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dissimulado. E então conheceu aquela menina, pois ela era pouco mais do que uma menina. E
não havia mais substância nela do que nas teias de aranha e na espuma do mar. Pensamentos e
língua sempre saltando disto para aquilo, sem pausa ou conexão que eu pudesse estabelecer.
Costumava ficar estafado apenas de ouvi-la. Mas Cavalaria sorria, e se maravilhava. Talvez
fosse por ela não se mostrar minimamente fascinada por ele. Talvez fosse por ela não parecer
particularmente ansiosa para conquistá-lo. Mas, mesmo com inúmeras damas mais elegíveis,
de melhor nascimento e maior inteligência, andando atrás dele, escolheu Paciência. E sequer
era um bom momento para se casar, quando ele a tomou como esposa e fechou a porta para
uma dúzia de alianças possíveis que uma noiva poderia ter lhe trazido. Não havia sequer uma
boa razão para se casar naquele momento. Nada.
– Exceto que ele queria fazer isso – eu disse, e mordi logo a língua, pois Breu acenou que
sim, agitando-se um pouco. Desviou o olhar do fogo e olhou para mim.
– Bem. Chega disso. Não vou te perguntar como é que você a impressionou desse jeito, ou o
que mudou na opinião dela a seu respeito. Mas na semana passada ela foi até Sagaz e pediu
que você fosse reconhecido como filho de Cavalaria e herdeiro, e que fosse dada a você uma
educação apropriada para um príncipe.
Fiquei atordoado. As tapeçarias das paredes teriam começado a rodopiar à minha frente, ou
era uma alucinação?
– Claro que ele recusou – continuou Breu sem piedade. – Tentou explicar a ela por que é
que tal coisa seria totalmente impossível. E tudo o que ela continuava a repetir era: “Mas você
é o rei. Como é que pode ser impossível?”, e ele lhe disse: “Os nobres nunca o aceitariam.
Significaria guerra civil. E pense no que seria a um garoto despreparado ser atirado
subitamente para o meio disso tudo”.
– Ah – eu disse calmamente.
Não conseguia lembrar o que tinha sentido por alguns instantes. Regozijo? Raiva? Medo?
Sabia apenas que o sentimento tinha passado, e que eu me sentia estranhamente desnudado e
humilhado por não sentir mais nada.
– Paciência, claro, não ficou totalmente convencida. “Então prepare o garoto”, disse ela ao
rei. “E, quando ele estiver pronto, julgue-o você mesmo.” Só Paciência poderia pedir uma
coisa dessas, e em frente a Veracidade e Majestoso. Veracidade ouviu calmamente, sabendo
como a discussão tinha de terminar, mas Majestoso estava furioso. Ele fica nervoso com muita
facilidade. Mesmo um idiota deveria saber que Sagaz não podia ceder ao pedido de
Paciência. Mas sabe quando aceitar um compromisso. Quanto ao resto, sucumbiu aos pedidos
dela, sobretudo, penso eu, para fechar a boca dela.
– Quanto ao resto? – perguntei estupidamente.
– Algumas coisas a nosso favor, outras em nosso prejuízo. Ou, pelo menos, inconvenientes
para nós – Breu parecia, ao mesmo tempo, irritado e fascinado. – Espero que você possa
encontrar mais horas no seu dia, garoto, pois não estou disposto a sacrificar nenhum dos meus
planos por causa dos dela. Paciência pediu que você fosse educado como é adequado ao seu
sangue. E assumiu ela própria a responsabilidade por essa educação. Música, poesia, dança,
canto, etiqueta... espero que seja mais tolerante para essas coisas do que eu fui. Apesar de
nada disso alguma vez ter parecido difícil para Cavalaria. Às vezes até encontrava utilidade
para esses conhecimentos. Mas isso vai tomar uma boa parte do seu dia. Você também vai
servir de pajem a Paciência. Já é velho demais para isso, mas ela insistiu. Pessoalmente,