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Humano-Demasiado-Humano

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segundo o qual se forma involuntariamente o comércio entre

professor e aluno, pai e família, patrão e empregado, comandante e

soldado, mestre e aprendiz. Todas essas relações se reorganizam

agora um pouco, sob influência da forma constitucional de governo

que domina: elas se tornam compromissos. Mas como deverão elas

se transformar e se deslocar, mudar de nome e de natureza, quando

esse novíssimo conceito tiver se apoderado de todas as cabeças! —

para o que, no entanto, talvez necessite de mais um século. Nisso

nada é mais desejável do que cautela e uma lenta evolução.

451. A justiça como chamariz dos partidos. — Representantes

nobres (embora não muito perspicazes) da classe dominante podem

muito bem jurar a si mesmos: "Vamos tratar os homens como

iguais, dar-lhes direitos iguais". Em tal medida, um modo de pensar

socialista baseado na justiça é possível; mas, como foi dito, apenas

no interior da classe dominante, que neste caso exerce a justiça com

sacrifícios e renúncias. Por outro lado, exigir igualdade de direitos,

como fazem os socialistas da casta subjugada, não é jamais produto

da justiça, mas da cobiça. — Se alguém mostra pedaços de carne

sangrenta a uma fera e depois os retira, até que afinal ela ruge:

vocês acham que esse rugido significa justiça?

452. Propriedade e justiça. — Quando os socialistas

demonstram que a divisão da propriedade, na humanidade de hoje,

é conseqüência de inúmeras injustiças e violências, e in summa

rejeitam a obrigação para com algo de fundamento tão injusto, eles

vêem apenas um aspecto da questão. O passado inteiro da cultura

antiga foi construído sobre a violência, a escravidão, o embuste, o

erro; mas nós, herdeiros de todas essas situações, e mesmo

concreções de todo esse passado, não podemos abolir a nós

mesmos, nem nos é permitido querer extrair algum pedaço dele. A

disposição injusta se acha também na alma dos que não possuem,

eles não são melhores do que os possuidores e não têm

prerrogativa moral, pois em algum momento seus antepassados

foram possuidores. O que é necessário não são novas distribuições

pela força, mas graduais transformações do pensamento;147 em

cada indivíduo a justiça deve se tornar maior e o instinto de

violência mais fraco.

453. O timoneiro das paixões. — O estadista provoca paixões

públicas, a fim de tirar proveito da paixão contrária que assim é

despertada. Vejamos um exemplo. Um estadista alemão sabe muito

bem que a Igreja católica nunca terá os mesmos planos que a

Rússia, e que se aliaria antes aos turcos do que a ela; sabe também

que uma aliança entre a Rússia e a França ameaçaria a Alemanha.

Se ele puder tornar a França o lar e bastião da Igreja católica, terá

afastado esse perigo por um longo tempo. Assim, terá interesse em

demonstrar ódio aos católicos e, mediante hostilidades de toda

espécie, transformar os partidários da autoridade do papa numa

apaixonada força política que será hostil à política alemã e que

deverá naturalmente se fundir com a França, rival da Alemanha: seu

objetivo será necessariamente a catolização da França, da mesma

forma como Mirabeau via na descatolização a salvação de sua

pátria. — Portanto, um Estado quer o obscurecimento de milhões

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