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NOREVISTA JANEIRO 2021

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SUMÁRIO<br />

<strong>JANEIRO</strong><br />

<strong>2021</strong><br />

05<br />

ENTREVISTA<br />

À MESA COM MIGUEL SOUSA LIMA<br />

ENTREVISTA<br />

A EXPERIÊNCIA DOS JOVENS NO PARLAMENTO<br />

24<br />

AÇORIANO<br />

122<br />

REPORTAGEM<br />

24<br />

58 RESILIÊNCIA FINANCEIRA E OPERACIONAL 128<br />

REPORTAGEM<br />

72 OS LIVROS EM TEMPO DE PANDEMIA<br />

138<br />

REPORTAGEM<br />

85 ATÉ QUE A MORTE NOS SEPARE<br />

140<br />

104<br />

REPORTAGEM<br />

O CRESCIMENTO DOS CENTROS DE SERVIÇOS<br />

PARTILHADOS EM PORTUGAL<br />

110<br />

ESTUDO<br />

MÁ VISÃO DUPLICA A PROBABILIDADE DE SOFRER DE<br />

DEPRESSÃO<br />

CRÓNICA<br />

COVID19 #FICAREMCASA<br />

CRÓNICA<br />

LEITURAS DESALINHADAS<br />

DESTAQUE<br />

FRASES DO MÊS<br />

Sátira Política<br />

a experiência dos jovens<br />

RESILIÊNCIA FINANCEIRA<br />

OS LIVROS EM TEMPO<br />

no parlamento açoriano 24<br />

E OPERACIONAL 58<br />

DE PANDEMIA<br />

72<br />

02 NODEZ20 03<br />

NODEZ20


EDITORIAL<br />

Se se pudesse escolher uma<br />

palavra para ilustrar o ano<br />

de 2020, escolheríamos<br />

precisamente esta – desafiante,<br />

a todos os níveis. Mais uma<br />

reflexão sobre a pandemia<br />

poderá parecer um pouco cliché,<br />

mas queira-se ou não, a verdade<br />

é que já vivemos com este vírus<br />

há quase um ano. O primeiro<br />

caso de COVID-19 foi reportado<br />

no dia 31 de dezembro de 2019<br />

em Wuhan e ninguém esperaria<br />

uma epidemia à escala mundial,<br />

que nos obrigasse a todos a ficar<br />

em casa, a esperar que os dias<br />

melhorassem e que os números<br />

diminuíssem.<br />

No dia 02 de fevereiro de<br />

2020, aterrou na Região um<br />

voo proveniente de Hong<br />

Kong, apesar de nenhum dos<br />

passageiros ser oriundo do<br />

epicentro do vírus começaramse<br />

a manifestar os primeiros<br />

sinais de preocupação, embora<br />

na altura o executivo tivesse<br />

dado a garantia de que não<br />

existisse qualquer perigo para a<br />

saúde pública.<br />

No dia 15 de março, surge o<br />

primeiro caso de COVID-19 na<br />

Região. Até então, tem sido uma<br />

batalha diária de vários agentes<br />

envolvidos, com a adoção de<br />

medidas adequadas à situação<br />

pandémica na Região. A<br />

mudança de Governo Regional,<br />

pelo que se pôde observar, não<br />

foi fator desorientador para as<br />

entidades envolvidas no que<br />

respeita a manter o que estava<br />

bem feito e a desenvolver novas<br />

medidas de forma a mitigar a<br />

pandemia.<br />

Os profissionais de saúde,<br />

felizmente, veem agora uma<br />

“luz ao fundo do túnel” com<br />

DESAFIANTE<br />

a chegada da vacina, sem<br />

descurar a responsabilidade de<br />

cada um de nós que tem e deve<br />

continuar a ser feita diariamente,<br />

sob o prejuízo de esgotarmos<br />

a capacidade de resposta do<br />

Sistema Regional de Saúde e de<br />

vivermos tempos difíceis no que<br />

respeita a recuperação da região<br />

pós-COVID.<br />

Impensável seria também não<br />

referir, pelo menos no espetro<br />

político regional, a mudança de<br />

uma Região que se governava<br />

há 24 anos pelo poder socialista.<br />

Apesar de terem conseguido<br />

maior número de votos nas<br />

urnas no passado dia 25 de<br />

outubro, a reedição da Aliança<br />

Democrática fez com que o<br />

PSD voltasse ao poder volvidos<br />

todos estes anos, assumindo a<br />

responsabilidade e reconhecendo<br />

as fragilidades que marcarão<br />

os próximos tempos no<br />

que respeita à recuperação<br />

económica da Região pós-<br />

COVID, mas também na<br />

resolução de problemas crónicos<br />

no nosso arquipélago, como<br />

é o caso do abandono escolar<br />

precoce, a precariedade no<br />

acesso dos jovens ao mercado<br />

de trabalho, mas também o igual<br />

acesso aos cuidados de saúde<br />

em toda e cada uma das nove<br />

ilhas, o subfinanciamento do<br />

SRS ou até mesmo o número<br />

de beneficiários do Rendimento<br />

Social de Inserção, a que o<br />

executivo já se propôs diminuir,<br />

com a criação de condições de<br />

desenvolvimento económico<br />

e de promoção da inclusão<br />

social, laboral, de competências<br />

pessoais, sociais e profissionais<br />

que permitam quebrar o ciclo de<br />

pobreza na Região.<br />

FICHA TÉCNICA:<br />

ISSN 2183-4768<br />

PROPRIETÁRIO ASSOCIAÇÃO AGENDA DE NOVIDADES<br />

NIF 510570356<br />

SEDE DE REDAÇÃO RUA DA MISERICÓRDIA, 42, 2º ANDAR,<br />

9500-093 PONTA DELGADA<br />

SEDE DO EDITOR RUA DA MISERICÓRDIA, 42, 2º ANDAR,<br />

9500-093 PONTA DELGADA<br />

DIRETOR/EDITOR RUI MANUEL ÁVILA DE SIMAS CP3325A<br />

DIRETORA ADJUNTA CLÁUDIA CARVALHO TPE-288A<br />

REDAÇÃO CHEFE REDAÇÃO RUI SANTOS TPE-288 A,<br />

CLÁUDIA CARVALHO TPE-288 A, SARA BORGES, ANA SOFIA<br />

MASSA, ANA SOFIA CORDEIRO<br />

REVISÃO ANA SOFIA MASSA<br />

PAGINAÇÃO MÁRIO CORRÊA, RAQUEL AMARAL E CARINA<br />

COELHO<br />

CAPTAÇÃO E EDIÇÃO DE IMAGEM RODRIGO RAPOSO E<br />

MIGUEL CÂMARA<br />

DEPARTAMENTO DE MARKETING, COMUNICAÇÃO E IMAGEM<br />

CILA SIMAS E RAQUEL AMARAL<br />

PUBLICIDADE RAQUEL AMARAL E TÂNIA MACHADO<br />

MULTIMÉDIA RODRIGO RAPOSO, RAFAEL ARAÚJO E MÁRIO<br />

CORRÊA<br />

INFORMÁTICA JOÃO BOTELHO<br />

RELAÇÕES PÚBLICAS CILA SIMAS<br />

Nº REGISTO ERC 126 641<br />

COLABORADORES ANTÓNIO VENTURA, JOÃO CASTRO,<br />

RICARDO SILVA<br />

CONTACTOS MARKETING@AGENDADENOVIDADES.COM<br />

ESTATUTO EDITORIAL:<br />

A NO É UMA REVISTA DE ÂMBITO REGIONAL (NÃO FICANDO<br />

EXCLUÍDOS OS PAÍSES DE LÍNGUA PORTUGUESA E<br />

COMUNIDADES PORTUGUESAS ESPALHADAS PELO MUNDO).<br />

A NO DISPONIBILIZA INFORMAÇÃO INDEPENDENTE E<br />

PLURALISTA RELACIONADA COM A POLÍTICA, CULTURA<br />

E SOCIEDADE NUM CONTEXTO REGIONAL, NACIONAL E<br />

INTERNACIONAL.<br />

A NO É UMA REVISTA AUTÓNOMA, SEM QUALQUER<br />

DEPENDÊNCIA DE NATUREZA POLÍTICA, IDEOLÓGICA E<br />

ECONÓMICA, ORIENTADA POR CRITÉRIOS DE RIGOR, ISENÇÃO,<br />

TRANSPARÊNCIA E HONESTIDADE.<br />

A NO É PRODUZIDA POR UMA EQUIPA QUE SE COMPROMETE<br />

A RESPEITAR OS DIREITOS E DEVERES PREVISTOS NA<br />

CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA; NA LEI DE<br />

IMPRENSA E NO CÓDIGO DEONTOLÓGICO DOS JORNALISTAS.<br />

A NO VISA COMBATER A ILITERACIA, INCENTIVAR O GOSTO<br />

PELA LEITURA E PELA ESCRITA, MAS ACIMA DE TUDO,<br />

PROMOVER A CIDADANIA E O CONHECIMENTO.<br />

A NO REGE-SE PELO CUMPRIMENTO RIGOROSO DAS NORMAS<br />

ÉTICAS E DEONTOLÓGICAS DO JORNALISMO E PELOS<br />

PRINCÍPIOS DE INDEPENDÊNCIA E PLURALISMO.<br />

À MESA COM<br />

Miguel Sousa Lima<br />

fundador da Clínica de São Gonçalo<br />

04 NODEZ20


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

Sejam bem-vindos ao “À Mesa Com”<br />

aqui no Restaurante da Associação<br />

Agrícola, nesta primeira revista do<br />

ano e naquela que vai ser a nossa<br />

primeira entrevista do ano. Estamos<br />

com o Doutor Miguel Sousa Lima,<br />

ele que é proprietário da Clínica de<br />

São Gonçalo, a clínica que faz sorrisos<br />

a muitos de nós açorianos e não só.<br />

Vamos tentar que o ano de <strong>2021</strong> seja<br />

com mais sorrisos. Doutor Miguel,<br />

muito obrigada por ter vindo. Eu<br />

gostaria de começar a entrevista com<br />

uma pergunta muito básica. Como é<br />

que foi a sua infância para vir dar a<br />

este objetivo que foi ser dentista?<br />

Bom, isso é uma pergunta super<br />

interessante. Acho que a infância é<br />

realmente a parte mais importante.<br />

Há alguns anos atrás eu vi o Nabeiro<br />

falar e dizer “paguem muitos cursos<br />

aos vossos filhos, mas principalmente<br />

viajem mais”, ou seja, os cursos<br />

são importantes, mas viajar muito<br />

é muito importante também. Eu,<br />

felizmente, tive desde o meu avô que<br />

foi uma pessoa que viajava imenso,<br />

ao meu pai e o meu pai fazia comigo<br />

o mesmo e eu tento fazer isso com os<br />

meus filhos. Acho que isto permite<br />

ter uma visão global do planeta onde<br />

estamos inseridos e vemos muitas<br />

oportunidades e acho que a minha<br />

infância foi uma infância muito feliz,<br />

muito na rua ao contrário do que hoje<br />

em dia acontece. Não tínhamos nada<br />

dessas coisas dos tablets e tal. Tinha<br />

dez anos quando tivemos aqueles<br />

primeiros spectrum 48k, aquelas<br />

cassetes horrorosas que levava muito<br />

tempo a abrir. Eu acho que foi um<br />

privilégio nascer nos Açores e vir<br />

viver neste paraíso.<br />

E como é que surgiu depois a carreira<br />

ENTREVISTA EM<br />

VÍDEO NA VERSÃO<br />

DIGITAL<br />

06 NODEZ20


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

de dentista? Normalmente no décimo<br />

ano é que se faz aquela escolha da<br />

área científica ou de humanidades.<br />

Quando é que surgiu o gosto? Foi<br />

antes?<br />

Não. Isto é uma coisa engraçada. O<br />

meu pai é veterinário e eu estava até<br />

a pensar ir para veterinária e por<br />

acaso naquele ano nós tínhamos o<br />

contingente Açores e toda a gente<br />

quis ir para veterinária e eu acabei<br />

por entrar em dentária quando devia<br />

era entrar em veterinária, mas os<br />

três anos são básicos e são iguais. Eu<br />

sempre tive essa coisa engraçada que<br />

eu sempre gostei de muita coisa e na<br />

realidade não gostava de nada em<br />

concreto. Por isso fui para a área de<br />

ciências porque achava que dava mais<br />

hipóteses de escolher várias áreas. Na<br />

realidade, eu acho que até engenharia<br />

agrónoma eu gostava de ter tirado.<br />

Eu adoro plantas e faço imensas<br />

experiências com isso, portanto<br />

eu acho que hoje em dia se me<br />

perguntarem ou um jovem perguntarme<br />

“o que é que devo fazer?” eu acho<br />

que deves escolher um nicho de<br />

mercado, focares-te neste nicho de<br />

mercado, fazendo uma coisa que tu<br />

realmente gostes, sejas cozinheiro,<br />

dentista, qualquer curso, mas o que<br />

importa é fazer uma coisa que se goste<br />

e isso é a parte mais importante.<br />

Miguel, depois de tirar o curso<br />

de medicina dentária, depois da<br />

especialização surgiram novos<br />

projetos. Queria que me contasses um<br />

bocadinho dessa transição. Depois<br />

de terminar o curso, o que é que<br />

aconteceu ao Miguel?<br />

Quando eu acabei o curso o que<br />

aconteceu ao Miguel é que ele não<br />

conhecia quase ninguém dentista. A<br />

minha família não tinha nada a ver<br />

com dentária. O meu pai não tinha<br />

quase nenhum conhecimento. Então,<br />

o Miguel pegou num “currículozinho”<br />

e foi bater à porta desde Lisboa entre<br />

Santarém até Sesimbra numa área<br />

gigantesca a entregar currículos e a<br />

ver qual era a tentativa de ter algum<br />

sucesso. Claro, consegui algum biscate<br />

aqui e outro ali, um consultório ali<br />

e acolá. Entretanto, eu acabei com<br />

uma média suficientemente boa<br />

e fui convidado a ser professor na<br />

Faculdade, porque nós acabámos<br />

os cursos, mas quando saímos não<br />

tínhamos experiência nenhuma.<br />

Então, eu optei por duas coisas:<br />

uma, fazer uma pós-graduação em<br />

cirurgia e implantologia e aproveitei<br />

para ir para a área da endodontia e<br />

desvitalizações. Na faculdade, ser<br />

professor…na realidade eu fui para lá<br />

para aprender do que propriamente<br />

ensinar. Foi uma experiência incrível<br />

quando depois disto fui fazer esta<br />

especialização só que, entretanto,<br />

o meu pai disse “vais fazer uma<br />

especialização em implantologia,<br />

mas achas que alguma vez vais<br />

trabalhar nos Açores?”. Era um tema<br />

interessante naquela altura e eu disse<br />

“é uma cosia que eu gosto realmente<br />

e eu vou especializar-me” e fi-lo e não<br />

estou nada arrependido.<br />

Depois surge também a clínica de<br />

São Gonçalo. Este novo projeto que<br />

já tem anos, mas que a cada ano que<br />

passa é mais um sucesso a arrecadar.<br />

Conte-nos um bocadinho da história<br />

da Clínica de São Gonçalo e de como<br />

08 NODEZ20


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

surgiu este projeto e de como foi uma<br />

inovação na altura.<br />

Naquela altura aconteceu uma coisa<br />

muita engraçada, porque eu estava<br />

na tal parceria com a faculdade de<br />

Yorba Linda e a Faculdade de Lisboa,<br />

medicina dentária de Lisboa, a fazer<br />

a pós-graduação em implantologia<br />

quando se dá o 11 de setembro e os<br />

estudantes estrangeiros são obrigados<br />

a não entrar nos Estados Unidos da<br />

América. Só que naquela altura eu já<br />

tinha a clínica e o meu pai já estava<br />

a montar, arranjou-me o espaço<br />

e estava a montar a clínica cá. Eu<br />

lembro-me perfeitamente de pensar<br />

às vezes “e se eu tivesse estado mais<br />

nos Estados Unidos? Como é que teria<br />

sido a minha vida?”. Às vezes é aquele<br />

tipo de questões que se pergunta.<br />

Na altura, venho para a clínica com<br />

muita vontade de tecnologia. Sempre<br />

adorei tecnologia, adoro tecnologia,<br />

continuo a adorar tudo o que é<br />

tecnologia, continuo a adorar tudo<br />

o que é gadgets e isso tudo é o meu<br />

problema. Agora que estamos no<br />

Natal é uma chatice, mas quis fazer<br />

uma clínica exatamente especializada<br />

em tecnologia, principalmente uma<br />

clínica que pudesse transformar<br />

sorrisos e em que isso transforma<br />

a vida das pessoas. Na altura ainda<br />

não tinha bem a noção, porque não<br />

conhecia bem como é que era aqui a<br />

população nos Açores, como é que<br />

eram as coisas e isso são coisas que se<br />

vão construindo, digamos assim.<br />

Miguel, quando abriste a clínica<br />

depois de teres visto o que era a<br />

realidade açoriana, achas que, no<br />

teu entender, a clínica veio fazer a<br />

diferença naquilo que é inovação,<br />

porque há muitas pessoas que pensam<br />

que as clínicas dentárias são para<br />

arranjar um dente, para pôr um pivot<br />

mas é muito mais para além disso e,<br />

hoje em dia, há muito mais para saber<br />

além do pôr o dente e tirar o dente.<br />

Bom, isso é uma coisa muito<br />

interessante. O que é que as pessoas<br />

esperam de um dentista, não é? De<br />

uma forma geral, as pessoas esperam<br />

não ter dor. Isso é o que as pessoas<br />

esperam. Tudo o resto que tu podes<br />

dar como opção à pessoa vem por<br />

acréscimo. Queres fazer um implante,<br />

queres fazer uma ponte, queres fazer<br />

uma prótese removível… Eu acho<br />

que é muito importante a relação<br />

médico-paciente. Eu acho que isto<br />

é fundamental, esta qualidade nos<br />

médicos e perceber o que é que as<br />

pessoas precisam. Se dizes que a<br />

minha clínica foi cá revolucionária,<br />

na realidade quando eu cá cheguei já<br />

havia umas clínicas bastante boas até,<br />

sinceramente, com colegas que faziam<br />

muitas coisas espetaculares. Neste<br />

sentido, eu não cheguei chegando e<br />

era aqui a grande novidade, não. O<br />

que eu acho é que até àquela altura<br />

havia pouco. O meu pai pensava<br />

“vais fazer implantes nos Açores”,<br />

porque realmente eu comecei a fazer<br />

implantes nos Açores há quase 20<br />

anos e naquela altura eu próprio<br />

não tinha noção da capacidade que<br />

nós poderíamos ter. Isso é outra das<br />

coisas, nós temos nos portugueses<br />

e não só, nos açorianos, mais ainda,<br />

aquela desculpa de “nós somos<br />

010 NODEZ20 011<br />

NODEZ20


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

pequenos demais”. Portugal está na<br />

ultraperiferia Europeia, os Açores estão<br />

no meio do mar. Ainda no outro dia eu<br />

vi uma entrevista até que o meu irmão<br />

dava para o Observador que dizia “o mar<br />

pode ser visto com os olhos fechados ou<br />

como uma oportunidade de expandirmos”.<br />

Foi assim que Portugal descobriu o<br />

mundo inteiro e eu acho que isto é muito<br />

importante. Por exemplo, a tecnologia<br />

que desenvolvi, desenvolvi porque estava<br />

aqui nos Açores, porque se eu estivesse em<br />

Lisboa, provavelmente com milhares de<br />

laboratórios ao meu lado, eu não tinha essa<br />

necessidade de ser criativo e de ir buscar<br />

outras coisas.<br />

Tu tentaste apetrechar a clínica de<br />

utensílios ou de, não sei muito bem como<br />

se chama aqueles aparelhos todos, que<br />

trouxeram inovação, ou seja, trouxeram<br />

aquela necessidade. Começou também a<br />

ser colocado nas pessoas que só se vai ao<br />

dentista porque se tem uma dor. Vai-se ao<br />

dentista porque faz parte da saúde. É nessa<br />

questão que eu queria que falasses um<br />

pouco. É que, no fundo, tu quiseste passar<br />

isso, a tua clínica quis passar isto para o<br />

cliente, o paciente.<br />

Sim, exato. Essa do cliente, paciente é<br />

engraçado. Eu costumo dizer que o cliente é<br />

