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penso que ela se arrepende de muita coisa e está tentando compensar o tempo perdido, algo
que nunca funciona. Você vai ter de reduzir o seu treino de armas. E Bronco vai ter de achar
outro rapaz para o estábulo.
Eu não me importava com o treino de armas. Como Breu tinha me feito notar com
frequência, um bom assassino trabalha de perto e silenciosamente. Se eu aprendesse bem a
minha profissão, não ficaria manejando espadas longas contra ninguém. Mas o tempo que
costumava passar com Bronco... mais uma vez tive a sensação estranha de não saber o que
sentia. Odiava Bronco. Às vezes. Ele era dominador, ditatorial e insensível. Esperava que eu
fosse perfeito e, contudo, dizia-me sem rodeios que eu nunca devia esperar nenhuma
recompensa por isso, mas também era aberto e direto, e acreditava que eu podia ser bemsucedido
naquilo que ele exigia de mim...
– Você provavelmente está pensando que vantagem é que ela nos trouxe – Breu continuava,
sem se dar conta do meu conflito interno. Reconheci uma empolgação suprimida na voz dele. –
É algo que já tentei conseguir para você duas vezes, e duas vezes recusaram. Mas Paciência
teimou e teimou até que ele se rendeu. É o Talento, garoto. Você vai ser treinado para o
Talento.
– O Talento – repeti, sem nenhuma ideia do que estava dizendo. Era tudo muito rápido para
mim.
– Sim.
Tentei organizar os meus pensamentos.
– Bronco me falou disso uma vez. Há muito tempo.
Abruptamente, lembrei-me do contexto dessa conversa. Depois de Narigudo ter nos
entregado acidentalmente. Falava disso como o oposto do que quer que fosse o sentido que eu
partilhava com os animais. O mesmo sentido que tinha me revelado a mudança no povo de
Forja. Será que treinar um me libertaria do outro? Ou seria uma privação? Pensei na
familiaridade que partilhava com cavalos e cães quando sabia que Bronco não estava por
perto. Lembrava-me de Narigudo, numa mistura de comoção e sofrimento. Nunca tinha estado
tão perto, antes ou depois, de outra criatura viva. Será que este novo treino para o Talento iria
me privar disso?
– Qual é o problema, garoto? – a voz de Breu era gentil, mas preocupada.
– Não sei – hesitei. Mas nem mesmo a Breu eu ousava revelar o meu medo. Ou a minha
mácula. – Nada.
– Você tem ouvido os relatos antigos sobre o treino – tentou adivinhar, completamente
errado. – Ouça, garoto, não pode ser assim tão ruim. Cavalaria passou por isso. E Veracidade
também. E, com a ameaça dos Navios Vermelhos, Sagaz decidiu voltar aos velhos costumes, e
estendeu o treino a outros possíveis candidatos. Quer criar um círculo, ou até dois, para
complementar o que ele e Veracidade podem fazer. Galeno não está muito entusiasmado, mas
creio que é uma ideia muito boa. Embora, mesmo eu próprio sendo um bastardo, nunca me ter
sido permitido o treino. Portanto, não tenho nenhuma ideia concreta de como o Talento pode
ser usado para defender as nossas terras.
– Você é um bastardo? – as palavras irromperam de mim. Todos os meus pensamentos
emaranhados foram subitamente cortados ao meio por essa revelação. Breu me encarou, tão
chocado com as minhas palavras quanto eu com as suas.
– Claro. Pensei que você já tivesse percebido isso há muito tempo. Garoto, para alguém tão