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involuntariamente alguma desconfiança face ao gênero e a sua
seriedade. Mas basta apontar as conseqüências: pois já se começa a
ver que produtos da mais séria natureza crescem no solo da
observação psicológica. Qual a principal tese a que chegou um dos
mais frios e ousados pensadores, o autor do livro Sobre a origem
dos sentimentos morais,28 graças às suas cortantes e penetrantes
análises da conduta humana? "O homem moral" — diz ele — "não
está mais próximo do mundo inteligível (metafísico) que o homem
físico." Esta proposição, temperada e afiada sob os golpes de
martelo do conhecimento histórico, talvez possa um dia, em algum
futuro, servir como o machado que cortará pela raiz a "necessidade
metafísica" do homem — se para a bênção ou para a maldição do
bem-estar geral, quem saberia dizê-lo? — mas, em todo o caso,
como uma tese das mais graves conseqüências, simultaneamente
fecunda e horrenda, e olhando para o mundo com aquela dupla face
que possuem todos os grandes conhecimentos.
38. Em que medida é útil. — Portanto: se a observação
psicológica traz mais utilidade ou desvantagem aos homens
permanece ainda sem resposta; mas certamente é necessária, pois a
ciência não pode passar sem ela. Mas a ciência não tem
consideração pelos fins últimos, e tampouco a natureza; e como
esta ocasionalmente produz coisas da mais elevada pertinência, sem
tê-las querido, também a verdadeira ciência, sendo a imitação da
natureza em conceitos, promoverá ocasionalmente, e mesmo com
freqüência, vantagem e bem-estar para os homens, e alcançará o
que é pertinente — mas igualmente sem tê-lo querido. Quem, na
atmosfera de tal modo de ver, sentir o ânimo demasiado frio, talvez
tenha muito pouco fogo em si: se olhar à sua volta, no entanto,
perceberá doenças que requerem compressas de gelo, e homens de
tal maneira "moldados" com ardor e espírito que mal encontram
lugar em que o ar lhes seja suficientemente frio e cortante. Além
disso, verá como indivíduos e povos muito sérios necessitam de
frivolidades, como outros muito excitáveis e inconstantes precisam
temporariamente, para sua saúde, de fardos pesados e opressores:
não deveremos nós, os homens mais espirituais de uma época que
visivelmente se inflama cada vez mais, recorrer a todos os meios de
extinção e refrigeração existentes, de modo a continuar ao menos
tão firmes, inofensivos e moderados como hoje ainda somos, e
talvez um dia servir a esta época como espelho e autoconsciência?
39. A fábula da liberdade inteligível.29 — A história dos
sentimentos em virtude dos quais tornamos alguém responsável por
seus atos, ou seja, a história dos chamados sentimentos morais,
tem as seguintes fases principais. Primeiro chamamos as ações
isoladas de boas ou más, sem qualquer consideração por seus
motivos, apenas devido às conseqüências úteis ou prejudiciais que
tenham. Mas logo esquecemos a origem dessas designações e
achamos que a qualidade de "bom" ou "mau" é inerente às ações,
sem consideração por suas conseqüências: o mesmo erro que faz a
língua designar a pedra como dura, a árvore como verde — isto é,
apreendendo o que é efeito como causa. Em seguida, introduzimos
a qualidade de ser bom ou mau nos motivos e olhamos os atos em
si como moralmente ambíguos. Indo mais longe, damos o