SCMedia News | Revista | Abril 2020
A revista dos profissionais de logística e supply chain.
A revista dos profissionais de logística e supply chain.
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Abr’ <strong>2020</strong><br />
4,60€<br />
Mensal<br />
10<br />
TECNOLOGIA<br />
VS. CORONAVIRUS<br />
OPORTUNIDADES<br />
PARA OS TRANSPORTES<br />
ECONOMIA<br />
COLABORATIVA<br />
NA ÚLTIMA MILHA<br />
O DESAFIO<br />
DO TELETRABALHO<br />
A resposta da supply chain<br />
ao Coronavírus
Formação IN-HOUSE<br />
Gestão de Stocks<br />
Negociação na Logística<br />
Gestão do Armazém<br />
Auditoria Logística<br />
Gestão de Compras<br />
Logística<br />
Compras<br />
Operações<br />
Workshops/Cursos<br />
Intra-Empresas<br />
estruturados e<br />
construídos à medida,<br />
realizados nas<br />
instalações da<br />
empresa, nos horários<br />
que forem mais<br />
convenientes.<br />
Procurement eficiente<br />
Seleção e avaliação de fornecedores<br />
O essencial da Gestão Logística e da Cadeia de Abastecimento<br />
Libertar e maximizar o potencial das equipas logísticas<br />
através da liderança eficaz<br />
Lean Logistics<br />
Gestão de Processos<br />
Facility Management<br />
Gestão de Rotas<br />
Gerir com sucesso a sua frota<br />
Como minimizar os custos de transporte<br />
Esta é uma oportunidade<br />
para reciclar<br />
conhecimentos, ampliar<br />
outros e alargar horizontes<br />
profissionais.<br />
Ferramentas de gestão logística para transitários<br />
Marcação de reuniões no Sector Transitário<br />
Sector Transitário - Formação em Vendas<br />
Formação Air & Sea - Vertente Comercial<br />
SAIBA MAIS EM:<br />
www.supplychainmagazine.pt/flow/<br />
flow@supplychainmagazine.pt<br />
Formação em Transporte Aéreo - Vertente Comercial<br />
Formação em Transporte Marítimo - Vertente Comercial<br />
Formação em Supply Chain<br />
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dora.assis@supplychainmagazine.pt<br />
Dora Assis<br />
EDITORIAL<br />
PANDEMIA A QUANTO OBRIGAS<br />
«Quem tem por que viver, suporta quase qualquer como».<br />
Nietzsche<br />
Está na ordem do dia, vem emprestada<br />
da Física e diz respeito à propriedade de<br />
alguns materiais dobrarem sem partir.<br />
Sim, estamos a falar de resiliência.<br />
No caso das pessoas, é provavelmente a<br />
maior herança que se traz dos primeiros anos<br />
de vida, ou não, válida em tantos momentos<br />
e circunstâncias posteriores, traduzida na<br />
capacidade de cairmos e voltarmos a<br />
levantar-nos. E é exactamente disso que<br />
fala esta nossa edição: de “dar a volta”<br />
às situações, do ser capaz de suportar a<br />
adversidade e conseguir tirar partido dela,<br />
convertendo-a, reconvertendo-a e até<br />
mesmo reinventando-a nosso favor.<br />
Muitos passaram a viver colados ao ecrã<br />
do computador e todo este tempo tem-nos<br />
dado tempo para percebermos o quanto<br />
precisamos uns dos outros. A pandemia e o<br />
confinamento têm posto em evidência todos os<br />
que asseguram e garantem os pilares normais<br />
das nossas vidas e, nem que seja intimamente,<br />
já todos agradecemos ao padeiro por continuar<br />
a fazer pão, ao carteiro por continuar a sua<br />
distribuição de correspondência e encomendas<br />
ou a quem nos atende no mercado, no<br />
supermercado e na farmácia e, claro, aos que<br />
todos dias trabalham para salvar vidas… E são<br />
tantos os pontos invisíveis da nossa vida em<br />
comum, que sempre tomámos como garantidos,<br />
e que agora se acendem!<br />
É o segundo número feito em confinamento<br />
e isto não tem sido fácil. Todos os dias, todos<br />
nós, estamos a reaprender a fazer alguma coisa<br />
e, por isso, nesta edição trazemos-lhe algumas<br />
ideias para começarmos todos a pensar como é<br />
que vai ser isto de pôr o mundo a funcionar de<br />
novo.<br />
Por aqui, vamos continuar a procurar<br />
ajudar com o que sabemos fazer melhor.<br />
Informar, levando até si dados que ajudem a<br />
pensar, contando-lhe histórias sobre o que<br />
organizações, empresas e pessoas estão a fazer<br />
em Portugal e por todo o mundo.<br />
Remotamente para quem pode e seguro na<br />
rua para quem o tem de fazer, fiquem bem!
4<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
#24 #34 #44<br />
ÍNDICE<br />
FACTOS & NÚMEROS<br />
TOp 10 riscos da cadeia<br />
de abastecimento em <strong>2020</strong> 6<br />
PROCUREMENT<br />
Procurement resiliente na batalha<br />
contra o Coronavírus 34<br />
LOGÍSTICA<br />
Ajuda global luta contra<br />
a guerra do Covid-19 8<br />
Covid-19, blockchain, cripto<br />
e máscaras… muitas máscaras<br />
e outro material médico 18<br />
A resposta da supply chain<br />
ao Coronavírus 24<br />
INTRALOGÍSTICA<br />
Economia colaborativa<br />
na última milha:<br />
oportunidade ou risco? 44<br />
TECNOLOGIAS<br />
Empresas procuram novas soluções<br />
online para responder ao Covid-19 48<br />
Tecnologia versus Coronavirus 56
SCM Supply Chain Magazine 5<br />
TRANSPORTES<br />
CARREIRA<br />
#56 #72<br />
Transporte de mercadorias<br />
enfrenta a pandemia 62<br />
Covid-19:<br />
Uma agenda para a recuperação 68<br />
O desafio do teletrabalho 72<br />
O MUNDO É REDONDO<br />
Crítica do livro The Diet Myth, Tim Spector 78<br />
FICHA TÉCNICA<br />
Sede, Administração e Redacção_<br />
Al. Júlio Dinis, n.º 68 – São Francisco<br />
2890-307 Alcochete<br />
T: 210 499 074<br />
Direcção Geral_<br />
Filipe Barros<br />
Directora_<br />
Dora Assis<br />
Redacção_<br />
Ana Paiva, Fábio Santos<br />
Colaboraram nesta edição_<br />
Cláudia Brito, Manuel Gomes<br />
Projecto gráfico_<br />
Maria João Carvalho<br />
Paginação _<br />
Maria João Carvalho<br />
Circulação & Eventos _<br />
Inês Ferreira<br />
Direcção Comercial _<br />
Filipe Barros<br />
Sales & Marketing _<br />
Margarida Matildes<br />
Impressão _<br />
VASP DPS<br />
MLP – Quinta do Grajal,<br />
Venda Seca<br />
2739-511 Agualva Cacém<br />
Tiragem _<br />
3 mil exemplares<br />
Propriedade_<br />
SC Media Unipessoal, Lda.<br />
Al. Júlio Dinis, n.º 68 – São Francisco<br />
2890-307 Alcochete<br />
T: 210 499 074<br />
Capital Social_<br />
100,00€<br />
Participações sociais_<br />
Susana Silva<br />
Administração_<br />
Filipe Barros<br />
Registo na ERC n.º _<br />
127322<br />
Depósito Legal n.º _<br />
458604/19<br />
Os artigos assinados apenas veiculam<br />
a posição dos seus autores.<br />
Interdita a reprodução de textos e<br />
imagens sem autorização expressa.
6<br />
FACTOS<br />
& NÚMEROS<br />
<strong>2020</strong> Annual<br />
Risk Report<br />
TOP 10 RISCOS DA CADEIA<br />
DE ABASTECIMENTO EM <strong>2020</strong><br />
Segundo um estudo da Resilience360,<br />
o <strong>2020</strong> Annual Risk Report, pertencente<br />
ao Grupo DHL, que procura antecipar os<br />
riscos a que temos de estar atentos ao longo<br />
deste ano, 99% das organizações participantes<br />
nesta pesquisa experienciaram, nos passados<br />
cinco anos, uma disrupção nas suas cadeias de<br />
abastecimento, o que, com a chegada da nova<br />
pandemia de Covid-19, poderá atingir os 100%.<br />
Tendo por base a análise dos principais<br />
desafios que as cadeias de abastecimento<br />
globais têm enfrentado nos passados anos,<br />
o estudo faz uma análise de tendências<br />
de risco emergentes, tendo ainda em conta<br />
a recente pandemia que abala o mundo<br />
e que veio criar uma nova disrupção.<br />
Especialmente neste clima de incerteza,<br />
é importante estarmos atentos aos diversos<br />
pontos da cadeia para tentarmos antecipar<br />
quaisquer problemas que possamos vir a ter<br />
e minimizar os riscos. Deste modo, o Top 10<br />
dos riscos para a cadeia de abastecimento<br />
indicado pelo estudo é:<br />
1 Ameaça dos ciber-ataques<br />
2 Mudanças nas políticas comerciais<br />
3 Aumento das sanções económicas<br />
4 Greves e protestos<br />
5 Atrasos fronteiriços<br />
6 Activismo climatérico<br />
7 Novas regulações ambientais<br />
8<br />
9<br />
10<br />
Disputas territoriais devido a novas rotas<br />
comerciais<br />
Contrabando de narcóticos<br />
em navios cargueiros<br />
Eventos de “Cisne Negro”<br />
(Black Swan Events)
8<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
Texto: Ana Paiva<br />
AJUDA GLOBAL<br />
LUTA CONTRA<br />
A GUERRA<br />
DO COVID-19<br />
São muitas as empresas, ao redor do mundo,<br />
que decidiram não baixar os braços ao ver as<br />
suas produções paradas devido à propagação<br />
da pandemia Covid-19. Para ajudar no combate<br />
a este vírus, foram capazes de se reinventar<br />
substituindo o normal modelo de negócio<br />
pelo fabrico de equipamentos de protecção<br />
destinados aos profissionais de saúde de vários<br />
países. Numa altura em que o isolamento é o<br />
nosso melhor amigo, a ajuda ao próximo ainda<br />
acontece, sem qualquer contágio.<br />
LOGÍSTICA<br />
Substituição das produções<br />
por equipamentos<br />
de protecção<br />
O<br />
Covid-19 não escolhe género, idade<br />
e muito menos estatuto económico.<br />
São muitos os países que lutam<br />
continuamente para combater este vírus que<br />
está a infectar milhares de pessoas a nível<br />
global, deixando algumas infectadas, curadas<br />
e outras, infelizmente, sem resistir. Do outro<br />
lado da moeda, temos a economia que está<br />
a sofrer grandes impactos, pois grande parte<br />
dos negócios mundiais parou. Contudo, nem<br />
todos quiseram ficar em casa, apesar de ser<br />
um dos métodos de prevenção mais eficazes.<br />
Há quem tenha decidido ir mais além.
