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Humano-Demasiado-Humano

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grandeza será tida como grande não apenas numa época, mas em

todas. Isso é um erro, porém; em todas as percepções e

julgamentos do que é belo e bom a humanidade se transforma

intensamente; é fantasia acreditar que estamos algumas léguas à

frente e que toda a humanidade segue o nosso caminho. Além

disso, um sábio não reconhecido pode hoje dar como certo que a

sua descoberta será feita igualmente por outros, e que no melhor

dos casos um historiador futuro reconhecerá que ele já sabia isto

ou aquilo, mas não pôde obter crédito para a sua tese. Não ser

reconhecido é interpretado pela posteridade como falta de vigor. —

Em suma, não se deve falar tão facilmente a favor do isolamento

altivo. Há exceções, sem dúvida; mas geralmente são nossos erros,

nossas fraquezas e tolices que impedem o reconhecimento de

nossas grandes qualidades.

376. Amigos. — Apenas pondere consigo mesmo como são

diversos os sentimentos, como são divididas as opiniões, mesmo

entre os conhecidos mais próximos; e como até mesmo opiniões

iguais têm, nas cabeças de seus amigos, posição ou força muito

diferente da que têm na sua; como são múltiplas as ocasiões para o

mal-entendido e para a ruptura hostil. Depois disso, você dirá a si

mesmo: como é inseguro o terreno em que repousam as nossas

alianças e amizades, como estão próximos os frios temporais e o

tempo feio, como é isolado cada ser humano! Se alguém percebe

isso, e também que todas as opiniões, sejam de que espécie e

intensidade, são para o seu próximo tão necessárias e

irresponsáveis como os atos, se descortina essa necessidade

interior das opiniões, devida ao indissolúvel entrelaçamento de

caráter, ocupação, talento e ambiente — talvez se livre da amargura

e aspereza de sentimento que levou aquele sábio a gritar: "Amigos,

não há amigos!".123 Esta pessoa dirá antes a si mesma: Sim, há

amigos, mas foi o erro, a ilusão acerca de você que os conduziu até

você; e eles devem ter aprendido a calar, a fim de continuar seus

amigos; pois quase sempre tais laços humanos se baseiam em que

certas coisas jamais serão ditas nem tocadas: se essas pedrinhas

começam a rolar, porém, a amizade segue atrás e se rompe. Haverá

homens que não seriam fatalmente feridos, se soubessem o que

seus mais íntimos amigos sabem no fundo a seu respeito? —

Conhecendo a nós mesmos e vendo o nosso ser como uma esfera

cambiante de opiniões e humores, aprendendo assim a menosprezálo

um pouco, colocamo-nos novamente em equilíbrio com os

outros. É verdade, temos bons motivos para não prezar muito os

nossos conhecidos, mesmo os grandes entre eles; mas igualmente

bons motivos para dirigir esse sentimento para nós mesmos. —

Então suportemos uns aos outros, assim como suportamos a nós

mesmos; e talvez chegue um dia, para cada um, a hora feliz em que

dirá:

"Amigos, não há amigos!" — disse o sábio moribundo;

"Inimigos, não há inimigos!" — digo eu, o tolo vivente.

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