da porta do gabinete para fora e o paciente<br />

é da porta do gabinete para dentro. Era uma<br />

piada que tínhamos com um gestor de há<br />

uns anos atrás. A saúde não se desassocia.<br />

Não há saúde oral, eu não gosto muito<br />

do termo saúde oral, porque acho que a<br />

saúde é uma coisa global e que está tudo<br />

interligado. Portanto, para termos uma<br />

pequena noção, a maior parte dos setores<br />

de uma pessoa estão na boca, nos dentes.<br />

Ao mesmo tempo os olhos também são um<br />

dos próprios setores principais. Posso ter<br />

uma dor na coluna porque a tua oclusão<br />

não está correta, está tudo interligado e é<br />

esta multidisciplinaridade, hoje em dia, da<br />

medicina que eu acho que é fantástica. Hoje<br />

em dia, trabalhamos com equipas desde<br />

cirurgiões capilares, cirurgiões plásticos,<br />

especializados em faces por exemplo. É tudo<br />

isto, esta equipa. Aconteceu que naquela<br />

altura um colega meu muito conhecido<br />

que era o Miguel Stanley lançou a tour ‘Eu<br />

preciso de ajuda em Portugal’. O Miguel<br />

Stanley foi talvez das pessoas que mais<br />

fizeram pela medicina dentária em Portugal.<br />

Outro termo que acho muito mau é dizerem<br />

que a cirurgia dentária é o parente pobre<br />

da medicina. Eu não concordo nada com<br />

isso quando eu acho que nós devemos estar<br />

na vanguarda. O Miguel fê-lo através da<br />

televisão, fê-lo porque tem uma capacidade<br />

extraordinária de comunicação e aquele<br />

programa é que mudou muito. Naquela altura<br />

o que eu fiz e aí acho que fui oportunista, vi<br />

oportunidade, não é? Foi ver os programas<br />

num bom sentido, foi ver o que é que as<br />

pessoas procuravam e tentar canalizar isto<br />

para cá, para o nosso mercado e para a nossa<br />

realidade e foi isso que fizemos que era não<br />

só as pessoas tiravam as dores dos dentes às<br />

pessoas, mas sim a capacidade de restituir<br />

àquela pessoa as capacidades de função e não<br />

só estética. Repara, um sorriso é uma coisa<br />

super importante, pois não só a tua imagem é<br />

importante para uma entrevista de emprego,<br />

para arranjar um companheiro, é tanta coisa<br />

012 NODEZ20<br />

013<br />

NODEZ20


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

que podemos fazer, é a tua própria<br />

autoestima, influencia a vários níveis,<br />

até psicológico, digamos assim.<br />

Miguel, eu sei que andaste um pouco<br />

pelo mundo desde a juventude, mas<br />

também a nível profissional. Eu<br />

gostava que me falasses de uma ou<br />

duas experiências que tiveste nesse<br />

mundo da medicina dentária em<br />

qualquer parte do mundo.<br />

Se eu tiver que definir países onde<br />

eu estive que mais me fascinaram,<br />

um deles foi Cuba. Fiz lá um estágio<br />

de meses em cirurgia no hospital<br />

Joaquín Albarrán. Para mim,<br />

foi uma experiência muito boa,<br />

porquê? Porque os médicos lá são<br />

extraordinários, fazem omoletes sem<br />

ovos. Eu aprendi a desenrascar-me,<br />

literalmente, lá e dar valor àquilo<br />

que nós temos. Nós, por definição,<br />

queixamo-nos todos os dias daquilo<br />

que nós temos, mas chegar a um<br />

país no qual as pessoas vivem<br />

miseravelmente, onde tu não sabes<br />

que o teu professor, um médico<br />

cirurgião na altura, um cirurgião,<br />

com experiência fantástica, com 50<br />

e tal anos, e tu perguntares se ele vai<br />

querer o resto da tua pasta de dentes<br />

porque lá uma pasta de dentes é<br />

um mês de ordenado. Sim, porque<br />

uma pasta de dentes equivale a um<br />

mês de ordenado deles, então fazte<br />

pensar um bocado na vida. Eu<br />

acho que Cuba foi fascinante. Eu,<br />

por exemplo, tinha estado lá com<br />

os meus pais de férias antes e, como<br />

qualquer turista tonto, pedia para<br />

cantarem o Che Guevara e aquelas<br />

piadas todas e depois apercebi-me do<br />

terror que aquelas pessoas viviam e<br />

à porta fechada dentro de um bloco<br />

operatório falava-se de coisas que não<br />

se falava na comunicação social e não<br />

apareciam em lado nenhum. Essa,<br />

por exemplo, foi uma das grandes<br />

experiências que tive. Posso dizerte<br />

que outro país que me fascinou e<br />

onde eu tive também na faculdade<br />

de Telavive, foi Israel. Aquilo tornanos,<br />

a nós, o berço talvez de muitas<br />

religiões, para quem tem religião ou<br />

não, mas independentemente das<br />

nossas crenças religiosas é um país<br />

fantástico e aí está outro bom exemplo<br />

do que é um país ultraperiférico<br />

planetário, rodeado de países que os<br />

odeiam de morte e é uma das maiores<br />

potências em medicina dentária, em<br />

implantologia por exemplo. Outro<br />

país a que também dedico uma das<br />

maiores experiências que tive foi na<br />

Tunísia a dar uma palestra. É isso a<br />

importância de um jornalismo de<br />

qualidade e não aquele jornalismo<br />

sensacionalista. Quando me<br />

convidaram e disseram “vais dar uma<br />

palestra para a Tunísia?” eu pensei<br />

assim “eu vou falar para os tunisinos”.<br />

Eu lembro-me perfeitamente de estar<br />

a voar de Paris para Tunes e pensar<br />

assim: “Deixa-me beber aqui o último<br />

copo de vinho porque eu vou chegar<br />

lá e nada. Não, qual quê, chego lá e<br />

malta super festiva, coisas diferentes,


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

obviamente. Os homens dançam com<br />

homens, as mulheres não dançam<br />

muito, são coisas assim, mas super<br />

festivos, foi super engraçado, uma<br />

grande experiência. No final, a única<br />

coisa que eu estranhei foi na entrega<br />

dos diplomas. Eu na minha vida só<br />

tinha beijado dois homens, o meu<br />

irmão e o meu pai e agora tinha que<br />

beijar todos os homens e as mulheres<br />

um aperto de mão e aquilo foi um<br />

bocado estranho a entrega dos<br />

diplomas no final, era cada um mais<br />

barbudo do que o outro, mas acho que<br />

são essas coisas que nos enriquecem<br />

culturalmente e passamos a ter uma<br />

perceção do mundo diferente. Se<br />

todos viajássemos mais, acho que<br />

havia muito menos guerras.<br />

Olha, eu sei que tens uma grande<br />

paixão pelos Estados Unidos. Eu<br />

sei que o teu irmão esteve há pouco<br />

tempo nos Estados Unidos e tu<br />

poderias também estar nos Estados<br />

Unidos, mas escolheste os Açores.<br />

É, é um facto. Eu adoro os Estados<br />

Unidos. Para já eu acho que nós<br />

Açorianos estamos entre os dois<br />

mundos. Há bocadinho falávamos e<br />

eu comentava exatamente isso, eu às<br />

duas por três senti que estava tanto<br />

a ir para os Estados Unidos, que<br />

estava quase mais perto dos Estados<br />

Unidos do que realmente do nosso<br />

país, de Portugal. Eu acho que nós<br />

nos Açores temos essa ambiguidade<br />

entre os dois mundos, não é? Vivemos<br />

aqui no meio da banheira e é sempre<br />

aquele pensamento muito nos Estados<br />

Unidos em relação à Europa. O que<br />

eu gosto nos Estados Unidos é que é<br />

uma terra de oportunidades, todos<br />

nós sabemos, mas o que eu mais<br />

gosto nos Estados Unidos é o facto de<br />

ser valorizada a meritocracia. Uma<br />

sociedade baseada onde as pessoas<br />

trabalham em mérito e onde falhar<br />

faz parte do processo. Uma das coisas<br />

que eu acho piada nos Americanos é<br />

que eles falham imenso enquanto que<br />

aqui é visto como quase um insucesso,<br />

apontar o dedo e falar dessas pessoas<br />

porque falharam seja a nível pessoal,<br />

seja a nível profissional. Lá não, falhar<br />

faz parte do processo e quantas mais<br />

vezes falhares mais probabilidade tens<br />

e quanto mais rapidamente superares<br />

esse obstáculo, mais oportunidade<br />

tens de ter sucesso. Eu adoro<br />

realmente os Estados Unidos por<br />

isso mesmo, por essa cultura que eles<br />

têm do empreendedorismo e ligada à<br />

meritocracia. É claro que a coisa que<br />

eu mais gosto nos Estados Unidos<br />

são as minhas duas sobrinhas que<br />

são Americanas, essa é a parte que eu<br />

gosto mais.<br />

Miguel, novos projetos. O que é que<br />

está escondido ou o que é que está<br />

neste momento na forja para sair?<br />

Olha, não vos posso revelar já. Eu<br />

tenho estado em conversações,<br />

porque ainda não fechamos, não<br />

chegamos a acordo ainda com o<br />

hospital, provavelmente quando essa<br />

entrevista for para o ar já temos uma<br />

resposta em relação a isto, mas eu<br />

sinceramente acho que o hospital<br />

privado dos Açores poderá ser um<br />

grande fenómeno que poderá vir a<br />

acontecer nesta região. Por vários<br />

motivos, por causa do turismo<br />

médico, das nossas comunidades ou<br />

mesmo essa diáspora que existe nos<br />

Estados Unidos. É uma oportunidade<br />

para eles virem cá. Sim, porque nos<br />

Estados Unidos a medicina dentária, a<br />

medicina geral é estupidamente cara.<br />

Porquê? Porque estás a pagar pelos<br />

processos todos. Mais de metade do<br />

salário de um médico é para pagar<br />

os processos judicias que existem,<br />

portanto é ridiculamente caro. Ou<br />

seja, uma coisa que aqui pode custar<br />

016 NODEZ20 017<br />

NODEZ20


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

500 euros, lá custa 5 mil dólares e o<br />

material é mais ou menos o mesmo e a<br />

gente acha “os americanos consolamse<br />

e estão a ganhar muito dinheiro”.<br />

Não, não estão, infelizmente, quem<br />

está a ganhar dinheiro com isto são as<br />

seguradoras.<br />

Por exemplo, já agora que levantaste<br />

isto, muitos dos teus clientes da<br />

Clínica de São Gonçalo são das<br />

nossas comunidades. Muitos dos<br />

nossos leitores que ouvem e leem<br />

essa entrevista serão com certeza ou<br />

terão alguém conhecido que frequenta<br />

a tua clínica. Como é que vês este<br />

fenómeno de vir tanta gente aqui para<br />

o meio do oceano e se calhar não são<br />

só açorianos, são também ligados<br />

ao continente e americanos mesmo.<br />

Porquê este fenómeno? O serviço é<br />

melhor?<br />

Há vários fatores que podem explicar<br />

isso. Um é exatamente esse, é o fator<br />

preço, não há dúvida que entra na<br />

equação claramente. É a tal história<br />

nos Estados Unidos de que as coisas<br />

se tornam muito caras exatamente<br />

por causa dos seguros que os médicos<br />

têm de pagar. Além disso acontece<br />

que nós em Portugal, talvez as pessoas<br />

não saibam, mas Portugal é um dos<br />

países mais desenvolvidos em medica<br />

dentária do planeta e devemos isso aos<br />

brasileiros porque foram os brasileiros<br />

que vieram para Portugal numa<br />

altura em que a medicina dentária era<br />

uma muito arcaica e os portugueses<br />

tiveram de se adaptar com um dos<br />

povos mais desenvolvidos do mundo<br />

em estética não só dentária, mas<br />

também na cirurgia plástica. Não é<br />

à toa que temos grandes exemplos<br />

de grandes clínicas que se fizeram<br />

em Portugal e que se espalharam um<br />

pouco por todo o globo. Eu também<br />

tive o privilégio de ter a sorte de<br />

nos Açores termos a RTP Açores<br />

que é um programa que passa na<br />

RTP Internacional que é a Consulta<br />

Externa e passa em prime time nos<br />

Estados Unidos. Isso significa que<br />

ao fim de muitos anos, hoje em<br />

dia, temos cerca de 30% dos nossos<br />

clientes da Clínica de São Gonçalo,<br />

tirando este ano atípico do covid,<br />

obviamente, mas 30% são americanos<br />

ou luso-descendentes ou até já<br />

pessoas que casaram com americanos<br />

e que já vinham cá. Estou aqui a<br />

lembrar-me diretamente de um caso<br />

em concreto do Eduardo Schumann,<br />

mas de outros que nos procuraram e<br />

isso é muito gratificante.<br />

Mas uma das coisas que se costuma<br />

dizer da medicina dentária, não<br />

estou a falar das outras medicinas,<br />

em específico, a medicina dentária<br />

está muito mais desenvolvida na<br />

Europa do que propriamente nos<br />

Estados Unidos e tu és um dos rostos<br />

principalmente de Portugal senão<br />

do top 10 a nível da Europa. Com<br />

este reconhecimento, como é esta<br />

sensação?<br />

Eu posso dizer que acima de tudo<br />

é realmente muito gratificante. É<br />

muito gratificante pela causa, pelo teu<br />

empenho, porque eu acho que quando<br />

tens o privilégio de o teu trabalho<br />

virar o teu hobby e conseguires com<br />

isto alcançar isso, porque realmente<br />

isso em termos monetários não dá<br />

nada, mas dá-te muito mais, é muito<br />

mais overwhelming, é aquilo que te<br />

vai realizar completamente e eu acho<br />

que enche completamente e depois<br />

tens o privilégio de conhecer pessoas<br />

de todo o lado, poderes viajar para<br />

todo o lado, explicares o teu ponto de<br />

vista. Eu começo e acabo sempre as<br />

minhas palestras com uma cauda de<br />

uma baleia a dar, eu já tive pessoas<br />

que vieram viajar, estou a lembrarme<br />

da Cláudia Cordati, uma médica<br />

dentista de San Diego que veio aqui<br />

aos Açores porque ouviu falar disto<br />

018 NODEZ20 019<br />

NODEZ20


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

e que isto era parecido com o Havai<br />

porque eu lhe tinha mostrado, e são<br />

essas coisas que eu acho que são<br />

fantásticas e teres amigos no planeta<br />

todo. Hoje em dia, às vezes, tenho<br />

chatices é com os jogos de futebol, às<br />

vezes é difícil porque eu gosto tanto<br />

de alguns países.<br />

Mas explica aqui aos nossos, explica<br />

aqui a quem está a ler e a ouvir-nos, o<br />

que é que é isso da AIC?<br />

O AIC é um centro de formação<br />

global de uma marca coreana já há<br />

uns anos valentes. Para começar, eu<br />

adoro a Ásia e adoro a mentalidade<br />

coreana, porquê? Porque os coreanos<br />

são “brincar é brincar e trabalhar<br />

é trabalhar”, mas quando eu digo<br />

trabalhar lá é trabalhar. Nós achamos<br />

que o norte da Europa, achamos que<br />

os alemães são assim, mas os alemães<br />

ao pé dos coreanos são pouco e isso é<br />

interessante, nós vemos a perspetiva<br />

do workaholic, lá é mesmo levado<br />

ao mais amplo sentido da palavra e<br />

são muito focados. Não é à toa que<br />

a Coreia é um país do tamanho de<br />

Portugal, que tem por aí 700 km lés<br />

a lés do tamanho de Portugal. É um<br />

país que tem a Samsung, se a gente for<br />

ver tem a terceira maior empresa do<br />

mundo de implantologia e o que faz<br />

é para uniformizar os cursos a nível<br />

planetário, forma diretores de cursos<br />

europeus como no caso somos 12 e<br />

depois esses diretores de curso dão<br />

as palestras. Fizemos um centro de<br />

formação que estamos a construir que<br />

era para termos montado este ano. Eu<br />

estava em França a fazer o centro de<br />

formação em Paris quando aconteceu<br />

esta história, quando rebentou o covid<br />

e eu tive só tempo de voltar para<br />

trás, mas ao mesmo tempo o covid<br />

foi outra grande abertura porque<br />

eu passei a dar grande parte das<br />

palestras online e então nós podemos<br />

aproveitar as coisas piores que nos<br />

acontecem para tentar ver o que<br />

podemos aprender com isto e isso foi<br />

uma das coisas que aprendi.<br />

Miguel, eu gostaria que deixasses<br />

uma mensagem como médico para<br />

os nossos leitores, pela primeira<br />

revista de <strong>2021</strong>, como médico de<br />

sorrisos porque passas também<br />

a ser conhecido assim, uma<br />

mensagem para todos eles a respeito<br />

precisamente daquilo que é a saúde<br />

oral que tu não gostas que se trate<br />

assim, mas dá-lhe outro nome.<br />

A minha mensagem para todos é<br />

que este ano esperemos todos nós<br />

que <strong>2021</strong> seja um ano onde haja<br />

mais sorrisos do que em 2020. Foi<br />

um ano caracterizado por função<br />

da pandemia da covid, por termos<br />

visto e termos equacionado muitas<br />

coisas, inclusive o que estamos aqui<br />

a fazer, se estamos no caminho certo.<br />

Acho que foi fantástico, para mim foi<br />

um ano fantástico, aqueles meses de<br />

clausura fizeram muita introspeção<br />

sobre mim mesmo, sobre o que eu<br />

pretendia para a minha vida. Acho<br />

que todos nós podemos ter ganho<br />

muito com isso.<br />

Do negativo tirar o positivo?<br />

Eu acho que isto é a mensagem. É<br />

claro que eu espero que <strong>2021</strong> seja um<br />

ano que a gente possa rir bastante e<br />

que as vacinas tenham muito sucesso<br />

e vamos todos ter esperança que esta<br />

coisa vai melhorar.<br />

020 NODEZ20 021<br />

NODEZ20


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GRUPO<br />

9600-549 Ribeira Grande<br />

geral@grupoideal.pt<br />

022 NODEZ20 023<br />

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ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