SCM Supply Chain Magazine 9
10<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
Muitas são as empresas que se têm<br />
reinventado para ajudar no combate a esta<br />
pandemia. Como? Alterando por completo<br />
os seus modelos de negócio, suportando as<br />
baixas de determinados produtos com grande<br />
procura que ajudam a prevenir a propagação<br />
do coronavírus, como álcool, desinfectantes,<br />
máscaras, batas médicas, luvas e até<br />
ventiladores e viseiras.<br />
No sector industrial foram muitas as<br />
empresas que utilizaram as suas fábricas<br />
e recursos para produzir equipamentos de<br />
protecção, como é o caso da Hovione que<br />
está a produzir, na unidade de Loures,<br />
40 toneladas de gel desinfectante por<br />
semana, disponibilizado gratuitamente para<br />
as instituições que mais precisam, como<br />
hospitais, câmaras municipais, protecção civil,<br />
camionistas e funcionários de supermercado.<br />
“Quarenta toneladas dá para lavar as mãos<br />
de 400 mil pessoas durante uma semana.<br />
A regra que nós temos é que cada pessoa<br />
não irá precisar de mais de 100 mililitros por<br />
semana”, refere Guy Villax, director-geral<br />
da empresa. A Hovione já recebeu contactos<br />
de mais de 100 entidades com pedidos de<br />
acesso ao gel desinfectante.<br />
Por sua vez, a produtora de vinhos José<br />
Maria da Fonseca, em parceria com a Destilaria<br />
Levira, estão também a produzir 5.000 litros<br />
de álcool gel para doar a instituições de saúde,<br />
de solidariedade social, forças de segurança<br />
e de socorro locais.<br />
Outra das empresas que substituiu a sua<br />
produção foi a Delta Cafés, que está a produzir<br />
máscaras e viseiras numa das unidades do<br />
Grupo Nabeiro, em Portalegre, de maneira a<br />
ajudar os profissionais de saúde. Este é um<br />
reforço em colaboração com a Toldiconfex,<br />
uma das unidades da Delta situada em Caia.<br />
Uma parte do equipamento de protecção já<br />
foi entregue aos hospitais de Portalegre e Elvas<br />
e a empresa também assegurou a distribuição<br />
de café pelas unidades de saúde. João Nabeiro,<br />
administrador do Grupo Nabeiro/Delta Cafés,<br />
sublinha que “de Norte a Sul, tendo em conta o<br />
momento que vivemos, estamos mobilizados,<br />
dentro das nossas possibilidades, para<br />
ajudarmos as instituições que estão a trabalhar<br />
arduamente no combate a esta pandemia”.<br />
A área das cervejas também pôs mãos à obra.<br />
A Super Bock e a Destilaria Levira juntaramse<br />
para produzir gel desinfectante para três<br />
unidades hospitalares no Porto. A primeira<br />
fase consiste na transformação, pela Destilaria<br />
Levira, de 56 mil litros de álcool, provenientes<br />
dos processos de produção de cerveja sem<br />
álcool, em aproximadamente 14 mil litros de<br />
álcool gel, um processo que segue as directrizes<br />
da Organização Mundial de Saúde (OMS).<br />
Desde a primeira quinzena de Março que<br />
outros 30 macro e micro cervejeiros de todo<br />
o país têm juntado esforços no combate ao<br />
coronavírus, doando ácido peracético, utilizado<br />
na indústria para a higienização, às entidades<br />
de saúde. Exemplo disso foi a iniciativa à qual<br />
QUARENTA TONELADAS<br />
DÁ PARA LAVAR AS MÃOS<br />
DE 400 MIL PESSOAS DURANTE<br />
UMA SEMANA. A REGRA QUE<br />
NÓS TEMOS É QUE CADA<br />
PESSOA NÃO IRÁ PRECISAR<br />
DE MAIS DE 100 MILILITROS<br />
POR SEMANA<br />
Guy Villax<br />
director-geral Hovione
a Cerveja Chica e a Lindinha Lucas aderiram,<br />
para doarem este composto químico. Além<br />
destas, vários cervejeiros começaram a fazê-lo<br />
e o stock foi crescendo. Já conseguiram doar<br />
mais de 700 mil litros de produto diluído.<br />
A Science4You também quis contribuir<br />
para a luta do Covid-19 e foi através de um<br />
telefonema que descobriu como: “houve um<br />
médico que nos ligou a dizer que estava com<br />
um dos nossos produtos em casa, uns óculos<br />
de protecção (que fazem parte de um kit de<br />
brinquedos) certificados e impecáveis para<br />
funcionar. Olhou para aquilo e disse<br />
‘isto é espectacular, eu preciso disto’. Ligou<br />
para nós e foi encomendada uma remessa de<br />
30 mil óculos”, explica Miguel Pina Martins,<br />
CEO da empresa.<br />
SCM Supply Chain Magazine 11
12<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
Em três semanas foram produzidos e<br />
colocados no mercado cerca de 400 mil óculos<br />
de protecção, não só em Portugal, mas também<br />
em Espanha e nos EUA para onde seguiu uma<br />
encomenda de 30 mil óculos. Como a procura<br />
é muito elevada, as encomendas são mais do<br />
que o stock disponível. Ainda assim, por dia são<br />
produzidas 15 mil unidades, o que permite dar<br />
resposta com alguma rapidez. Os óculos vêm<br />
de uma fábrica em Leiria para a de Loures,<br />
onde é finalizada a produção, embalada e<br />
gerida a distribuição das encomendas.<br />
VENTILADORES E VISEIRAS<br />
PROVENIENTES DA INDÚSTRIA<br />
AUTOMÓVEL<br />
A indústria automóvel não ficou indiferente<br />
à pandemia e muitas empresas decidiram<br />
também utilizar os seus recursos para ajudar.<br />
A Volkswagen disponibilizou seis furgões<br />
Transporter à Cruz Vermelha Portuguesa para<br />
acções no terreno destinadas ao combate<br />
ao coronavírus, de forma a possibilitar os<br />
coordenadores regionais da instituição a dar<br />
apoio logístico e coordenação nas operações<br />
que decorrem em solo português. Além de<br />
tudo isto, estes veículos são essenciais para<br />
transportar colaboradores e voluntários para<br />
distribuir alimentos e prestar apoio social junto<br />
dos mais carenciados e idosos.<br />
É através das capacidades de engenharia,<br />
design e fabrico que a Visteon também está<br />
focada em produzir e doar equipamentos<br />
necessários para enfermeiros e médicos<br />
que estão na linha da frente no combate<br />
ao Covid-19, a nível global. A empresa está<br />
a utilizar as linhas de produção na unidade<br />
de Palmela para produzir viseiras que serão<br />
doadas a instalações médicas locais.<br />
A Visteon espera fornecer até 50.000<br />
equipamentos de protecção individual.<br />
A produção teve início no dia 1 de <strong>Abril</strong> com o<br />
objectivo de criar 2.000 unidades por dia, de<br />
forma a fornecer, numa primeira fase,<br />
12 hospitais e centros médicos em Portugal.<br />
No entanto, devido à crescente procura em todo<br />
o continente, a empresa visa apoiar instalações<br />
em toda a Europa, um esforço visível através<br />
das mais de 2.000 máscaras produzidas.
SCM Supply Chain Magazine 13<br />
Não é apenas em solo português que<br />
esta onda de novas produções está a tomar<br />
lugar. A nível internacional, já muitas marcas<br />
substituíram as suas produções.<br />
Em Espanha, que também tem sido<br />
fortemente afectada pelo Covid-19, a Seat<br />
está a utilizar a fábrica em Martorell, onde é<br />
produzido o eixo frontal do subchassis para o<br />
Seat Leon, para fabricar ventiladores assistidos.<br />
Uma equipa de engenheiros começou a<br />
desenhar vários protótipos até que o modelo<br />
final fosse produzido. Um dos componentes-<br />
-chave à criação destes ventiladores passa<br />
pelas engrenagens impressas na Seat, eixos<br />
de velocidades e um motor adaptado de um<br />
limpa pára-brisas.<br />
“Modificar uma linha de montagem que<br />
fabrica uma sub-estrutura, uma peça de<br />
automóvel, e ser capaz de transformá-la para<br />
fabricar ventiladores tem sido um trabalho<br />
árduo que envolve muitas áreas da empresa<br />
e nós fizemo-lo no tempo recorde de uma<br />
semana”, explica Sergio Arreciado da área<br />
de Engenharia de Processos da Seat.<br />
Por Itália, a Lamborghini está também a<br />
produzir máscaras e viseiras na fábrica de<br />
Sant’Agata Bolognese que serão doadas ao<br />
hospital de Sant’Orsola-Malpighi, em Bolonha.<br />
Este trabalho está a ser levado a cabo pelas<br />
equipas que produzem os interiores dos superdesportivos<br />
da marca italiana, produzindo<br />
diariamente 1.000 máscaras. Já as viseiras,<br />
os departamentos de fibra de carbono e de<br />
investigação estão a produzir 200 unidades<br />
por dia, com recurso a impressoras 3D.<br />
“HOUVE UM MÉDICO QUE NOS LIGOU<br />
A DIZER QUE ESTAVA COM UM DOS<br />
NOSSOS PRODUTOS EM CASA,<br />
UNS ÓCULOS DE PROTECÇÃO<br />
(QUE FAZEM PARTE DE UM KIT DE<br />
BRINQUEDOS) CERTIFICADOS E<br />
IMPECÁVEIS PARA FUNCIONAR.<br />
OLHOU PARA AQUILO E DISSE ‘ISTO É<br />
ESPECTACULAR, EU PRECISO DISTO’.<br />
LIGOU PARA NÓS E FOI ENCOMENDADA<br />
UMA REMESSA DE 30 MIL ÓCULOS”<br />
Miguel Pina Martins, CEO Science4You
14<br />
ABRIL <strong>2020</strong>
SCM Supply Chain Magazine 15<br />
TÊXTIL E CALÇADO<br />
VESTEM E PROTEGEM<br />
PROFISSIONAIS DE SAÚDE<br />
Outra indústria que também pode fazer a<br />
diferença é a do têxtil e calçado, pois podem<br />
contribuir com a doação de batas e máscaras<br />
aos médicos e enfermeiros de todo o mundo.<br />
E assim o têm feito.<br />
A Sonix, com sede em Barcelos, decidiu<br />
então suspender a produção normal para<br />
fabricar equipamentos médicos como batas<br />
e máscaras. Aliado a isso, tem ainda o<br />
departamento de nanotecnologia suspendido<br />
das normais investigações para produzir gel<br />
desinfectante. Todo o equipamento será<br />
entregue a alguns hospitais como os de Braga,<br />
São João e Barcelos.<br />
“DE NORTE A SUL, TENDO<br />
EM CONTA O MOMENTO<br />
QUE VIVEMOS, ESTAMOS<br />
MOBILIZADOS, DENTRO DAS<br />
NOSSAS POSSIBILIDADES,<br />
PARA AJUDARMOS AS<br />
INSTITUIÇÕES QUE ESTÃO A<br />
TRABALHAR ARDUAMENTE NO<br />
COMBATE A ESTA PANDEMIA”<br />
JOÃO NABEIRO, ADMINISTRADOR DO<br />
GRUPO NABEIRO/DELTA CAFÉS<br />
IMÓVEL PARA VENDA<br />
ARRUDA DOS VINHOS<br />
ALVERCA<br />
11.000 m 2<br />
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16<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
“Temos recebido inúmeros pedidos de vários<br />
locais a solicitarem ajuda e expondo casos<br />
verdadeiramente dramáticos com necessidade<br />
de vestuário para as equipas (médicos,<br />
enfermeiros, auxiliares e bombeiros)”, refere<br />
Conceição Dias, empresária que lidera a<br />
empresa, ressalvando que apesar de todos<br />
estarem a contribuir consoante o que é<br />
possível, os esforços serão insuficientes.<br />
Apela a todas as empresas e profissionais<br />
têxteis para apoiarem através de mão-de-obra<br />
ou matérias-primas “para que seja possível<br />
minimizar estas situações e dar, dentro do<br />
possível, melhores condições a estes heróis<br />
que lutam diariamente para nos salvarem da<br />
tragédia que todos vivemos”.<br />
Luís Onofre, designer de calçado também<br />
reinventou o seu negócio para ajudar face<br />
à falta de material de protecção individual<br />
no país. Já iniciou uma produção diária de<br />
500 máscaras não cirúrgicas na sua fábrica<br />
em Oliveira de Azeméis, em conjunto com o<br />
Centro Tecnológico do Calçado de Portugal<br />
(CTCP), e tenciona aumentar para as 800<br />
unidades. Este equipamento será doado às<br />
instituições do concelho e arredores, tendo<br />
sido também garantida a distribuição em<br />
hospitais, lares e Cruz Vermelha.<br />
Em Itália, marcas como a Armani estão<br />
a fabricar roupa de protecção para os<br />
profissionais de saúde, nas suas unidades de<br />
produção. Em França também abraçaram este<br />
desafio marcas como Yves Saint Laurent e<br />
a Balenciaga que estão a fabricar máscaras<br />
de protecção, ou a Louis Vuitton, Givenchy e<br />
Dior que estão a produzir álcool gel.<br />
Há algo inquestionável sobre tudo<br />
isto: a solidariedade e o compromisso de<br />
tantas e tantas empresas que, por livre<br />
vontade, decidiram suspender os seus<br />
habituais modelos de negócio para ajudar os<br />
profissionais de saúde que lutam, dia e noite,<br />
contra o coronavírus. Toda a gente pode<br />
ajudar nesta guerra. Enquanto uns podem<br />
ficar na retaguarda a impedir a propagação<br />
do vírus, outros apresentam-se como a<br />
resistência, ajudando os que estão na linha<br />
da frente, lutando para que o vírus se renda<br />
finalmente. •
SCM Supply Chain Magazine 17<br />
MODIFICAR UMA LINHA DE MONTAGEM QUE FABRICA UMA<br />
SUBESTRUTURA, UMA PEÇA DE AUTOMÓVEL, E SER CAPAZ<br />
DE TRANSFORMÁ-LA PARA FABRICAR VENTILADORES TEM SIDO<br />
UM TRABALHO ÁRDUO QUE ENVOLVE MUITAS ÁREAS DA EMPRESA<br />
E NÓS FIZEMO-LO NO TEMPO RECORDE DE UMA SEMANA<br />
Sergio Arreciado, Engenharia de Processos da Seat
18<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
LOGÍSTICA<br />
Vírus traz<br />
oportunidades para<br />
a blockchain<br />
COVID-19, BLOCKCHAIN,<br />
CRIPTO E MÁSCARAS…<br />
MUITAS MÁSCARAS<br />
E OUTRO MATERIAL<br />
MÉDICO<br />
Até há bem pouco tempo,<br />
Corona era uma cerveja<br />
mexicana que se bebia com lima<br />
no gargalo, ou um jogador do FCP<br />
– dependente da nossa escolha.<br />
Muitos de nós pensavam no que<br />
fazer na Páscoa, nas dietas préépoca<br />
balnear, ou na reta final<br />
do campeonato, no Euro <strong>2020</strong>,<br />
nas férias e festivais de verão,<br />
ou que destino escolher<br />
para uma próxima viagem<br />
de fim-de-semana.
