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BARRETOS EM 3ª PESSOA

Essa é uma obra sobre a cidade. Sobre o seu passado. Aqui, a cidade, Barretos, substantivo próprio, ganha novas roupagens, inclusive na gramática. Ela passa a ser o assunto em comum e a referência em quem todos os autores se debruçam; a 3ª pessoa – “ela”. Independente da natureza dos textos e da origem dos autores, a ideia é que os leitores, especialmente os barretenses, tenham a chance de visualizar a paisagem da cidade nos tempos idos, em diferentes décadas.

Essa é uma obra sobre a cidade. Sobre o seu passado. Aqui, a cidade, Barretos, substantivo próprio, ganha novas roupagens, inclusive na gramática. Ela passa a ser o assunto em comum e a referência em quem todos os autores se debruçam; a 3ª pessoa – “ela”.

Independente da natureza dos textos e da origem dos autores, a ideia é que os leitores, especialmente os barretenses, tenham a chance de visualizar a paisagem da cidade nos tempos idos, em diferentes décadas.

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Minha Barretos:

O ser-tão profundo

N

Adonias Garcia

ão, não é uma definição pejorativa no mundo moderno em que ser

bacana é ser da urbis, chamar uma cidade de sertão pode parecer um insulto,

mas o lugar onde nasci era sertão: a metáfora do profundo, E, se não era

para os outros, era, ao menos, para mim.

Eu nasci numa Barretos que não existe mais — era um lugar mágico

para meu olhar de criança: a rua da minha casa não era asfaltada, não havia

luz elétrica nem água encanada; era tudo tão difícil para os adultos, mas

para as crianças, que levantavam de manhã e brincavam o dia todo em meio

a árvores, plantas e na terra, era um tempo mágico, um espaço do encantamento.

Ainda hoje, 50 anos depois, as imagens das ruas, das árvores, dos

quintais abertos cheios de frutas, do piquete com uma paineira plantada pelo

meu pai em frente à minha casa, da boiada passando em campo aberto ali

no limite da cidade, onde está a rua Sofia Thomé, ocupam os meus sonhos.

A infância nunca morre, nos ensinou a Psicanálise.

Não sabia também que estava vivendo o fim de um ciclo, compreendamos.

Mas antes, leitor, me permita falar de outras coisas e de voltar no

tempo. Primeiro, no meu espaço-tempo mágico: meu pai, Anésio Garcia, era

peão de boiadeiro, dono de uma tropa de burros (os burros eram usados para

conduzir boiadas em longas distâncias porque são mais resistentes que os

cavalos). Também meus irmãos mais velhos eram peões; meu pai também

era comissário, contratado para buscar boiadas em Goiás, Mato Grosso, Minas

Gerais e tantos outros lugares. Minha mãe cuidava da casa, das crianças

e meu pai viajava. Quando ouvi, adulto, os versos de Renato Teixeira “o meu

pai foi peão, minha mãe, solidão”, entendi a vida de minha mãe, de minha família e

tantas outras famílias brasileiras. Ao menos as famílias daquele tempo.

Todos sabemos que Barretos cresceu pautada no comércio de bois, sobretudo

na venda de bois magros e, justamente por isso, muitas comitivas

de outros lugares do Brasil vinham à cidade. Os bois gordos que chegavam

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