O Aprendiz De Assassino - Saga - Robin Hobb
que eu batesse, e ali estava eu, os dedos ainda sujos de tinta e as folhas úmidas na mão.Estava sem palavras quando Paciência irritadamente me disse para entrar, que já estavaatrasado demais. Eu me empoleirei na beirada de uma cadeira onde jaziam uma capaamarrotada e um trabalho de costura inacabado. Coloquei as pinturas ao meu lado, sobre umapilha de tábuas.– Eu acho que você poderia aprender a recitar um verso, se quisesse – observou comalguma aspereza. – E, portanto, poderia aprender a compor versos, se quisesse. Ritmo e metronão são mais que... isso é o cãozinho?– É o que pretende ser – balbuciei, e não consigo me lembrar de ter me sentido maisterrivelmente acanhado em toda a minha vida.Ela ergueu as folhas com cuidado e as examinou uma a uma, segurando-as primeiro de pertoe depois com o braço esticado. Fitou por mais um tempo a pintura embaçada.– Quem fez estas pinturas? – perguntou, por fim. – Não que seja desculpa para você estaratrasado. Mas eu podia achar bom uso para alguém que consegue pôr no papel o que os olhosveem, com cores tão verdadeiras. Esse é o problema de todos os herbanários que tenho. Todasas ervas são pintadas com o mesmo verde, não importa que sejam cinzentas ou cor-de-rosaquando crescem. Tábuas assim são inúteis se você está tentando aprender com elas...– Suspeito que ele próprio pintou o cãozinho, senhora – interrompeu Renda com bondade.– E o papel, é melhor do que eu tive que... – Paciência parou de repente. – Você, Tomás? –(E acho que essa foi a primeira vez em que se lembrou de usar o nome que tinha atribuído amim.) – Você pinta assim?Consegui fazer um gesto que sim diante do seu olhar incrédulo. Levantou outra vez asimagens.– Seu pai não era capaz de desenhar uma linha curva, exceto num mapa. Sua mãe sabiadesenhar?– Não tenho memórias dela, senhora.A resposta foi seca. Não conseguia me lembrar de ninguém que tivesse tido a coragem deme perguntar uma coisa dessas.– O quê, nenhuma? Mas você tinha cinco anos de idade. Você deve se lembrar de algumacoisa: a cor do cabelo, a voz, do que ela te chamava...Será que estava sentindo na sua voz uma ânsia dolorosa, uma curiosidade que quase nãosuportava satisfazer?Quase, por um momento, eu me lembrei. Um cheiro de menta ou era... tinha passado.– Nada, senhora. Se ela tivesse querido que eu me lembrasse dela, teria ficado comigo,suponho.Fechei o coração. Com certeza eu não devia nenhuma lembrança à mãe que havia merejeitado e que nunca tinha procurado por mim desde que tínhamos nos separado.– Bem. – Creio que pela primeira vez Paciência percebeu que tinha levado a conversa parauma área difícil. Fitou o dia cinzento pela janela. – Alguém te ensinou bem – observou derepente, com bastante entusiasmo.– Penacarriço – falei, e como ela não disse nada, acrescentei: – O escriba da corte, sabe?Gostaria que eu fosse seu aprendiz. As minhas letras lhe agradam e agora ele me ensina acopiar as imagens. Quando temos tempo. Estou muitas vezes ocupado, e ele se ausenta comfrequência, nas suas buscas por novos juncos para fazer papel.
– Juncos para fazer papel? – perguntou ela distraidamente.– Ele usa um papel especial. Tinha várias resmas dele, mas aos poucos as gastou. Obteve-ode um mercador, que o tinha obtido de outro, e esse por sua vez de outro, e, portanto, não sabede onde veio. Mas, pelo que lhe foi dito, era feito de juncos esmagados. Esse papel é de umaqualidade muito melhor do que qualquer um dos que fazemos: é fino, flexível e não estragatanto com o tempo, e, apesar disso, recebe bem a tinta, sem encharcá-la de modo que os cantosdas runas borrem. Penacarriço diz que, se pudéssemos duplicá-lo, muita coisa mudaria. Comum papel resistente e de boa qualidade, qualquer um poderia ter uma cópia de qualquer tábuade saber da torre. Se o papel fosse mais barato, mais crianças poderiam ser ensinadas a ler eescrever, diz ele. Não percebo por que é tão...– Não sabia que havia alguém aqui que partilhava do meu interesse – uma animação súbitailuminou o rosto da dama. – Tentou papel feito de raízes de lírio esmagadas? Tive algumsucesso com isso. E também com papel que você cria trançando e depois umedecendo eprensando folhas feitas de fios de casca da árvore de quinu. É forte e flexível, mas asuperfície deixa muito a desejar. Ao passo que este papel...Olhou outra vez de relance para as folhas que segurava na mão e ficou silenciosa. Entãoperguntou hesitantemente:– Você gosta tanto assim deste cãozinho?– Sim – disse simplesmente, e os nossos olhos se encontraram de repente.Fitou-me da mesma forma distraída com que olhava frequentemente pela janela. De repente,seus olhos se encheram de lágrimas.– Às vezes, você é tão parecido com ele que... – a voz dela se perdeu. – Devia ter sidomeu! Não é justo, devia ter sido meu!Gritou as palavras com tanta ferocidade que pensei que me atacaria. Em vez disso, elasaltou sobre mim e apertou-me num abraço, ao mesmo tempo pisando no cão e deixando cairum vaso de plantas. O cão saltou para trás com um ganido, o vaso se espatifou no chão,lançando água e estilhaços em todas as direções, enquanto a testa da senhora me acertou comforça no queixo, de forma que por um momento tudo o que vi foram estrelas. Antes quepudesse reagir, largou-me e saiu correndo para o quarto de dormir com um grito que lembravaum gato escaldado, batendo a porta atrás de si. E, durante todo esse tempo, Renda continuouentretida com o seu bordado.– Ela tem isso, às vezes – observou com bondade e acenou-me com a cabeça na direção daporta. – Volte amanhã – lembrou-me e acrescentou: – Sabe, a Dama Paciência está ficandobastante apegada a você.