SCM Supply Chain Magazine 19<br />
José Reis Santos, Partner co-founder | DKJ International<br />
pandemia que nos tem posto os olhos em bico.<br />
E nos tornou, de um momento para o outro,<br />
em pessimistas especialistas em epidemias,<br />
processos de contágio, uso de máscaras e<br />
ventiladores. Numa gente sem praia nem<br />
jantaradas, sem copos ou música ao vivo,<br />
sem burburinho, trânsito ou abraços. E que<br />
triste é estarmos sem abraços, apressando a<br />
orientalização dos nossos costumes enquanto<br />
escolhemos os tons da prateleira e dos décors<br />
a usarmos nas zoom calls.<br />
POST-COVID I: BLOCKCHAIN<br />
E<br />
ste mundo, e estes planos, colapsaram<br />
em direto e em simultâneo em Março,<br />
suspendendo vidas, projetos e futuros.<br />
O nosso 25 de <strong>Abril</strong> foi descido por um que<br />
nos representou a todos, e o 1.º de Maio<br />
encheu a Alameda como se Pyongyang<br />
se tratasse. O planeta, hiper-globalizado<br />
nas últimas décadas, fechou-se em copas<br />
nacionalistas, auto-isoladoras, Estados<br />
de Emergência e suspensão de direitos e<br />
garantias. A economia, rampante estes últimos<br />
anos, e dispersa por um tecido económico<br />
alargado do turismo às startups, dos serviços<br />
às indústrias criativas, reduz-se hoje ao<br />
negócio internacional de materiais médicos,<br />
plataformas de entrega de comida e de<br />
streaming online e pouco mais. Milhões já<br />
perderam os seus postos de trabalho, milhares<br />
já fecharam empresas, e outros tantos<br />
encontram-se no limbo quase administrativo<br />
do lay off, sem saber muito bem com que<br />
contar, como pagar a renda depois do verão,<br />
ou como se organizar com os miúdos em<br />
casa, 24/7. O planeta, antes colorido num<br />
arco-íris garrido, é hoje monotemático: tom<br />
cinza Covid-19. Tudo gira em torno de uma<br />
Talvez por ser um osso do ofício, mas tenho<br />
pensado em formas como pode a tecnologia<br />
blockchain ser utilizada na gestão e saída da<br />
crise atual. No que respeita à rede da grande<br />
logística mundial, e como muito bem apontou<br />
o World Economic Forum, assistimos nos<br />
últimos tempos ao desmembramento de muitas<br />
linhas de cadeias de distribuição, em virtude<br />
do descalabro do comércio internacional e<br />
do encerramento e controlo apertado das<br />
fronteiras nacionais. Assim sendo, centenas de<br />
setores industriais, totalmente dependentes de<br />
longas e interligadas cadeias de logística e de<br />
fornecimento, encontram-se hoje sem matérias-<br />
-primas primárias e/ou secundárias, não lhes<br />
restando outra forma que não seja fechar,<br />
entrar em lay off ou procurar alternativas de<br />
fornecimento. E refere, bem, o relatório do<br />
World Economic Forum que esta pode ser uma<br />
excelente oportunidade para setores inteiros<br />
colocarem na blockchain a sua cadeia logística,<br />
digitalizando-a, permitindo-lhes assim um<br />
melhor controlo sobre a origem de proveniência<br />
da sua matéria-prima e no relacionamento<br />
comercial através de smart contracts com os<br />
seus fornecedores, de primeira e segunda linha,<br />
bem como os mais distantes.
20<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
A este exemplo acrescentava eu a debacle<br />
e descontrolo no acesso a certos materiais<br />
médicos, verificada pela compra de material<br />
sem qualidade e de origem duvidosa (a maioria<br />
com certificados falsificados). E estamos<br />
a falar de compras efetuadas por Estados<br />
como a Espanha, França ou a Holanda, em<br />
princípio instituições capazes e capacitadas<br />
para tratar da due diligence de forma<br />
conveniente. Ora estivessem estes produtos<br />
na blockchain, poder-se-ia ter acesso de forma<br />
transparente e verificável – no momento<br />
certo da operação – a toda a documentação<br />
e certificação correspondente ao produto<br />
em causa, confirmando-se imediatamente<br />
a legitimidade do mesmo sem riscos nem<br />
incertezas. Da mesma forma que poderia o<br />
cliente final seguir live o trajeto do seu produto,<br />
devidamente geo-referenciado, e ativar, através<br />
de smart contracts, um conjunto de obrigações<br />
comerciais que tivessem assumido (desde o<br />
transporte e transitários, desalfandegamento<br />
ou mesmo a execução de formas de pagamento,<br />
inclusive utilizando criptomoedas). Tudo à<br />
distância de um clique, como se apraz dizer;<br />
um clique que tiraria muitas dores de cabeça<br />
ao comprador final, limparia o mercado dos<br />
abutres, brokers e fishers, fornecendo as<br />
garantias necessárias da qualidade e veracidade<br />
do produto, poupando uns valentes cobres<br />
aos cofres do Estado e dos contribuintes, sem<br />
referir a poupança de tempo, esta variável<br />
tão importante quando tratamos de bens de<br />
primeiríssima necessidade.<br />
Uma outra aplicação de blockchain, tão<br />
ou mais importante, em minha opinião,<br />
que a anterior, tem a ver com a segurança<br />
da boa utilização de dados pessoais para<br />
providenciar garantias de imunidade individuais<br />
e coletivas em cenário pós-COVID-19. Em<br />
concreto refiro-me aos projetos e propostas<br />
que visam recolher e utilizar um conjunto de<br />
dados coletados através do que cada um(a)<br />
de nós voluntaria para a rede, e através de<br />
um aglomerado de ferramentas periféricas<br />
integradas que passam pela informação gerada<br />
passivamente nos nossos smartphones e Apps,<br />
e toda a rede de vigilância digital e de recolha<br />
de dados institucionais já existente. Julgo ser<br />
este o sentido das aplicações que o Governo
SCM Supply Chain Magazine 21<br />
português (e outros, incluindo a UE) tem dado<br />
a indicação de querer desenvolver, procurando<br />
num primeiro momento identificar, rastrear,<br />
conter e gerir a pandemia, para depois –<br />
espero – utilizar estas mesmas plataformas<br />
para devolver a confiança necessária para<br />
que a população possa regressar ao espaço<br />
público e ao trabalho, à rua, restaurantes,<br />
cinemas, teatros, praia, estádios, etc, de forma<br />
segura e capacitada em tempo real para que<br />
saibamos que estes espaços e as pessoas em<br />
nosso redor nos oferecem as condições de<br />
segurança necessárias. Será, aliás, decisivo que<br />
esta sensação de segurança seja rapidamente<br />
alcançada, se quisermos que parte do tecido<br />
económico nacional recupere nos próximos<br />
meses de verão, em especial o ligado ao<br />
turismo, hotelaria e aos serviços.<br />
POST COVID II: CRIPTOMOEDAS<br />
No mesmo sentido da blockchain, também o<br />
uso de criptomoedas se tornou assunto neste<br />
mundo dominado pelo negócios e negociatas de<br />
materiais médicos, especialmente se seguirmos<br />
o rastro e as peripécias do dinheiro entre a<br />
Europa e a China, e verificarmos não só algumas<br />
das condições na aquisição (50% no ato da<br />
encomenda e 50% quando a mesma se encontra<br />
pronta a embarcar para Portugal, 100% à<br />
cabeça para ventiladores) como as dificuldades<br />
em garantir que determinados pagamentos<br />
cheguem a tempo ao seu destino. Recordemos<br />
para este efeito a odisseia do governo<br />
português em garantir 500 ventiladores de um<br />
fornecedor chinês, tema aliás motivador de<br />
diversos artigos e notícias em terras lusas.<br />
IMOVEIS PARA VENDA<br />
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22<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
Ora pudesse o Estado português pagar<br />
em criptomoeda, digamos Bitcoin, esta<br />
transferência seria efetuada num par de<br />
minutos, de forma quase imediata, com custos<br />
de operação baixíssimos e desprezando<br />
quaisquer impedimentos formalistas como<br />
o fecho durante o fim-de-semana ou outras<br />
especificidades de funcionamento, pois<br />
transferências de criptomoedas – se aceites<br />
pelas partes – comportam não somente a<br />
mesma capacidade de transporte de valor<br />
como são independentes de quaisquer<br />
intervenção de uma terceira parte (banco), e<br />
respetivas habilidades de cobrar e condicionar<br />
serviços sobre os quais não deveriam ter<br />
tamanha capacidade de intervenção. No<br />
caso destes nossos ventiladores, não foi<br />
necessário o recurso a formas de pagamento<br />
“alternativas”, mas resta saber qual o custo<br />
financeiro total de tão lesta operação, e<br />
quantos negócios não ficaram por fazer<br />
por incapacidade de garantir que uma<br />
determinada transferência atingisse<br />
o seu destino a tempo e horas.
