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O Aprendiz De Assassino - Saga - Robin Hobb

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Serpenteou o seu caminho pelo meio de nós, sem nenhuma ordem específica. Como

estávamos muito afastados, não podíamos ver os rostos uns dos outros, nem agradava a

Galeno que os nossos olhos seguissem os seus movimentos. Portanto, ouvíamos apenas as

palavras breves e ríspidas dele, seguidas do exalar ofegante daquele que tinha acabado de ser

tocado. Para Serena, ele disse com desgosto:

– Abra-se ao toque, já te disse. Não se encolha como um cão que apanhou.

Por fim, chegou a minha vez. Ouvi as palavras dele e, como ele tinha nos aconselhado antes,

tentei me libertar de todas as minhas percepções sensoriais e me abrir apenas para ele. Senti o

toque da sua mente na minha, como cócegas suaves na testa. Mantive-me firme. Tornou-se

mais forte, um calor, uma luz, mas eu me recusei a me deixar levar. Senti Galeno dentro da

minha mente, olhando-me severamente, e, usando as técnicas de concentração que ele tinha nos

ensinado (imagine um balde da mais pura madeira branca e você mergulhando nele), consegui

me manter firme diante dele, esperando, consciente da atração do Talento, mas não cedendo a

ele. Três vezes o calor invadiu-me e três vezes me mantive firme diante dele. Então ele se

retirou. Com má vontade, fez um aceno com a cabeça, mas nos seus olhos, em vez de

aprovação, vi sinais de medo.

Aquele primeiro toque foi como a faísca que finalmente acende o pavio. Compreendi o que

era. Ainda não conseguia fazer aquilo, ainda não podia transmitir os meus pensamentos, mas

tinha um conhecimento que não cabia em palavras. Tinha capacidade para usar o Talento. E,

com esse conhecimento, a minha determinação se tornou mais forte, e não haveria nada, nada

que Galeno pudesse fazer para me impedir de aprendê-lo.

Penso que ele sabia disso, pois se virou contra mim nos dias que se seguiram com uma

crueldade que agora acho incrível. Ele me maltratou com palavras duras e golpes, mas nada

me fazia virar as costas. Golpeou-me uma vez na cara com o açoite. Deixou uma marca visível

em mim e, por acaso, aconteceu de eu entrar no salão de jantar e Bronco estar lá. Vi os olhos

dele se arregalarem. Eu o vi levantar-se da mesa, a mandíbula apertada de uma maneira que eu

conhecia muito bem, mas evitei o olhar dele baixando os olhos. Ficou em pé por um momento,

olhando raivoso para Galeno, que respondeu com um olhar de superioridade. Então, com os

punhos cerrados, Bronco virou as costas para ele e deixou o salão. Fiquei aliviado pois não

haveria um confronto. Mas, naquele momento, Galeno olhou para mim, e o triunfo que vi no

rosto dele gelou o meu coração. Eu era dele, e ele sabia disso.

Dor e vitória misturaram-se durante a semana que se seguiu. Ele nunca perdia uma

oportunidade de me humilhar. E, contudo, eu sabia que desempenhava com excelência cada

exercício que nos dava. Sentia os outros tentando sentir o toque do Talento dele, mas para

mim era tão simples quanto abrir os olhos. Vivi um momento de intenso medo. Ele tinha

entrado na minha mente e tinha me dado uma frase para repetir em voz alta.

– Sou um bastardo e mancho a honra do nome do meu pai – eu disse em voz alta,

calmamente.

E então ele falou outra vez dentro da minha mente. Você obtém a sua força de algum lugar,

bastardo. Isso não é o seu Talento. Pensou que eu não ia achar a fonte? Então desisti e fugi

ao toque, escondendo Ferreirinho dentro da mente. O sorriso dele mostrava todos os seus

dentes.

Nos dias que se seguiram, brincamos de esconde-esconde. Eu tinha de deixá-lo entrar na

minha mente para aprender a usar o Talento. Mas, mal o deixava entrar, eu pulava em brasa

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