AEXPERIÊNCIA<br />

JOVENS<br />

DOS<br />

PARLAMENTO NO<br />

AÇORIANO<br />

POR CLÁUDIA CARVALHO<br />

Em virtude das eleições do passado<br />

dia 25 de outubro de 2020, foram<br />

eleitos três jovens para o parlamento<br />

açoriano de três partidos – PS,<br />

PSD e PPM. Os deputados foram<br />

eleitos pelos círculos eleitorais de<br />

São Miguel e Flores e têm idades<br />

compreendidas entre os 28 e os<br />

31. Todos prometem defender os<br />

interesses dos jovens açorianos<br />

perante os desafios que enfrentam<br />

no que respeita ao acesso ao<br />

emprego e na definição de melhores<br />

políticas para a juventude. A NO<br />

entrevistou, assim, os três jovens<br />

que desempenham funções durante<br />

a próxima legislatura.<br />

024 NODEZ20 025<br />

NODEZ20


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

FLÁVIO<br />

SOARES<br />

Deputado do PSD/A e Presidente da JSD<br />

Sou um jovem, de 31<br />

anos, que se orgulha de<br />

ter agora a oportunidade<br />

de servir os Açores na<br />

Assembleia Legislativa.<br />

Nasci na Feteira Pequena,<br />

no Nordeste, mas resido<br />

em Ponta Delgada há<br />

cerca de 10 anos.<br />

“<br />

FALE-NOS<br />

SOBRE SI – DO<br />

SEU PERCURSO<br />

PESSOAL,<br />

ACADÉMICO E<br />

PROFISSIONAL.<br />

Depois de concluir o curso de<br />

Técnico de Gestão de Equipamentos<br />

Informáticos na Escola Profissional<br />

de Nordeste, decidi vir para<br />

Ponta Delgada para ter mais<br />

oportunidades de emprego, mas<br />

nunca abandonei o meu concelho.<br />

Fui, durante cerca de 10 anos,<br />

colaborador da Fundação Gaspar<br />

Frutuoso, destacado no Instituto<br />

de Investigação em Vulcanologia<br />

e Avaliação de Riscos (IVAR) da<br />

Universidade dos Açores onde<br />

pratiquei atividades relacionadas<br />

com a operação e manutenção da<br />

Estação Internacional de Infrassons,<br />

integrada nas Nações Unidas e<br />

instalada na ilha Graciosa.<br />

Durante todos estes anos de<br />

experiência, tive a oportunidade de<br />

participar em diversos Workshops<br />

e Formações Internacionais<br />

relacionados com a minha atividade<br />

e ainda tive a oportunidade de ser<br />

autor e coautor de várias publicações<br />

e apresentações científicas quer<br />

a nível nacional, quer a nível<br />

internacional.<br />

Sou Presidente da JSD Açores desde<br />

2017, estando já a terminar o meu<br />

segundo e último mandato.<br />

026 NODEZ20 NODEZ20 027


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

Quem me conhece sabe que venho de uma família humilde e<br />

trabalhadora, onde sempre foi imposto que é preciso trabalhar<br />

para se conseguir alcançar os nossos objetivos e onde o<br />

respeito pelos outros, independentemente de tudo, deve estar<br />

sempre em primeiro lugar. Nada se consegue sem trabalho e<br />

tem sido essa a minha lei de vida. Trabalhar para conseguir<br />

alcançar objetivos.<br />

Desde muito cedo envolvi-me na minha comunidade, quer em<br />

atividades religiosas, quer em atividades culturais e sociais.<br />

Lutei e trabalhei pela vida e isso faz de mim uma pessoa com<br />

enorme orgulho no percurso sério e dedicado que mantive até<br />

aos dias de hoje e quero continuar a ter com o novo desafio<br />

que vou enfrentar nos próximos quatro anos.<br />

O interesse<br />

pelo campo<br />

político<br />

começou a<br />

manifestar-se<br />

desde novo?<br />

Se sim, porquê?<br />

Sempre me interessei pela política,<br />

gostava de acompanhar os debates<br />

da Assembleia da República e de<br />

ouvir alguns comentadores sobre<br />

a atualidade política. Apenas<br />

com 22 anos de idade me envolvi<br />

na Juventude Social Democrata<br />

porque sentia que devia e queria<br />

contribuir para o desenvolvimento<br />

da minha região. Toda a restante<br />

responsabilidade foi surgindo aos<br />

poucos, sem me aperceber do que<br />

estava acontecendo. Hoje tenho a<br />

responsabilidade de ser deputado<br />

regional, mas sem amarras aos<br />

cargos, apenas e só comprometido<br />

em melhorar a qualidade de vida de<br />

todos os Açorianos, em especial os<br />

mais jovens.<br />

028 NODEZ20 029<br />

NODEZ20


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

QUANDO E<br />

PORQUE É QUE<br />

SE TORNOU<br />

MEMBRO<br />

INTEGRANTE<br />

DA JUVENTUDE<br />

SOCIAL<br />

DEMOCRATA<br />

DOS AÇORES?<br />

Tudo começou em 2012 quando<br />

decidi integrar o PSD Açores e, por<br />

via disso, a JSD Açores. Acabei por<br />

ficar a conhecer melhor o projeto,<br />

os objetivos e algumas das suas<br />

propostas. Durante todo esse ano,<br />

ano em que se realizaram eleições<br />

regionais, participei em iniciativas<br />

de campanha e acompanhei, por<br />

diversas vezes, algumas ações, isto<br />

sem estar em qualquer órgão da JSD<br />

Açores. Depois, inesperadamente,<br />

ingressei os órgãos da JSD<br />

Nordeste. Longe de mim pensar<br />

que algum dia seria presidente da<br />

JSD Açores. Não foi esse o meu<br />

objetivo inicial. Queria apenas<br />

contribuir com alguma coisa, por<br />

mais insignificante que fosse, mas na<br />

verdade tudo me foi surgindo e fui<br />

adaptando-me às realidades.<br />

É,<br />

ATUALMENTE,<br />

O PRESIDENTE<br />

DA JSD/<br />

AÇORES.<br />

SENTE QUE<br />

O FACTO DE<br />

JÁ ESTAR<br />

INTIMAMENTE<br />

LIGADO À<br />

ÁREA FOI<br />

UM FATOR<br />

FACILITADOR<br />

PARA SI NO<br />

PANORAMA<br />

POLÍTICO<br />

REGIONAL?<br />

Naturalmente que sim, o facto de<br />

ser presidente de uma estrutura<br />

regional dá uma visão e uma<br />

perspetiva diferente das coisas. Tudo<br />

isto fez com que conhecesse pessoas<br />

de todas as ilhas e com capacidades<br />

impressionantes. Isso naturalmente<br />

fez com que tivesse uma projeção<br />

regional que de outra forma não<br />

seria possível. É preciso que os<br />

políticos regionais assumam uma<br />

visão regional, mas diferenciada<br />

para cada ilha. Não podemos<br />

continuar a achar que as medidas<br />

que são implementadas em Santa<br />

Maria terão o mesmo impacto que<br />

aquelas que serão implementadas<br />

na Terceira. Isto nos trará um<br />

desenvolvimento efetivo para todos.<br />

030 NODEZ20 031<br />

NODEZ20


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

O QUE É QUE<br />

O LEVOU A<br />

ACEITAR O<br />

CONVITE DO<br />

PARTIDO<br />

SOCIAL<br />

DEMOCRATA<br />

PARA<br />

INTEGRAR<br />

A LISTA ÀS<br />

ELEIÇÕES<br />

REGIONAIS?<br />

QUAIS ERAM<br />

AS SUAS<br />

EXPECTATIVAS?<br />

Como já referi anteriormente,<br />

aceitei todos os desafios ao longo<br />

destes anos com o propósito de<br />

servir e de contribuir ativamente<br />

para o desenvolvimento de cada<br />

uma das nossas ilhas e foi isto que<br />

me fez aceitar o desafio proposto<br />

de integrar a lista candidata à<br />

Assembleia Legislativa da Região<br />

Autónoma dos Açores por São<br />

Miguel. Fui indicado pela concelhia<br />

de Nordeste e isto trouxe-me outras<br />

responsabilidades acrescidas.<br />

Não podia virar as costas a uma<br />

responsabilidade destas, de poder<br />

servir o meu concelho natal, a<br />

minha ilha e a nossa Região. O<br />

Nordeste merece ter um deputado<br />

que o represente e que o possa<br />

defender e ser a sua voz. Este é<br />

um dos meus compromissos.<br />

O Nordeste é<br />

um concelho<br />

abandonado<br />

pelos governos<br />

socialistas, que não<br />

cumpriram os seus<br />

compromissos,<br />

alguns deles com<br />

mais de 20 anos.<br />

No entanto, como<br />

presidente da JSD<br />

Açores, considero<br />

que a juventude<br />

deve ter alguém que<br />

os represente. Não<br />

podemos afirmar<br />

que contamos<br />

com a juventude e<br />

depois não incluir os<br />

jovens, em lugares<br />

de destaque, nas<br />

respetivas listas.<br />

A JSD merece e<br />

deve ter alguém<br />

que a represente<br />

no Parlamento<br />

Regional. Não<br />

baixarei os braços<br />

para defender<br />

os interesses da<br />

juventude.<br />

032 NODEZ20 033<br />

NODEZ20


ENTREVISTA<br />

A ÁREA DOS<br />

JOVENS É DE<br />

ESPECIAL<br />

INTERESSE<br />

PARA SI,<br />

SOBRETUDO<br />

PELO CARGO<br />

QUE OCUPA<br />

ENQUANTO<br />

PRESDIDENTE<br />

DA JSD/A. O<br />

QUE PODEM OS<br />

AÇORIANOS,<br />

EM ESPECIAL<br />

OS JOVENS,<br />

ESPERAR DE<br />

SI DURANTE<br />

OS PRÓXIMOS<br />

QUATRO ANOS?<br />

Acredito que poderei dar um<br />

contributo muito grande em<br />

melhorar a qualidade de vida dos<br />

jovens e não só. Não podemos<br />

admitir que as políticas públicas<br />

para a juventude sejam apenas o<br />

cartão Interjovem ou os programas<br />

de estágio. Temos de ir mais longe e<br />

é nisto que acredito que posso dar o<br />

meu contributo, como, aliás, tenho<br />

dado enquanto presidente da JSD<br />

Açores, como referiu.<br />

Os Açores passaram de uma<br />

região a um passo de consolidar o<br />

seu crescimento a uma região de<br />

instabilidade e incerteza, fruto de<br />

sucessivas governações que apenas<br />

visaram a manutenção no poder dos<br />

mesmos de sempre.<br />

Hoje, são os jovens os mais<br />

prejudicados com as opções do<br />

passado recente.<br />

As políticas de juventude devem ser<br />

abrangentes e integrar a conceção<br />

do jovem e do seu projeto de<br />

vida, passando, primeiro, por um<br />

momento de auscultação sem filtros.<br />

Qualquer governo deverá fazer<br />

sua prioridade o bem-estar da sua<br />

população, dependendo deste todo<br />

o sucesso das suas medidas.<br />

A juventude açoriana pode contar<br />

comigo para que, com determinação<br />

e empenho, as poder defender e<br />

apresentar as melhores medidas<br />

e aquelas que vão ao encontro da<br />

resolução dos seus problemas.<br />

Acredito que poderei dar um forte<br />

contributo nesse aspeto e espero não<br />

desiludir.<br />

034 NODEZ20<br />

NODEZ20


ENTREVISTA<br />

HÁ ALGUMA<br />

MENSAGEM<br />

QUE QUEIRA<br />

DEIXAR AOS<br />

NOSSOS<br />

LEITORES?<br />

Para terminar, e de uma forma<br />

muito resumida, penso ser<br />

importante que todos os açorianos<br />

possam dar uma oportunidade a<br />

este governo regional. A alternância<br />

democrática é muito importante<br />

para o próprio espírito livre de cada<br />

um mas, e acima de tudo, para que<br />

não se crie vícios, que num passado<br />

muito recente se veio a confirmar<br />

que se criaram. Estou certo de que<br />

este Governo vai dar o seu melhor<br />

para satisfazer os interesses de<br />

todos os Açorianos e que vão, de<br />

alguma forma, contribuir para<br />

o desenvolvimento de cada uma<br />

das nossas nove ilhas. Os Açores<br />

precisavam desta mudança e vamos<br />

poder confirmar isto mesmo nos<br />

próximos tempos. Os Açorianos só<br />

têm a ganhar com esta mudança,<br />

não a desperdicemos.<br />

036 NODEZ20


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

GUSTAVO<br />

ALVES<br />

Deputado do PPM/A<br />

Sou o Gustavo Alves, 28 anos,<br />

natural de Ponta Delgada,<br />

freguesia virada a norte na Ilha<br />

das Flores. Conheci, e conheço,<br />

nesta freguesia e ilha, gente<br />

muito diligente, trabalhadora,<br />

que respeita o outro, que<br />

tem sentido de interajuda e<br />

responsabilidade. Atravessam<br />

a ilha só para ir dar uma<br />

“mãozinha” e nada pedir em<br />

troca. Serão pagos um dia com<br />

a sorte e saúde. Faço parte desse<br />

tipo de pessoa... Aquele que, por<br />

outro lado, é ingénuo e a vida<br />

vai ensinando a amadurecer, não<br />

fosse o tempo o melhor professor<br />

e curandeiro.<br />

““<br />

FALE-NOS<br />

SOBRE SI – DO<br />

SEU PERCURSO<br />

PESSOAL,<br />

ACADÉMICO E<br />

PROFISSIONAL.<br />

Durante o meu percurso de<br />

adolescente viajei diversas vezes,<br />

como outros colegas de turma,<br />

para outras ilhas, em actividades<br />

escolares ou desportivas, e também<br />

em férias com a família. Conheci<br />

então outras realidades para além<br />

da vivida na Ilha das Flores e,<br />

sendo um pouco reguila, nunca me<br />

conformei com a diferença do nível<br />

de vida de uma ilha para a outra,<br />

ou mesmo com cidades de Portugal<br />

Continental. Vendo um enorme<br />

potencial em imensas áreas nas<br />

Flores, sempre fui muito sonhador<br />

e criativo nas possíveis soluções<br />

para certos problemas. Mas, como<br />

outros, nunca passei disso. Muito<br />

por falta de capital, local para<br />

começar algo, acesso a ferramentas,<br />

coragem para arriscar e ir contra<br />

todos os que dizem que não vai<br />

dar certo. Ao fim e ao cabo, eu e<br />

outros sonhadores nunca tiveram<br />

uma rampa de lançamento para o<br />

empreendedorismo jovem, logo o<br />

dinheiro no bolso não podia crescer.<br />

038 NODEZ20 NODEZ20 039


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

Entretanto, estava sem rumo<br />

no ensino secundário e um<br />

amigo aconselhou-me o curso<br />

profissional de Contramestre da<br />

Marinha Mercante. Assim o fiz e<br />

fui marinheiro durante uns anos.<br />

Viajei pela Europa, absorvi coisas<br />

lindas e ideias práticas que se<br />

adoptam nesses países. Contudo,<br />

enjoava muito e tinha grandes<br />

ideias para regressar à ilha mãe e<br />

fazer o meu primeiro negócio. A<br />

pandemia ajudou a deixar os navios,<br />

pois metade da frota para quem<br />

prestava serviços entrou em layup,<br />

acção de encostar os navios em<br />

portos com taxas baixas, desligar<br />

praticamente tudo a bordo, reduzir<br />

ao máximo a tripulação e esperar<br />

por melhores preços de mercado<br />

para reactivar os navios. Regressei<br />

a casa, estive desempregado uns<br />

meses e encontrei trabalho no café<br />

restaurante “O Porto Velho” até às<br />

recentes eleições regionais.<br />

QUANDO É<br />

QUE SURGIU<br />

O INTERESSE<br />

PELO CAMPO<br />

POLÍTICO?<br />

Sempre que pensava na<br />

possibilidade de me envolver na<br />

política passava sempre por me<br />

candidatar a uma junta de freguesia,<br />

mas só quando tivesse um negócio<br />

montado e estivesse com a vida<br />

estável, dedicando-me ao máximo<br />

no governo da freguesia e servidão<br />

das pessoas, esperando assim a<br />

confiança da maioria do eleitorado.<br />

Previa isso acontecer daqui a uma<br />

década… e eis que recebo o convite<br />

do líder regional do PPM, Paulo<br />

Estevão, para integrar uma lista às<br />

eleições regionais.<br />

040 NODEZ20 041<br />

NODEZ20


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

O QUE É QUE<br />

O LEVOU A<br />

ACEITAR O<br />

CONVITE DO<br />

PPM PARA<br />

INTEGRAR<br />

A LISTA ÀS<br />

ELEIÇÕES<br />

REGIONAIS?<br />

QUAIS ERAM<br />

AS SUAS<br />

EXPECTATIVAS?<br />

Quando recebi o convite pensei<br />

logo nas dificuldades todas que iria<br />

encontrar. Não sendo muito letrado<br />

e com alguns conflitos no cérebro<br />

e defeitos que me atribuo, como<br />

seria encarar a hipótese de ser uma<br />

das vozes do povo no Parlamento<br />

Açoriano! Mas pelo contrário,<br />

sinto que, sendo próximo das<br />

pessoas e sabendo ouvi-las, posso<br />

ajudar o povo a desenvolver as suas<br />

aptidões, aumentar a oferta local e<br />

consequente aumento de receita.<br />

Pensei seriamente no assunto.<br />

As pessoas a quem partilhei o<br />

assunto, na generalidade, tinham<br />

muitas dúvidas de eu conseguir<br />

ser eleito. Seriam precisos muitos<br />

votos, o partido é pequeno e era<br />

um risco para o futuro: se quisesse<br />

concorrer para algo público, seja<br />

emprego ou apoios, o sentimento<br />

é que iriam-me cortar em tudo; se<br />

tivesse algum negócio, que iria ter<br />

várias inspecções à porta só para<br />

vingança. Isto era a realidade vivida<br />

e era a realidade que tinha que ser<br />

combatida. Ser chamado para tal,<br />

para mim é uma honra e avancei<br />

com a convicção de que seria eleito.<br />

O PPM<br />

CONSEGUIU,<br />

PELA PRIMEIRA<br />

VEZ, FORMAR<br />

UM GRUPO<br />

PARLAMENTAR.<br />

COMO É<br />

QUE SERÁ<br />

ACOMPANHAR<br />

O DEPUTADO<br />

PAULO<br />

ESTÊVÃO<br />

PARA ESTES<br />

PRÓXIMOS<br />

QUATRO<br />

ANOS?<br />

Entrar para o Parlamento, pela<br />

primeira vez, ao lado do Paulo<br />

Estêvão, para mim é um prestígio<br />

enorme. Vou aprender muita coisa<br />

com ele e pedir muita ajuda para<br />

elevarmos estas duas pequenas ilhas<br />

esquecidas há anos. As Flores estão<br />

a perder população há décadas, não<br />

há quase outra hipótese de emprego<br />

sem ser nos serviços públicos. A<br />

habitação é um problema actual que<br />

se não se fizer nada a curtíssimo<br />

prazo, estamos a expulsar jovens<br />

desta terra. A saúde está cada vez<br />

pior, “só quem passa é que sabe”,<br />

como diz muita gente, a educação<br />

está esquecida e desvalorizada…<br />

Portanto, o Paulo conseguiu um<br />

Grupo Parlamentar que lhe vai<br />

arranjar mais uns cabelos brancos,<br />

pois a herança nas Flores não é das<br />

mais sustentáveis e planeadas. Assim<br />

como pelos Açores fora… vai dar<br />

trabalho!<br />

042 NODEZ20 043<br />

NODEZ20


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

EM OUTUBRO, ANTES<br />

DE TER SIDO ELEITO,<br />

GARANTIU QUE TERIA<br />

“UM FORTE EMPENHO”<br />

PARA “ACOMPANHAR<br />

PORMENORIZADA-<br />

MENTE AS OBRAS DE<br />

RECONSTRUÇÃO<br />

DO PORTO DAS<br />

LAJES”. MANTÉM A<br />

MESMA FIRMEZA<br />

DESTA AÇÃO<br />

FISCALIZADORA<br />

DA SUA PARTE<br />

ENQUANTO DEPUTADO<br />

AGORA QUE O PPM É<br />

PARTE INTEGRANTE<br />

DO EXECUTIVO?<br />

Sem dúvida alguma, mas agora com<br />

responsabilidades acrescidas para<br />

com essa e qualquer obra pública.<br />

O dinheiro dos contribuintes ou da<br />

Europa, tem que ser bem empregue<br />

e gerido com o máximo de controlo.<br />

O Porto Comercial das Flores, que<br />

chamei e é chamado erradamente<br />

de Porto das Lajes, é fundamental<br />

para a ilha e precisamos da sua<br />

reconstrução. Mas não queremos<br />

uma reconstrução feita às pressas e<br />

com falhas irremediáveis. Queremos<br />

algo bem pensado e com perspetiva<br />

para o futuro e que seja bastante<br />

operacional. Por isso apercebo-me<br />

logo à partida que o projecto no<br />

seu todo deveria ser mais discutido.<br />

Quero salientar que, entretanto,<br />

é essencial estudar um navio que<br />

tenha as melhores características<br />

para suportar a ilha, e até outras,<br />

mesmo com o porto assim neste<br />

estado. Faltava visão aos anteriores<br />

governantes. Aos novos, vou<br />

partilhar umas ideias e sei que vão<br />

ser mais tidas em conta que no<br />

passado.<br />

O QUE É<br />

QUE OS<br />

FLORENTINOS<br />

PODEM<br />

ESPERAR<br />

DO SEU<br />

CONTRIBUTO<br />

NO QUE<br />

RESPEITA A<br />

DEFENDER OS<br />

INTERESSES<br />

DA SUA ILHA?<br />

Os florentinos podem esperar muito<br />

empenho e dedicação no que toca a<br />

defender os interesses da ilha. Para<br />

isso também peço, aos florentinos<br />

e a todos os açorianos, que quando<br />

encontrarem algum problema ou<br />

situação difícil, primeiro devem<br />

reportar/reclamar no sítio certo,<br />

conforme o tipo de problema.<br />

Ninguém pode resolver nada se não<br />

se apresentar queixa ou reclamação.<br />

Parece ser da nossa cultura não<br />

reclamar formalmente, pensando<br />

sempre que não dá em nada. E peço<br />

também que compreendam que<br />

os deputados não sabem de tudo<br />

o que se passa em todo o lado. A<br />

população tem de alertar. A falar é<br />

que nos entendemos.<br />

044 NODEZ20 045<br />

NODEZ20


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

A ÁREA DOS<br />

JOVENS É DE<br />

ESPECIAL<br />

INTERESSE<br />

PARA SI,<br />

SOBRETUDO<br />

PORQUE É O<br />

DEPUTADO<br />

MAIS NOVO NO<br />

PARLAMENTO<br />

AÇORIANO. QUE<br />

CONTRIBUTO É<br />

QUE OS JOVENS<br />

AÇORIANOS<br />

PODEM<br />

ESPERAR DE<br />

SI?<br />

Aos jovens açorianos posso dizer<br />

que, sendo eu igual a eles, passo por<br />

situações semelhantes às deles. Vou<br />

me esforçar muito para transmitir<br />

esperança e ideias de que é possível<br />

viver nos Açores com uma excelente<br />

qualidade de vida. Para isso temos<br />

de ser muito trabalhadores, como<br />

os nossos antepassados, e temos de<br />

viver em comunidade, não deixando<br />

morrer a nossa cultura e identidade.<br />

Portanto, da minha parte, espero<br />

criar soluções para que os jovens<br />

descubram os seus melhores<br />

atributos, que não abandonem o<br />

ensino e incentivá-los a trabalhar<br />

muito. A única solução em tudo será<br />

sempre muito trabalho.<br />

HÁ ALGUMA<br />

MENSAGEM<br />

QUE QUEIRA<br />

DEIXAR AOS<br />

NOSSOS<br />

LEITORES?<br />

Aos leitores quero apelar ao cuidado<br />

com a alimentação e o stresse, pois<br />

estão a aparecer cada vez mais<br />

doenças em pessoas cada vez mais<br />

novas e maioritariamente derivam<br />

disso. É uma grande preocupação<br />

minha. “Nós somos o que<br />

comemos” e “Que o teu alimento<br />

seja o teu medicamento” são velhas<br />

máximas que devemos seguir.<br />

Bebam água várias vezes ao dia.<br />

Sejam ativos. Sejam felizes.<br />

047<br />

NODEZ20


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

VÍLSON<br />

PONTE<br />

Deputado do PS/A<br />

FALE-NOS<br />

SOBRE SI – DO<br />

SEU PERCURSO<br />

PESSOAL,<br />

ACADÉMICO E<br />

PROFISSIONAL.<br />

Comecei a trabalhar na Direção<br />

Regional de Apoio ao Investimento<br />

e à Competitividade como técnico<br />

analista nas operações de gestão de<br />

projetos de investimento apoiados<br />

por fundos comunitários, o que me<br />

deu a oportunidade de conhecer os<br />

desafios e o tecido económico da<br />

região. Conhecimento esse que se<br />

articula na construção da posição<br />

e ação política que trago para as<br />

funções que hoje desempenho.<br />

Atualmente, a nível político,<br />

sou Presidente da Juventude<br />

Socialista dos Açores, Deputado na<br />

Assembleia Legislativa Regional,<br />

eleito pelo PS no círculo eleitoral de<br />

São Miguel, e integro a Comissão de<br />

Política Geral como membro efetivo.<br />

Sou um jovem como qualquer<br />

outro, com experiências e<br />

horizontes próprios da idade.<br />

Nasci e vivo em Ponta Delgada.<br />

Fiz a licenciatura em Economia<br />

e depois o Mestrado em Ciências<br />

Económicas e Empresariais, com<br />

especialização em Finanças, na<br />

Universidade dos Açores.<br />

“<br />

048 NODEZ20 049<br />

NODEZ20


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

O INTERESSE<br />

PELO CAMPO<br />

POLÍTICO<br />

COMEÇOU A<br />

MANIFESTAR-<br />

SE DESDE<br />

NOVO? SE SIM,<br />

PORQUÊ?<br />

O que despertou a minha ação e<br />

intervenção política foi um conjunto<br />

de momentos que aguçaram o<br />

meu interesse político, mas não me<br />

recordo precisamente do momento<br />

em que se deu o clique. Desde<br />

novo, olho para a política como<br />

uma forma de corrigir situações<br />

de injustiça na sociedade, em que<br />

nós coletivamente nos organizamos<br />

para dar resposta às necessidades<br />

de todos e não só de alguns. Para<br />

mim, estar na política implica um<br />

compromisso em ajudar os outros<br />

e transformar a sociedade para que<br />

as coisas sejam diferentes nas várias<br />

dimensões da nossa vida. A minha<br />

missão é contribuir, como puder,<br />

para isso. Mas, há uma perceção de<br />

que a política é isto ou aquilo.<br />

Temos de desmitificar, de uma vez<br />

por todas, e falar sobre aquilo que<br />

tem impedido muitos jovens, de<br />

encontrar na política um canal para<br />

a resposta aos seus anseios e aos<br />

seus problemas, e para a afirmação<br />

das suas ideias e dos seus projetos.<br />

A política precisa dos políticos e dos<br />

partidos. Não achar que é assim é<br />

destruir os mais básicos valores da<br />

democracia e incentivar o regresso<br />

dos regimes anteriores aos do 25 de<br />

abril.<br />

QUANDO E<br />

PORQUE É QUE<br />

SE TORNOU<br />

MEMBRO<br />

INTEGRANTE<br />

DA JUVENTUDE<br />

SOCIALISTA<br />

DOS AÇORES?<br />

Inscrevi-me na Juventude Socialista<br />

por iniciativa própria. Não houve<br />

nenhuma influência da família e<br />

amigos na minha militância. Fui<br />