SCM Supply Chain Magazine 23<br />
MÁSCARAS, MÁSCARAS<br />
E MAIS MÁSCARAS…<br />
Devido a estar envolvido no mundo<br />
(internacional) das Startups, em blockchain,<br />
critpoassets, e agora neuromarketing,<br />
biométricos e neurofeedback, tenho<br />
conseguido cimentar contactos em várias<br />
áreas e setores, e em vários sítios do mundo.<br />
Neste sentido, quando a Covid chegou com<br />
estalo, dei por mim a falar diretamente com<br />
diversos fornecedores e fábricas na China, com<br />
os quais tenho procurado colocar interessados<br />
à fala diretamente, assim fornecendo este<br />
acesso a quem mais dele precisa. Não coloco,<br />
que seja bem claro, nenhuma das minhas<br />
empresas nestes negócios, nem criei ou<br />
me associei a alguma empresa de brindes<br />
e outro material de escritório. Procurei sim<br />
colocar preços reais ao alcance de instituições<br />
e privados para que o erário público não<br />
seja delapidado à conta de um conjunto de<br />
abutres com acesso privilegiado. E, com pena<br />
minha, percebi que para o mercado português<br />
tal atitude tem-se demonstrado incapaz<br />
de romper com alguns lobbies e relações<br />
privilegiadas, pois só assim se entende que<br />
tivesse havido vários ajustes diretos por<br />
valores muito acima dos reais, com evidente<br />
prejuízo para os contribuintes nacionais.<br />
No mesmo sentido, também uma outra<br />
instituição com desígnio público me referia<br />
ter efetuado a encomenda 1 milhão de<br />
máscaras “cirúrgicas” simples a um euro cada,<br />
quando as mesmas – à altura – andariam por<br />
volta dos 40 cêntimos, ou seja uma diferença<br />
de 600.000 euros que poderiam ter sido<br />
empregues de forma a beneficiar a população<br />
e os utentes desta instituição.<br />
E podia ainda contar-vos uma outra história<br />
que deixou, vai para um mês, 7 milhões<br />
de máscaras na China: 2 milhões prontas a<br />
embarcar num avião que me foi dito estar no<br />
ar, e outros 5 milhões em stock e preparadas<br />
para serem entregues no espaço de um par de<br />
dias. Tudo porque fui contactado numa sexta<br />
depois do almoço por alguém que se dizia<br />
estar articulado com o Estado português (e<br />
Ministério da Saúde), e que desejava ver até<br />
ao final desse mesmo dia útil uma solução<br />
capaz de resolver esta encomenda. E assim o<br />
fiz, preparando os tais 7 milhões de máscaras,<br />
devidamente certificadas, só para me ser<br />
dito mais tarde que afinal o Ministério havia<br />
saltado fora do negócio, primeiro, e que os<br />
certificados que havíamos mandado não<br />
estavam conformes, o que depois provei não<br />
ser verdade.<br />
Espero que se consiga ir começando a<br />
olhar para o futuro com critério e sentido<br />
de oportunidade, e que os diversos atores<br />
com capacidade e responsabilidade<br />
(Estado, privados, instituições e outras<br />
organizações) consigam ser consequentes<br />
na forma como procurarão lançar as bases<br />
para o que esperamos seja uma franca e<br />
lesta recuperação social pós-Covid. E, como<br />
em tantas outras ocasiões de crise, que<br />
saibamos aproveitar a oportunidade para<br />
introduzir um conjunto de medidas e projetos<br />
que potenciem o nosso futuro coletivo,<br />
como acredito que seja a digitalização<br />
procedimental e exploração da tecnologia<br />
blockchain em áreas tão decisivas para a<br />
reentrada na nova normalidade como são<br />
o setor da logística/supply chain – que<br />
literalmente nos alimenta diariamente–,<br />
e as questões ligadas à próxima geração de<br />
Direitos Humanos: os direitos, a soberania<br />
plena e a capacidade de gestão da nossa<br />
identidade digital. •
24<br />
LOGÍSTICA<br />
A importância da cadeia<br />
de abastecimento em<br />
cenário de pandemia
SCM Supply Chain Magazine 25<br />
Texto: Ana Paiva<br />
A RESPOSTA DA SUPPLY CHAIN<br />
AO CORONAVÍRUS<br />
Os efeitos do Covid-19 sentem-se em toda a Europa, em todos os sectores.<br />
Um deles tem sido a corrida aos supermercados, a ruptura de stock e o medo<br />
que os bens essenciais se esgotem de um dia para o outro. Para evitar que tudo<br />
isto aconteça, as cadeias de abastecimento do país não têm parado, como a<br />
do Grupo Os Mosqueteiros, Auchan, Cerealis ou Novadis. Nesta pandemia são<br />
muitos os heróis que se posicionam na linha da frente e estes são alguns deles.<br />
N<br />
o combate à pandemia Covid-19, vários<br />
sectores de actividade não puderam parar<br />
porque, se assim fosse, o mundo entraria<br />
em colapso. Enquanto muitas empresas<br />
encerraram temporariamente, serviços<br />
como farmácias, hospitais e supermercados<br />
mantêm o normal funcionamento para que<br />
nada falte à população. Para isso, a cadeia<br />
de abastecimento não pode parar e, mais<br />
uma vez, é em momentos como estes que<br />
percebemos a sua importância.<br />
Os profissionais das grandes cadeias de<br />
retalho têm vivido dias como nunca viveram.<br />
Têm uma carga horária mais pesada, bem<br />
como medidas redobradas de protecção e têm<br />
ainda de saber gerir a ansiedade de trabalhar<br />
neste contexto. Não é nada fácil.<br />
“A missão de continuarmos a alimentar<br />
o país é muito nobre”, confessa Nuno<br />
Bastos, director de logística do Grupo<br />
Os Mosqueteiros, nas SCM Talks, evento<br />
organizado pela Supply Chain Magazine.<br />
Das insígnias deste grupo, apenas a cadeia<br />
de retalho Intermarché é que não tem sofrido<br />
quebras pois têm registado altos níveis<br />
de procura. Já o Bricomarché, a Roady e as<br />
gasolineiras estão a sofrer a desaceleração<br />
do negócio porque, ao contrário do que<br />
acontece no supermercado, não há procura.<br />
O responsável explica que existe uma<br />
alteração completa no paradigma da<br />
procura e do volume, que põe em causa<br />
as previsões e a capacidade instalada, “em<br />
Março acabámos com 11% de crescimento em<br />
produtividade/hora, ou seja, simplificámos<br />
processos, desafiámo-nos e acelerámos a<br />
transformação digital em muitos domínios”.<br />
Para se adaptarem ao contexto actual<br />
e trabalharem segundo as regras de<br />
segurança recomendadas, foi necessário<br />
realizar alterações significativas no espaço,<br />
bem como um trabalho de gestão muito<br />
organizado: “neste momento estamos a<br />
gerir a alteração da procura, o risco, a<br />
desestruturação da cadeia de abastecimento<br />
e a gestão das equipas… os medos, os<br />
anseios, as expectativas, o dia-a-dia”.<br />
A nível interno, além de terem
26<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
“A MISSÃO DE CONTINUARMOS A ALIMENTAR<br />
O PAÍS É MUITO NOBRE.”<br />
Nuno Bastos, director de logística do Grupo Os Mosqueteiros<br />
alterado EPI’s, mudaram rotinas, deixaram de<br />
ter controlos de acesso e acabaram com os<br />
espaços sociais. Considerando que estão “na<br />
trincheira de guerra”, refere que a preocupação<br />
número um é “manter as operações vivas e as<br />
equipas à tona”.<br />
Por sua vez, na cadeia de retalho Auchan, o<br />
cenário é praticamente idêntico. Segundo uma<br />
reportagem da RTP, foram implementadas<br />
novas medidas na plataforma logística da<br />
Azambuja de forma a aumentar a segurança<br />
dos colaboradores, como lavatórios móveis<br />
distribuídos pelo espaço, pontos de álcool para<br />
a desinfecção e ainda a expansão do espaço<br />
do refeitório para permitir o distanciamento<br />
social, assegura Ana Leandro, directora de<br />
abastecimento da insígnia.<br />
A nível de colaboradores, refere que foram<br />
necessários reforços para dar resposta a este<br />
momento de alta procura, “há mais funcionários<br />
a trabalhar, não só porque tivemos volumes<br />
mais elevados, mas também no âmbito do<br />
plano de contingência”. São ainda necessárias<br />
equipas de retaguarda para responder a<br />
possíveis aumentos de movimentação de<br />
produtos.
