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O Aprendiz De Assassino - Saga - Robin Hobb

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ajudante de cara azeda consertava um pedaço da grade que Fuligem tinha deslocado com um

coice. Não parecia disposto a falar, e os cavalos estavam tão calmos e confortáveis quanto se

poderia esperar. Dei uma voltinha pelo convés. Estávamos numa embarcação pequena e bem

tratada, um navio usado para comércio entre ilhas, mais largo do que fundo. A sua forma rasa

lhe permitia subir rios e alcançar praias sem sofrer danos, mas o seu desempenho em águas

mais profundas deixava muito a desejar. Movia-se lateralmente, com um mergulho aqui e um

salto ali, como uma camponesa que carrega peso deslocando-se no meio de um mercado cheio

de gente. Parecia que éramos a sua única carga. Um marujo me deu um par de maçãs para

dividir com os cavalos, mas pouca conversa. E, portanto, depois de ter repartido a fruta,

acomodei-me perto dos animais na palha e segui o conselho de Breu sobre descansar.

Os ventos foram favoráveis, e o capitão nos levou mais perto das falésias ameaçadoras do

que pensei ser possível, mas retirar os cavalos da embarcação foi, ainda assim, uma tarefa

desagradável. Todo o discurso e os avisos de Breu não tinham me preparado para a escuridão

da noite sobre a água. As lanternas no convés pareciam tentativas patéticas, confundindo-me

mais com as sombras que criavam do que ajudando com a luz fraca. Por fim, um marujo levou

Breu à costa, no pequeno barco a remo do navio. Eu fui para a água com os cavalos relutantes,

pois sabia que Fuligem se debateria contra uma corda de orientação e provavelmente faria

afundar o barco a remo. Agarrei-me a Fuligem e a encorajei, confiando no seu bom senso para

nos encaminhar em direção à lanterna turva na costa. Puxava o cavalo de Breu com uma corda

longa, pois não queria que ele ficasse perto demais de nós, batendo os cascos na água. O mar

estava frio, a noite era negra e, se eu tivesse alguma noção, teria desejado estar em outro

lugar, mas há algo num garoto que o faz pegar o mundanamente difícil e desagradável e

transformá-lo num desafio pessoal e numa aventura.

Saí da água pingando, gelado e completamente exultante. Segurei as rédeas de Fuligem e

instiguei o cavalo de Breu a me seguir. Quando finalmente consegui submeter ambos ao meu

controle, Breu já estava ao meu lado, com uma lanterna na mão, rindo. O marujo já ia longe,

remando em direção ao navio. Breu me deu as minhas coisas secas, mas elas não me serviram

muito por cima das roupas encharcadas.

– Onde está o caminho? – perguntei, a voz tremendo com os arrepios.

Breu soltou uma bufada irônica.

– Caminho? Dei uma olhada rápida nele enquanto você estava puxando o cavalo. Não é um

caminho, não é nada mais do que o curso que a água toma quando escoa das falésias. Mas vai

ter de servir.

Na verdade, era um pouco melhor do que ele tinha descrito, mas não muito. Era estreito e

íngreme, e o cascalho que o cobria desprendia-se debaixo dos pés. Breu foi à frente com a

lanterna. Eu o segui, com os cavalos em fila indiana. Em um dado momento, o baio de Breu se

recusou a continuar, puxando-me para trás, desequilibrando-me e quase fazendo Fuligem cair

de joelhos ao tentar puxar na direção contrária. Continuei a andar em frente, com o meu

coração saindo pela boca, até alcançarmos o topo da falésia.

Foi então que a noite e a ladeira aberta se estenderam diante de nós, sob a lua navegante e

as estrelas dispersas, e o espírito aventureiro tomou conta de mim outra vez. Suponho que

possa ter sido a atitude de Breu. A semente de carris deixava os olhos dele grandes e

brilhantes, mesmo à luz da lanterna, e a energia, embora não fosse natural, era contagiante.

Mesmo os cavalos pareciam afetados, resfolegando e abanando as cabeças. Breu e eu rimos

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