, não acreditando no quão estúpido ele era. – Galeno não me deixaria

voltar ao grupo. E, mesmo que deixasse, nunca poderia recuperar todas as lições que perdi. Já

falhei nisso, Bronco. Falhei e está feito, e preciso encontrar outra coisa para fazer. Gostaria

de aprender a cuidar dos falcões, por favor.

Eu me ouvi dizer essa última frase com alguma surpresa, pois na verdade aquilo nunca tinha

passado pela minha cabeça antes. A resposta de Bronco foi tão ou mais estranha.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!