SCM Supply Chain Magazine 27<br />
A INCESSANTE PROCURA<br />
PELOS BENS ESSENCIAIS<br />
O aumento da procura fez disparar a carga<br />
de trabalho em todos os elos da cadeia de<br />
abastecimento, desde os armazéns onde os<br />
produtos são expedidos, até às lojas. O motivo<br />
que levou a este cenário foi o medo que<br />
se esgotassem os bens essenciais, levando<br />
grande parte da população a açambarcar<br />
supermercados na fase em que se registaram<br />
os primeiros casos de Covid-19 em Portugal.<br />
Produtos como enlatados, leite e farinha foram<br />
os que menos tardaram em desaparecer graças<br />
aos prazos de validade mais alargados.<br />
A realidade é esta: enquanto algumas<br />
empresas estão encerradas, outras estão a viver<br />
um pico intenso de produção, como é<br />
o caso da Cofaco, dono da marca Bom Petisco.<br />
Ao ECO, a fonte oficial da empresa afirma<br />
que têm vindo a assistir “a um aumento das<br />
solicitações de fornecimento por parte das<br />
cadeias de distribuição, o que poderá significar<br />
apenas um aumento das necessidades de<br />
stockagem”. Ainda assim, assegura que foram<br />
implementados os planos de contingência de<br />
forma a continuar a garantir a demanda dos<br />
clientes.<br />
A mesma situação acontece na Ramirez,<br />
sublinhando que as conservas de peixe<br />
funcionam, por norma, em contra-ciclo, sendo<br />
mais procuradas em alturas de crise “desde<br />
essa data [24 de Fevereiro], a Ramirez regista<br />
um aumento extraordinário da procura e no<br />
mês de Março atingimos um pico muito forte ao<br />
nível das encomendas, muito acima do que é<br />
Centro Logístico da LPR, Warrington, Inglaterra<br />
Red is<br />
making<br />
things<br />
easier<br />
Com a LPR consegue facilmente gerir as suas<br />
encomendas e monitorizar os seus stocks online<br />
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seu parque de paletes. Todos os nossos serviços logísticos e de gestão de<br />
informação são automáticos. Para além disso, no nosso Portal poderá<br />
facilmente acompanhar toda a sua atividade: visualizar os fluxos de paletes,<br />
encomendas, stocks, inspeções de qualidade, rentabilizando tempo, espaço<br />
físico e custos de transporte. Para mais informações visite a LPR.eu<br />
A pallet is red, red is a pallet
28<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
normal para a época do ano em que vivemos”,<br />
explica Luís Avides Moreira, administrador-<br />
-adjunto da Ramirez, ao ECO.<br />
Considerados também como bens essenciais,<br />
embora registem menos procura do que os<br />
enlatados, são a água e o leite. A Água de Luso<br />
diz ter sentido um aumento da procura por<br />
águas engarrafadas, como explica ao ECO Nuno<br />
Pinto Magalhães, director de Comunicação e<br />
Relações Institucionais da Sociedade Central<br />
de Cervejas e Bebidas, que detém a Sociedade<br />
Água de Luso “estamos a assistir a um pico<br />
de procura de águas engarrafadas, através do<br />
nosso canal de vendas de grande distribuição,<br />
nomeadamente de grandes formatos (acima<br />
de 1,5 litros), cujo crescimento dos números<br />
acumulados este ano face ao ano passado, em<br />
volume e para este canal de vendas, está acima<br />
dos 35%”.<br />
Já no caso do leite, desde o início do mês de<br />
Março que a Lactogal colocou no mercado 45<br />
mil toneladas de produtos como leite, queijos,<br />
iogurtes, bebidas lácteas, águas e sumos, o que<br />
representa “um crescimento de 13,8% face ao<br />
período homólogo, sendo que se verifica um<br />
crescimento de 14,5% em produtos lácteos<br />
não refrigerados (leites e bebidas lácteas) e 8%<br />
de produtos refrigerados (iogurtes e queijos)”,<br />
refere a fonte oficial da empresa ao ECO. No<br />
que toca à água, o crescimento é ainda mais<br />
notório registando um aumento de 50% face ao<br />
igual período de 2019.<br />
A Central de Cervejas também teve de<br />
adaptar a produção e distribuição ao contexto<br />
em que vivemos. À SCM, Nuno Jacinto, regional<br />
warehouse & distribution manager da Novadis,<br />
explica que numa primeira fase o foco passou<br />
por reforçar a produção e os enchimentos<br />
de forma a aumentar o nível de stock dos<br />
produtos essenciais que esperavam registar<br />
maior procura, o que ajudou “a conseguir dar<br />
resposta ao incremento de encomendas do<br />
canal off trade, principalmente nos nossos<br />
SKU’s de água”. Já no canal HORECA, houve<br />
uma grande quebra resultante do encerramento<br />
do mercado, apesar de continuarem a fornecer<br />
regularmente o pequeno retalho tradicional e<br />
os pontos de venda que estão a trabalhar em<br />
regime take-away ou home delivery.<br />
As prioridades entre todas as empresas neste<br />
momento são transversais: gerir o negócio da<br />
melhor maneira possível e garantir a segurança<br />
dos seus colaboradores e clientes, e a<br />
Sociedade Central de Cervejas não é excepção.<br />
“Temos clara noção que esta situação está a<br />
ser um enorme desafio para os nossos clientes,<br />
e por essa razão temos estado em constante<br />
contacto, apesar de remotamente, com o<br />
objectivo de colaborar e ajudar a ultrapassar<br />
algumas dificuldades pelas quais estão a<br />
passar”, refere Nuno Jacinto.<br />
E porque o futuro ainda se mostra incerto,<br />
o responsável salienta que é difícil prever o<br />
mercado nos próximos meses, mas tudo indica<br />
que se trate de uma recuperação lenta<br />
NESTE MOMENTO ESTAMOS<br />
A GERIR A ALTERAÇÃO DA<br />
PROCURA, O RISCO,<br />
A DESESTRUTURAÇÃO DA<br />
CADEIA DE ABASTECIMENTO<br />
E A GESTÃO DAS EQUIPAS…<br />
OS MEDOS, OS ANSEIOS,<br />
AS EXPECTATIVAS, O DIA-A-DIA<br />
Nuno Bastos,<br />
director de logística do Grupo Os Mosqueteiros
SCM Supply Chain Magazine 29
30<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
“com uma<br />
abertura<br />
progressiva dos<br />
pontos de venda<br />
e com restrições<br />
à sua normal<br />
operação”.<br />
Passará também<br />
pela segurança<br />
das equipas,<br />
clientes e<br />
consumidores<br />
durante o<br />
processo de<br />
reabertura<br />
“para que todos<br />
tenhamos a confiança para retomar os nossos<br />
hábitos de consumo fora de casa”.<br />
Outra das empresas que também sentiu<br />
não só um aumento na procura, mas também<br />
uma grande pressão em toda a cadeia de<br />
abastecimento, foi a Cerealis, empresa do<br />
sector agro-alimentar que se dedica à produção<br />
derivada da transformação de cereais. Perante<br />
a situação, implementou “um plano focado<br />
na minimização dos impactos na satisfação<br />
das encomendas, o que implicou o reforço<br />
imediato da produção, a concentração da nossa<br />
oferta, de forma a ganhar capacidade através<br />
da produção de grandes séries, e o recurso a<br />
trabalho extraordinário”, afirma Bárbara Fraga,<br />
directora de logística da Cerealis.<br />
Este reforço de produção reflectiu-se na<br />
procura por produtos mais ajustados ao<br />
consumo em casa. Apesar de o incremento das<br />
encomendas não ter sido idêntico ao longo<br />
do processo, acabou por ser transversal a<br />
todas as categorias de produtos que a empresa<br />
comercializa, desde cereais de pequeno-<br />
-almoço, bolachas, massas e farinhas, sendo<br />
que os dois últimos registaram mais procura.<br />
“HÁ MAIS FUNCIONÁRIOS A<br />
TRABALHAR, NÃO SÓ PORQUE<br />
TIVEMOS VOLUMES MAIS<br />
ELEVADOS, MAS TAMBÉM<br />
NO ÂMBITO DO PLANO<br />
DE CONTINGÊNCIA”<br />
ANA LEANDRO<br />
DIRECTORA DE<br />
ABASTECIMENTO DA AUCHAN<br />
Bárbara Fraga aponta que um dos<br />
maiores desafios neste momento é<br />
“o planeamento num ambiente atípico como<br />
este, em que temos de nos debater com<br />
fluxos diferentes do habitual em toda a<br />
cadeia de abastecimento, tendo uma grande<br />
flexibilidade de adaptação aos cenários<br />
alternativos que vão surgindo, de forma<br />
a assegurar que não paramos”.
32<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
“TEMOS CLARA NOÇÃO QUE<br />
ESTA SITUAÇÃO ESTÁ A SER<br />
UM ENORME DESAFIO PARA<br />
OS NOSSOS CLIENTES, E POR<br />
ESSA RAZÃO TEMOS ESTADO<br />
EM CONSTANTE CONTACTO,<br />
APESAR DE REMOTAMENTE, COM<br />
O OBJECTIVO DE COLABORAR<br />
E AJUDAR A ULTRAPASSAR<br />
ALGUMAS DIFICULDADES PELAS<br />
QUAIS ESTÃO A PASSAR”<br />
Nuno Jacinto,<br />
Manager da Regional Warehouse<br />
& Distribution Managerda Novadis<br />
Para manter o fornecimento dos produtos<br />
da Cerealis no mercado é essencial um<br />
grande espírito de colaboração entre todos<br />
os intervenientes, desde fornecedores a<br />
colaboradores, “a actuação de todos tem sido<br />
fundamental neste contexto de crise, onde<br />
a segurança de cada um tem de ser uma<br />
premissa sempre presente, e a comunicação<br />
permanente, uma obrigação”, sublinha.<br />
De forma a mitigar ao máximo a hipótese<br />
de infecção dos funcionários, a Cerealis<br />
implementou um plano de contingência<br />
que visa garantir as condições de higiene e<br />
segurança dos colaboradores, utilização de<br />
equipamentos de protecção individual, o<br />
reforço dos procedimentos de desinfecção,<br />
ajustes nos procedimentos de troca de turnos,<br />
medidas de distanciamento e de rotação<br />
entre equipas, de forma a manter algumas<br />
de salvaguarda.<br />
Após este período conturbado, nenhuma<br />
pessoa será a mesma, e o mesmo acontecerá<br />
com as empresas. No regresso à normalidade,<br />
Bárbara Fraga acredita que “esta situação<br />
assimilou, ainda mais, o sentido de missão,<br />
compromisso e o dever social e humano<br />
da Cerealis”.<br />
São muitos os planos idealizados para
SCM Supply Chain Magazine 33<br />
quando a poeira assentar. Aos poucos, as<br />
operações voltarão à normalidade, a confiança<br />
voltará e os negócios irão reerguer-se.<br />
Na cadeia de abastecimento não será<br />
diferente, mas haverá um sentimento de<br />
fortalecimento inegável levado a cabo por<br />
este pensamento: ‘se não foi por este motivo<br />
que parámos, não será por mais nenhum’. •<br />
“ESTA SITUAÇÃO ASSIMILOU, AINDA<br />
MAIS, O SENTIDO DE MISSÃO,<br />
COMPROMISSO E O DEVER SOCIAL<br />
E HUMANO DA CEREALIS”<br />
Bárbara Fraga,<br />
Directora de Logística da Cerealis
34<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
PROCUREMENT<br />
A resposta<br />
do procurement<br />
à Covid-19
SCM Supply Chain Magazine 35<br />
Texto: Ana Paiva<br />
PROCUREMENT RESILIENTE NA<br />
BATALHA CONTRA O CORONAVÍRUS<br />
São muitos os sectores que estão a ser postos à prova devido ao coronavírus. A área de compras e procurement,<br />
apesar de detectar muitos desafios, está a superá-los. Empresas como a Cerealto, a Daufood, a Daymon e a<br />
Hovione têm aplicado os seus planos de contingência de forma a gerir e superar os obstáculos causados pelo<br />
coronavírus. É caso para dizer que o procurement testou positivo à pandemia, mas na luta contra ela.<br />
E<br />
m tempo de pandemia, um dos primeiros<br />
passos das empresas foi activar os<br />
seus planos de contingência para fazer<br />
face aos riscos. De forma a dar resposta às<br />
necessidades que rapidamente se impuseram,<br />
foi fundamental alterar dinâmicas das<br />
operações para garantir a continuidade do<br />
negócio. No procurement o mesmo aconteceu,<br />
e os planos B’s não tardaram em ser aplicados.<br />
A Cerealto Siro Foods, empresa do<br />
sector agro-alimentar que se dedica ao<br />
desenvolvimento e fabrico de produtos<br />
derivados do cereal, registou um grande<br />
aumento de pedidos, tal como a maioria das<br />
organizações do mesmo sector, centrados<br />
principalmente em massas, bolachas e bolos,<br />
conta Ana Maria Dias, global procurement<br />
director da Cerealto. Este aumento originou<br />
também um incremento nos pedidos de última<br />
hora junto dos fornecedores, o que gerou não<br />
só caos na cadeia de abastecimento, como<br />
na cadeia logística devido à escassez de<br />
transportes para atender à repentina procura.<br />
“Têm sido tempos sem precedentes em<br />
que toda a dinâmica da nossa actividade<br />
profissional mudou radicalmente e tem<br />
vindo a ser desafiada todos os dias”, revela.<br />
Assim, implementaram várias medidas<br />
e procedimentos no que diz respeito ao<br />
impacto nas compras de matérias-primas<br />
e materiais de embalagem: mapearam os<br />
fornecedores até à origem e identificaram<br />
os que estavam localizados em geografias<br />
de risco e, posteriormente, priorizaram o<br />
fornecimento de matérias-primas críticas<br />
e aumentaram a cobertura das mesmas;<br />
analisaram e identificaram os materiais<br />
que corriam o risco de atrasar ou escassear<br />
e anteciparam pedidos; mantiveram as linhas<br />
de comunicação abertas com os fornecedores<br />
para que, internamente, estivessem todos<br />
informados sobre os desenvolvimentos e<br />
desafios enfrentados; criaram vários comités<br />
de riscos diários, entre os quais um de risco<br />
da cadeia de abastecimento que reúne<br />
diariamente para analisar vários temas;<br />
e trabalham rapidamente na homologação<br />
de fornecedores alternativos. Mesmo com<br />
todas estas medidas, houve fornecedores<br />
que tiveram de fechar fábricas para<br />
as quais a Cerealto teve de activar um<br />
plano de homologação urgente com um<br />
impacto significativo no custo habitual<br />
das matérias-primas.
