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O Aprendiz De Assassino - Saga - Robin Hobb

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Eu estava faminto, com as mãos inchadas e vermelhas do frio, e com a boca tão seca que

não teria conseguido falar mesmo se quisesse. Os outros aparentavam estar mais ou menos na

mesma, embora alguns tivessem sofrido mais intensamente do que eu. Pelo menos eu estava

habituado a tarefas que levavam longas horas, muitas delas ao ar livre. Graça, cerca de um

ano mais velha do que eu, estava acostumada a ajudar a Dona Despachada com a costura. O

rosto redondo tinha se tornado mais branco que vermelho com o frio, e eu a ouvi falar alguma

coisa em segredo para Serena, que pegou na mão dela enquanto descíamos as escadas.

– Não teria sido tão ruim se ele tivesse nos dedicado pelo menos um momento de atenção –

respondeu Serena em segredo. Então tive a desagradável experiência de vê-las olhar de

relance para trás, receosas, verificando se Galeno tinha visto as duas falarem uma com a

outra.

O jantar dessa noite foi a mais triste refeição que alguma vez eu tinha suportado em Torre

do Cervo. Foi servida para nós uma papa fria de grão cozido, pão, água e nabos cozidos e

amassados. Galeno, sem comer, sentou-se à cabeceira da nossa mesa. Não houve conversas.

Penso que nem sequer olhamos uns para os outros. Comi as porções que foram designadas

para mim e deixei a mesa quase tão esfomeado como quando tinha chegado.

Na metade do caminho de volta ao quarto, lembrei-me de Ferreirinho. Voltei à cozinha para

buscar os ossos e restos que Tempero guardou para mim, e uma jarra de água para reabastecer

a tigela dele. Pareceram um terrível fardo para mim enquanto subia as escadas. Achei estranho

que um dia de relativa inatividade, lá fora no frio, tivesse me cansado tanto quanto um dia de

trabalho pesado.

Assim que cheguei ao quarto, o cumprimento acolhedor de Ferreirinho e o seu consumo

ávido da carne foram como uma cura milagrosa. Logo que acabou de comer, nós nos

aninhamos na cama. Ele queria me morder e lutar comigo, mas desistiu depressa. Deixei o

sono tomar conta de mim.

Acordei, como se tivesse sido atingido por um relâmpago, no meio da escuridão, receoso

de ter dormido demais. Um olhar rápido para o céu me informou que eu conseguiria vencer o

sol numa corrida para o topo da torre, mas por pouco. Não tinha tempo de me lavar ou comer

ou limpar o quarto, e ainda bem que Galeno tinha proibido sapatos ou meias, pois também não

tinha tempo de calçar os meus. Estava cansado demais para até mesmo me sentir um idiota ao

correr pelo terreiro e pelas escadas acima, para a torre. Podia ver os outros correndo na

minha frente debaixo da luz trêmula da tocha, e, quando emergi da escadaria, o açoite de

Galeno desceu sobre minhas costas.

Atingiu-me com uma precisão inesperada através da camisa fina. Gritei tanto de surpresa

quanto de dor.

– Fique em pé como um homem e tenha domínio sobre si mesmo, bastardo – disse-me

Galeno duramente e me bateu outra vez com o açoite.

Os outros tinham voltado aos seus lugares do dia anterior. Pareciam tão desgastados quanto

eu, e a maior parte também parecia tão chocada quanto eu pela forma como Galeno tinha me

tratado. Até hoje não sei o porquê, mas fui silenciosamente para o meu lugar e fiquei ali,

encarando Galeno.

– Quem quer que chegue em último lugar estará atrasado e será tratado assim – avisou-nos.

Aquilo me pareceu ser uma regra cruel, pois a única maneira de evitar o açoite no dia

seguinte seria chegar suficientemente cedo para vê-lo açoitar um dos meus companheiros.

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