Gestão Hospitalar N.º 23 2020
Editorial #Os dias que correm Opinião Doenças societais associadas ao Covid-19 Pandemia na Madeira A resposta da RAM à pandemia de Covid-19 Voz do Cidadão Doente oncológico e Covid-19 Opinião A ética em tempo de pandemia Estudo APAH Aprender com a Covid-19: A visão dos gestores de saúde em Portugal Estudo APAH O impacto da Covid-19 na atividade hospitalar do SNS Estudo APAH Acesso a cuidados de saúde em tempos de pandemia Estudo APAH A participação pública nos hospitais do SNS Saúde Militar Covid-19: as lições que só recordaremos na próxima pandemia Opinião A pandemia antecipou a mudança tecnológica em décadas Espaço ENSP “Barómetro Covid-19 - Opinião social”: o que pensam os portugueses em tempo de Covid-19? Saúde Pública Comunicação em saúde em tempos de pandemia Desenhos Diário de uma pandemia Direito Biomédico Discussão jurídica em torno da utilização de nanotecnologia(s) no combate à Covid-19 Iniciativa APAH I Prémio Healthcare Excellence Prémio Healthcare Excellence: edição Covid-19 Iniciativa APAH I Prémio Healthcare Excellence Atuação preventiva em ERPI Gestão Prescrição: mais valor em saúde em Portugal Investigação O impacto da transformação digital e a liderança no futuro da saúde Publicação APAH Apresentação do livro “Um olhar sobre a evolução da gestão hospitalar em Portugalˮ de José Nogueira da Rocha Publicação APAH Value Based Health Care em Portugal Estudo APAH Acessibilidade ao medicamento hospitalar Iniciativa APAH | Prémio Coriolano Ferreira 2020 Desafios e contributos da especialização em administração hospitalar na esfera da pandemia Iniciativa APAH | Fórum do Medicamento Reflexão sobre o modelo de acesso ao medicamento hospitalar Iniciativa APAH | Bolsa Capital Humano A urgência mais urgente dos cuidados de saúde Academia Digital APAH Todos juntos, na construção de uma saúde de excelência!
Editorial #Os dias que correm
Opinião Doenças societais associadas ao Covid-19
Pandemia na Madeira A resposta da RAM à pandemia de Covid-19
Voz do Cidadão Doente oncológico e Covid-19
Opinião A ética em tempo de pandemia
Estudo APAH Aprender com a Covid-19: A visão dos gestores de saúde em Portugal
Estudo APAH O impacto da Covid-19 na atividade hospitalar do SNS
Estudo APAH Acesso a cuidados de saúde em tempos de pandemia
Estudo APAH A participação pública nos hospitais do SNS
Saúde Militar Covid-19: as lições que só recordaremos na próxima pandemia
Opinião A pandemia antecipou a mudança tecnológica em décadas
Espaço ENSP “Barómetro Covid-19 - Opinião social”: o que pensam os portugueses em tempo de Covid-19?
Saúde Pública Comunicação em saúde em tempos de pandemia
Desenhos Diário de uma pandemia
Direito Biomédico Discussão jurídica em torno da utilização de nanotecnologia(s) no combate à Covid-19
Iniciativa APAH I Prémio Healthcare Excellence Prémio Healthcare Excellence: edição Covid-19
Iniciativa APAH I Prémio Healthcare Excellence Atuação preventiva em ERPI
Gestão Prescrição: mais valor em saúde em Portugal
Investigação O impacto da transformação digital e a liderança no futuro da saúde
Publicação APAH Apresentação do livro “Um olhar sobre a evolução da gestão hospitalar em Portugalˮ de José Nogueira da Rocha
Publicação APAH Value Based Health Care em Portugal
Estudo APAH Acessibilidade ao medicamento hospitalar
Iniciativa APAH | Prémio Coriolano Ferreira 2020 Desafios e contributos da especialização em administração hospitalar na esfera da pandemia
Iniciativa APAH | Fórum do Medicamento Reflexão sobre o modelo de acesso ao medicamento hospitalar
Iniciativa APAH | Bolsa Capital Humano A urgência mais urgente dos cuidados de saúde
Academia Digital APAH Todos juntos, na construção de uma saúde de excelência!
