You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
religião, o Estado inevitavelmente perderá seu antigo véu de Ísis152
e não mais despertará reverência. Observada de perto, a soberania
do povo serve para afugentar também o último encanto e
superstição no âmbito destes sentimentos; a democracia moderna é
a forma histórica do declínio do Estado. — Mas a perspectiva que
resulta desse forte declínio não é infeliz em todos os aspectos: entre
as características dos seres humanos, a sagacidade e o interesse
pessoal153 são as mais bem desenvolvidas; se o Estado não mais
corresponder às exigências dessas forças, não ocorrerá de maneira
alguma o caos: uma invenção ainda mais pertinente que aquilo que
era o Estado, isto sim, triunfará sobre o Estado. Quantas forças
organizadoras a humanidade já não viu se extinguirem — por
exemplo, a do clã hereditário, que por milênios foi bem mais
poderosa que a da família, e que muito antes desta já reinava e
ordenava. Nós mesmos vemos a significativa noção legal e política
da família, que um dia predominou em toda a extensão do mundo
romano, tornar-se cada vez mais pálida e impotente. Assim, uma
geração posterior também verá o Estado se tornar insignificante em
vários trechos da Terra — algo que muitos homens da atualidade
não podem conceber sem medo e horror. Trabalhar pela difusão e
realização dessa idéia é certamente outra coisa: é preciso pensar
muito presunçosamente de sua própria razão e mal compreender a
história pela metade, para já agora pôr as mãos no arado — já que
ainda ninguém pode mostrar as sementes que depois serão lançadas
no terreno rasgado. Confiemos, portanto, na "sagacidade e
interesse pessoal dos homens", para que o Estado subsista por
bastante tempo ainda, e sejam rechaçadas as tentativas destruidoras
de supostos sábios zelosos e precipitados!
473. O socialismo em vista de seus meios. — O socialismo é o
visionário irmão mais novo do quase extinto despotismo, do qual
quer ser herdeiro; seus esforços, portanto, são reacionários no
sentido mais profundo. Pois ele deseja uma plenitude de poder
estatal como até hoje somente o despotismo teve, e até mesmo
supera o que houve no passado, por aspirar ao aniquilamento
formal do indivíduo: o qual ele vê como um luxo injustificado da
natureza, que deve aprimorar e transformar num pertinente órgão
da comunidade. Devido à afinidade, o socialismo sempre aparece
na vizinhança de toda excessiva manifestação de poder, como o
velho, típico socialista Platão na corte do tirano da Sicília;154 ele
deseja (e em algumas circunstâncias promove) o cesáreo Estado
despótico neste século, porque, como disse, gostaria de vir a ser
seu herdeiro. Mas mesmo essa herança não bastaria para os seus
objetivos, ele precisa da mais servil submissão de todos os cidadãos
ao Estado absoluto, como nunca houve igual; e, já não podendo
contar nem mesmo com a antiga piedade religiosa ante o Estado,
tendo, queira ou não, que trabalhar incessantemente para a
eliminação deste — pois trabalha para a eliminação de todos os
Estados existentes —, não pode ter esperança de existir a não ser
por curtos períodos, aqui e ali, mediante o terrorismo extremo. Por
isso ele se prepara secretamente para governos de terror, e empurra
a palavra "justiça" como um prego na cabeça das massas
semicultas, para despojá-las totalmente de sua compreensão (depois
que esta já sofreu muito com a semi-educação) e criar nelas uma