sem saber no que poderia dar, mas<br />

o que mais me interessava era poder<br />

dar o meu contributo com novas<br />

ideias, novas visões e novos projetos,<br />

com muita vontade e convicção de<br />

incluir um olhar atento às dinâmicas<br />

políticas, sociais e económicas<br />

em que achei que poderia fazer<br />

a diferença, através da ideia do<br />

socialismo democrático.<br />

050 NODEZ20<br />

051


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

É,<br />

ATUALMENTE,<br />

O PRESIDENTE<br />

DA JS/AÇORES.<br />

SENTE QUE<br />

O FACTO DE<br />

JÁ ESTAR<br />

INTIMAMENTE<br />

LIGADO À ÁREA<br />

FOI UM FATOR<br />

FACILITADOR<br />

PARA SI NO<br />

QUE RESPEITA<br />

À SUA<br />

ENVOLVÊNCIA<br />

NO PANORAMA<br />

POLÍTICO<br />

REGIONAL?<br />

Há diferentes formas de se fazer<br />

política. A ligação à militância<br />

política permite-nos aprender como<br />

fazer política e também formar<br />

valores e conhecer outras pessoas<br />

das mais diferentes naturezas,<br />

quer sociais, quer culturais, quer<br />

regionais, que estão empenhadas<br />

por mudar e melhorar as coisas. A<br />

atividade política é uma atividade<br />

muito exigente porque procurar<br />

representar as pessoas exige de nós<br />

o maior empenho para concretizar<br />

uma sociedade diferente e, portanto,<br />

estar ligado a uma juventude<br />

partidária possibilita também ter<br />

esse impacto real nas pessoas e na<br />

sociedade.<br />

O QUE É QUE<br />

O LEVOU A<br />

ACEITAR O<br />

CONVITE DO<br />

PARTIDO<br />

SOCIALISTA<br />

PARA<br />

INTEGRAR<br />

A LISTA ÀS<br />

ELEIÇÕES<br />

REGIONAIS?<br />

Desde logo, foi um absoluto<br />

privilégio abraçar o projeto que<br />

sempre deu sentido à minha<br />

participação política e com o qual<br />

me sinto honrado por servir os<br />

Açorianos e defender os Açores<br />

nesta legislatura. Por outro lado,<br />

o facto de ser jovem permite-me<br />

estar mais próximo de uma geração<br />

que precisa de ser representada.<br />

Nós temos grandes desafios como<br />

geração e, por isso, poder pensar e<br />

agarrar nestes desafios e ter uma voz<br />

no Parlamento Regional a dizer e<br />

a propor soluções é algo único que<br />

preenche as minhas expetativas e<br />

que me enche de responsabilidade e<br />

de motivação.<br />

053<br />

NODEZ20


ENTREVISTA<br />

NO DEBATE DO<br />

PROGRAMA<br />

DO GOVERNO,<br />

TECEU<br />

ALGUMAS<br />

CRÍTICAS<br />

DURANTE O<br />

SEU DISCURSO<br />

AO EXECUTIVO,<br />

COM ESPECIAL<br />

DESTAQUE À<br />

JUVENTUDE.<br />

O QUE É QUE<br />

FALTA NO<br />

PROGRAMA<br />

DO GOVERNO<br />

EM RELAÇÃO<br />

A ESTE GRUPO<br />

DA NOSSA<br />

SOCIEDADE?<br />

Tanta coisa. O teor do Programa<br />

está ao nível da indigitação,<br />

formação e composição deste<br />

Governo. Está, portanto, ferido no<br />

essencial porque não apresenta um<br />

caminho ou ideia construtiva que<br />

possa concretizar a visão panfletária<br />

que o Programa explora. E ainda<br />

está ferido por esquecer respostas<br />

claras, concretas e urgentes a uma<br />

geração que quando consegue<br />

arranjar emprego, muitas vezes é<br />

um emprego sem estabilidade, a<br />

uma geração que vê oportunidades<br />

vedadas no campo da habitação.<br />

Mas, na minha opinião, falta<br />

respostas ao mercado de trabalho,<br />

como por exemplo diminuir e<br />

combater a precariedade – regra<br />

geral do emprego jovem de hoje – o<br />

que atrasa a realização pessoal e o<br />

sustento de uma vida autónoma a<br />

muitos jovens.<br />

Agora ainda mais notório devido<br />

à dimensão da crise que estamos<br />

a atravessar, sendo necessário um<br />

conjunto de soluções que têm de<br />

ser tomadas já. Além disso, não foi<br />

vista como prioridade a melhoria<br />

das condições que os programas<br />

de estágios oferecem aos jovens,<br />

aliás desconsidera-a por completo<br />

e destaca o aumento dos benefícios<br />

para as empresas na contratação de<br />

estagiários, também é importante,<br />

é certo. E, portanto, não há um<br />

Programa que tenha mecanismos<br />

de apoio à criação de emprego<br />

de qualidade e que seja, de facto,<br />

algo direcionado aos jovens e que<br />

consiga também criar emprego para<br />

as pessoas que foram afetadas pela<br />

pandemia.<br />

054 NODEZ20 055<br />

NODEZ20


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

O PS É O MAIOR<br />

PARTIDO DA<br />

OPOSIÇÃO NO<br />

PARLAMENTO<br />

AÇORIANO. O<br />

QUE É QUE OS<br />

AÇORIANOS<br />

PODEM<br />

ESPERAR DA<br />

BANCADA<br />

SOCIALISTA E,<br />

EM ESPECIAL,<br />

DE SI, NO QUE<br />

RESPEITA AO<br />

CONTRIBUTO<br />

PARA A<br />

CONSTRUÇÃO<br />

DE POLÍTICAS E<br />

MEDIDAS PARA<br />

A SOCIEDADE<br />

AÇORIANA?<br />

No Parlamento Açoriano, o PS não<br />

é o maior partido da oposição. O<br />

PS é o maior partido no Parlamento<br />

e nos Açores porque ganhou<br />

as eleições, ganhou com mais<br />

mandatos e mais votos. O PS é,<br />

e continuará a ser, o Partido dos<br />

Açores. Os Açorianos podem contar<br />

com o PS – como sempre contaram<br />

– para um diálogo construtivo e<br />

sustentável, com todos os partidos,<br />

no sentido de trabalhar para propor<br />

e arranjar soluções concretas que<br />

possam melhorar o seu projeto de<br />

vida. Quero ser no parlamento uma<br />

voz que leve as causas e os desafios<br />

da nossa geração para a discussão<br />

política, que é hoje confrontada com<br />

o regresso da crise económica e<br />

social, o acelerar da crise climática e<br />

a crise da democracia. Isso significa<br />

não só fazer com que estas sejam<br />

ouvidas, como também concretizar<br />

soluções que possam dar resposta às<br />

necessidades das pessoas.<br />

HÁ ALGUMA<br />

MENSAGEM<br />

QUE QUEIRA<br />

DEIXAR AOS<br />

NOSSOS<br />

LEITORES?<br />

Este momento difícil que estamos<br />

e vamos continuar a atravessar e<br />

os desafios com que agora somos<br />

confrontados convoca-nos para um<br />

grau de urgência que exige uma<br />

ação imediata e clara. E, para isso,<br />

os Açorianos e os Jovens Açorianos<br />

podem contar com as nossas<br />

respostas em várias frentes, em<br />

torno de uma forte defesa das causas<br />

de uma geração que, tal como já<br />

referi, precisa de ser representada.<br />

Temos uma palavra e uma visão de<br />

futuro a dizer sobre as mais variadas<br />

causas da nossa sociedade, para<br />

todos os problemas e todas as idades<br />

para que ninguém fique para trás.<br />

056 NODEZ20 057<br />

NODEZ20


REPORTAGEM<br />

SARA BORGES<br />

RESILIÊNCIA<br />

FINANCEIRA E<br />

OPERACIONAL<br />

O PAPEL DOS CFO’S<br />

NAS EMPRESAS PORTUGUESAS<br />

As pequenas e médias empresas<br />

(PME), por outras palavras,<br />

empresas com menos de 250<br />

pessoas empregadas, são<br />

frequentemente referidas como<br />

a espinha dorsal da economia<br />

europeia, proporcionando empregos<br />

e oportunidades de crescimento.<br />

No entanto, após as restrições<br />

provocadas pela pandemia do<br />

coronavírus, estas também podem<br />

estar entre as empresas mais<br />

afetadas pela desaceleração da<br />

atividade económica.<br />

059<br />

NODEZ20


REPORTAGEM<br />

Em 2017, a esmagadora maioria (98,9%) das<br />

empresas na economia empresarial não financeira<br />

da União Europeia pertencia a empresas com menos<br />

de 49 pessoas empregadas (pequenas empresas),<br />

seguidas das médias empresas (50-249 pessoas<br />

ocupadas) com 0,9% dos totais empreendimentos.<br />

Em contrapartida, apenas 0,2% de todas as empresas<br />

tinham 250 ou mais pessoas ocupadas e foram,<br />

portanto, classificadas como grandes empresas,<br />

segundo revelam os dados divulgados pelo Eurostat.<br />

Em 2017, havia 22,2 milhões de PME na economia<br />

empresarial não financeira da UE, contribuindo com<br />

mais de metade do valor acrescentado no total (56%,<br />

3,5 mil milhões de EUR).<br />

As PMEs empregavam 83,9 milhões de pessoas em<br />

2017, representando 67% do total de empregados.<br />

Mais da metade deles estavam empregados em<br />

três atividades económicas: setor de comércio<br />

distributivo (20,7 milhões de pessoas, 27% das<br />

pequenas empresas e 19% das médias empresas),<br />

manufatura (15,8 milhões de pessoas, 14% e 33%) e<br />

construção (10,2 milhões, 14% e 7%).<br />

Entre os Estados-Membros da UE com dados<br />

disponíveis, a percentagem de pessoas empregadas<br />

por pequenas empresas era mais elevada em<br />

Portugal, onde as pequenas empresas empregavam<br />

61% de todos os trabalhadores, seguida de perto<br />

por Espanha (58%), Letónia e Estónia (ambas 57%)<br />

bem como a Eslováquia (56%). As empresas de<br />

média dimensão empregavam as percentagens mais<br />

elevadas de pessoas no Luxemburgo (25%), seguidas<br />

de perto pela Lituânia (23%), Estónia e Letónia<br />

(ambos com 22%).<br />

Desta forma, a pandemia criou<br />

e continuará a criar enormes<br />

constrangimentos às empresas.<br />

Neste contexto, muita da pressão<br />

é colocada nos ombros dos Chief<br />

Financial Officers (CFO’s), como<br />

que desafios irão encontrar<br />

nas empresas e como podem<br />

liderar numa fase de disrupção e<br />

transformação dos seus negócios<br />

e operações?<br />

Foi neste sentido que o Jornal<br />

Económico, em parceria com<br />

a EY, promoveu o webinar<br />

“CFO – Resiliência Financeira<br />

e Operacional” que contou<br />

com a presença de Isabel Faria,<br />

Associate Partner e Head of Risk<br />

& Operations da EY, Luís Pedro<br />

Mendes, Audit Partner e Head<br />

of Capital Markets da EY, Nuno<br />

Nogueira da Silva, Associate<br />

Partner e Head of Turnaround<br />

and Restructuring Strategy da EY<br />

e Paula Catarino, Administradora<br />

e CFO do Grupo Progelcone.<br />

É expectável registar-se em<br />

<strong>2021</strong> uma quebra económica<br />

ainda mais vigorosa e de um<br />

impacto ainda mais negativo<br />

no desempenho das empresas<br />

sobretudo se tivermos em conta<br />

o final da moratória legal já em<br />

setembro e que irá implicar um<br />

esforço adicional de tesouraria<br />

por parte das empresas e que<br />

levaram muitas a terem que<br />

desenvolver processos de<br />

restruturação. Desta forma,<br />

com o fecho abrupto de um<br />

espectro muito alargado do tecido<br />

empresarial, ficou em evidência<br />

muitas das fragilidades das<br />

empresas portuguesas, sobretudo<br />

ao nível dos seus processos de<br />

gestão de tesouraria.<br />

061<br />

NODEZ20


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

Segundo Nuno Nogueira da Silva, Associate<br />

Partner e Head of Turnaround and<br />

Restructuring Strategy da EY, nenhuma<br />

empresa estava preparada para uma situação<br />

dessas, realçando a estrutura do tecido<br />

empresarial português, caracterizado<br />

sobretudo por empresas de pequena e média<br />

dimensão, das quais uma fatia relevante são<br />

microempresas. Estas são empresas que apesar<br />

de serem muito importantes para a nossa<br />

economia e face à sua dimensão e escassez<br />

natural de recursos que estas empresas têm,<br />

obviamente que fazem a sua gestão numa<br />

base diária e por isso mesmo não estavam<br />

preparadas para o impacto inicial desta<br />

pandemia. Não dispondo de planos de<br />

tesouraria tiveram uma dificuldade acrescida.<br />

No entanto, as empresas de grande dimensão,<br />

que até dispunham destas ferramentas, foram<br />

igualmente afetadas. A grande diferença é que<br />

por terem estes mecanismos implementados,<br />

tiveram uma capacidade de resposta e de reação<br />

mais rápida e adequada e com isso conseguiram<br />

ter tempo para estudar diferentes cenários e<br />

em função destes cenários definir estratégias<br />

de negociações com os seus principais<br />

stockeholders, com os seus principais credores.<br />

Em relação aos apoios prestados pelo Estado,<br />

Nuno Nogueira da Silva refere que foram<br />

instrumentos muito importantes para aliviar a<br />

tesouraria das empresas, mas que, no entanto,<br />

acabaram por criar um efeito anestésico e<br />

acabar por esconder algumas debilidades que<br />

até já traziam antes da pandemia. Este tipo<br />

de empresas tem uma gestão muito focada no<br />

imediato, no curto prazo e neste momento estão<br />

a desconsiderar o efeito dos apoios do Estado,<br />

como é o caso da moratória que irá cessar em<br />

<strong>2021</strong>.<br />

Por outro lado, Paula Catarino, Administradora<br />

e CFO do Grupo Progelcone (uma empresa<br />

que atua no setor alimentar) dá a conhecer<br />

o percurso que a empresa percorreu neste<br />

período de pandemia. Deste modo, menciona<br />

que nos primeiros tempos verificou-se<br />

uma espécie de negação e acrescenta que a<br />

partir de março verificou-se um corte total<br />

de recebimentos e pagamentos. No que diz<br />

respeito à tesouraria, afirma que “tivemos de<br />

reagir pois houve uma consciência coletiva que<br />

o dinheiro tinha de girar na economia e foi isso<br />

que lentamente aconteceu.<br />

062 NODEZ20 063<br />

NODEZ20


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

Os clientes começaram timidamente a pagar,<br />

nós também não podíamos falhar com<br />

os fornecedores, mas principalmente não<br />

podíamos falhar com o Estado”, acrescentando<br />

que as cadeias de restauração “são uma grande<br />

parte do nosso negócio, com capital humano<br />

muito intensivo, ficaram bastante assustadas<br />

e esse é um grande problema, bem como a<br />

questão das rendas que ao longo do tempo<br />

foram negociando. O que nos pediram a<br />

nós foi o que pedimos aos nossos clientes,<br />

compreensão no prazo dos pagamentos e foi<br />

isso que aconteceu”.<br />

Quando questionada sobre o modo como se gere a tesouraria<br />

nesses tempos de incerteza, a CFO do Grupo Progelcone<br />

respondeu “com cautela”. Refere que a moratória do crédito é<br />

“uma medida extremamente importante” para as empresas.<br />

Contudo, realça um aspeto importante, afirma que “não nos<br />

podemos esquecer que vamos ter a fatura no futuro e vamos ter<br />

de juntar à nossa dívida os juros que temos de capitalizar e vamos<br />

atempadamente e preventivamente fazer cenários para conseguir<br />

resolver esses compromissos”.<br />

Em contraposição ao cenário de negação proferido por Paula<br />

Catarino, Isabel Faria, Associate Partner e Head of Risk &<br />

Operations da EY, a mesma refere que há dois momentos de<br />

reação. Uma reação imediata, que se foca no facto de as empresas<br />

terem de tomar decisões num curto prazo e há uma reação<br />

mais contínua no tempo, de médio prazo, onde as empresas são<br />

obrigadas a uma reflexão maior e mais profunda e a um repensar<br />

das operações mais abrangente.<br />

Num primeiro momento de reação, as<br />

empresas viraram-se para os seus planos de<br />

continuidade de negócio, para os seus planos<br />

de crise, as que os tinham porque quem não<br />

tinha teve de tomar um conjunto de medidas<br />

mais a doc e muitas vezes com mais custos, mas<br />

a maior parte das empresas acabou por formar<br />

equipas de gestão de crise com maior ou menor<br />

grau de formalismo, mas que obrigaram a criar<br />

uma série de procedimentos novos e a repensar<br />

práticas de trabalho.<br />

064 NODEZ20 065<br />

NODEZ20


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

Com o avançar da situação<br />

pandémica deixou de se poder pensar<br />

tanto no curto prazo e acabou por<br />

se olhar mais no foco da resiliência<br />

da cadeia de valor. Começámos<br />

a assistir às empresas a olharem<br />

para os seus processos de negócio,<br />

a documentá-los, a identificarem<br />

instâncias de risco mais críticas. Tudo<br />

isto foi muito importante porque ao<br />

identificarem-nas têm também de<br />

identificar quais são os controlos e<br />

as ações de mitigação que servem<br />

para dar resposta a esses riscos. É este<br />

aumento de uma consciência, de uma<br />

maior necessidade de monitorização<br />

e controlo e ainda da eficiência<br />

operacional que ajuda muito à reflexão<br />

que as empresas têm de fazer numa<br />

situação de conjuntura económica<br />

como a que vivemos agora.<br />

Para Isabel Faria, olhar para os<br />

processos internos tornou-se<br />

imperativo. No entanto há diferenças<br />

entre processos produtivos e processos<br />

de suporte ou de BackOffice. Quando<br />

falamos de processos produtivos a<br />

tendência atual é olhá-los do ponto<br />

de vista das boas práticas de lead<br />

management e nomeadamente da<br />

metodologia 5S. Quando olhamos<br />

numa perspetiva de processos de<br />

suporte, o foco é o emagrecimento dos<br />

custos e se primeiramente as empresas<br />

perguntavam onde vamos cortar,<br />

gradualmente assistimos à pergunta<br />

onde e como vamos otimizar. O que<br />

estamos a ver é as empresas a procurar<br />

restruturar processos como os<br />

processos financeiros, os processos de<br />

compra, recursos humanos, portanto,<br />

procurar aspetos que tornem mais<br />

eficientes os seus próprios processos.<br />

Assim, com a incerteza causada pela pandemia e<br />

todos os riscos que acarreta consigo é certo que<br />

tal traduzir-se-á em obstáculos no processo de<br />

encerramento de contas e no relato financeiro<br />

anual das Empresas. Luís Pedro Mendes, Audit<br />

Partner e Head of Capital Markets da EY, refere<br />

que a pandemia acaba por ter um impacto brutal<br />

na vida das pessoas, das empresas e da economia<br />

como um todo. Nessa medida a questão do<br />

encerramento de contas e do relato financeiro não<br />

é indiferente.<br />

066 NODEZ20 067<br />

NODEZ20


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

Há desafios acrescidos que<br />

a pandemia traz nestes dois<br />

processos, eu diria que desde logo<br />

há um desafio operacional. Deste<br />

modo, começa por referir que a<br />

maior parte das empresas continua<br />

a ter os seus colaboradores em<br />

trabalho remoto e isto é uma<br />

disrupção muito grande no<br />

processo de encerramento de<br />

contas. Assim, essa disrupção<br />

traz um desafio acrescido nas<br />

atividades de encerramento de<br />

contas daqueles que preparam as<br />

demonstrações financeiras e que<br />

as fazem, mas também na vertente<br />

dos CFO’s que os supervisionam,<br />

da supervisão que fazem dessas<br />

atividades. Também realça o facto<br />

de que o risco de cibersegurança<br />

aumentou significativamente<br />

devido ao trabalho em casa que<br />

obriga a ter acesso remoto às<br />

ferramentas do escritório.<br />

Seguidamente, menciona um<br />

desafio técnico, fazendo um<br />

enquadramento temporal,<br />

Luís Pedro Mendes refere que<br />

“o primeiro caso em Portugal<br />

acontece no dia 2 de março,<br />

a pandemia é declarada pela<br />

OMS no dia 11, portanto no<br />

que se refere às contas de 2019<br />

a pandemia foi tratada como<br />

um evento subsequente não<br />

ajustado, sem reflexo direto<br />

naquilo que são os números de<br />

2019, a não ser a divulgação que<br />

estávamos diante de um evento<br />

que tinha uma incerteza e que<br />

as estimativas desses impactos<br />

eram muito difíceis de apurar.<br />

Ora bem, em 2020 estamos em<br />

plena pandemia de Covid-19<br />

já não se qualifica como evento<br />

não ajustável. Será preciso que as<br />

empresas reflitam isso”. Declara<br />

que os apoios governamentais<br />

que têm que ser refletidos, há<br />

reestruturações e medidas que<br />

se tomaram a nível da proteção<br />

do balanço e que muitas delas<br />

têm que ser acauteladas e,<br />

portanto, os colaboradores e os<br />

preparadores das demonstrações<br />

financeiras precisam de ter isso<br />

em consideração.<br />

Contudo, defende que o grande<br />

desafio consiste na incerteza, “eu<br />

diria em suma que a pandemia<br />

traz aqui uma relevância<br />

acrescida ao relato financeiro.<br />

Quanto mais transparente for o<br />

relato mais confiança terão os<br />

utilizadores das demonstrações<br />

financeiras e obviamente todo o<br />

mercado de capitais”.<br />

Nuno Nogueira da Silva prevê<br />

que quando cessarem os<br />

mecanismos de apoios dispostos<br />

pelo Governo, que com toda a<br />

certeza não irá coincidir com<br />

o fim da crise económica, que<br />

as restrições de liquidez das<br />

empresas por essa altura se<br />

venham a agravar e tenham<br />

maiores dificuldades para fazer<br />

face ao seu serviço de dívida e<br />

maiores dificuldades em honrar<br />

as suas responsabilidades<br />

perante outros credores.<br />

068 NODEZ20 069<br />

NODEZ20


REPORTAGEM<br />

PUB<br />

E a isto acrescenta-se o facto<br />

de Portugal ser dos países mais<br />

endividados e um dos que apresentam<br />

uma maior proporção de moratórias<br />

face ao crédito total concedido, o CFO<br />

refere “não tenho grandes dúvidas<br />

que <strong>2021</strong> e 2022 vão ser marcados<br />

por este agravamento desta crise<br />

económica, que infelizmente logo<br />

sucederá, se nada for feito, a um<br />

agravamento da crise social”. Deste<br />

modo, defende que a melhor forma<br />

de as empresas se preparem para esse<br />

momento é ganhando consciência<br />

da dura realidade que o fim destes<br />

apoios do Estado chegará um dia.<br />

Como também se tornarem cientes<br />

que chegará o dia em que terão de<br />

iniciar o reembolso daquelas linhas de<br />

crédito que, entretanto, foram obtidas<br />

e que hoje ainda beneficiam dos seus<br />

períodos de carência. Posto isto, refere<br />

que o segundo passo incide num<br />

período de reflexão das empresas,<br />

efetuando um diagnóstico interno<br />

ou por outras palavras uma revisão<br />

independente do plano de negócios<br />

que, aliado ao plano de continuidade,<br />

permitirão às empresas perceber<br />

em que condições poderão operar<br />

no futuro. E será com base neste<br />

diagnóstico, com base na dimensão<br />

dos problemas de cada empresa iniciar<br />

os seus processos de reestruturação,<br />

sejam eles de ordem financeira ou de<br />

ordem operacional.<br />

E, portanto, face a estas perspetivas<br />

para <strong>2021</strong>, em particular entre abril e<br />

outubro do próximo ano, as empresas<br />

vão ver as suas responsabilidades<br />

crescer e por isso considero que<br />

devem já começar a preparar esse<br />

momento.<br />

Antevendo uma conjuntura<br />

económica difícil para a maioria das<br />

empresas em <strong>2021</strong>, Isabel Faria elenca<br />

um conjunto de lições que devem ser<br />

aprendidas em 2020. Deste modo,<br />

a primeira lição é que as medidas<br />

de curto prazo têm contrapartidas.<br />

Portanto, se há algo que esta<br />

conjuntura económica difícil mostra<br />

é a necessidade de haver medidas<br />

adaptáveis, ágeis e quem diz medidas<br />

diz processos operacionais ágeis.<br />

Uma segunda lição é que os planos de<br />

continuidade de negócio e os planos<br />

de crise não devem ficar fechados até à<br />

próxima pandemia ou até ao próximo<br />

fator de risco externo que apareça,<br />

porque podem aparecer a qualquer<br />

momento. Uma outra lição aprendida<br />

é devermos acompanhar muito<br />

aproximadamente as tendências que<br />

impactam a excelência operacional.<br />

Alguns exemplos são a mudança de<br />

paradigma de produção, da produção<br />

em massa para a customização<br />

em massa ditada pela alteração do<br />

perfil dos clientes, dos próprios<br />

consumidores que querem produtos<br />

diferentes e serviços diferentes.<br />

071<br />

NODEZ20


REPORTAGEM<br />

ANA MASSA<br />

OS LIVROS<br />

EM TEMPO DE<br />

PANDEMIA<br />

Entre 17 e 20 de dezembro, o afamado<br />

evento cultural “Arquipélago de Escritores”<br />

passou este ano para o formato digital,<br />

atendendo à conjuntura atual. Dos variados<br />

painéis que decorreram ao longo deste<br />

período, destaco o do dia 18 de dezembro,<br />

intitulado “Livros em Tempo de Pandemia”,<br />

cujo painel foi composto por Rita Fazenda,<br />

editora no Grupo LeYa e moderadora desta<br />

conversa, Carlos Alberto Machado, editor<br />

da Companhia das Ilhas e proprietário de<br />

uma nova livraria sediada na ilha do Pico,<br />

e Paula Quadros, proprietária da livraria In<br />

