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O Aprendiz De Assassino - Saga - Robin Hobb

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ondulantes e pelas árvores dispersas que nos escondiam de qualquer perseguição. Quando vi o

brilho de um curso d’água, fiz um gesto para indicá-lo, sem uma palavra. Em silêncio, demos

de beber aos cavalos e lhes oferecemos um pouco dos grãos que Breu trazia consigo. Afrouxei

os arreios e esfreguei os dorsos sujos dos animais com um punhado de erva. Para nós, havia a

água fria do rio e o pão duro da viagem. Cuidei dos cavalos o melhor que pude. Breu parecia

imerso em pensamentos, e por muito tempo respeitei a intensidade da sua concentração. Mas

finalmente não consegui conter por mais tempo a curiosidade e perguntei:

– Você realmente é o Homem Pustulento?

Breu se sobressaltou e me encarou. O seu olhar era tanto de pena como de espanto e

divertimento.

– O Homem Pustulento? O lendário arauto de doença e desastre? Por favor, garoto, você

não é ignorante. A lenda tem centenas de anos. Com certeza você não pode acreditar que eu

seja assim tão velho.

Encolhi os ombros. Queria dizer “Você tem marcas de pústulas no rosto e traz a morte”,

mas não pronunciei uma palavra sequer. Por vezes Breu aparentava ser muito idoso, mas em

outras ocasiões era tão cheio de energia que parecia um jovem no corpo de um velho.

– Não, não sou o Homem Pustulento – continuou, mais para si próprio do que para mim. –

Mas, a partir de hoje, os rumores da presença dele vão se espalhar pelos Seis Ducados como

pólen ao vento. Haverá histórias de doença e peste e punições divinas por más ações

imaginadas. Gostaria de não ter sido visto dessa maneira. As pessoas do reino já têm o

suficiente para ter medo de mim. Mas há preocupações maiores para nós do que superstições.

Como quer que tenha sabido, você tinha razão. Estive pensando cautelosamente em tudo o que

vi em Forja. E me lembrei das palavras dos que tentaram nos apedrejar. E a aparência de

todos. Conheci os moradores de Forja, em tempos passados. Eram pessoas fortes, não do tipo

que se põe a fugir em pânico supersticioso. Mas pelo que vimos na estrada, era exatamente

isso que estavam fazendo. Deixando Forja, para sempre, ou pelo menos tinham intenção de

fazer isso. Levando tudo o que lhes restava e que poderiam carregar. Deixando as casas onde

seus avós nasceram. E deixando para trás familiares se arrastando e pilhando as ruínas. A

ameaça dos Navios Vermelhos não era vã. Penso naquelas pessoas e tremo. Algo estava

dolorosamente errado, garoto, e temo o que virá em seguida. Porque se os Navios Vermelhos

podem capturar o nosso povo e exigir que lhes paguemos para que os matem, por medo de que

então os devolvam no estado em que aqueles estavam... que escolha amarga! E mais uma vez

atacaram onde estávamos menos preparados para recebê-los.

Virou-se para mim como se fosse dizer mais alguma coisa, e subitamente titubeou. Sentouse

abruptamente, sua pele se acinzentando. Inclinou a cabeça e cobriu a rosto com as mãos.

– Breu! – gritei em pânico e corri para perto dele, mas ele se virou para o outro lado.

– Semente de carris – ele disse, através das mãos que abafavam a sua voz. – O pior é a

maneira súbita como ela te abandona. Bronco tem muita razão em te prevenir em relação a ela,

garoto. Mas às vezes não há opções que não sejam ruins. Às vezes, em situações como estas.

Ele levantou a cabeça. Tinha os olhos turvos, a boca quase solta.

– Agora preciso descansar – disse, tão merecedor de pena quanto uma criança doente.

Segurei-o quando caiu para o lado e ajudei-o a se estender no chão. Fiz um travesseiro para

a cabeça dele com os meus alforjes e o cobri com as capas. Ele ficou deitado e imóvel, o

pulso lento e a respiração pesada, desde aquele momento até a tarde do dia seguinte. Dormi a

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