36<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
Contratempos é algo que não falta quando<br />
acontecem imprevistos na cadeia que têm<br />
de ser corrigidos rapidamente. No caso<br />
da Ceralto, alguns atrasos nas entregas<br />
dos materiais obrigaram a uma alteração<br />
da planificação das fábricas, bem como<br />
fornecedores de filme que registaram um<br />
aumento tal nas encomendas que, de repente,<br />
já não tinham matéria-prima para atender a<br />
todos os pedidos. Assim, foi necessário gerir<br />
fornecedores em várias localizações mundiais,<br />
bem como o stress na cadeia logística.<br />
Segundo os seus fornecedores, também se<br />
registou um aumento dos preços em materiais<br />
de embalagem, motivados pelo incremento de<br />
custos logísticos, de desinfecção de fábricas<br />
e custos operativos derivados de planos de<br />
contingência.<br />
Este é um processo do qual vão tirando<br />
aprendizagens, como adianta Ana Maria Dias,<br />
“uma das quais é a necessidade de trabalhar<br />
com fornecedores locais e que tenham bem<br />
definidos os seus planos de contingência, bem<br />
como ter sempre<br />
vários fornecedores<br />
homologados para<br />
as nossas matériasprimas<br />
e materiais<br />
de embalagem”.<br />
Considera ainda<br />
que “nunca os<br />
departamentos<br />
de procurement<br />
tiveram um desafio<br />
tão difícil e um<br />
teste de resistência<br />
tão grande não só<br />
às suas capacidades<br />
como também<br />
à sua robustez”.<br />
Esta apresentase<br />
também como uma aprendizagem para as<br />
empresas melhorarem ou reforçarem processos<br />
e procedimentos, bem como o “manual de<br />
gestão de riscos”.<br />
Por sua vez, Luís Pica, chief supply chain<br />
officer da Daufood, franchise da Domino’s<br />
Pizza, explica o processo pelo qual passaram<br />
para fazer face ao coronavírus, referindo<br />
que, de imediacto, procuraram identificar os<br />
potenciais efeitos de uma crise desta escala<br />
na operação da empresa, considerando que<br />
“a melhor resposta só seria possível com<br />
uma preparação atempada para os piores<br />
cenários. Tendo em conta o papel da supply<br />
chain em toda a actividade da Daufood, foi a<br />
área que primeiro identificou e delineou um<br />
plano de contingência”. Por esse motivo, foi<br />
a área seleccionada para liderar a criação e<br />
acompanhamento do plano de contingência da<br />
organização.<br />
No plano foram identificadas as actividades<br />
essenciais à continuidade do negócio e as<br />
medidas a implementar para garantir a
SCM Supply Chain Magazine 37<br />
TÊM SIDO TEMPOS<br />
SEM PRECEDENTES EM<br />
QUE TODA A DINÂMICA<br />
DA NOSSA ACTIVIDADE<br />
PROFISSIONAL MUDOU<br />
RADICALMENTE<br />
E TEM VINDO A SER<br />
DESAFIADA TODOS<br />
OS DIAS<br />
Ana Maria Dias, Cerealto<br />
continuidade do mesmo, cobrindo quatro<br />
áreas globais, cujas medidas foram aplicadas<br />
em todos os mercados: a comunicação com<br />
os colaboradores (Recursos Humanos),<br />
a comunicação nas lojas (Operações),<br />
comunicação com o cliente (Marketing)<br />
e a supply chain. Esta última, segundo o<br />
responsável, “procurou, em primeiro lugar,<br />
planear uma eventual escassez de produtos nos<br />
armazéns e nas lojas, reforçando encomendas<br />
e stocks”. De seguida, solicitaram-se os planos<br />
de contingência de todos os fornecedores,<br />
incluindo os riscos inerentes ao transporte<br />
de mercadorias de outros países. Além disso,<br />
procuraram manter uma comunicação frequente<br />
com os fornecedores para prever e coordenar<br />
eventuais constrangimentos.
38<br />
Deu-se ainda especial atenção à aquisição<br />
atempada e reforço de produtos de protecção<br />
individual.<br />
Na área da logística, as acções<br />
passaram por um reforço de comunicação<br />
e acompanhamento junto de todos os<br />
colaboradores de armazéns e de produção<br />
de forma a criar um ambiente protegido<br />
e, quanto a parceiros logísticos externos,<br />
reviram toda a política de contingência que<br />
já existia.<br />
A discussão e colaboração de todas as áreas<br />
foi fundamental para também preparar a<br />
organização para o impacto económico desta<br />
pandemia na actividade.<br />
Luís Pica acredita que “este exercício irá,<br />
certamente, servir no futuro para enfrentar<br />
outras possíveis crises de larga escala”.
SCM Supply Chain Magazine 39<br />
“ESTE EXERCÍCIO IRÁ,<br />
CERTAMENTE, SERVIR NO<br />
FUTURO PARA ENFRENTAR<br />
OUTRAS POSSÍVEIS CRISES<br />
DE LARGA ESCALA”<br />
Luís Pica, Daufood<br />
DESAFIOS E OPORTUNIDADES<br />
DA GESTÃO DO RISCO<br />
ALÉM-FRONTEIRAS<br />
Como em tantas outras empresas, houve<br />
também um impacto significativo nas<br />
operações da Daymon, multinacional de<br />
consultoria, desenvolvimento e gestão de<br />
marcas próprias, refere Pedro Carmo, director<br />
global sourcing & procurement da empresa.<br />
Explica que têm sentido este impacto na<br />
actividade das field teams, pois foram<br />
suspensos alguns serviços e outros sofreram<br />
alterações. Os maiores desafios, nas áreas<br />
de core de consultoria e desenvolvimento de<br />
marcas próprias, passa por manter os prazos<br />
normais de entrega dos projectos, tendo em<br />
conta a complexidade de operar em vários<br />
países que atravessam fases diferentes da<br />
pandemia, o que obriga a um grande esforço de<br />
adaptação.<br />
De forma a mitigar os efeitos do vírus, a<br />
Daymon “tem ajustado as suas equipas de<br />
operações a outros serviços que os nossos<br />
clientes tanto necessitam e requisitam nesta<br />
fase”, afirma o responsável. Além disso, e<br />
como é óbvio, a empresa tem assegurado<br />
as condições de segurança e de protecção<br />
necessárias às suas equipas.<br />
Nas restantes áreas de negócio a<br />
preocupação principal passa pelo impacto<br />
económico a que estarão sujeitos nos próximos<br />
meses. De momento, encontram-se a rever<br />
os planos de crescimento para <strong>2020</strong> e 2021,<br />
adaptando-os à nova realidade. Pedro Carmo<br />
confessa que “o grande motor de mitigação que<br />
estamos a utilizar são as novas tecnologias de<br />
teletrabalho que estamos a potenciar dentro
40<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
do grupo e com os nossos parceiros, com<br />
resultados muito positivos”, acrescentando que<br />
“a marca própria é um dos pilares de apoio ao<br />
consumidor na gestão do seu orçamento nestes<br />
tempos difíceis, e a Daymon, e os seus parceiros<br />
retalhistas e fornecedores, continuaram a<br />
proporcionar as melhores soluções ao melhor<br />
preço em todos os mercados onde operamos”.<br />
Na área de procurement, o responsável<br />
revela que “têm sido semanas muito intensas<br />
e desafiantes” nas geografias onde marcam<br />
presença. No período que antecedeu o<br />
confinamento da população, a Daymon sentiu<br />
uma grande pressão sobre o aumento da<br />
procura e o fornecimento de produtos-<br />
-chave, como os alimentares e de higiene.<br />
Passada esta fase, os impactos estão agora<br />
mais relacionados com os desafios na cadeia<br />
de fornecimento aos clientes “devido à<br />
instabilidade que se vai notando nos serviços<br />
logísticos, à dificuldade de fabricantes em<br />
manter níveis de produção ou até mesmo
SCM Supply Chain Magazine 41<br />
em aumentá-los (seja por problemas de<br />
mão-de-obra, ou de matérias-primas), na<br />
limitação que alguns países estão a colocar<br />
à saída de bens, e, genericamente, na menor<br />
capacidade de resposta que todos os<br />
intervenientes da cadeia de valor têm<br />
sentido”, explica. De forma a planear melhor<br />
os aumentos da procura, estão a realizar um<br />
trabalho em conjunto com os fabricantes<br />
e retalhistas garantindo o fornecimento<br />
necessário, tendo ainda redefinido prioridades<br />
nos projectos de desenvolvimento de produtos<br />
de marcas próprias.<br />
Para o futuro, a Daymon está,<br />
estrategicamente, a estudar o impacto que<br />
a pandemia terá no comportamento dos<br />
consumidores nos vários países onde têm<br />
operações. Pedro Carmo considera que a<br />
abrangência global da empresa permite<br />
ter uma visão privilegiada do retalho e dos<br />
consumidores nas várias etapas deste vírus<br />
e, assim, “podemos utilizar esse know-how
42<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
para, em conjunto com os nossos parceiros,<br />
retalhistas e fornecedores, definirmos novas<br />
estratégias e direcções que lhes permitam<br />
adaptar os seus programas de marca própria<br />
para responderem aos novos desafios”.<br />
No caso da Hovione, o facto de ter uma<br />
fábrica em Macau, permitiu estar exposta<br />
mais cedo aos desafios da Covid-19, uma vez<br />
que o vírus se instalou nesta cidade antes de<br />
em Portugal. Assim, através da experiência<br />
da empresa em Macau foi possível antecipar<br />
e organizar pro-activamente as equipas,<br />
trabalhando em diferentes fluxos de trabalho<br />
e com total transparência, sendo capazes de<br />
agir rapidamente com base no conhecimento<br />
que já detinham, de acordo com Vasco Grilo,<br />
head of global procurement da Hovione.<br />
Duas das medidas implementadas, com<br />
o foco na segurança dos colaboradores,<br />
foram o teletrabalho para quem seria<br />
necessário, e higienizar o local de trabalho<br />
para quem não pôde ficar em casa.<br />
O impacto nas operações começou a sentir-<br />
-se quando o número de casos em Portugal,<br />
na Irlanda e nos EUA começou a aumentar,<br />
países onde a empresa detém várias<br />
instalações, uma vez que alguns membros<br />
das equipas se encontravam em quarentena<br />
ou isolamento. Ainda assim, até ao momento,<br />
o responsável revela que ainda não sofreram<br />
nenhuma interrupção significativa de material<br />
ou mesmo nas operações, fazendo o possível<br />
para que a entrega dos produtos e serviços<br />
decorra normalmente.<br />
No que à logística diz respeito,<br />
Vasco Grilo considera-a “resiliente”, uma<br />
vez que as equipas deste sector têm<br />
conseguido encontrar alternativas enquanto<br />
colaboram com os fornecedores, ainda que<br />
as restrições às viagens aéreas comerciais<br />
estejam a limitar as opções de carga<br />
NÃO SABEMOS O DIA DE<br />
AMANHÃ, MAS ADAPTAR-<br />
NOS-EMOS RAPIDAMENTE<br />
ÀS RESTRIÇÕES<br />
E DESAFIOS QUE ESTA<br />
CRISE NOS IMPÕE,<br />
BEM COMO AOS<br />
NOSSOS NEGÓCIOS<br />
Vasco Grilo,<br />
Hovione<br />
aérea da empresa, onde os preços subiram<br />
significativamente.<br />
Por outro lado, a área de compras e<br />
procurement tem implementado um processo<br />
de gestão de risco, monitorizando o risco de<br />
interrupção dos seus fornecedores globais,<br />
e apoiado pela variedade de estratégias de<br />
mitigação que adoptaram. “A proximidade com<br />
fornecedores críticos e stakeholders internos<br />
tem sido fundamental, e as compras estão<br />
cada vez mais envolvidas no planeamento e<br />
gestão de projectos, garantido a continuidade<br />
do fornecimento”, explica o responsável.<br />
Esta crise mostra que é necessário continuar<br />
a apostar na gestão do risco, avaliar a<br />
pegada geográfica dos fornecedores e ainda<br />
desenvolver estratégias para mitigar impactos<br />
negativos no futuro.<br />
Pedro Carmo termina afirmando que<br />
“não sabemos o dia de amanhã, mas<br />
adaptar-nos-emos rapidamente às restrições<br />
e desafios que esta crise nos impõe, bem<br />
como aos nossos negócios”. •
SCM Supply Chain Magazine 43
44<br />
INTRALOGÍSTICA<br />
Descomplicar<br />
a ‘last mile’<br />
ECONOMIA<br />
COLABORATIVA<br />
NA ÚLTIMA MILHA:<br />
OPORTUNIDADE<br />
OU RISCO?<br />
Em tempos de confinamento<br />
forçado que o consumidor<br />
vive por causa da crise do<br />
coronavírus, o e-commerce<br />
(principalmente de alimentos)<br />
observa um claro e marcado<br />
crescimento. Neste cenário<br />
inesperado de crescimento<br />
exponencial, a última milha<br />
tem ainda mais relevância e<br />
os modelos operacionais de<br />
entrega são cruciais para as<br />
grandes superfícies.