Folio, em Angra do Heroísmo.<br />

072 NODEZ20


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

Rita Fazenda começou por<br />

afirmar que “mais do que<br />

nunca os livros sofreram com<br />

o cenário que nós estamos a<br />

viver no mundo e para quem<br />

não sabe além do turismo e da<br />

restauração, o setor dos livros<br />

foi o que mais sofreu em termos<br />

de quebra de vendas com a<br />

pandemia”. De facto, os livros<br />

desceram à volta de 70%, entre<br />

abril e agosto, e só agora é que<br />

estão a recuperar. A moderadora<br />

questionou aos convidados como<br />

é o dia a dia de um livreiro nos<br />

Açores, ao que Carlos Machado<br />

afirmou que a sua experiência<br />

enquanto livreiro ainda é muito<br />

curta, atendendo a que abriu<br />

a sua livraria no dia 12 de<br />

novembro. “A verdade é que o<br />

livro e a leitura são atividades<br />

minoritárias e eu acho que era<br />

importante termos consciência<br />

disso porque isto tem uma série<br />

de implicações de natureza<br />

filosófica, política, económica,<br />

por aí fora. É na verdade uma<br />

atividade minoritária. Há<br />

poucos leitores, compram-se<br />

poucos livros e por um lado o<br />

livro não faz parte do dia a dia<br />

das pessoas. O livro enquanto<br />

objeto de prazer, objeto de<br />

conhecimento, objeto de troca,<br />

de partilha, esquecemos isso. Eu<br />

trabalho, sempre trabalhei para<br />

que essas pequenas minorias<br />

não desapareçam, dando o meu<br />

pequeno contributo para isso<br />

e se crescerem um bocadinho<br />

essas minorias ficamos contentes<br />

e somos todos um bocadinho<br />

menos infelizes”.<br />

Relativamente à livraria, Carlos<br />

clarifica que a sua montra “está<br />

exatamente em frente à saída das<br />

caixas registadoras do supermercado<br />

que é uma coisa que nunca me<br />

passou pela cabeça e é curioso ver<br />

aquele vai-vem das pessoas que<br />

nesta época natalícia vêm com os<br />

cestos de compras, já com muitas<br />

prendas embrulhadas e vão passando<br />

sorrateiramente à porta da livraria<br />

e nós ficamos sempre naquela<br />

expetativa do entra, não entra, mas<br />

a verdade é que não podemos dizer<br />

que estamos insatisfeitos, apesar<br />

deste panorama que não é simpático<br />

para ninguém. Aproximam-se<br />

pessoas que nós pensamos que não<br />

têm hábitos de leitura e acabam por<br />

entrar e perguntar qualquer coisa,<br />

gente mais nova, gente com gostos<br />

muitos específicos, da fauna açoriana,<br />

ou flora, tem sido uma experiência<br />

gratificante”.<br />

074 NODEZ20 075<br />

NODEZ20


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

Paula Quadros, por sua vez, afirma que o<br />

seu dia a dia na livraria não se diferencia do<br />

seu dia a dia em casa, “porque o livreiro no<br />

nosso país não tem vias especiais sequer de<br />

acesso aos livros. Portanto, a maior parte<br />

das editoras, ao contrário daquilo que se<br />

faz noutros países nem sequer manda uma<br />

newsletter específica para os livreiros para<br />

saber aquilo que é publicado. Portanto, a<br />

primeira dificuldade que há aqui, tirando<br />

aquelas tais de falta de compradores… O que<br />

é estranho é que há grande dificuldade em<br />

saber o que é que se publica em Portugal”.<br />

A proprietária da In Folio também se queixa do processo de<br />

distribuição dos livros e do respetivo transporte, confirmando<br />

que “para chegar cá um livro, em média, é um mês. Agora,<br />

quando me pedem um livro é extremamente complicado dizer<br />

à pessoa que ou pagam um porte de correio que é mais caro<br />

do que o livro ou, se tudo correr bem, o livro demorará em<br />

média um mês a chegar. Portanto, as dificuldades do livreiro<br />

e eu penso que o sítio mais difícil para ser livreiro no nosso<br />

país é nos Açores, porque em Lisboa é fácil, deve ser pegar<br />

no telefone e os livros no dia, no máximo, estão na livraria,<br />

aqui não. Portanto, é essa luta, a parte mais desagradável é<br />

conseguir ter os livros”.<br />

Relativamente ao mercado do livro, Rita Fazenda<br />

esclarece um pouco este processo: “Os livros são<br />

editados e depois são distribuídos ou pelas próprias<br />

editoras ou por distribuidoras especialistas na<br />

distribuição de livros e, de facto, os livros têm tiragens<br />

baixas, o número de exemplares que se imprimem dos<br />

livros e depois é complicado responder aos pedidos<br />

das grandes cadeias e dos livreiros independentes que<br />

é o caso do Carlos e da Paula”.<br />

076 NODEZ20 077<br />

NODEZ20


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

A editora percebe que estas situações<br />

dos livreiros independentes são muito<br />

complicadas de gerir e que “realmente<br />

com as tiragens que se fazem em Portugal<br />

às vezes é quase impossível e depois o que<br />

acaba por acontecer é que estas grandes<br />

cadeias não vendem os livros, devolvem e<br />

provavelmente os pequenos ficam sempre<br />

um bocadinho engolidos pela roda”.<br />

Assim, “perde-se um bocadinho a parte<br />

mais bonita que é precisamente isto, que<br />

é conseguir o leitor pedir o livro e uma<br />

semana depois ter o livro e vocês, em cima<br />

disso, ainda estão à mercê da distribuição,<br />

ou seja, da questão dos envios que no vosso<br />

caso teria de ser por avião ou barco e vão<br />

sempre ficar muito condicionados por<br />

isto. De facto, deveria existir uma série de<br />

medidas que ajudasse nesse sentido”.<br />

No que concerne à seleção<br />

de livros na livraria, Carlos<br />

esclarece que esta questão dos<br />

“grandes grupos, da distribuição,<br />

nós enquanto editores fazemos<br />

distribuição direta, mas é uma<br />

carga de trabalho absolutamente<br />

incrível, nós somos os melhores<br />

clientes dos correios dos CTT<br />

das Lajes do Pico. Seremos talvez<br />

na ilha aqueles que mais vezes<br />

vão buscar livros aos transitários.<br />

Eu estou farto de explicar isto às<br />

pessoas e pensam que eu estou a<br />

exagerar, mas é um martírio. Nós<br />

temos a política de que lá entra<br />

aquilo que a gente gosta, embora<br />

façamos a encomenda de qualquer<br />

livro que um cliente queira, não<br />

importa o quê, desde que exista no<br />

mercado e que a gente possa ter<br />

acesso a ele. No entanto, só entra<br />

na livraria aquilo que nós achamos<br />

que não é lixo, aquilo que não<br />

conspurca, aquilo que acrescenta<br />

alguma coisa”.<br />

Paula acrescenta ainda que<br />

acredita plenamente que a venda<br />

de livros não irá aumentar pois<br />

“nada e ninguém no nosso país<br />

consegue fazer uma política<br />

cultural com pés e cabeça, uma<br />

política de livro só se pode<br />

alicerçar se no nosso país houver<br />

uma política cultural com a<br />

vertente educativa, porque é<br />

preciso transmitir a cultura, depois<br />

aprende-se e depois a cultura cria e<br />

é nesta política que o livro se pode<br />

integrar e é assim que poderiam<br />

passar a haver mais pessoas com o<br />

gosto pelo livro”.<br />

078 NODEZ20 079<br />

NODEZ20


REPORTAGEM<br />

No que concerne o papel do livreiro<br />

neste panorama de fomentar e cativar os<br />

leitores, Carlos afirma que os livreiros<br />

tiveram um papel fundamental para “que<br />

isto não fosse por um plano inclinado<br />

abaixo até um ponto sem retorno, mas<br />

podem-se contar nos dedos de uma mão<br />

os verdadeiros livreiros que existem em<br />

Portugal”, afirmando que infelizmente<br />

muita gente se acomoda pelo livro que<br />

é anunciado na televisão ou que saiu<br />

numa revista cor de rosa. “Eu preciso de<br />

sobreviver”, segundo Carlos, é uma frase<br />

“absolutamente terrível e tem levado a<br />

que as livrarias se encham de lixo, que<br />

os livros tenham circulação em livraria<br />

num máximo de uma semana, um mês<br />

e depois desaparece. Ou seja, não há<br />

livrarias de fundo, há livrarias com espaço<br />

para os livros que saíram durante uns bons<br />

anos para trás e que se mantém em livraria<br />

que é uma coisa completamente diferente,<br />

é o mesmo que irmos ao supermercado<br />

e só ter uma zona de batatas e outra de<br />

margarinas e de resto não ter mais nada<br />

lá. Os supermercados têm de tudo e as<br />

livrarias também deviam ter de tudo o que<br />

se passa no mercado livreiro durante uns<br />

bons 10 anos”.<br />

No que concerne aos programas regionais<br />

da área da cultura, Carlos afirma que<br />

“são muito bonitos e toda a gente está<br />

de acordo com eles, mas não dizem<br />

nada. Basicamente são declarações de<br />

princípios para parecer bem. Na área do<br />

livro é terrível, o que se resolve é subsidiar<br />

as edições para ficarem de consciência<br />

tranquila. Dou-vos um exemplo: a<br />

Companhia das Ilhas, em parceria com<br />

a Imprensa Nacional, está a editar a obra<br />

completa de Vitorino Nemésio.<br />

Toda a gente acha nos Açores que Vitorino<br />

Nemésio é o grande escritor açoriano, para<br />

além de Antero de Quental, mas não se<br />

mexe uma palha para divulgar a obra deste<br />

autor de renome nacional. Não há desculpa<br />

para que isto aconteça assim desta maneira,<br />

mas acontece e os níveis de leitura às vezes<br />

veem-se por aqui”. Assim, a política de que<br />

o orador há pouco falava consistiria em<br />

algo que pusesse “o livro na ordem do dia.<br />

Quando houve alguém que seja capaz de<br />

fazer isto, as coisas mudam um bocadinho”.<br />

081<br />

NODEZ20


REPORTAGEM<br />

A proprietária da In Folio<br />

interveio neste momento para<br />

contrapor que “não é o livro<br />

que tem de estar no centro, o<br />

que tem de estar é a leitura,<br />

porque eu estou convencida<br />

que se vendem mais livros<br />

do que aqueles que se leem.<br />

Muitos dos livros que eu vendo<br />

não sei se eles são lidos. O<br />

problema é que há muita gente<br />

com um padrão de instrução<br />

elevado que não sabe ler, que é<br />

funcionalmente analfabeto”.<br />

Para terminar, Rita Fazenda<br />

conclui que para se fomentar o<br />

gosto pela leitura não é “obrigar<br />

as pessoas a ler determinadas<br />

coisas que vamos conseguir<br />

fazer isso e para isso temos de<br />

começar muito cedo com livros<br />

infantis e criando estes hábitos<br />

de leitura nas crianças para que<br />

eles percebam que os livros de<br />

facto são um objeto maravilhoso<br />

e que lhes vai trazer tanto e isso<br />

claro que pode começar por uma<br />

política governamental que ajude<br />

de alguma forma para que em<br />

algumas fases da vida a que isso<br />

aconteça mas que de facto eu<br />

acho que aqui falhou qualquer<br />

coisa enquanto povo. Eu sou de<br />

uma geração em que o meu gosto<br />

começou pelo meu pai, uma<br />

pessoa que também fomentava<br />

a questão de comprar livros e<br />

de me passar este gosto e o meu<br />

tornar de editora surgiu com<br />

uma professora na secundária<br />

que me deixou este bichinho.<br />

Portanto, eu acho que todas as<br />

peças são fundamentais. Nesse<br />

aspeto, os livreiros tiveram um<br />

papel fundamental e não só,<br />

os bibliotecários. Na minha<br />

geração, também as bibliotecas<br />

eram uma fonte inestimável de<br />

conhecimento e os bibliotecários<br />

vibravam com os livros e eram<br />

eles que nos tocavam de alguma<br />

forma. Isto para dizer que eu<br />

acho que ninguém se deve<br />

desresponsabilizar por isto,<br />

editores, livreiros, inclusive<br />

distribuidores. Isto é um esforço<br />

conjunto. A leitura não é só um<br />

passatempo, mas sim uma forma<br />

de passar conhecimento e crescer<br />

como pessoas”.<br />

083<br />

NODEZ20


PUB<br />

REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

“<br />

ATÉ QUE<br />

A MORTE<br />

NOS SEPARE<br />

POR SOFIA CORDEIRO<br />

”<br />

O Núcleo<br />

da Amnistia<br />

Internacional<br />

de São Miguel,<br />

em parceria<br />

com a livraria<br />

Letras Lavadas,<br />

promoveu no dia<br />

25 de novembro o<br />

webinar “Até que<br />

a violência nos<br />

separe” através<br />

da rede social<br />

Facebook.<br />

084 NODEZ20 085<br />

NODEZ20


REPORTAGEM<br />

A amnistia é uma comunidade global de ativistas e<br />

defensores dos direitos humanos e a visão que move a<br />

amnistia é a de um mundo em que cada pessoa possa<br />

usufruir de todos os direitos consagrados na declaração<br />

Universal dos direitos humanos independentemente de<br />

quem seja e onde esteja.<br />

A missão do Núcleo é integrar e envolver a comunidade<br />

na luta pela defesa dos direitos humanos e em concreto<br />

pelos direitos humanos das vítimas de violência<br />

doméstica.<br />

Este evento pretendeu assinalar o Dia da Eliminação<br />

da Violência Contra a Mulher, que contou com um<br />

painel de convidadas que dedicam a sua ação diária a<br />

estas temáticas. O painel contou com a participação de<br />

Malvina Sousa, autora do livro “Até que a violência nos<br />

separe”, Maria José Raposo, Presidente da Umar Açores,<br />

Raquel Rebelo, gestora do Gabinete de Apoio à Vítima<br />

de Ponta Delgada – Apav<br />

Açores e Piedade Lalanda,<br />

Professora Coordenadora<br />

da UAc.ESS – Escola<br />

Superior de Saúde da<br />

Universidade dos Açores. A<br />

moderadora deste webinar<br />

foi Florbela Carmo, Membro<br />

do Núcleo da Amnistia<br />

Internacional de São Miguel.<br />

Para abordar este tema<br />

aproveitou-se o livro de<br />

Malvina Sousa, “Até que<br />

a morte nos separe”,<br />

recentemente publicado<br />

pela livraria Letras Lavadas<br />

na qual existe uma<br />

provocação subjacente no<br />

título derivada da célebre<br />

expressão matrimonial.<br />

A autora revela que quis<br />

mostrar que “há aqui um<br />

arrancar e uma vontade<br />

de revelar que esta ideia<br />

que está subjacente na<br />

nossa cultura que depois<br />

de casados a morte é que<br />

pode separar, não tem de<br />

ser respeitado se os direitos<br />

humanos, se o respeito, se<br />

os direitos básicos não são<br />

respeitados.<br />

086 NODEZ20 087<br />

NODEZ20


REPORTAGEM<br />

E, portanto,<br />

a partir daí há esta<br />

provocação de dizer<br />

às pessoas que isto é um<br />

juramento que é feito, mas que não<br />

tem de ser levado até ao final se não<br />

correr bem.”<br />

Por outra razão, Malvina também<br />

aponta que agarrou no título “não só<br />

para chamar a atenção da temática e<br />

para revelar algo daquilo que o livro<br />

tinha, mas também para chamar a<br />

atenção destes outros aspetos e para<br />

demonstrar que também a nossa<br />

cultura está subjacente no título do<br />

livro que é mostrar que apesar de toda<br />

a cultura, de todos os preconceitos que<br />

estão por trás de tudo isto podemos ir<br />

contra se as coisas não estão a correr<br />

bem.<br />

Por outro lado, também é importante mencionar que se a<br />

frase diz assim ‘até que a morte nos separe’ e a violência<br />

é precisamente um alerta e uma chamada de atenção<br />

para que nós não devemos deixar chegar até aí, porque<br />

nós sabemos que hoje em dia é cada vez mais uma realidade<br />

e foi neste sentido que o título foi escolhido”.<br />

A autora foi questionada se foi difícil dissociar a mulher na<br />

produção da obra, na qual a autora respondeu que “não<br />

falaria tanto da mulher, diria mais na pessoa”, mas que “sem<br />

dúvida que sendo mulher esta é uma temática que nos<br />

atinge essencialmente, mas é preciso realçar isso que a<br />

violência não é só contra as mulheres aliás isto está<br />

presente no livro, mas será difícil, porque na minha vida é<br />

difícil dissociar a pessoa que eu sou de tudo aquilo que eu<br />

faço e, portanto, a pessoa que eu sou está presente neste<br />

livro por diversos motivos como está presente em outras<br />

coisas que eu já escrevi, está presente no livro não só a partir<br />

das personagens não só através da temática que acho que é<br />

importante e que nós devemos falar muito acerca dela e não<br />

taparmos os olhos como tem sido muitas vezes”.<br />

Malvina Sousa divulga que “a pessoa que eu sou está também<br />

presente nas falas das personagens, nos costumes, na<br />

forma como é vista a sociedade e ao longo de toda a obra e<br />

sobretudo nas mensagens que são transmitidas.<br />

088 NODEZ20 089<br />

NODEZ20


REPORTAGEM<br />

Esta obra apesar de ter como pano de fundo a violência é para<br />

mim uma obra que fala sobretudo de relações e emoções e é<br />

precisamente por isso que eu acho que nós somos emoções<br />

e são elas que mexem connosco e por isso é que eu sinto que<br />

estou tão presente aí na obra e há personagens que têm de facto<br />

características minhas”.<br />

Maria José Raposo afirma que a definição de violência doméstica<br />

se confunde com a de violência conjugal especialmente nos<br />

mais jovens. A presidente explica que “a palavra doméstica vai<br />

da partilha daquele homem e daquela mulher e estamos a falar<br />

de casais heterossexuais como também de casais gays ou<br />

lésbicas a que se aplica a mesma lei e, portanto, tem a ver com<br />

a conjugalidade e não só ocorre no espaço de casa, o espaço<br />

de casa é o espaço privilegiado para o agressor porque à partida<br />

é um espaço que ninguém está a observar e quando existem<br />

crianças, estas podem estar a observar de forma direta ou<br />

indireta, mas à partida o agressor sente que está no seu espaço<br />

e é aí que ocorre a maior parte da vitimização para com estas<br />

mulheres”.<br />

P<br />

ortanto, a violência doméstica<br />

abarca vários tipos de violência:<br />

física, psicológica, verbal, sexual,<br />

económica e a financeira.<br />

A violência também é, muitas<br />

vezes, perpetuada na fase da<br />

separação e é nesta altura<br />

que as mulheres têm um risco<br />

acrescido perante aquele<br />

agressor e acontece quando<br />

aquela mulher é mãe, aquele<br />

homem é pai e têm de “negociar”<br />

entre si a partilha daquela<br />

criança.<br />

A presidente também explica<br />

como se distingue a violência<br />

no namoro. Ocorre numa fase<br />

mais jovem e à partida aquele<br />

homem e aquela mulher não<br />

coabitam, mas passam “imensas<br />

horas na casa um do outro, mas<br />

não estamos agora a falar na<br />

violência no namoro, mas sim de<br />

uma violência doméstica, onde<br />

ambos estão numa intimidade<br />

entre si”.<br />

Atualmente, na época de<br />

confinamento, o apoio à<br />

vítima tem sido “ligeiramente<br />

diferente de modo a que não as<br />

puséssemos em maior risco e<br />

maior perigo e, muitas vezes,<br />

tivemos de o fazer utilizando as<br />

redes sociais, mas, sobretudo,<br />

090 NODEZ20


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

para a maior parte das<br />

mulheres a grande<br />

ferramenta deste contacto<br />

foi pelo telemóvel, porque<br />

as vítimas estavam mais<br />

coagidas, ‘mais vigiadas’,<br />

mais controladas nos<br />

seus espaços, nos<br />

seus quereres e nas<br />

suas vontades, porque<br />

obrigatoriamente tiveram<br />

de passar mais tempo<br />

junto do seu pseudo<br />

agressor”.<br />

Maria José Raposo<br />

denota que os números<br />

“desceram fortemente”<br />

devido ao confinamento,<br />

porque a vítima tinha<br />

“pouca mobilidade e<br />

também percebemos<br />

que houve mais ajuda<br />

familiar, sentimos que<br />

as famílias foram mais<br />

unidas entre si, os tios<br />

foram mais próximos da<br />

vítima e, muitas vezes,<br />

numa situação normal, a<br />

vítima, antes da pandemia,<br />

estava sozinha durante<br />

a pandemia, esta vítima<br />

teve mais apoio familiar,<br />

mas que obrigou aqui uma<br />

monitorização da nossa<br />

parte muito maior a vítimas<br />

que estamos extramente<br />

preocupadas com a sua<br />

segurança”.<br />

As associações notaram que os<br />

números de pedidos de ajuda durante<br />

o confinamento tinham diminuído<br />

exatamente porque viviam mais com o<br />

agressor e assim que o confinamento<br />

acabou os efeitos são emocionais,<br />

sobretudo, “pela ausência de<br />

privacidade, estar uma pessoa limitada<br />

às rotinas, porque, infelizmente, o<br />

confinamento para as vítimas resultou<br />

numa obrigatoriedade de movimentos,<br />

cálculo de liberdade de movimentos”, e,<br />

por isso, uma das estratégias da APAV<br />

é aproveitar “movimentos como ir às<br />

compras se conseguissem sozinhas ou<br />

mesmo passear algum animal ou outra<br />

rotina de forma individual refletir sobre<br />

aquilo que se tem passado, porque para<br />

muitas pessoas isso já era suficiente<br />

ter estes momentos a sós, felizmente,<br />

posso falar por algumas vítimas que<br />

não devem ter tido estes momentos,<br />

porque é muito importante refletir pelo<br />

que se passou e arranjar algumas<br />

estratégias de coping para lidar com<br />

estas situações.”<br />

Também foi avaliado o impacto pósconfinamento<br />

e “um alegado agressor<br />

que está habituado a 24 horas no<br />

confinamento com a vítima e depois<br />

se vê sem ela, as repercussões nesta<br />

mesma vítima depois do confinamento<br />

foram graves, porque este alegado<br />

agressor, supostamente, tornou-se uma<br />

pessoa mais controladora, novamente a<br />

falta de liberdade de movimentos.<br />

092 NODEZ20 093<br />

NODEZ20


Portanto, eu analisaria esta questão tanto a nível do confinamento<br />

como o pós-confinamento e na questão do controlo e falta de<br />

liberdade”.<br />

O Gabinete de Apoio à Vítima indica que o nível familiar é outro dos<br />

impactos sentidos, nomeadamente, “a falta do controlo exercido<br />

e podemos ver a questão do isolamento de outras pessoas. Se<br />

uma pessoa tem de estar mais disponível para o alegado agressor<br />

implicitamente estará menos disponível para outras pessoas o<br />

que vai causando aqui também isolamento para a vítima e que<br />

depois tem consequências nefastas na sua parte emocional,<br />

nomeadamente, a falta de convivência social, porque depois poderá<br />

desencadear aqui uns sentimentos de desânimo, tristeza, a própria<br />

falta de atividade social também poderá cada vez mais causar alguns<br />

impactos em outras esferas, porque se a pessoa se torna mais<br />

isolada vai também de alguma forma estar menos a par de algumas<br />

questões que lhe são importantes e, portanto, vai sempre minando<br />

aqui a própria autoestima da vítima”.<br />

Piedade Lalanda fala sobre as várias condicionantes da violência:<br />

as relações conjugais ou as relações afetivas ou familiares ou as<br />

relações de género sejam elas no grupo de família, trabalho ou<br />

sociedade em geral. “A relação principal nas estatísticas da violência<br />

doméstica é a relação de conjugalidade ou ex-conjugalidade que<br />

representa 60% dos agressores e, portanto, que eram cônjuge ou<br />

ex-cônjuge como também já foi aqui dito a questão do namoro e<br />

também uma relação que já representa 16% que é a relação paisfilhos<br />

em que o agressor é o filho e essa também é uma<br />

situação que pode ser de risco”. A violência não acontece<br />

num grupo definido, “porque é transversal e é transversal<br />

até também em termos de classe social mesmo que<br />

encontremos uma percentagem mais significativa de vítimas<br />

e de agressor com baixo nível sócio-escolar ou de baixa<br />

escolaridade”. Também são encontradas vítimas com ensino<br />

superior “só que há uma grande diferença entre as classes<br />

sociais em matéria de denúncia, em visibilidade destas<br />

situações de violência doméstica e de certeza que há uma<br />

‘maior vergonha’ na denúncia nas classes sociais mais<br />

elevadas, porque isso, muitas vezes, mexe com prestígio,<br />

situações sociais de relevo e mexe até com estatutos de<br />

poder que são mais difíceis, nomeadamente há casos<br />

mediáticos nas revistas que há pessoas que tiveram a<br />

coragem de mostrar ao quadro social a situação em que foi<br />

vítima”.<br />

Um outro aspeto é a questão socioeconómica e que “há<br />

um aspeto interessante que na caracterização das vítimas<br />

a maioria é empregada e poderíamos pensar que estamos<br />

perante mulheres inativas, domésticas, mais vulneráveis<br />

com menos rendimentos, mas a realidade não é essa. Há<br />

muitas mulheres que são empregadas e têm o seu próprio<br />

rendimento”.


