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O Aprendiz De Assassino - Saga - Robin Hobb

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entre Veracidade e o Duque Calvar, numa discussão a portas fechadas no dia seguinte, mas

muito do que ouvi se referia à guarda da torre da Ilha de Vigia e esboçava os estranhos

contornos daquela situação.

Ouvi reclamações de que as estradas não eram tão bem conservadas quanto antes. Alguém

comentou que ficaria contente se visse os trabalhos nas fortificações de Guarda da Baía serem

retomados. Um homem se queixou de que os bandidos no interior eram tantos que ele quase

não podia esperar que mais de dois terços das suas mercadorias chegassem de Vara. Isso

também parecia ser o fundamento das reclamações da minha companheira de mesa sobre a

falta de tecido de qualidade. Olhei para o Duque Calvar e para a forma como ele tomava nota

de todos os gestos da jovem esposa. Como se Breu sussurrasse ao meu ouvido, ouvi a sua

análise da situação.

– Eis um duque cuja mente não está na tarefa de governar o seu ducado.

Suspeitei que a Dama Graça estivesse vestindo os reparos de que as estradas necessitavam

e os salários dos soldados que teriam mantido as rotas mercantes devidamente guardadas

contra os salteadores. Talvez as joias que pendiam das suas orelhas tivessem servido para

pagar a guarda das torres da Ilha de Vigia.

O jantar finalmente acabou. O meu estômago estava cheio, mas a fome persistia, de tão

pouco substanciosa que a refeição tinha sido. Depois disso, dois menestréis e um poeta nos

mantiveram entretidos, mas deixei os ouvidos mais afinados para as conversas casuais dos

presentes do que para os finos versos do poeta e as baladas dos menestréis. Calvar sentou-se

à direita do príncipe, enquanto a sua senhora se sentou à esquerda, com o cão no colo,

dividindo a cadeira com ela.

Graça estava encantada com a presença do príncipe. As suas mãos mexiam-se

frequentemente para tocar num brinco ou num bracelete. Não estava acostumada a usar tantas

joias. A minha suspeita era de que ela vinha de uma família simples e estava fascinada com a

própria posição. Um menestrel cantou “Bela Rosa no Meio do Trevo”, com os olhos fixos

nela, e foi recompensado com um rubor das suas bochechas. Contudo, à medida que

transcorria o sarau, e que eu me sentia mais cansado, fui notando que a Dama Graça murchava.

Bocejou uma vez, levantando a mão tarde demais para encobrir a boca. O pequeno cão tinha

adormecido no seu colo, e contorcia-se e gania ocasionalmente nos sonhos do seu pequeno

cérebro. À medida que se tornava mais sonolenta, comecei a achá-la mais parecida com uma

criança; afagava o cão como se fosse uma boneca, e encostou a cabeça ao canto da cadeira.

Começou a cambalear por duas vezes. Vi-a beliscar disfarçadamente a pele dos pulsos num

esforço para se manter acordada. Ficou visivelmente aliviada quando Calvar chamou os

menestréis e o poeta para recompensá-los pelo sarau. Tomou o braço do seu senhor para

segui-lo rumo ao quarto sem nunca largar o cão que acomodava no colo.

Senti-me aliviado ao subir a escadaria em direção à antessala de Veracidade. Carimo tinha

arrumado uma cama de penas para mim e alguns lençóis. Era tão confortável quanto a minha

própria cama. Estava ansioso para dormir, mas Carimo fez um gesto para que eu fosse ao

quarto de Veracidade. Veracidade, sempre soldado, não precisava de lacaios para andarem

por ali e descalçarem as suas botas. Apenas Carimo e eu o servimos. Carimo papagueava e

resmungava enquanto seguia os passos de Veracidade, pegando e alisando as vestimentas que

o príncipe casualmente largava. Imediatamente levou as botas de Veracidade para um canto e

começou a espalhar mais cera no couro. Veracidade enfiou uma camisola pela cabeça e virou-

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