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de cabeças de outro Estado, para tirar desse obscurecimento sua
própria vantagem. É a mesma disposição de espírito que apóia o
regime republicano no Estado vizinho — le désordre organisé [a
desordem organizada], como diz Mérimée148 — pela razão única
de supor que ele torna o povo mais fraco, mais dividido e menos
apto para a guerra.
454. Os perigosos entre os subversivos. — Podemos dividir os
que pretendem uma subversão da sociedade entre aqueles que
desejam alcançar algo para si e aqueles que o desejam para seus
filhos e netos. Esses últimos são os mais perigosos; porque têm a
fé e a boa consciência do desinteresse. Os demais podem ser
contentados com um osso: a sociedade dominante é rica e
inteligente o bastante para isso. O perigo começa quando os
objetivos se tornam impessoais; os revolucionários movidos por
interesse impessoal podem considerar todos os defensores da
ordem vigente como pessoalmente interessados, sentindo-se então
superiores a eles.
455. Valor político da paternidade. — Quando um homem não
tem filhos, não tem pleno direito de intervir na discussão sobre as
necessidades de um Estado. É preciso ter arriscado, juntamente
com os outros, aquilo que mais se ama: apenas isso vincula
fortemente ao Estado; é preciso ter em vista a felicidade de seus
pósteros, e por isso, antes de tudo, ter pósteros, a fim de participar
justa e naturalmente nas instituições e em suas mudanças. O
desenvolvimento de uma moral superior depende de que a pessoa
tenha filhos; isso desfaz o seu egoísmo, ou, mais corretamente:
isso amplia o seu egoísmo no tempo, e a faz perseguir seriamente
objetivos que vão além da duração de sua vida individual.
456. Orgulho dos antepassados. — Com razão podemos sentir
orgulho de uma linha ininterrupta de bons antepassados que chega
até o pai — mas não da linha mesma, pois cada um de nós todos a
tem. A descendência de bons antepassados constitui a genuína
nobreza de nascimento; uma única interrupção na corrente, isto é,
um mau ancestral, anula essa nobreza. Devemos perguntar a
qualquer um que fale da própria nobreza: entre os seus ancestrais
não há nenhum violento, cobiçoso, dissoluto, maldoso, cruel? Se,
com boa ciência e consciência, ele puder responder "não" a essa
pergunta, então procuremos a sua amizade.
457. Escravos e trabalhadores. — O fato de que damos mais
valor à satisfação da vaidade do que a todas as outras comodidades
(segurança, moradia, prazeres de toda espécie) se mostra, num
grau ridículo, em que todo mundo (excetuando razões políticas)
deseja a abolição da escravatura e tem completo horror à redução
dos homens a esse estado: ao mesmo tempo, cada qual deve
admitir que em todo aspecto os escravos vivem de maneira mais
segura e feliz do que o trabalhador moderno, e que o trabalho
escravo é pouco trabalho em relação àquele do "trabalhador".
Protesta-se em nome da "dignidade humana": mas isso, em termos
mais simples, é a velha vaidade que experimenta como a sina mais