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GH SAÚDE MILITAR<br />
aos primeiros sinais de uma potencial ameaça pandémica,<br />
falharam a janela de oportunidade para protelar a<br />
introdução e disseminação da doença e, muito rapidamente<br />
evoluímos (pelo menos na Europa e nas Américas)<br />
para as fases de contenção da transmissão e de<br />
mitigação dos seus efeitos. Existem nesta circunstância<br />
muitas atenuantes, pois é certo que se tratava de uma<br />
doença desconhecida e de um agente viral novo com<br />
transmissibilidade inusitadamente elevada. Mas, quando<br />
era já evidente a ameaça pandémica, houve claramente<br />
condicionalismos e critérios extra-sanitários que retardaram<br />
o acionamento dos sistemas de detecção e<br />
vigilância e a implementação de contra-medidas. Esses<br />
condicionalismos vão provavelmente manter-se e fazem<br />
antever que na próxima pandemia esta lição aprendida<br />
sobre o acionamento dos alertas e a precocidade da ativação<br />
da resposta poderá ser amargamente esquecida.<br />
Colaboração multissectorial<br />
Muitos se perguntam porque é que na fase de mitigação,<br />
a dinâmica da pandemia ultrapassou tão rapidamente a<br />
capacidade de resposta dos sistemas de saúde mais robustos<br />
do mundo. Terá havido nalguns países decisões e<br />
posicionamentos menos acertados que em parte serão<br />
compreensíveis à luz da incerteza da situação e da sua<br />
enorme escala. Todavia o conhecimento acumulado na<br />
esfera da biosegurança e da biodefesa preconizava que o<br />
desenvolvimento de sistemas de detecção precoce (early<br />
detection), o treino de equipas de campo para investigação<br />
epidemiológica e as reservas de material e equipamento<br />
eram factores-chave para a eficácia dos planos de<br />
contingência e contenção. Estava também bem definido<br />
que a eficiência dos sistemas de repostas deveriam estar<br />
baseados na articulação de diversos departamentos da<br />
Administração do Estado e no emprego coordenado da<br />
grande diversidade de competências técnicas e de meios<br />
materiais. Sabia-se que eram requeridos mecanismos de<br />
coordenação e cooperação multissectorial para potenciação<br />
de meios já existentes de modo a coaptá-los às<br />
necessidades levantadas pela pandemia.<br />
Surpreendentemente, a grande maioria dos países apenas<br />
procurou gerir a sua resposta tendo como instrumento<br />
quase único os seus sistemas de saúde. Outros<br />
sectores da sociedade foram chamados em fases mais<br />
adiantadas do processo mas, em grande parte do mundo<br />
ocidental a implementação das decisões epidemiológicas<br />
ficou sobretudo a cargo de uma saúde pública<br />
que já estava muito sobrecarregada. Por exemplo, os<br />
sectores académicos, da defesa e da proteção social<br />
foram apenas envolvidos pontualmente, muitas vezes<br />
recorrendo a solicitações inusitadas. Vários sectores<br />
da sociedade incluindo atores locais intervieram muita<br />
vezes por modus próprio revelando a pouca eficiência<br />
dos mecanismos disponíveis de coordenação intersectorial.<br />
A Covid-19 deixou claro que a cooperação intersectorial<br />
entre departamentos do estado e com atores<br />
locais e não estatais deve ser planeada e treinada.<br />
Mas devemo-nos perguntar se na próxima pandemia a<br />
transversalidade entre sectores vai funcionar. Teremos<br />
agora algum tempo para estabelecer um modus operandi<br />
na gestão das respostas de emergência e definir<br />
mecanismos para ultrapassar a cultura de isolacionismo<br />
dos departamentos do Estado. Se o planeamento desta<br />
cooperação não for estimulada, então seguramente esqueceremos<br />
a lição de que a organização do emprego<br />
das competências e dos meios disponíveis é o modo<br />
mais eficaz de enfrentar uma emergência.<br />
Emprego dos sistemas de saúde<br />
Foram muito poucos os que fizeram notar que o emprego<br />
dos sistemas de saúde teve racionalidade pouco<br />
clara. Há quem se interrogue porque é que a rede de<br />
cuidados primários não foi envolvida na resposta à pandemia<br />
e pelo contrário foi reduzida a sua atividade. É<br />