REPORTAGEM<br />

A professora afirma que “o<br />

problema maior não está tanto a<br />

este nível, mas na qualidade da<br />

relação e aí entra a dimensão<br />

cultural que é o padrão de<br />

homens e mulheres que ainda<br />

perdura da imagem do chefe de<br />

família no fundo uma relação<br />

hierárquica entre homens e<br />

mulheres dentro da própria<br />

família. E isto é que destrói, é<br />

o lastro favorável para entrar a<br />

violência, ou seja, no contexto<br />

em que não há uma democracia<br />

familiar e nós infelizmente<br />

ainda temos no nosso<br />

contexto cultural esta ideia<br />

de que o homem, porque<br />

‘veste calças’, como se<br />

dizia no passado, tem mais<br />

poder e esta ideia não está<br />

só na cabeça dos homens<br />

também está na cabeça das<br />

mulheres e, por isso, o mais<br />

difícil de desconstruir na violência<br />

doméstica são estes estereótipos<br />

que as mulheres alimentam e<br />

quando elas alimentam no sentido<br />

que ‘naturalizam’ e consideram<br />

‘expectável’ ” que a vítima ache<br />

que é motivo da reação violenta<br />

qualquer atitude por parte dele “é<br />

porque ela tem interiorizado este<br />

modelo e isto remete-nos para<br />

uma direção muito importante<br />

dos tais grupos de risco que<br />

são as famílias que ainda agora<br />

educam os seus filhos em modelos<br />

desiguais, portanto enquanto<br />

esta desigualdade de género fizer<br />

parte dos padrões do modelo<br />

de referência da educação nós<br />

estamos a alimentar ou estamos a<br />

dificultar, se quisermos, o combate<br />

aos comportamentos violentos”.<br />

A investigadora continua que<br />

“há muito a fazer nos modelos<br />

educativos pedagógicos, há muito<br />

a fazer na questão do namoro,<br />

na prevenção da violência nas<br />

relações de namoro, aliás um dia<br />

disse um estudante do secundário<br />

que a propósito do comportamento<br />

violento dizia “não é normal, mas é<br />

habitual”, ou seja, eles reconhecem<br />

que o comportamento violento<br />

destrói o outro, mas também<br />

reconhecem que isto faz parte da<br />

sua linguagem e esta naturalização<br />

da sua linguagem violenta é algo<br />

que tem de ser desconstruído”.<br />

Há trabalho a fazer “a nível da<br />

educação como ao nível da família,<br />

da escola, trabalho, política, da<br />

sociedade e do sistema judicial,<br />

nós temos que, infelizmente, e<br />

as estatísticas demonstram que<br />

sempre que não se condenam<br />

os agressores e a taxa de<br />

coordenação é muito, muito baixa<br />

desde logo o número de processos<br />

096 NODEZ20 097<br />

NODEZ20


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

de acusações é 16% da quantidade dos<br />

inquéritos que são feitos ao nível da<br />

violência doméstica e depois há muitas<br />

penas suspensas. Em Portugal esta baixa<br />

coordenação dos agressores leva a uma<br />

baixa denúncia, quanto menos agressores<br />

forem condenados, menos as vítimas acham<br />

que vale a pena denunciar e isto também<br />

é uma área de intervenção que<br />

se tem de trabalhar muito para<br />

dar visibilidade e aumentar<br />

a consciência crítica das<br />

pessoas que são vítimas de<br />

violência doméstica, elas<br />

têm de ter a consciência<br />

que não é normal ser<br />

vítima, elas não têm o<br />

direito de se sujeitarem a<br />

estes quadros de violência<br />

não é um destino, nem é<br />

uma fatalidade e foi dito<br />

aqui no princípio pela<br />

Malvina, é um compromisso<br />

que se estabelece na<br />

relação conjugal seja formal<br />

ou não formal, mas essa<br />

violência conjugal não pode<br />

destruir a dignidade de<br />

nenhum dos membros que<br />

constrói aquela relação”.<br />

E para se perceber se<br />

há algum tipo de violência<br />

a “nosso redor” o grande sinal de alerta<br />

“é a rutura do contacto da vítima com<br />

o mundo. Isto é uma estratégia do<br />

próprio agressor que vai minando e<br />

controlando sobretudo o mundo normal o<br />

contacto da pessoa com os amigos, com<br />

a família, com os colegas e vai criando um<br />

ser omnipresente e omnipotente, o único<br />

que tem a palavra, a verdade e o único que<br />

tem o caminho certo e a vítima ao mesmo<br />

tempo que vai deixando de contar com as<br />

outras pessoas e de pedir ajuda”, “mas<br />

para se aceitar a ajuda é preciso se<br />

reconhecer que se tem de ser ajudado,<br />

por isso é que as pessoas, às vezes,<br />

nos dizem como é que é possível<br />

uma vítima levar tantos anos<br />

até pedir ajuda, porque<br />

no fundo a agressão<br />

vai triturando essa<br />

capacidade de contar<br />

com os outros e ela vai<br />

se tornando dependente<br />

do próprio agressor, ela<br />

própria vai justificando os<br />

comportamentos dele e vaise<br />

tornar dependente das<br />

armas”.<br />

A professora realça o<br />

papel das associações<br />

intervenientes, afirmando<br />

que “é interessante ver<br />

aqui como a APAV e a<br />

UMAR têm de inventar,<br />

criar estratégias para<br />

devolver às vítimas a<br />

capacidade para se<br />

libertarem, porque as<br />

estratégias normais dos<br />

contactos diários com<br />

as pessoas, com as<br />

098 NODEZ20 099<br />

NODEZ20


amigas eventualmente com a família estão minadas<br />

e nós vemos, às vezes, pessoas que já não nos dizem grandes<br />

conversas ao telefone ou que nos mandam SMS muito secos<br />

que já não têm conteúdo, porque estão demasiado cercadas<br />

num mundo que não é saudável e isto é um sinal de alerta,<br />

alguém que nós conhecemos e que vai perdendo a capacidade<br />

de contacto e isto é um processo lento, há uma fase em que<br />

a pessoa reage, revolta-se, mas à medida que o tempo vai<br />

passando vai perdendo as forças e vai perdendo a razão para<br />

lutar e vai-se submetendo e vai-se esquecendo de si própria até<br />

na sua imagem, na sua aparência, na sua maneira de arranjar<br />

para se vestir para sair ou cuidar da sua cara e vai dando mais<br />

razões ao agressor para ser eventualmente mal tratada. Eu<br />

acho que isso é o grande sinal de alerta, é a perda do contacto<br />

com o mundo e o ter de encontrar estratégias para se tirar<br />

desse mundo”.<br />

Por outro lado, um outro sinal de alerta “tem a ver com essa<br />

incapacidade de se distanciar de si própria. Quando alguém<br />

não consegue ver o sítio onde está e as coisas que está a<br />

viver está muito mais vulnerável e muito mais fragilizada, tem<br />

de sair para poder olhar para si própria e para se ver. Não são<br />

só aquelas imagens que aparecem nas campanhas com os<br />

olhos negros ou com ferida, não! As pancadas muitas vezes<br />

são interiores, são humilhações, é a violência verbal, é o<br />

desrespeito pelas suas escolhas, por aquilo que ela gosta ou<br />

quer ser, por aquilo que ela acha que está certo e é um triturar<br />

permanente daquilo que é a pessoa, é que é a grande marca<br />

aquela que é mais difícil de se ver, mas é aquela que a pessoa<br />

tem de se distanciar para se<br />

reconhecer (…) e isso é preciso<br />

olhar, saber interpretar os sinais<br />

de mudança no comportamento<br />

da vítima para poder ajudar<br />

e pegar no fio da meada e<br />

começar a fazer com que esta<br />

pessoa saia desse mundo e<br />

possa verbalizar”.<br />

Os procedimentos para pedir<br />

ajuda às instituições vai<br />

depender de como é que aquela<br />

mulher se encontra naquele<br />

preciso momento. No período<br />

de confinamento “foram elas<br />

próprias que minimizavam essa<br />

violência, porque elas estavam<br />

centradas no seu papel de mães<br />

em apoiar, em arranjar os meios<br />

de comunicação para que os<br />

filhos pudessem ter a escola em<br />

casa nas devidas condições.<br />

Muitas destas mulheres<br />

tiveram que cuidar de outros<br />

familiares, nomeadamente mães<br />

e pais dependentes e havia o<br />

minimizar desta violência, ou<br />

seja, “ela amanhã vai passar,<br />

ela amanhã vai-se resolver” e<br />

o que é que estas mulheres<br />

fizeram? Fizeram o exercício<br />

imenso de não se olharem para<br />

si enquanto mulheres, mas se<br />

olharem para si enquanto<br />

0100 NODEZ20 0101<br />

NODEZ20


mães, filhas, enquanto<br />

cuidadoras, enquanto<br />

trabalhadoras, porque neste<br />

curto espaço de casa elas<br />

também correspondiam ao<br />

seu trabalho, em teletrabalho<br />

e, portanto, houve este<br />

minimizar”.<br />

“E no primeiro atendimento,<br />

nós vamos fazer com que<br />

esta mulher perceba que tem<br />

direitos, não tem só deveres<br />

e que é uma pessoa como<br />

outra qualquer e aí vamos<br />

perceber a dimensão da<br />

violência, vamos perceber<br />

se ela continua a estar<br />

segura naquele espaço<br />

ou não e vamos delinear<br />

um plano para esta mulher<br />

sempre conversando com ela<br />

chamando a atenção que ela<br />

pode conversar com as nossas<br />

juristas, desabafar com as<br />

nossas psicólogas e conversar<br />

com a nossa assistente social<br />

e à maneira que ela nos<br />

procura através das redes<br />

sociais, do telemóvel, através<br />

do telefone, um atendimento<br />

presencial como ela quiser”.<br />

A diretora da UMAR esclarece<br />

que primeiro é preciso “ouvir,<br />

ouvir e ouvir e nunca comentar<br />

e nunca responder de maneira<br />

a colocar dúvidas na cabeça<br />

daquela vítima, porque ela é<br />

que sabe da sua vida, mas<br />

posso te acompanhar à APAV.<br />

E<br />

muitas vezes aquela mulher está<br />

debilitada de maneira que vai omitir<br />

muitos factos importantes na denúncia<br />

e à conversa connosco vai fazendo<br />

uma resenha histórica e vamos tentar<br />

meter na cabeça que quando ela for<br />

apresentar aquela denúncia tenha os<br />

factos todos, porque são aqueles factos,<br />

o dia, a hora, o momento como começou<br />

que vão permitir ao Ministério Público<br />

fazer o seu trabalho condignamente”. No<br />

mesmo sentido, “quanto mais informação<br />

ela tiver, mais concertada será a sua<br />

decisão, não vale a pena num ato<br />

irrefletido ir fazer uma queixa e depois<br />

omitir informações, mais vale reestruturar<br />

esta narrativa (…) e só o facto de<br />

expor a outra pessoa ajuda a construir<br />

este discurso e até nós organizações<br />

podemos ajudar nesta denúncia. Se esta<br />

vítima está de tal forma debilitada a nível<br />

emocional e consequentemente cognitivo<br />

isto também acontece depois a nível do<br />

discurso, havendo alguns desfasamentos<br />

que, às vezes, são consequências da<br />

própria vitimização, nós podemos ajudar<br />

depois a nível do processo-crime os<br />

resultados são melhores e sobretudo<br />

respeitar o timing da vítima. Às vezes<br />

há vítimas que não estão preparadas<br />

para tomar certos procedimentos<br />

logo e já e nós vamos trabalhando ao<br />

nível de psicoeducação e algumas<br />

estão fragilizadas ao ponto de se auto<br />

culpabilizarem pela violência e nós<br />

tentamos sensibilizar”.<br />

0102 NODEZ20 0103<br />

NODEZ20


REPORTAGEM<br />

RUI SANTOS<br />

O CRESCIMENTO<br />

DOS CENTROS<br />

DE SERVIÇOS<br />

PARTILHADOS<br />

EM PORTUGAL<br />

Numa talk do Jornal Económico, Tiago Henriques,<br />

Manager da Shared Services Centres, explicou o<br />

crescimento destes centros em Portugal. Segundo o<br />

mesmo, os centros de serviços partilhados tiveram<br />

origem no final da década de 80 nos Estados Unidos<br />

da América “junto de grandes conglomerados<br />

de empresas organizacionais que pressionados<br />

pelo custo entendem centralizar em algumas<br />

geografias, e às vezes só numa, as suas atividades<br />

mais transacionais”, o principal objetivo desses<br />

centros é wa redução de custos, “mas também a<br />

uniformização de processos com todos os ganhos<br />

que advêm disso”, referiu, lembrando que ao “longo<br />

do tempo os conceitos foram evoluindo, mas na sua<br />

origem é este o conceito”.<br />

0104 NODEZ20


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

Em Portugal estes centros têm evoluído “de<br />

uma forma muito positiva”, sendo que nos<br />

últimos quatro anos “os estudos que temos<br />

indicam que estas estruturas cresceram na casa<br />

dos 44%. Aquilo que nos apercebemos é que<br />

estas tarefas de carácter mais transacional,<br />

pagamentos ou recebimentos, portanto tarefas<br />

muito administrativas, vão progredindo para<br />

funções que se encostam cada vez mais ao<br />

core business das empresas”. Para Tiago<br />

Henriques, aquilo que faz os investidores<br />

procurarem Portugal e que os que já estão<br />

continuem a olhar para o país “é de facto o<br />

valor acrescentado que os portugueses são<br />

capazes de trazer a estes centros e a estas<br />

empresas”.<br />

“Há uma parte dos colaboradores das<br />

organizações que não são portugueses e o<br />

Turismo nos últimos anos, com indicadores<br />

menos positivos agora pelo momento que<br />

estamos a viver, mas de facto isto fez com<br />

que quem não estava em Portugal olhasse<br />

para Portugal como um sítio onde podia ter<br />

as suas famílias e podia desenvolver as suas<br />

carreiras”, explicou, acrescentando que, para<br />

quem investe, “olhar para o talento de Portugal<br />

é um facto incontornável, é algo que faz no<br />

limite decidir por Portugal”, afirmou.<br />

Não sendo o país “mais barato do mundo,<br />

porque os nossos recursos humanos não<br />

são os mais baratos”, no entanto estes “são<br />

considerados os melhores”.<br />

O Manager da Shared Services Centres diz que, nos últimos anos,<br />

“pela pressão do imobiliário junto, principalmente, das grandes<br />

metrópoles são onde estes investidores tendem a querer investir<br />

mais, pelas redes de transporte que servem as grandes metrópoles<br />

são outro dos grandes pontos de interesse”. Entre outros aspetos<br />

igualmente “muito importantes”, Tiago Henriques destacou<br />

também o facto de os portugueses tenderem a dominar idiomas<br />

“muito importantes” como o espanhol e o inglês, algo positivo para<br />

os centros de serviços partilhados caso procurem estruturas que<br />

atravessam fronteiras, “isto traz logo pontos consideráveis para<br />

Portugal”, acrescendo a isso “a reputação das nossas pessoas e os<br />

bons exemplos de quem já cá está que tende a continuar a investir,<br />

em vez de retirar operações, como acontece em outras geografias,<br />

a tendência de quem está em Portugal é continuar a investir em<br />

funções que trazem muito valor às empresas”.<br />

0106 NODEZ20 0107<br />

NODEZ20


REPORTAGEM<br />

Tiago Henriques diz que não há um padrão<br />

nem perfil para os projetos procurados pelos<br />

investidores em Portugal, e que os mesmos<br />

“procuram é olhar para processos mais<br />

refinados, mais alargados, imagine: passamos<br />

de áreas que se chamavam account payable<br />

ou receivable para purchase to pay ou order<br />

to cash, tal e qual como os nomes indicam<br />

são scopes muito mais alargados”. Também<br />

existem outros exemplos como a tecnologia<br />

“com imensos projetos a entrar em Portugal,<br />

projetos gigantescos na área da engenharia,<br />

nomeadamente mais a norte do país. Daí<br />

a minha resposta não há um padrão, mas<br />

definitivamente procuram o conhecimento<br />

português e a capacidade de adaptação do<br />

povo português também”, explicou.<br />

Em relação à pandemia, essas estruturas<br />

estão a reagir “particularmente bem, mas é<br />

surpreendente ver como essas empresas se<br />

organizaram tão rapidamente para conseguir<br />

ultrapassar este momento mais difícil”,<br />

também pelo facto de existirem determinadas<br />

tarefas “que não têm que ser desenvolvidas<br />

no escritório, aquelas tarefas que já estão<br />

implementadas e já estão muito automatizadas<br />

não carecem de trabalho em grupo”. No<br />

entanto, Tiago Henriques confessou que<br />

“alguns clientes reportam alguma dificuldade<br />

principalmente naqueles projetos que exigem<br />

conhecimentos multidisciplinares, imagine:<br />

estamos a desenvolver uma ferramenta para<br />

automatizar um processo e isto obriga a que as<br />

equipas desenhem, mas depois, em conjunto,<br />

criem as ferramentas, quem parametriza<br />

e quem desenvolve, e é essa a grande<br />

dificuldade, é conseguir transformar ideias em<br />

ações e aí”, podendo ser, do seu ponto de vista,<br />

“a área onde estas empresas estão a ter mais<br />

dificuldades”. Contudo, “parece que continua<br />

a haver interesse em investir em Portugal.<br />

Existem alguns processos para <strong>2021</strong> e 2022”,<br />

avançou, reforçando a ideia de que “quem cá<br />

está continua a olhar para Portugal como um<br />

país onde pode continuar a introduzir tarefas e<br />

muitas vezes a retirá-las dos seus headquarters<br />

o que são ótimas notícias para Portugal”.<br />

0109<br />

NODEZ20


ESTUDO<br />

ESTUDO<br />

MÁ VISÃO<br />

DUPLICA A PROBABILIDADE DE<br />

SOFRER DE DEPRESSÃO<br />

PORTUGUESES<br />

PREFEREM<br />

COMPRAR<br />

ONLINE<br />

A associação de má visão com uma<br />

maior probabilidade de sofrer de<br />

depressão é um dos resultados de<br />

um estudo recentemente publicado<br />

em que se avaliaram dificuldades<br />

de visão reportadas pelos próprios<br />

indivíduos em 30 países europeus,<br />

incluindo Portugal. Este estudo foi<br />

realizado com o apoio do programa<br />

de investigação Eurovisão da União<br />

Europeia Horizonte 2020 e foi<br />

publicado na Acta Ophthalmologica,<br />

com a autoria de vários investigadores<br />

internacionais de optometria e<br />

oftalmologia.<br />

A má visão contribui para impedir o<br />

desenvolvimento de todo o potencial<br />

das crianças, para a limitação de<br />

produtividade nos adultos e perda de<br />

autonomia na terceira idade. Também<br />

conduz ao isolamento, à sensação<br />

de insegurança e impotência e à<br />

degradação da autoconfiança. Como<br />

tal, contribui para os comportamentos<br />

depressivos de uma forma muito<br />

marcada.<br />

Estes resultados enfatizam a<br />

necessidade de uma abordagem<br />

abrangente, de resposta eficaz<br />

integrada, na comunidade e de<br />

proximidade. Os cuidados para<br />

a saúde da visão são os cuidados<br />

de especialidade mais frequentes<br />

nos seres humanos e devem ser<br />

assegurados desde o nascimento e ao<br />

longo de toda a extensão da vida.<br />

Cerca de 5 milhões de portugueses<br />

sofrem de erro refrativo, e ainda<br />

assim, o Estado Português ainda<br />

não implementou as recomendações<br />

da Organização Mundial de Saúde<br />

sobre a integração e planeamento da<br />

força de trabalho dos cuidados para<br />

a saúde da visão desde os cuidados<br />

primários aos cuidados hospitalares e<br />

de reabilitação. Estas recomendações<br />

foram recentemente reforçadas pela<br />

OMS para o rastreio da retinopatia<br />

diabética no dia 14 de Novembro,<br />

onde mais uma vez se reforça o papel<br />

fundamental que os Optometristas<br />

devem desempenhar na prestação<br />

de cuidados primários para a saúde<br />

da visão. Até lá, cada vez mais<br />

portuguesas e portugueses irão ver<br />

pior o seu presente e futuro.<br />

Em 2020, 30% dos portugueses<br />

admite fazer as suas compras de Natal<br />

exclusivamente online (6,1% em<br />

2019). A conclusão é de um estudo<br />

realizado pelo Instituto Português de<br />

Administração de Marketing (IPAM)<br />

sobre os hábitos dos portugueses face<br />

às compras de Natal que, este ano,<br />

aponta para alterações acentuadas no<br />

comportamento do consumidor.<br />

Ainda assim, os portugueses preveem<br />

gastar, em média, 374 euros nas<br />

compras de Natal, um valor não<br />

muito diferente quando comparado<br />

com os 385 euros de 2019.<br />

“Quando analisada a variação dos<br />

valores gastos ao longo dos anos em<br />

compras de Natal, verifica-se uma<br />

oscilação significativa. Em 2009,<br />

os portugueses previam gastar 490<br />

euros, mas 11 anos depois, este valor<br />

diminuiu consideravelmente, fruto da<br />

conjuntura socioeconómica”, afirma<br />

Mafalda Ferreira, docente do IPAM<br />

e coordenadora deste estudo. “Como<br />

resultado da pandemia e provável<br />

crise económica dos próximos<br />

tempos, estes resultados não surgem<br />

como estranhos, nomeadamente,<br />

no caso do aumento acentuado das<br />

compras exclusivamente online. Os<br />

portugueses estão com sentimentos<br />

negativos face ao consumo, que se<br />

acentuaram nesta época natalícia, e<br />

estes valores são um reflexo disso”,<br />

acrescenta a responsável.<br />

Para compreender a situação<br />

financeira das famílias, o IPAM<br />

procurou também saber se os<br />

portugueses iriam receber subsídio<br />

de Natal e concluiu que 28% dos<br />

inquiridos não o receberá nesta<br />

altura, o que terá um impacto<br />

