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Humano-Demasiado-Humano

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aproximadamente; nestes o homem já não deve ter se alterado

muito. O filósofo, porém, vê "instintos" 3 no homem atual e supõe

que estejam entre os fatos inalteráveis do homem, e que possam

então fornecer uma chave para a compreensão do mundo em geral:

toda a teleologia se baseia no fato de se tratar o homem dos últimos

quatro milênios como um ser eterno, para o qual se dirigem

naturalmente todas as coisas do mundo, desde o seu início. Mas

tudo veio a ser; não existem fatos eternos: assim como não existem

verdades absolutas. — Portanto, o filosofar histórico é doravante

necessário, e com ele a virtude da modéstia.

3. Estima das verdades despretensiosas. — É marca de uma

cultura superior 4 estimar as pequenas verdades despretensiosas

achadas com método rigoroso, mais do que os erros que nos

ofuscam e alegram, oriundos de tempos e homens metafísicos e

artísticos. No início as primeiras são vistas com escárnio, como se

não pudesse haver comparação: umas tão modestas, simples,

sóbrias, aparentemente desanimadoras, os outros tão belos,

esplêndidos, encantadores, talvez extasiantes. Mas o que foi

arduamente conquistado, o certo, duradouro e por isso relevante

para todo o conhecimento posterior, é afinal superior; apegar-se a

ele é viril e demonstra coragem, simplicidade, moderação. Aos

poucos, não apenas o indivíduo, mas toda a humanidade se alçará a

esta virilidade, quando enfim se habituar a uma maior estima dos

conhecimentos sólidos e duráveis, e perder toda crença na

inspiração e na comunicação milagrosa de verdades. — É certo que

os adoradores das formas, com sua escala do belo e do sublime,

terão boas razões para zombar inicialmente, tão logo a estima das

verdades despretensiosas e o espírito científico comecem a

predominar: mas apenas porque seus olhos não se abriram ainda

para a atração da forma mais simples, ou porque os homens

educados nesse espírito ainda não se acham plena e intimamente

tomados por ele, de modo que continuam a imitar irrefletidamente

as velhas formas (e isso bastante mal, como faz quem já não se

importa muito com algo). Em tempos passados, o espírito não era

solicitado pelo pensamento rigoroso; ocupava-se em urdir formas e

símbolos. Isso mudou; a ocupação séria com o simbólico tornou-se

distintivo da cultura inferior; assim como nossas artes mesmas se

tornam cada vez mais intelectuais e nossos sentidos mais

espirituais, e como atualmente julgamos, por exemplo, de maneira

bem diversa da de cem anos atrás aquilo que é sensualmente

harmonioso: assim também as formas de nossa vida se tornam

cada vez mais espirituais, e para os olhos de épocas antigas talvez

mais feias, mas apenas porque não conseguem ver como o reino da

beleza interior, espiritual, continuamente se aprofunda e se amplia, e

em que medida, para todos nós, o olhar inteligente 5 pode hoje valer

mais que a estrutura mais bela e a construção mais sublime.

4. Astrologia e coisas afins. — É provável que os objetos da

sensibilidade religiosa, moral e estética pertençam apenas à

superfície das coisas, enquanto o ser humano gosta de crer que

pelo menos nisso ele toca no coração do mundo; ele se engana,

porque essas coisas o fazem tão bem-aventurado e tão

profundamente infeliz, e portanto mostra aí o mesmo orgulho que

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