SCM Supply Chain Magazine 45<br />
Fernando Penteado, Senior Supply Chain Manager com larga experiência em multinacionais de FMCG<br />
No entanto, como em todos os processos<br />
(ou ciclos) de modernização, as relações<br />
económicas entre empregados e<br />
empregadores são as mais afetadas, seja<br />
pelas melhorias implementadas pelos novos<br />
métodos produtivos que substituem as<br />
atividades antes executadas por operários, ou<br />
pela troca dos processos derivados da mesma<br />
modernização.<br />
As operações de logística e distribuição,<br />
dependentes de mão-de-obra intensiva,<br />
geralmente são afetadas de maneira severa<br />
por este tipo de mudança nos meios de<br />
produção, e, embora a logística 4.0 seja<br />
o principal tema nos dias atuais, com a<br />
automatização dos processos e utilização de<br />
robôs nos processos operativos, quero abordar<br />
outro tópico, talvez não tão claro ou fácil de<br />
tratar, mas bastante significativo do ponto<br />
de vista das relações de trabalho que é o uso<br />
da economia colaborativa nos processos de<br />
última milha.<br />
É facto que a população urbana se encontra<br />
em constante crescimento, especialmente<br />
nos países em desenvolvimento, (estima-se<br />
que em 2050: dos 9 mil milhões de habitantes<br />
da terra, 6,4 mil milhões viverão em áreas<br />
urbanas), em contrapartida o crescimento<br />
do e-commerce no mundo gira em torno dos<br />
+20% ao ano, com mais de 70 mil milhões de<br />
entregas e em constante crescimento, fazendo<br />
com que a logística de última milha se torne<br />
cada vez mais complexa com uma verdadeira<br />
explosão da procura por entregas fracionadas<br />
nas cidades.<br />
Ainda mais complexo são os requerimentos<br />
dos clientes atuais, geralmente difusos e, por<br />
que não, um pouco utópicos. Se por um lado,<br />
a nova geração de consumidores está ciente<br />
do seu impacto ambiental, controla com muito<br />
mais cuidado e tenta compensar o máximo<br />
possível as suas “emissões” de CO2, seja em<br />
passagens aéreas ou mesmo na compra de<br />
produtos reciclados; está mais disposto a<br />
pagar mais por produtos ECO & BIO, e é muito<br />
mais cuidadoso com a reciclagem, por outro<br />
lado, exige entregas grátis nas suas compras,<br />
requer menores prazos de entrega, solicita<br />
acompanhamento constante (e às vezes até<br />
insano) da situação das suas entregas e uma<br />
flexibilidade quase ilimitada na troca do local<br />
de entrega a cada minuto.<br />
De acordo com a análise de Dimas<br />
Gimeno, empresário com mais de 18 anos de<br />
experiência no setor de bens de consumo, e<br />
que presidiu o El Corte Inglés entre 2014 e<br />
2018: O aumento das vendas do e-commerce,<br />
a coroação da velocidade da Amazon como<br />
o padrão ouro de excelência e a crescente<br />
disposição dos consumidores de pagar um<br />
pouco mais pelo transporte ultra rápido,<br />
abastecem a tempestade perfeita que está a<br />
revolucionar a última milha.
46<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
ÚLTIMA MILHA E REVOLUÇÃO 4.0<br />
E é exatamente aí, nesta confluência de<br />
variáveis que proliferam as soluções de<br />
Economia Colaborativa, tanto como opção<br />
alternativa para a entrada de mercadorias nos<br />
centros urbanos com cada vez mais restrições<br />
(ex. Madrid, Londres, etc.), mas também<br />
como oportunidade para obter rendimentos<br />
adicionais para pessoas, que por um motivo<br />
ou outro, viram as suas ocupações desaparecer<br />
na última “revolução” tecnológica.<br />
A internet e as novas tecnologias<br />
promoveram modelos alternativos de consumo<br />
nos últimos anos. A relação entre quem<br />
oferece um produto ou serviço e quem tem<br />
uma necessidade específica está a mudar<br />
significativamente. A economia colaborativa,<br />
que se baseia em emprestar, alugar, comprar<br />
ou vender produtos em função de necessidades<br />
específicas e não tanto em benefícios<br />
económicos. De facto, nesse sistema, o dinheiro<br />
pode não ser o único valor de troca para as<br />
transações.<br />
Os serviços são considerados troca de<br />
mercadorias. Por exemplo, uma pessoa que<br />
pode oferecer acomodação a outra durante<br />
alguns dias, pode trocar esse serviço por aulas<br />
de inglês ou francês. Como o próprio nome<br />
sugere, é um modelo focado na colaboração<br />
e na ajuda mútua. Este fenómeno também é<br />
definido por alguns teóricos como “Uberização”,<br />
nome derivado da empresa de transporte.<br />
No início dos anos 2000, quando iniciei<br />
a minha carreira na Avon Cosméticos, a<br />
tendência dos negócios em tempos de crise foi<br />
de crescimento, uma vez que muitas pessoas<br />
desempregadas migraram para alternativas<br />
individuais de microempresas como é o caso<br />
das vendas de catálogo. Algo semelhante com<br />
o que vemos agora com aqueles que usam<br />
APP’s de entrega como complemento da sua<br />
renda, fornecendo tudo, desde entrega de<br />
alimentos até pacotes eletrónicos de entrega<br />
porta-a-porta. Embora não possamos dizer<br />
que é o trabalho dos sonhos, em muitos casos<br />
permitem garantir a renda básica para sustentar<br />
uma família, além de permitir horários de<br />
trabalho mais flexíveis.<br />
O modelo operacional de entrega por meio<br />
de distribuidores independentes tornou-se<br />
uma (ou a principal) solução para garantir<br />
uma entrega eficaz e de “baixo” custo pelas<br />
organizações. Estabelecendo um contrato com<br />
um único intermediário é possível coordenar<br />
a recolha e entrega de mercadorias, tanto<br />
nas lojas como em pontos de consolidação<br />
em poucas horas, sem a necessidade de<br />
mão-de-obra fixa ou reforçar a quantidade<br />
de distribuidores em determinados slots. Em<br />
muitos casos, este modelo de negócio é o que<br />
impulsiona o que chamamos de e-commerce de<br />
alimentos frescos, possibilitando as entregas<br />
em poucas horas em zonas urbanas, de mota,<br />
bicicletas ou a pé.
SCM Supply Chain Magazine 47<br />
CONCLUSÕES<br />
As expectativas dos consumidores mudaram<br />
drasticamente nos últimos anos. Como<br />
resultado, algumas mudanças importantes<br />
tiveram que ser aceites no setor de logística<br />
e entrega personalizada. Os retalhistas<br />
também tiveram que encontrar formas de<br />
adaptação. Espera-se que a procura aumente<br />
significativamente, dada a atraente proposta<br />
de valor de entrega no mesmo dia para os<br />
consumidores.<br />
O mercado para entregas “same day”<br />
é impulsionado por tendências macro<br />
subjacentes, incluindo o aumento do PIB per<br />
capita, a rápida adoção do comércio eletrónico,<br />
a urbanização e as mudanças nas expectativas<br />
dos consumidores. Assim mesmo, a entrega<br />
no mesmo dia requer uma massa crítica<br />
de consumidores com recursos financeiros<br />
suficientes para pagar por esse serviço<br />
premium.<br />
Num cenário económico e político cada<br />
vez mais conturbado, as estratégias de<br />
otimização e redução de custos tornamse<br />
essenciais para responder aos clientes<br />
e à sobrevivência das empresas. Fazendo<br />
a operação por meio de plataformas de<br />
Economia Colaborativa como as APP’s são,<br />
mais do que uma tendência, uma necessidade.<br />
Por outro lado, é responsabilidade do poder<br />
público, garantir as condições mínimas pelas<br />
quais essas operações devem ser realizadas,<br />
mediando e legislando sobre o tema, uma<br />
vez que, optando por um modelo neoliberal<br />
puro, com mínima intervenção do Estado,<br />
uma situação de predominância do poder do<br />
capital, enquanto a regulamentação excessiva<br />
provavelmente favorecerá uma migração para<br />
a informalidade. Como em tudo na vida, a<br />
chave é encontrar o equilíbrio.<br />
Por fim, é crucial que cada atividade ou<br />
iniciativa realizada esteja alinhada com<br />
os valores éticos e profissionais. Como<br />
profissionais de Logística e Supply Chain<br />
é nossa responsabilidade garantir o bem-estar<br />
de todos os envolvidos nas operações,<br />
sejam intra-logística ou última milha.<br />
O bem-estar dos colaboradores e dos<br />
prestadores de serviço deve ser o “Fiel<br />
da Balança” contra qualquer iniciativa de<br />
otimizar tempos e custos. •
48<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
Texto: Fábio Santos<br />
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de pandemia<br />
A nova pandemia de coronavírus espalha pelo<br />
mundo um clima de incerteza: falsa segurança,<br />
não sabemos quando irá tudo realmente ficar<br />
bem – apesar de o dizermos -, desconfiança<br />
de tudo e todos… A melhor solução para<br />
evitar a propagação é ficar em casa, e isso<br />
obrigou muitos negócios a repensar os seus<br />
modelos para se tentarem adaptar às novas<br />
necessidades dos consumidores. A resposta…<br />
está no digital.