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que eu batesse, e ali estava eu, os dedos ainda sujos de tinta e as folhas úmidas na mão.
Estava sem palavras quando Paciência irritadamente me disse para entrar, que já estava
atrasado demais. Eu me empoleirei na beirada de uma cadeira onde jaziam uma capa
amarrotada e um trabalho de costura inacabado. Coloquei as pinturas ao meu lado, sobre uma
pilha de tábuas.
– Eu acho que você poderia aprender a recitar um verso, se quisesse – observou com
alguma aspereza. – E, portanto, poderia aprender a compor versos, se quisesse. Ritmo e metro
não são mais que... isso é o cãozinho?
– É o que pretende ser – balbuciei, e não consigo me lembrar de ter me sentido mais
terrivelmente acanhado em toda a minha vida.
Ela ergueu as folhas com cuidado e as examinou uma a uma, segurando-as primeiro de perto
e depois com o braço esticado. Fitou por mais um tempo a pintura embaçada.
– Quem fez estas pinturas? – perguntou, por fim. – Não que seja desculpa para você estar
atrasado. Mas eu podia achar bom uso para alguém que consegue pôr no papel o que os olhos
veem, com cores tão verdadeiras. Esse é o problema de todos os herbanários que tenho. Todas
as ervas são pintadas com o mesmo verde, não importa que sejam cinzentas ou cor-de-rosa
quando crescem. Tábuas assim são inúteis se você está tentando aprender com elas...
– Suspeito que ele próprio pintou o cãozinho, senhora – interrompeu Renda com bondade.
– E o papel, é melhor do que eu tive que... – Paciência parou de repente. – Você, Tomás? –
(E acho que essa foi a primeira vez em que se lembrou de usar o nome que tinha atribuído a
mim.) – Você pinta assim?
Consegui fazer um gesto que sim diante do seu olhar incrédulo. Levantou outra vez as
imagens.
– Seu pai não era capaz de desenhar uma linha curva, exceto num mapa. Sua mãe sabia
desenhar?
– Não tenho memórias dela, senhora.
A resposta foi seca. Não conseguia me lembrar de ninguém que tivesse tido a coragem de
me perguntar uma coisa dessas.
– O quê, nenhuma? Mas você tinha cinco anos de idade. Você deve se lembrar de alguma
coisa: a cor do cabelo, a voz, do que ela te chamava...
Será que estava sentindo na sua voz uma ânsia dolorosa, uma curiosidade que quase não
suportava satisfazer?
Quase, por um momento, eu me lembrei. Um cheiro de menta ou era... tinha passado.
– Nada, senhora. Se ela tivesse querido que eu me lembrasse dela, teria ficado comigo,
suponho.
Fechei o coração. Com certeza eu não devia nenhuma lembrança à mãe que havia me
rejeitado e que nunca tinha procurado por mim desde que tínhamos nos separado.
– Bem. – Creio que pela primeira vez Paciência percebeu que tinha levado a conversa para
uma área difícil. Fitou o dia cinzento pela janela. – Alguém te ensinou bem – observou de
repente, com bastante entusiasmo.
– Penacarriço – falei, e como ela não disse nada, acrescentei: – O escriba da corte, sabe?
Gostaria que eu fosse seu aprendiz. As minhas letras lhe agradam e agora ele me ensina a
copiar as imagens. Quando temos tempo. Estou muitas vezes ocupado, e ele se ausenta com
frequência, nas suas buscas por novos juncos para fazer papel.