negativo no comportamento face<br />

ao consumo nesta quadra. Dos que<br />

recebem subsídio de Natal, 15,6%<br />

prevê despender entre 51% a 75%<br />

desta quantia extra em compras; 5,8%<br />

0110 NODEZ20 0111<br />

NODEZ20


ESTUDO<br />

vai gastar a totalidade do subsídio;<br />

enquanto 8% pretende poupar este<br />

valor.<br />

Procurando analisar a situação<br />

de 2020 relativamente ao quadro<br />

do ano anterior, foi solicitado aos<br />

inquiridos que comparassem o valor<br />

que preveem gastar este ano, com o<br />

valor gasto em 2019, sendo que 17%<br />

refere que em 2020 irá gastar um valor<br />

inferior ao de 2019. De destacar que<br />

75% dos inquiridos responde que irá<br />

gastar o mesmo que no ano anterior, o<br />

que remete, apesar de tudo, para uma<br />

estabilidade no comportamento do<br />

consumidor em 2020. Os inquiridos<br />

que vão gastar um valor inferior<br />

referem que irão efetuar cortes nas<br />

compras para amigos e familiares.<br />

Quanto aos destinatários dos<br />

presentes de Natal, as crianças são<br />

privilegiadas nos agregados familiares<br />

com filhos (55% dos inquiridos),<br />

em 100% dos casos analisados neste<br />

estudo. De referir ainda que, em 75%<br />

dos casos, é mencionada a intenção de<br />

compra de presentes para o cônjuge e,<br />

em 62%, para os pais, irmãos e outros<br />

familiares. Apenas 30% dos inquiridos<br />

refere a intenção de comprar prendas<br />

para amigos.<br />

Relativamente aos produtos a<br />

comprar, para as crianças até aos<br />

12 anos as prendas preferidas serão<br />

brinquedos (48%), seguidas de roupas<br />

e sapatos (20%) e livros (8%). Para os<br />

adolescentes (entre os 12 e os 18 anos)<br />

as escolhas recaem na roupa/sapatos<br />

(32,1%), jogos eletrónicos (16%)<br />

e acessórios (8%). Para os adultos,<br />

a opção mais escolhida para os<br />

presentes de natal são roupa/sapatos<br />

(30%), seguida de acessórios (21%) e<br />

livros (16%).<br />

Quanto ao local para a realização de<br />

compras, o número de inquiridos que<br />

opta pelos centros comerciais (20%)<br />

é superior ao de quem escolhe os<br />

centros comerciais e comércio de rua<br />

(10%), sendo que a pandemia trouxe<br />

uma alteração profunda dos locais<br />

de compra, com 30% dos inquiridos<br />

a afirmar que fará exclusivamente<br />

compras online.<br />

O estudo do IPAM verificou ainda<br />

que 63% dos inquiridos efetua as suas<br />

compras durante o mês de dezembro<br />

e que, quem compra antecipadamente,<br />

fá-lo para evitar a concentração<br />

de pessoas e garantir a entrega dos<br />

produtos comprados online.<br />

Este estudo do IPAM que caracteriza<br />

o comportamento dos consumidores<br />

face às compras de Natal é realizado<br />

pelo 12.º ano consecutivo, o que<br />

possibilita uma análise detalhada das<br />

principais alterações nos hábitos de<br />

consumo. Num ano atípico como<br />

2020, de acordo com esta análise, a<br />

perceção da população portuguesa<br />

sobre o Natal é, sobretudo, negativa,<br />

não sendo de admirar que a situação<br />

pandémica tenha impactado os<br />

hábitos de consumo, dando origem<br />

aos resultados mais distintos dos<br />

últimos 10 anos.<br />

0112 NODEZ20 0113<br />

NODEZ20


ESTUDO<br />

CÉLULAS MESENQUIMAIS DO<br />

TECIDO DO CORDÃO UMBILICAL<br />

DEMONSTRAM BENEFÍCIOS<br />

NO TRATAMENTO DA ARTRITE<br />

REUMATOIDE<br />

De acordo com investigações<br />

recentes sobre o efeito das células<br />

mesenquimais derivadas do cordão<br />

umbilical no tratamento da artrite<br />

reumatoide, pode concluir-se que<br />

existe um potencial terapêutico<br />

destas células, nomeadamente antiinflamatório.<br />

A redução da inflamação<br />

ocorre devido a uma capacidade<br />

imunomodelatória/imunossupressora<br />

das células mesenquimais.<br />

A artrite reumatoide está clinicamente<br />

definida como uma doença crónica,<br />

inflamatória e autoimune que se<br />

caracteriza pela inflamação das<br />

articulações e que pode conduzir<br />

à destruição do tecido articular<br />

e periarticular. O conhecimento<br />

adquirido por vários cientistas a nível<br />

mundial sobre o potencial terapêutico<br />

das células estaminais, tem levado<br />

ao aparecimento de vários ensaios<br />

clínicos recentes sobre esta temática.<br />

Em 2018, investigadores do<br />

departamento de reumatologia de<br />

vários hospitais de Seoul em conjunto<br />

com os institutos de medicina<br />

regenerativa e centros de investigação<br />

da Coreia do Sul avaliaram 11 doentes<br />

com artrite reumatoide. Destes, 78%<br />

são mulheres com uma idade média<br />

de 57 anos e com uma duração média<br />

da doença de 9 anos e meio. Após 24h<br />

da infusão das células mesenquimais<br />

provenientes do cordão umbilical,<br />

observou-se diminuição significativa<br />

de várias citocinas pro-inflamatórias<br />

(IL-1β, IL-6, IL-8, e TNF-α). Tal<br />

facto comprova a capacidade<br />

imunomodulatória destas células.<br />

Este estudo abriu a possibilidade de<br />

explorar o tratamento e a melhoria de<br />

doenças imunomediadas, incluindo<br />

doenças autoimunes, como a artrite<br />

reumatoide .<br />

Mais recentemente, em 2019, foi<br />

realizado outro ensaio clínico com<br />

o propósito de estudar o efeito da<br />

infusão das células mesenquimais<br />

provenientes do cordão umbilical<br />

nesta patologia com um período de<br />

seguimento mais alargado (3 anos).<br />

Sessenta e quatro doentes (87%<br />

mulheres) com idades compreendidas<br />

entre 18-64 anos foram submetidos<br />

a uma infusão intravenosa com<br />

células mesenquimais do tecido<br />

do cordão umbilical. Após o<br />

primeiro e terceiro ano da infusão,<br />

os doentes foram avaliados em três<br />

categorias: Marcadores inflamatórios<br />

sistémicos, Segurança e Eficácia.<br />

Após três anos, os marcadores<br />

inflamatórios sistémicos reduziram<br />

significativamente, realçando a<br />

capacidade destas células diminuírem<br />

o ambiente inflamatório evidenciando<br />

a eficácia do uso destas células como<br />

terapia 2 .<br />

Para além disso, as células<br />

mesenquimais do tecido do cordão<br />

umbilical apresentam uma capacidade<br />

de proliferação e diferenciação<br />

únicas, assim como a aptidão de,<br />

depois de estarem na corrente<br />

sanguínea, se dirigirem para o<br />

local inflamado exercendo os seus<br />

efeitos benéficos (homing). Esta<br />

capacidade de “homing”, associada<br />

à vantagem de terem propriedades<br />

hipoimunogénicas, ou seja, de não<br />

reagirem à infusão de células como<br />

0114 NODEZ20 0115<br />

NODEZ20


ESTUDO<br />

com 68 anos que foi diagnosticado<br />

com artrite reumatoide desde os seus<br />

53 anos de idade. Na figura C e D<br />

está, respetivamente, representado<br />

o antes e um ano depois da infusão<br />

com células mesenquimais do tecido<br />

do cordão umbilical numa doente<br />

com 33 anos com artrite reumatoide<br />

desde os seus 29 anos de idade com<br />

queixas de muitas dores. Como se<br />

pode observar em ambas as situações,<br />

os doentes não conseguem esticar<br />

os dedos devido à inflamação<br />

existente nas junções articulares.<br />

No entanto, após o tratamento<br />

existe uma melhoria substancial<br />

permitindo um maior movimento<br />

dos membros, sublinhando a eficácia<br />

desta terapêutica. Para além disso,<br />

os efeitos terapêuticos das células<br />

mesenquimais mantêm-se durante o<br />

período de acompanhamento, sempre<br />

com resultados clínicos estáveis,<br />

melhorando de forma substancial a<br />

qualidade de vida dos doentes com<br />

artrite reumatoide 2 .<br />

um agente estranho que possa<br />

despoletar resposta imunológica,<br />

permitem realizar tratamentos<br />

com células do próprio indivíduo<br />

(autólogos) ou de outros indivíduos<br />

(alogénicos), possibilitando a<br />

utilização destas células como um alvo<br />

terapêutico muito eficaz e seguro.<br />

Um e três anos após o tratamento,<br />

todos os valores das análises<br />

sanguíneas de rotina mantiveram-se<br />

sem alterações comparativamente<br />

com a fase anterior ao tratamento.<br />

As funções hepática e renal<br />

também não sofreram alterações,<br />

demonstrando que o tratamento<br />

com células mesenquimais do tecido<br />

do cordão umbilical é seguro. O<br />

cálculo do desenvolvimento da artrite<br />

reumatoide (score DAS28) diminuiu<br />

significativamente um ano depois do<br />

tratamento, continuando a diminuir<br />

até ao terceiro ano. O mesmo<br />

resultado foi observado na avaliação<br />

da capacidade funcional dos doentes<br />

(Health Assessment Questionnaire).<br />

Este questionário avalia de 0 a 3 as<br />

capacidades quotidianas do indivíduo,<br />

desde conseguir vestir-se até abrir<br />

torneiras, frascos, subir escadas, entre<br />

outros .<br />

A eficácia deste tratamento é real<br />

e pode ser também observada<br />

naturalmente por qualquer pessoa.<br />

Na figura ilustrada em baixo estão<br />

retratadas as mãos de um paciente<br />

antes (figura A) e após três anos do<br />

tratamento com células mesenquimais<br />

derivadas do tecido cordão umbilical<br />

(figura B). Trata-se de um paciente<br />

Figura retirada do artigo Wang L,et al. (2019) Drug<br />

design, Development and Therapy 2<br />

De forma a estudar e desenvolver<br />

um tratamento mais potente contra<br />

a artrite reumatoide, a utilização das<br />

células mesenquimais do cordão<br />

umbilical também tem surgido em<br />

combinação com outras terapias. Este<br />

ano, um outro ensaio clínico realizado<br />

com 63 doentes, demonstrou que a<br />

aplicação das células mesenquimais<br />

do cordão umbilical com interferão-γ<br />

aumenta significativamente a taxa de<br />

resposta em 93,3% (American College<br />

of Rheumatology 20 response rates)<br />

ao terceiro mês de acompanhamento.<br />

Ou seja, considerando a resposta à<br />

doença, a terapia combinada com<br />

as células mesenquimais do cordão<br />

umbilical leva a uma melhoria<br />

0116 NODEZ20 0117<br />

NODEZ20


ESTUDO<br />

PUB<br />

substancial dos doentes com artrite<br />

reumatoide quando comparada com<br />

uma terapia sem o uso das células<br />

mesenquimais. Assim, estes autores<br />

sugeriram esta terapia combinada<br />

como uma nova estratégia clínica para<br />

o tratamento da artrite reumatoide<br />

dado que se observou uma sinergia na<br />

eficácia do tratamento sem quaisquer<br />

efeitos colaterais durante um período<br />

observacional de 1 ano .<br />

Andreia Gomes, responsável<br />

pela Unidade de Investigação &<br />

Desenvolvimento da BebéVida,<br />

afirma “É necessário salientar que<br />

em todos estes estudos e os critérios<br />

de segurança destas infusões<br />

durante e após o tratamento foram<br />

continuamente avaliados, concluindo<br />

que esta terapêutica é segura e não é<br />

tóxica, uma vez que todos os sinais<br />

vitais e clinicamente relevantes se<br />

mantiveram estáveis”.<br />

“A eficácia de um tratamento é<br />

um fator determinante para a cura<br />

de certas doenças, como a artrite<br />

reumatoide, bem como o aumento<br />

da qualidade de vida dos doentes. No<br />

entanto, a avaliação da segurança da<br />

aplicação destas células é a principal<br />

prioridade”, reforça Andreia Gomes.<br />

PRATOS<br />

GEOTERMICOS<br />

U M A E X P E R I Ê N C I A Ú N I C A<br />

I N S P I R A D A N A N A T U R E Z A<br />

RESTAURANTE CALDEIRAS DA RIBEIRA GRANDE<br />

0118 NODEZ20 0119<br />

NODEZ20


ESTUDO<br />

Questões culturais e socioeconómicas impedem<br />

igualdade de género no acesso a cuidados e prevenção<br />

da deficiência visual e/ou cegueira evitável<br />

A prevalência de deficiência visual<br />

e cegueira é superior nas mulheres<br />

do que nos homens. Esta diferença<br />

acentua-se com a idade e na sua<br />

maioria não é devido a fatores<br />

intrínsecos das causas, mas sim a<br />

fatores culturais e socioeconómicos.<br />

Esta é uma das conclusões que se<br />

retira dos estudos recentemente<br />

publicados na The Lancet Global<br />

Health pelo grupo internacional<br />

de peritos sobre a perda de visão,<br />

Vision Loss Expert Group (VLEG)<br />

e do Instituto de Avaliação e<br />

Métricas em Saúde da Universidade<br />

de Washington, que conta com<br />

dois investigadores Optometristas<br />

portugueses, sobre o peso global das<br />

causas e prevalência da deficiência<br />

visual. Os estudos, Causes of<br />

blindness and vision impairment in<br />

2020 and trends over 30 years, and<br />

prevalence of avoidable blindness in<br />

relation to VISION 2020: the Right<br />

to Sight: an analysis for the Global<br />

Burden of Disease Study; e Trends in<br />

prevalence of blindness and distance<br />

and near vision impairment over<br />

30 years: an analysis for the Global<br />

Burden of Disease Study analisam<br />

com uma profundidade, dimensão e<br />

detalhe nunca antes atingido, o peso<br />

e relevância das diferentes causas<br />

de deficiência visual e cegueira no<br />

mundo, incluindo Portugal.<br />

As limitações no acesso a cuidados<br />

para a saúde da visão e as<br />

dificuldades económicas de acesso<br />

aos tratamentos, inclusive óculos e/<br />

ou lentes de contacto, representam<br />

um estrangulamento no orçamento<br />

individual e familiar no momento<br />

de decidir e procurar soluções<br />

para as dificuldades de visão. Por<br />

diferentes contextos culturais e<br />

socioeconómicos, é menos provável<br />

as meninas/mulheres verem a sua<br />

deficiência visual avaliada e tratada,<br />

resultando numa maior prevalência<br />

de deficiência visual e/ou cegueira<br />

evitável em todas as causas no<br />

sexo feminino, com exceção do<br />

glaucoma. Esta deficiência visual e/<br />

ou cegueira resulta na limitação de<br />

desenvolvimento de todo o potencial<br />

das meninas e na perda de autonomia<br />

e capacidade produtiva das mulheres,<br />

traduzindo-se em consequências<br />

fundamentais na sua independência e<br />

autonomia. Este desequilíbrio é ainda<br />

mais evidente com o aumento da<br />

idade.<br />

Vera Carneiro e Raúl Alberto de<br />

Sousa, Optometristas e Colaboradores<br />

do IHME/Global Burden Disease<br />

enfatizam a importância da boa visão<br />

na promoção da igualdade de género,<br />

no desenvolvimento individual e<br />

da sociedade. Assegurar boa visão<br />

é assegurar o acesso à igualdade de<br />

oportunidades.<br />

É esta uma das mais valias da<br />

implementação das recomendações<br />

da Organização Mundial de Saúde<br />

sobre a integração e planeamento da<br />

força de trabalho dos cuidados para<br />

a saúde da visão, desde os cuidados<br />

primários aos cuidados hospitalares e<br />

de reabilitação. Cerca de 5 milhões de<br />

portugueses sofrem de erro refrativo,<br />

a maior causa de deficiência visual<br />

evitável.<br />

As/os Optometristas são as/os<br />

especialistas com formação mais<br />

aprofundada e detalhada para<br />

diagnosticar e tratar o erro refrativo.<br />

Desempenham um papel fundamental<br />

na prestação de cuidados primários<br />

para a saúde da visão de acordo com<br />

as recomendações da Organização<br />

Mundial de Saúde, com as quais o<br />

Estado Português se comprometeu<br />

e ainda estão por implementar.<br />

Até lá, cada vez mais portuguesas<br />

e portugueses irão ver pior o seu<br />

presente e futuro.<br />

Os artigos completos podem ser<br />

consultados na Lancet Global Health<br />

(https://www.thelancet.com/journals/<br />

langlo/home).<br />

0120 NODEZ20 0121<br />

NODEZ20


CRÓNICA<br />

CRÓNICA<br />

Enfermeira Filipa<br />

Durante umas semanas vivi, pelo<br />

menos, duas experiências que não<br />

esquecerei. A primeira ser uma jovem<br />

infetada com COVID-19, experiência<br />

que, segundo os dados que são<br />

divulgados diariamente pela Direção<br />

Regional de Saúde (DRS), partilho<br />

com milhares de pessoas. A segunda o<br />

meu contato com o Serviço Regional<br />

de Saúde do lado de quem o utiliza.<br />

Tenho que ressalvar que esta foi,<br />

e ainda é, a minha experiência. E<br />

não querendo generalizar o que<br />

vivi, no fundo, tenho imaginado<br />

que se o fizesse, e aplicando toda a<br />

minha experiência a todas as pessoas<br />

infetadas na Região Autónoma dos<br />

COVID19<br />

#Ficaremcasa<br />

Açores, o caso não seria apenas<br />

alarmante mas gravíssimo. Bom, no<br />

mínimo, revestido de imprecisões e<br />

confusão.<br />

Sou enfermeira, tenho 35 anos. Sou<br />

continental mas resido na ilha de<br />

São Miguel há 15 anos. Não tenho<br />

antecedentes de saúde, não sou<br />

fumadora e, devido à minha atividade<br />

profissional, mantive e mantenho-me<br />

informada sobre as atualizações das<br />

informações relativas à pandemia.<br />

Escrevo este artigo como cidadã e não<br />

como enfermeira, embora as duas<br />

sejam absolutamente indissociáveis.<br />

Sem saber bem por onde começar,<br />

vou fazê-lo relembrando o dia D<br />

(do diagnóstico). Quando recebi o<br />

telefonema da Delegação de Saúde de<br />

Ponta Delgada, custou-me a acreditar<br />

nas palavras que estava a ouvir. Se eu<br />

não tinha sintomas, não sentia nada<br />

de diferente como poderia eu ter<br />

contraído o vírus SARS-CoV-2?<br />

Não esperem “pontadas” ao respirar<br />

ou, mesmo, falta de ar. Se estão em<br />

casa também não esperem ficar<br />

especialmente cansados. Na minha<br />

experiência tal não aconteceu. Não<br />

sei, até hoje, onde contraí o novo<br />

coronavírus. Provavelmente nunca<br />

irei saber.<br />

Bem, voltando ao dia D, foi neste<br />

dia que começou uma das maiores<br />

aventuras da minha vida, daquelas<br />

que deixam lições e marcas que são<br />

difíceis de apagar. Aqui começou o<br />

meu confronto com a realidade que<br />

nos falam nos órgãos de comunicação<br />

social.<br />

Diagnóstico estabelecido, era hora<br />

de me isolar no domicílio do meu<br />

namorado (com quem tinha estado<br />

sem restrições até aquela hora).<br />

Dúvidas eram muitas, incertezas<br />

cada vez mais e algum receio do que<br />

estaria para vir, devo confessar. Sem<br />

direito a grandes questões durante<br />

o telefonema, foi-me dito que a<br />

equipa da Delegação de Saúde de<br />

Ponta Delgada estaria ao meu dispor<br />

para tornar a experiência menos<br />

penosa. A informação era curta e<br />

clara: 14 dias isolamento, com direito<br />

a efetuar o primeiro “teste de cura”<br />

no final dos mesmos, sendo que só<br />

seria considerada recuperada com<br />

dois testes negativos com intervalo<br />

de 24 a 48 horas entre cada um. O<br />

meu coabitante, como sempre foi<br />

“amavelmente” tratado, ficaria em<br />

0122 NODEZ20 0123<br />

NODEZ20


CRÓNICA<br />

isolamento profilático durante o<br />

mesmo tempo e só seria “libertado”<br />

após os meus dois testes negativos.<br />

O que se seguiu foram dias de<br />

contatos diários pelos elementos da<br />

linha de vigilância ativa, exceto ao<br />

domingo porque o vírus também<br />

é filho de Deus. Fui contatada nos<br />

dias preconizados sem exceção.<br />

As vozes que me contatavam do<br />

outro lado eram sempre simpáticas<br />

e afáveis. Mas era só isso. Todas as<br />

dúvidas teriam de ser colocadas<br />

via e-mail. A equipa de médicos da<br />

Delegação de Saúde responderia<br />

quando tivesse disponibilidade.<br />

Portanto, a história de que estariam<br />

ao dispor para qualquer dúvida era<br />

daquelas bonitas de livro mas que na<br />

realidade não acontecem. Informações<br />

contraditórias dos diferentes<br />

elementos da equipa, contatos<br />

recorrentes para marcação de testes<br />

que já tinham sido efetuados e falhas<br />

na comunicação foram constantes.<br />

Como não tinha essa informação<br />

registada? Não há comunicação?<br />

Pedi a mim mesma muitas vezes que<br />

me acalmasse. A verdade é que não<br />

havia muito que pudesse fazer. A<br />

culpa também não seria da senhora<br />

do outro lado do telefone. Mas com<br />

certeza também não seria minha.<br />

Seria de quem?<br />

Eu aí percebi muitas coisas. A<br />

desorganização de um sistema que<br />

eu achava ser organizado e rigoroso.<br />

Percebi o caos do Serviço Regional<br />

de Saúde. Um caos diferente do da<br />

televisão.<br />

É grave a evidente falta de<br />

compromisso com o doente, que<br />

está em casa à espera das chamadas<br />

prometidas e do acompanhamento<br />

que merece. Eu tive muita sorte com<br />

os sintomas, mas e quem não teve?<br />

Então, porque me disseram que<br />

existia um sistema organizado? Não<br />

percebo e preocupo-me. Não me<br />

preocupo apenas com esta situação<br />

em concreto, preocupo-me com tudo<br />

o que eu vi falhar até aqui, e que<br />

acumulado é triste de se ver.<br />

