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Humano-Demasiado-Humano

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deves percorrer? — o de teus antepassados".

593. Vaidade e ambição como educadoras. — Enquanto um

homem não se torna instrumento do interesse humano geral, pode

atormentá-lo a ambição; mas sendo esse objetivo alcançado,

trabalhando ele necessariamente como uma máquina para o bem de

todos, pode então surgir a vaidade; ela o humanizará nas pequenas

coisas, o tornará mais sociável, mais indulgente, mais suportável,

quando a ambição tiver completado nele o trabalho mais grosseiro

(torná-lo útil).

594. Principiantes filosóficos. — Se alguém começou a

partilhar a sabedoria de um filósofo, anda pelas ruas com o

sentimento de haver mudado e se tornado um grande homem; pois

depara com muitos que não conhecem tal sabedoria, e então tem de

apresentar um julgamento novo e desconhecido acerca de tudo:

porque reconhece um código de leis, acha que é obrigado a se

comportar como um juiz.

595. Agradando pelo desagrado. — As pessoas que buscam

dar o que falar, e assim desagradar, desejam o mesmo que as que

procuram agradar e não dar o que falar, apenas num grau muito

bem elevado e de maneira indireta, através de um estágio que

aparentemente as afasta do seu objetivo. Querem influência e

poder, e por isso mostram sua superioridade, embora de uma

maneira tal que é sentida como desagradável; pois sabem que quem

alcança o poder agrada em quase tudo o que diz e faz, e mesmo

quando desagrada parece ainda agradar. — Também o espírito

livre, e igualmente o indivíduo crente, querem ter poder, para com

ele agradar; quando, por causa de sua doutrina, são ameaçados de

um mau destino, de perseguição, cárcere, execução, eles se

comprazem no pensamento de que desse modo sua doutrina será

gravada e marcada a fogo na humanidade; tomam isso como um

meio doloroso, mas potente, embora de ação retardada, para afinal

alcançar o poder.

596. Casus belli e outros casos. — O príncipe que inventa um

casus belli [motivo de guerra], uma vez tomada a decisão de fazer

guerra ao vizinho, é como o pai que atribui ao filho uma outra mãe,

que deverá ser tida como a verdadeira. Os motivos declarados de

nossas ações não seriam quase todos como essas mães supostas?

597. Paixão e direito. — Ninguém fala com mais paixão de

seus direitos do que aquele que no fundo da alma tem dúvida em

relação a esses direitos. Levando a paixão para o seu lado, ele quer

entorpecer a razão e suas dúvidas: assim adquire uma boa

consciência, e com ela o sucesso entre os homens.

598. Artifício do abstinente. — Quem protesta contra o

casamento, à maneira dos padres católicos, procurará entendê-lo na

sua concepção mais baixa, mais vulgar. De modo igual, quem

recusa as honras dos contemporâneos apreenderá o conceito de

honra de uma forma baixa; assim torna mais fáceis, para si mesmo,

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