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presente. Sem que ele queira, torna-se sua tarefa infantilizar a
humanidade; eis a sua glória e o seu limite.
148. Os poetas tornando a vida mais leve. — Na medida em
que também querem aliviar a vida dos homens, os poetas desviam o
olhar do árduo presente ou, com uma luz que fazem irradiar do
passado, proporcionam novas cores ao presente. Para poderem
fazer isso, eles próprios devem ser, em alguns aspectos, seres
voltados para trás: de modo que possamos usá-los como pontes
para tempos e representações longínquas, para religiões e culturas
agonizantes ou extintas. Na realidade, são sempre e
necessariamente epígonos. Certamente há coisas desfavoráveis a
dizer sobre os seus meios de aliviar a vida: eles acalmam e curam
apenas provisoriamente, apenas no instante; e até mesmo impedem
que os homens trabalhem por uma real melhoria de suas condições,
ao suprimir e purgar paliativamente a paixão dos insatisfeitos, dos
que impelem à ação.
149. A lenta flecha da beleza. — A mais nobre espécie de
beleza é aquela que não arrebata de vez, que não se vale de assaltos
tempestuosos e embriagantes (uma beleza assim desperta
facilmente o nojo), mas que lentamente se infiltra, que levamos
conosco quase sem perceber e deparamos novamente num sonho,
e que afinal, após ter longamente ocupado um lugar modesto em
nosso coração, se apodera completamente de nós, enchendo-nos os
olhos de lágrimas e o coração de ânsias. — O que ansiamos, ao ver
a beleza? Ser belos: imaginamos que haveria muita felicidade ligada
a isso. — Mas isto é um erro.
150. Vivificação da arte. — A arte ergue a cabeça quando as
religiões perdem terreno. Ela acolhe muitos sentimentos e estados
de espírito gerados pela religião, toma-os ao peito e com isso tornase
mais profunda, mais plena de alma, de modo que chega a
transmitir elevação e entusiasmo, algo que antes não podia fazer. A
riqueza do sentimento religioso, que cresceu e se tornou torrente,
continuamente transborda e deseja conquistar novos domínios: mas
o crescente Iluminismo abalou os dogmas da religião e instilou uma
radical desconfiança: assim, expulso da esfera religiosa pelo
Iluminismo, o sentimento se lança na arte; em certos casos também
na vida política, ou mesmo diretamente na ciência. Sempre que se
nota, nos empenhos humanos, uma coloração mais intensa e mais
sombria, pode-se presumir que o temor de espíritos, aroma de
incenso e sombras da Igreja ali permaneceram.
151. De que modo a métrica embeleza. — A métrica põe um
véu sobre a realidade; ocasiona alguma artificialidade no falar e
impureza no pensar; por meio das sombras que joga sobre o
pensamento, às vezes encobre, às vezes realça. Tal como a sombra
é necessária para embelezar, também o "vago" é necessário para
tornar distinto. — A arte torna suportável a visão da vida,
colocando sobre ela o véu do pensamento impuro.
152. A arte da alma feia. — Estabelecem-se limites demasiado