Cada caso é um caso e o meu é<br />

diferente. Não tenho sintomas graves,<br />

nem legítimos. Será que faço parte<br />

daqueles números oficiais da DRS?<br />

Li religiosamente os comunicados<br />

emitidos diariamente pela entidade<br />

supra mencionada: em nenhum deles<br />

constavam dados que coincidissem<br />

com o meu caso. De certeza que sim,<br />

eles é que estão na linha da frente,<br />

tal como eu estou, desta pandemia,<br />

só temos que confiar... Senão íamos<br />

confiar em quem?<br />

Os dias passaram. A rotina é óbvia.<br />

O tempo sobra. Organizei os quartos,<br />

a casa e as ideias. Apanhei sol, fiz<br />

exercício físico, reforcei o sistema<br />

imunitário. A uma certa altura do<br />

meu isolamento acho que venderia a<br />

alma ao diabo por um teste negativo<br />

se isso fosse garantia de liberdade.<br />

Teria eu cometido um crime ao<br />

contrair SARS-CoV-2? Mentalmente<br />

ouvi muitas vezes a frase dos filmes:<br />

“Tem o direito de permanecer<br />

calada e tudo o que disser pode ser<br />

usado contra si.” Estava em prisão<br />

domiciliária, com direito a receber<br />

um telefonema por dia. Senti uma<br />

sensação de total abandono pela<br />

DRS. E eu que estou ao serviço do<br />

Serviço Regional de Saúde, sem nunca<br />

lhe falhar, há onze anos. A palavra<br />

ingratidão inundou-me o pensamento<br />

muitas vezes.<br />

Enquanto isso, a ciência, o mundo e a<br />

vida, aconteciam fora daquelas quatro<br />

0124 NODEZ20 0125<br />

NODEZ20


CRÓNICA<br />

PUB<br />

paredes.<br />

Vi, já em casa, os critérios de cura<br />

serem alterados em todo o mundo,<br />

em Portugal Continental e na Região<br />

Autónoma da Madeira… Exceto<br />

nos Açores. Seria o clima da nossa<br />

Região Autónoma tão diferente que<br />

o vírus se comportaria de forma<br />

diferente também? Ironia à parte,<br />

estávamos atrasados e desatualizados<br />

sobre os avanços da ciência mundial.<br />

Consultei, porque tempo não me<br />

faltou, toda a literatura atualizada<br />

sobre a pandemia. As regras foram<br />

atualizadas pela DGS dia 14 de<br />

Outubro, na nossa Região foi<br />

atualizada dia 12 de Novembro. Um<br />

mês depois. Sem justificação. Tudo<br />

isto foi, no mínimo e sem querer ferir<br />

suscetibilidades, despropositado e<br />

revestido de incompetência.<br />

Se existe rigor para encerrar<br />

estabelecimentos, Escolas e para<br />

impor cercas a concelhos, também<br />

nós devemos exigir rigor nos<br />

processos e planos de combate ao<br />

vírus, bem como no empenho e<br />

organização de toda a comunidade<br />

médica. Aproveitando a deixa, o<br />

aconselhamento e atendimento<br />

médico deixou muito a desejar.<br />

A tão apregoada empatia, o tão<br />

exaltado rigor científicos nunca<br />

existiram por parte do médico que<br />

me contatou duas vezes. Atrevo-me<br />

a dizer, correndo os devidos riscos,<br />

que foi frio, incompreensivo e com<br />

desconhecimento de todos os avanços<br />

e atualizações relativas a pandemia.<br />

Acima de qualquer decisão, sempre<br />

deve haver o entendimento de que o<br />

tempo de cada um é diferente. Com a<br />

saúde não se brinca.<br />

0126 NODEZ20 0127<br />

NODEZ20


CRÓNICA<br />

CRÓNICA<br />

Por Ricardo Silva<br />

Benjamin Ferencz, Palavras que Tocam a Alma,<br />

As extraordinárias lições de vida do último<br />

procurador dos Julgamentos de Nuremberga,<br />

Lua de Papel, 2020.<br />

Terá sido, sem dúvida, uma entrevista publicada<br />

na revista Visão, já neste Outono findo, que<br />

me chamou a atenção para este homem e o seu<br />

pensamento. Portador de uma história de vida<br />

notável pela sua mensagem que sempre quis<br />

transmitir ao mundo, Benjamin Ferencz não é,<br />

contudo, um homem qualquer nem vulgar. Tem<br />

uma marca profunda no Direito Internacional<br />

e na Cultura da Lei Internacional como<br />

imperativo da resolução das dissensões entre os<br />

homens. Rejeitou sempre a pulsão da guerra, o<br />

rufar dos tambores, as marchas pela glória sobre<br />

o outro e o erguer de bandeiras sobre as cinzas,<br />

invocando a regra, o acordo e o tratado como<br />

primado da legalidade e de uma construção<br />

societária diferente. É um exemplo neste<br />

caminho que trilhou a partir da sua história<br />

pessoal e da II Guerra Mundial onde teve um<br />

papel de relevo, contra todas as previsões. O<br />

caminho que trilhou, cheio de dificuldades,<br />

adversidades de diversa ordem, mas onde como<br />

ele diz os “milagres” foram acontecendo em<br />

nome da Humanidade.<br />

Em inglês “Parting Words”, foi publicado em<br />

Portugal, em setembro de 2020, num<br />

título comercial, quase evangélico,<br />

dando a ideia que estamos perante um<br />

livro de autoajuda de cariz espiritual.<br />

Sendo um resumo de uma série de<br />

conversas entre este e a jornalista<br />

Nadia Khomami, do The Guardian,<br />

é convertido em nove lições de vida<br />

de quem tem autoridade para o fazer.<br />

Depois de um artigo bem sucedido<br />

no seu jornal, conseguiu converter<br />

em livro as longas conversas com a<br />

personalidade fascinante de Ferencz,<br />

um seu novo amigo, depois de ter<br />

levado algum tempo para o convencer<br />

neste sentido.<br />

Numa escrita muito acessível,<br />

dialogante, de citação constante na<br />

voz passiva e de quando em vez na<br />

ativa, somos levados à experiência<br />

centenária deste advogado ao serviço<br />

de causas humanitárias. Fala-se<br />

da importância do sonho na vida<br />

de cada um e de sabermos ir atrás<br />

dos nossos, sem querermos imitar<br />

ninguém; não são precisos grandes<br />

sonhos, megalómanos ou absurdos<br />

até, mas mesmo aqueles simples e<br />

ao nosso alcance terão de ter sempre<br />

a dedicação e a crença no objetivo<br />

que prosseguimos. Num segundo<br />

momento aborda a importância<br />

da educação como oportunidade<br />

transformadora da vida. Aproveitar<br />

constantemente os momentos onde<br />

a aprendizagem se pode cultivar<br />

seja pela leitura, filmes, passeios,<br />

viagens ou pela música, todas estas<br />

são atividades que se justapõem<br />

à parte mais académica e formal,<br />

indispensável ao crescimento de cada<br />

um. Ter o sentido da descoberta,<br />

mas também desprovermo-nos da<br />

comparação imobilizadora com os<br />

outros na medida que os seus sucessos<br />

não nos podem retirar o prazer dos<br />

nossos. A boa educação conduz-nos à<br />

sensibilidade de encontrar alegria em<br />

cada dia nas variantes mais simples,<br />

porque sendo ela uma emoção temos<br />

de a procurar para poder sentila.<br />

O livro prossegue com o relato<br />

interessante de várias experiências da<br />

vida de tão eminente narrador, onde<br />

se encontra inspiração e aprendizagem<br />

em cada uma. O<br />

0128 NODEZ20 0129<br />

NODEZ20


ter iniciativa própria e encontrar no<br />

medo um meio de ponderação não é<br />

negativo, mas não pode ser inibidor<br />

do que se pretende fazer ou atingir;<br />

entender que na vida o caminho não é<br />

uma reta e que tem as suas – por vezes<br />

grandes – adversidades, procurando<br />

na persistência e na luta a força para<br />

a superação dos obstáculos; a opção<br />

clara por fazer o Bem, como valor<br />

supremo da Humanidade, encontrou<br />

nele, como judeu, uma força para<br />

combater o sentimento de vingança<br />

nos julgamentos de Nuremberga,<br />

onde foi, aos 27 anos, procurador<br />

público como defensor dos Direitos<br />

Humanos altamente atingidos pelo<br />

regime nazi. Na declaração de abertura<br />

do julgamento disse isso mesmo. “A<br />

vingança não é o nosso objetivo”,<br />

consciente que não queria transformarse<br />

naquilo que combatia e odiava, e que<br />

o nazismo levou a situações extremas<br />

de paranoia em termos daquilo que<br />

conhecemos do Holocausto.<br />

Este pequeno, mas grande homem<br />

viria a ser um dos grandes fundadores<br />

do Tribunal Internacional de Haia<br />

contra os crimes da humanidade,<br />

infelizmente ainda não reconhecido<br />

por muitos países; liderou esforços<br />

para indemnizações justas da<br />

Alemanha Ocidental a Israel; recebeu<br />

inúmeros prémios e condecorações,<br />

entre eles a Medalha da Liberdade<br />

(em 2014), tendo-a recebido no ano<br />

anterior Nelson Mandela, para se ter a<br />

dimensão da distinção. Recebeu cinco<br />

condecorações de guerra do Pentágono<br />

devido ao seu desempenho e empenho,<br />

sobretudo, pela responsabilidade<br />

histórica, de formular uma acusação<br />

consistente contra os horrores do<br />

nazismo em Nuremberga.<br />

Fazer isto quando se é jovem só pode<br />

abrir um prenúncio positivo sobre<br />

a dimensão humana de alguém que<br />

foi aprofundando o pensamento em<br />

volta da Justiça como valor da criação<br />

humana e como meio de regulação do<br />

bom convívio entre os homens.<br />

De fácil leitura, o livro é a tradução<br />

sintética de uma vida, já centenária,<br />

que arranjou sempre em torno de si as<br />

forças de superação das dificuldades.<br />

Aconselho a leitura àqueles que gostam<br />

de recolher experiências fundadas<br />

na vida dos seus semelhantes, para<br />

poderem aprofundar o sentido da Alma<br />

humana. Verão que sentirão o toque<br />

das suas palavras.<br />

Pode ser o primeiro desafio de <strong>2021</strong>,<br />

acreditando na vinda de um tempo<br />

diferente e melhor para todos nós!<br />

A leitura vale a pena!<br />

JOÃO F. CASTRO<br />

PROFESSOR MESTRADO EM GESTÃO PORTUÁRIA<br />

joaocastro@sapo.pt<br />

Passaram 5 anos desde que, em 2015,<br />

a Organização das Nações Unidas<br />

(ONU), na cimeira de Paris, definiu<br />

a agenda 2030, com 17 Objetivos<br />

de Desenvolvimento Sustentável,<br />

enquanto visão comum para a<br />

Humanidade na gestão do planeta.<br />

Um esforço coletivo, de 195 países,<br />

para conter a subida da temperatura<br />

da Terra em 1,5ºC. Quando falamos<br />

de Oceanos, destaca-se a inclusão<br />

do ODS nº 14: proteger a vida<br />

marinha, que propõe uma utilização<br />

sustentável dos mares e recursos<br />

marinhos, nomeadamente: proteger<br />

10% das águas marinhas através de<br />

áreas protegidas ou outras medidas<br />

de conservação eficazes; acabar com<br />

a sobrepesca e a pesca ilegal, não<br />

reportada e não regulamentada e as<br />

práticas de pesca destrutivas; proibir<br />

certas formas de subsídios à pesca;<br />

Política Comum de<br />

Pescas - um desafio!<br />

proporcionar o acesso dos pescadores<br />

artesanais de pequena escala aos<br />

recursos marinhos e aos mercados.<br />

A União Europeia (UE) tem<br />

manifestado intenção de promover<br />

uma utilização sustentável dos<br />

oceanos e proteger os ecossistemas<br />

marinhos, num reconhecimento<br />

da sua importância económica<br />

(representando cerca de 500 milhões<br />

de euros de VAB e 6,1 milhões de<br />

empregos), social (visto que 22 EM<br />

têm faixa costeira e grande parte<br />

da população beneficia de serviços<br />

marítimos e de lazer) e ambiental<br />

(enquanto sistema de controlo do<br />

clima e regulador das concentrações<br />

de CO2, à escala global). Os<br />

diferentes Estados-Membros<br />

(EM) têm subscrito vários acordos<br />

internacionais para a proteção de<br />

espécies e habitats<br />

0130 NODEZ20 0131<br />

NODEZ20


CRÓNICA<br />

CRÓNICA<br />

marinhos onde se incluem as<br />

convenções: sobre o Direito do Mar;<br />

a Diversidade Biológica; as Espécies<br />

Migradoras pertencentes à Fauna<br />

Selvagem (Convenção de Bona); e<br />

a Conservação da Vida Selvagem<br />

e dos Habitats Naturais da Europa<br />

(Convenção de Berna).<br />

O Tratado sobre o Funcionamento<br />

da União Europeia (TFUE)<br />

considera que a UE integra nas suas<br />

políticas a proteção do ambiente<br />

e o desenvolvimento sustentável<br />

(TFUE, artigos 7º e 11º), exercendo<br />

competência exclusiva em matéria de<br />

conservação dos recursos biológicos<br />

do mar (TFUE, artigo 3º), no âmbito<br />

da Política Comum das Pescas<br />

(PCP), bem como de partilha de<br />

competências e responsabilidade pelas<br />

políticas ambientais, em diretivas<br />

como: a Diretiva-Quadro Estratégia<br />

Marinha (DQEM - 2008/56/CE - JO<br />

L 164 de 25.6.2008); e as Diretivas<br />

Aves (Diretiva 2009/147/CE - JO L<br />

20 de 26.1.2010) e Habitats (Diretiva<br />

92/43/CEE).<br />

marinhos.<br />

As pescas da UE são reguladas pela<br />

Política Comum das Pescas (PCP -<br />

Regulamento (UE) nº 1380/2013 - JO<br />

L 354 de 28.12.2013) com o objetivo<br />

da sustentabilidade ambiental,<br />

reduzindo os impactos negativos no<br />

ecossistema marinho (PCP, artigo<br />

2º). Tinha como objetivo assegurar<br />

que, até 2020, a taxa de pesca não<br />

excederia o "rendimento máximo<br />

sustentável" (PCP, artigo 2º, nº 1 e 2),<br />

garantindo a existência de unidades<br />

populacionais de peixes produtivos<br />

nos ecossistemas marinhos.<br />

Os relatórios apontam para uma<br />

degradação geral do ambiente<br />

marinho, contudo, os mares da<br />

macaronésia parecem apresentar<br />

um estado favorável, relativamente<br />

à sua biodiversidade, sobretudo em<br />

comparação com a situação do mar<br />

Mediterrâneo, mar Céltico ou mar<br />

do Norte. Para as pescas dos Açores<br />

este pode ser um contexto favorável,<br />

sobretudo quando consideramos a<br />

sua seletividade, sem a utilização de<br />

arrastões (proibidos nos Açores), que<br />

provocam danos físicos no fundo<br />

marinho, sobrepesca nos recursos<br />

demersais e elevado volume de<br />

capturas acessórias.<br />

Este é um contexto que poderá<br />

merecer afinamento na abordagem da<br />

próxima Política Comum de Pescas,<br />

quando Portugal prepara, a partir<br />

de 1 janeiro de <strong>2021</strong>, o exercício da<br />

presidência do conselho da União<br />

Europeia.<br />

Bom Ano <strong>2021</strong><br />

Fonte: TCE, com base no documento técnico Delineation of the MSFD Article 4 marine regions and subregions<br />

Em 2020, a Agência Europeia do<br />

Ambiente (AEA - Relatório nº<br />

17/2019) comunicou que a perda de<br />

biodiversidade marinha nos mares<br />

da Europa não tinha sido travada,<br />

existindo uma elevada proporção de<br />

avaliações das espécies e dos habitats<br />

marinhos que revelavam um estado<br />

de conservação desfavorável ou<br />

desconhecido. Indica a pesca como<br />

uma das principais pressões sobre<br />

o ambiente marinho, nos mares da<br />

Europa, face à extração de recursos<br />

e aos danos que provoca nos fundos<br />

0132 NODEZ20 0133<br />

NODEZ20


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Paulo Filipe Silva Borges<br />

Licenciado em Geologia<br />

Mestre em Geociências,<br />

ramo do Ambiente e<br />

Ordenamento<br />

A importância dos poços<br />

no abastecimento de<br />

água às populações<br />

na Graciosa<br />

De meados até finais do século XIX, assistiu-se nas ilhas<br />

do arquipélago dos Açores a um forte investimento<br />

público em infraestruturas. Deste investimento são<br />

exemplos a construção de pontes, infraestruturas<br />

portuárias, repavimento de estradas e criação de<br />

espaços de lazer comunitários, os então chamados<br />

Passeios Públicos. Mas, provavelmente os vestígios mais<br />

notórios atualmente desse investimento público serão os<br />

chafarizes, fontanários públicos e arquinhas, construídos<br />

ou renovados a partir da década de 50 do século XX.<br />

Procurando a Administração Pública da época dar<br />

resposta à necessidade de fornecer água em proximidade<br />

das populações, que anteriormente teriam de se deslocar<br />

a grandes distâncias para obter água, e em conjugação<br />

com as cisternas e poços privados assegurou, à época,<br />

uma melhora qualitativa das condições de vida das<br />

populações. Estes chafarizes, tal como algumas outras<br />

infraestruturas da época, são muitas vezes identificáveis<br />

pela cartela em pedra com a inscrição em relevo “O.P.”,<br />

Obras Públicas, seguida da data de construção.<br />

A utilização destes equipamentos de fornecimento de<br />

água verificou-se até meados do século XX, nos centros<br />

urbanos Açoreanos, quando se criou a rede de água<br />

canalizada doméstica. Nos povoados rurais, a utilização<br />

de chafarizes e cisternas continuou até, pelo menos,<br />

à década de 90 do século XX, e, nos povoados mais<br />

remotos até ao século XXI. Atualmente, a maioria dos<br />

chafarizes das Obras Públicas do século XIX encontramse<br />

desativados, estando os poucos que ainda têm água<br />

como elemento decorativo das<br />

povoações ou servindo de bebedouro<br />

para os gados (Borges, 2020)<br />

Os poços são construções tubulares<br />

verticais de pouca profundidade e<br />

de grande diâmetro. Estas estruturas<br />

perfuram o nível não saturado de<br />

água, atingindo o nível freático,<br />

possibilitando a captação de água<br />

subterrânea.<br />

Foram identificados 17 Furos,<br />

23 nascentes e seis poços na ilha<br />

Graciosa, sendo cinco destes poços<br />

localizados na Plataforma NW, e<br />

um poço de maré junto à costa E da<br />

No Arquipélago dos Açores existem<br />

dois tipos de poços, os poços<br />

que captam águas de aquíferos<br />

suspensos e os que captam águas de<br />

aquíferos basais, sendo estes últimos<br />

denominados de “poços de maré”.<br />

Estes poços, do tipo de “poço de<br />

maré”, têm oscilações do nível freático<br />

por influências da ação das marés.<br />

ilha. Dos cinco poços inventariados<br />

na Plataforma NW, dois foram<br />

soterrados, restando poucos vestígios<br />

locais (Borges, 2019).<br />

0134 NODEZ20 0135<br />

NODEZ20


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no | www.norevista.pt<br />

Os poços localizados na Plataforma<br />

NW apresentam características muito<br />

semelhantes, sendo construídos<br />

com materiais da mesma tipologia<br />

(rochas basálticas), mas com graus<br />

de conservação diferentes. Não há<br />

afloramentos que possibilitem a<br />

caracterização geológica no local,<br />

sendo identificadas apenas as rochas<br />

basálticas (s.l.) com elevada alteração<br />

superficial, no entanto, destaca-se a<br />

caracterização dos solos da plataforma<br />

com uma qualidade excecional.<br />

Em profundidade existe grande<br />

complexidade estratigráfica dos<br />

materiais entre basaltos e piroclastos.<br />

paleossolo que, dada a sua extensão<br />

e baixa permeabilidade, constitui um<br />

importante elemento na hidrogeologia<br />

da ilha. Este paleossolo possivelmente<br />

é o elemento crucial para a existência<br />

destes poços e da água que nele<br />

aparece. Esta estrutura hidrogeológica<br />

surge, portanto, no subdomínio I-2<br />

inclui o Unidade de Vitória do CV de<br />

Vitória-Vulcão Central nos grupos de<br />

litologias piroclásticas ou basálticas,<br />

formando aquíferos não confinadas<br />

ou livres, devido à sua alta porosidade<br />

e permeabilidade e ao grau de<br />

fracturação e vesiculação das escoadas<br />

basálticas.<br />

Num dos poços é possível identificar<br />

uma tubagem no seu interior que<br />

atinge a superfície associada ao<br />

instrumento. Este instrumento é uma<br />

bomba manual de água da empresa<br />

Oliva, utilizada antigamente para<br />

bombear a água do poço de forma<br />

mais prática do que o balde e corda.<br />

Assim, com este elemento mostra-se<br />

a importância que este poço teria na<br />

satisfação das necessidades de água,<br />

por ser o único equipado com bomba,<br />

revelando também que o facto dos<br />

antigos o terem escolhido para colocar<br />

este equipamento, pela importância<br />

que teria para o abastecimento de<br />

água, mesmo que esteja indicado que<br />

as águas estariam “quinadas”.<br />

Em termos hidrogeológicos, estes<br />

poços localizam-se no domínio I,<br />

que se divide nos subdomínios I-1 e<br />

I-2, separados parcialmente por um<br />

0136 NODEZ20 0137<br />

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“Governaremos com o dinheiro que<br />

tivermos. Não vamos é fingir que temos o<br />

dinheiro que não temos”<br />

José Manuel Bolieiro, Presidente do Governo Regional<br />

“RABO DE PEIXE É UM EXEMPLO DE<br />

CIVISMO E CIDADANIA PARA O PAÍS”<br />

Artur Lima, Vice-Presidente do Governo Regional dos Açores<br />

“É necessário enfrentar os problemas<br />

financeiros da SATA e é imperativo a<br />

sua profunda reestruturação”,<br />

JOAQUIM BASTOS E SILVA, SECRETÁRIO REGIONAL DAS FINANÇAS, PLANEAMENTO E ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA<br />

“Não é ajustado apresentar um novo Programa<br />

de Governo, construído e baseado em velhas<br />

soluções para as crises económicas”<br />

FRANCISCO CÉSAR, DEPUTADO DO PS/AÇORES<br />

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