contra-intuitivo usar na primeira linha os hospitais mais<br />
diferenciados e os meios mais sofisticados sem o apoio<br />
de uma cadeia de triagem que despistasse os assintomáticos<br />
e retivesse os casos ligeiros. A pressão sobre a<br />
primeira linha, que afinal era a última linha, prolongou-se<br />
degradando a resiliência hospitalar de tal modo que o<br />
combate à pandemia se centra agora em impor medidas<br />
restritivas de circulação, mobilidade e convívio social<br />
tendo como referência as estimativas de capacidade disponível<br />
em cuidados intensivos. Ou seja, esta estratégia<br />
hipotecou nas primeiras fases os recursos humanos e<br />
materiais mais preciosos dos sistemas de saúde deixando-os<br />
sem munições para um combate que ainda não<br />
sabemos quanto tempo vai durar. A justificação por esta<br />
opção poderá ser simples: a rede de cuidados saúde primários<br />
não estava treinada, não estava equipada e não<br />
foi preparada para poder prestar um apoio eficaz na<br />
referenciação e acompanhamento dos casos. Será que<br />
na próxima pandemia os profissionais e as estruturas da<br />
saúde comunitária estarão devidamente apetrechadas<br />
para intervirem desde o primeiro momento?<br />
A reduzida capacidade de diagnóstico laboratorial molecular<br />
foi uma limitação importante na implementação de<br />
medidas de contenção da pandemia. Em muitos países<br />
houve dificuldades no acesso a reagentes. Mas noutros,<br />
incluindo Portugal, a impreparação do sistema de saúde<br />
para realizar testes moleculares foi evidente. A rede<br />
dos sistemas de saúde e em particular os serviços de<br />
Patologia Clínica dos hospitais demonstraram reduzida<br />
competência no diagnóstico molecular e na operação<br />
em condições de bio-segurança exigidas durante esta<br />
pandemia. Esta situação é tanto mais intrigante quanto,<br />
pelos menos em Portugal, existe um grande número de<br />
biólogos moleculares que estão sub-aproveitados e facilmente<br />
poderiam ser recrutados para os serviços hospitalares<br />
proporcionando competências e qualidade no<br />
diagnóstico molecular em toda a rede hospitalar. Esperemos<br />
pois, que antes da próxima pandemia a orgânica<br />
interna dos serviços de patologia clínica se empenhem<br />
“<br />
A PANDEMIA QUE VIVEMOS<br />
TEM DIMENSÃO HISTÓRICA<br />
E FICARÁ REGISTADA COMO<br />
UMA DAS GRANDES PANDEMIAS<br />
QUE AFECTARAM A HUMANIDADE,<br />
DEIXANDO-NOS MUITAS LIÇÕES.<br />
SERÁ QUE SERÃO APRENDIDAS?<br />
SERIA BOM QUE NÃO<br />
AS ESQUECÊSSEMOS.<br />
”<br />
em incorporar as competências da biologia molecular<br />
capacitando os hospitais para executar de modo autónomo<br />
diagnósticos moleculares que serão cada vez mais<br />
a marca de qualidade da patologia clínica e de anatomia<br />
patológica do século XXI.<br />
Um último aspecto da atuação da saúde refere-se às metodologias<br />
de controlo epidemiológico que são o principal<br />
instrumento da saúde pública. Em 1926, Francisco<br />
Castro Bicho afirma na sua tese de doutoramento da<br />
Faculdade de Medicina da Universidade do Porto que<br />
"A luta contra as doenças infecciosas resume-se na participação<br />
dos casos, no isolamento dos doentes, na vigilância<br />
dos contactos e na desinfecção, além de algumas<br />
outras medidas gerais de profilaxia".<br />
Quase cem anos depois a abordagem é muito similar,<br />
nomeadamente no que se refere às atividades de contact-tracing<br />
e vigilância de isolamentos e quarentenas. É<br />
no mínimo decepcionante que já dentro da terceira década<br />
do século da informação, pudéssemos contar tão<br />
pouco com as mais modernas tecnologias de informação<br />
para combater uma doença que ameaça a saúde da<br />
humanidade, a economia global e a estabilidade social à<br />
escala planetária.<br />
A pandemia que vivemos tem dimensão histórica e ficará<br />
registada como uma das grandes pandemias que afectaram<br />
a humanidade, deixando-nos muitas lições. Será que<br />
serão aprendidas? Seria bom que não as esquecêssemos,<br />
porque como disse George Santayana "os que esquecem<br />
o passado estão condenados a repeti-lo". Ã<br />
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