SCM Supply Chain Magazine 49
50<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
D<br />
e um momento para o outro, o mundo<br />
parou. Os estabelecimentos comerciais<br />
começaram a fechar, muitas empresas<br />
entraram em lay-off, os consumidores<br />
saíam apenas por maior necessidade e o<br />
e-commerce, como nunca se tinha visto no<br />
nosso país, cresceu repentinamente. De um<br />
momento para o outro todos precisávamos<br />
de fazer as nossas compras online e que a<br />
entrega fosse feita em nossa casa, evitando<br />
mesmo os pick-up points… E nem todas as<br />
empresas estavam preparadas para isso.<br />
Quando foi decretado o estado de<br />
emergência surgiu o grande aumento<br />
das encomendas online. O Continente<br />
Online, o Mercadão e Auchan Online<br />
foram alguns dos casos de retalhistas que<br />
foram sobrecarregados com encomendas,<br />
especialmente de bens de primeira<br />
necessidade, e as entregas chegaram a atrasar<br />
semanas em determinadas regiões, por falta<br />
de soluções de transporte que conseguissem<br />
responder a este crescimento inesperado.<br />
CASOS DE LOJAS NÃO<br />
PRESENTES NO ONLINE<br />
Por outro lado, retalhistas que não contavam<br />
com loja online para servir os seus clientes,<br />
rapidamente procuraram acompanhar as<br />
necessidades do mercado, através de parcerias<br />
com outras empresas ou mesmo desenvolvendo<br />
plataformas próprias. Caso disso foi o Grupo<br />
DIA, que não tendo uma plataforma virtual para<br />
as suas lojas Minipreço e Clarel, estabeleceu<br />
uma parceria com a Glovo para integrar os<br />
seus produtos na aplicação da empresa de<br />
distribuição, disponíveis sete dias por semana.<br />
Miguel Guinea, presidente-executivo da<br />
DIA Portugal, comenta que “com esta parceria<br />
estamos a reforçar o nosso compromisso<br />
com os clientes das lojas Minipreço e Clarel,<br />
agilizando entregas em casa numa fase tão<br />
crítica para a segurança e bem-estar de todos.<br />
Estamos a adoptar as melhores ferramentas em<br />
tempo recorde para dar as respostas adequadas
SCM Supply Chain Magazine 51<br />
aos nossos clientes para que continuem a poder<br />
contar sempre connosco”.<br />
Segundo avança o retalhista, ambas as<br />
empresas reforçaram os cuidados a ter com<br />
produtos, nomeadamente em termos de<br />
higienização e equipamentos para o seu<br />
manuseamento. Tanto na preparação como na<br />
entrega dos produtos os profissionais são agora<br />
munidos de luvas e máscaras. O entregador fica<br />
responsável por deixar a encomenda à porta<br />
do cliente com uma distância mínima de dois<br />
metros e por assinar em seu nome, eliminando<br />
qualquer contacto físico.<br />
INDÚSTRIA LANÇA-SE NO ONLINE<br />
Também a indústria começou a procurar estas<br />
novas soluções. Numa parceria com a Glovo e<br />
com a Uber Eats, a Unilever FIMA criou “O Seu<br />
Mercado”, uma loja online onde os clientes<br />
encontram produtos das suas principais marcas,<br />
como Dove, Skip, Comfort, CIF, Knorr, Calvé,<br />
Lipton e Olá, e os podem receber em casa.<br />
A fabricante de bens de consumo procurou<br />
desta forma que os clientes que estavam de<br />
quarentena continuassem a ter acesso aos seus<br />
produtos de primeira e segunda necessidade<br />
sem que estes tivessem de sair de casa e<br />
evitando ter de esperar por entregas mais<br />
morosas devido ao congestionamento pelo qual<br />
o país se encontrava a passar. Nesta primeira<br />
fase, as entregas só estavam disponíveis na<br />
zona de Lisboa, mas a empresa estimava uma<br />
demora de meia hora na entrega ao domicílio.<br />
Devido à pandemia que está a afectar o<br />
mundo, as medidas de higiene e segurança<br />
tomadas pelas transportadoras também foram<br />
factores importantes para a parceria, e isso foi<br />
muito visível e defendido pelas empresas que<br />
procuravam uma solução de transporte viável e<br />
segura para os seus clientes.<br />
FARMÁCIAS AO DOMICÍLIO<br />
Através de uma parceria entre a Associação<br />
Nacional de Farmácias (ANF) e os CTT,<br />
os portugueses passaram a poder contar<br />
com um serviço de entrega de medicamentos<br />
ao domicílio, em qualquer parte do país.<br />
Os cidadãos podem fazer encomendas por<br />
e-mail ou telefone, e receber os medicamentos<br />
temporariamente indisponíveis na farmácia<br />
directamente em casa, sem necessitarem de se<br />
deslocar novamente e “facilitar a quarentena<br />
dos portugueses”, revelaram as entidades.<br />
O serviço está preparado para responder a<br />
receitas médicas e a outras necessidades de<br />
medicamentos e produtos de saúde, sendo a<br />
entrega garantida no dia seguinte no caso de<br />
realizarem as encomendas até às 16 horas.<br />
ASSOCIAÇÕES<br />
TAMBÉM NO DIGITAL<br />
A Associação Nacional de Transportadores<br />
Públicos Rodoviários de Mercadorias (ANTRAM)<br />
também lançou a sua loja online no final<br />
de <strong>Abril</strong>, facilitando o acesso a produtos e<br />
serviços essenciais à sua actividade diária que<br />
a associação vendia nas suas instalações<br />
COM ESTA PARCERIA ESTAMOS A<br />
REFORÇAR O NOSSO COMPROMISSO<br />
COM OS CLIENTES DAS LOJAS<br />
MINIPREÇO E CLAREL, AGILIZANDO<br />
ENTREGAS EM CASA NUMA FASE<br />
TÃO CRÍTICA PARA A SEGURANÇA<br />
E BEM-ESTAR DE TODOS<br />
Miguel Guinea,<br />
presidente-executivo da DIA Portugal
52<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
a clientes e associados. Entre estes podemos<br />
encontrar máscaras, viseiras e desinfectantes,<br />
como forma de protecção do Covid-19, e ainda<br />
guias de transporte, CMR, livretes de controlo<br />
(individuais e de registo), blocos de prontosocorro<br />
e até tacógrafos.<br />
A ANTRAM explica que este lançamento<br />
se enquadra na estratégia de fortalecimento<br />
da relação de proximidade aos seus clientes<br />
e associados, dando resposta imediata às<br />
necessidades dos clientes e aos inúmeros<br />
pedidos.<br />
MUNICÍPIOS APOIAM<br />
PRODUTORES LOCAIS<br />
NO ONLINE<br />
No distrito de Coimbra, o concelho de<br />
Cantanhede anunciou a criação de uma<br />
plataforma de comercialização de produtos<br />
agrícolas e pecuários locais chamada “Da<br />
Terra À Mesa”, dinamizada pelo Gabinete<br />
Municipal de Apoio ao Agricultor e tendo como<br />
finalidade ajudar a economia local.<br />
O município explica que ao mesmo tempo<br />
que procura criar um circuito mais curto de<br />
“ESTES ALIMENTOS<br />
JÁ SE ENCONTRAM<br />
COMPLETAMENTE<br />
ADAPTADOS AO CLIMA,<br />
PRAGAS E SOLOS”<br />
comércio, promovendo o contacto directo<br />
com o produtor e o consumidor, também<br />
possibilita “um eficaz escoamento da<br />
produção, contribuindo para um aumento<br />
significativo da qualidade de vida dos<br />
agricultores”.<br />
A fonte também defende que os “estes<br />
alimentos já se encontram completamente<br />
adaptados ao clima, pragas e solos,<br />
completamente adaptados ao clima, pragas<br />
e solos, exigindo por isso a aplicação<br />
de uma menor quantidade de produtos<br />
fitofarmacêuticos e fertilizantes, apresentando-<br />
-se assim mais naturais, beneficiando com<br />
isso a saúde dos consumidores e o bolso dos<br />
produtores”.
Terreno Industrial<br />
ZONA INDUSTRIAL DE LINHÓ (SINTRA)<br />
85.000 m 2<br />
• INDÚSTRIA<br />
• LOGÍSTICA<br />
• RETAIL<br />
Próximo:<br />
- Autodromo do Estoril<br />
- Zona Industrial da Beloura<br />
- Centro Logístico LIDL<br />
Contacto:<br />
terreno.landlog@gmail.com
54<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
FORMAÇÕES, CONFERÊNCIAS<br />
E SEMINÁRIOS<br />
As plataformas de videoconferências e de<br />
streaming foram das principais beneficiárias com<br />
a chegada do COVID-19. Devido à pandemia e à<br />
necessidade de um maior distanciamento social,<br />
deu-se a evolução para um formato digital,<br />
igualmente eficaz em diversos negócios das<br />
áreas de formação e de criação de eventos.<br />
Muitas empresas que tinham ofertas<br />
formativas também aproveitaram para alterar<br />
o modelo em que funcionavam, como foi<br />
também o nosso caso. Através da Flow Training<br />
Academy, a SCM também disponibilizava<br />
formação in-house com profissionais<br />
certificados e experientes.<br />
É importante que as empresas mantenham<br />
os seus colaboradores activos e, agora que<br />
limitados devido a lay-offs ou em teletrabalho,<br />
que continuem a investir nas suas pessoas<br />
enquanto elementos diferenciadores.<br />
Ao nível das conferências e seminários,<br />
foram modelos que também requereram uma<br />
adaptação virtual. Tal como nas formações,<br />
as ideias foram passadas em streaming, mas<br />
a interacção com o público passou a ser feita<br />
maioritariamente através de comentários<br />
escritos em caixas de texto, ou chats.
SCM Supply Chain Magazine 55<br />
MARKETPLACES<br />
No caso do KuantoKusta, o comparador de<br />
preços que há cerca de ano e meio evoluiu<br />
também para Marketplace apresentou, apenas<br />
durante o mês de <strong>Abril</strong>, 6,5 milhões de visitas,<br />
o que representa um crescimento de 130%,<br />
esperando terminar o ano com 65 milhões<br />
de visitas. Segundo revelou, tratou-se de um<br />
aumento homólogo “sem precedentes”, e<br />
destaca que este aumento se deu, em grande<br />
parte, ao confinamento imposto pela pandemia.<br />
Com este aumento de visitas, as expectativas<br />
iniciais de terminarem o ano com receitas no<br />
valor de 4,5 milhões de euros subiram para os<br />
cinco milhões.<br />
Também o Dott, o marketplace que surgiu<br />
da parceria dos CTT com a Sonae, apresentou<br />
um aumento no número de empresas<br />
registadas, tendo o número duplicado entre<br />
Março e <strong>Abril</strong>. De acordo com Gaspar D’Orey,<br />
presidente executivo da plataforma, através<br />
de uma entrevista à Lusa, o número de<br />
registos quintuplicou, mas explica que é feita<br />
uma selecção dos candidatos.<br />
Desde o início do ano que a empresa<br />
tem vindo a duplicar as vendas, tendo atingido<br />
o pico na primeira semana de <strong>Abril</strong>.<br />
O QUE MUDOU?<br />
Nos últimos meses muita coisa mudou,<br />
mas todas elas interligadas. As empresas<br />
foram forçadas a avançar para um nível a que,<br />
em grande parte, ainda não tinham chegado,<br />
e os hábitos dos consumidores também<br />
evoluíram. Apesar de todo o lado negativo,<br />
a pandemia também veio acelerar a entrada<br />
de muitas empresas no digital,<br />
disponibilizando mais serviços à distância,<br />
testando modelos diferentes e novas formas<br />
de fazer o que já era feito antes.<br />
Reinventar é a palavra-chave. Aderir às<br />
novas tecnologias para reformular o nosso<br />
negócio e a forma como ele é feito pode ser<br />
um grande passo para atingir um fim maior,<br />
e este período em que as pessoas ficaram<br />
em casa para evitar a propagação do vírus<br />
foi uma grande oportunidade para muitas<br />
empresas. •
56<br />
Texto: Ana Paiva<br />
TECNOLOGIA<br />
TECNOLOGIAS<br />
O papel da tecnologia<br />
no combate ao<br />
coronavírus<br />
CORONAVÍRUS<br />
Sabemos que o futuro passará pela tecnologia. Contudo, em cenário de pandemia, o conceito de<br />
“futuro” é um pouco incerto. Recorrendo aquilo que temos a certeza, o presente, a tecnologia tem<br />
vindo a mostrar-se bastante útil naquela que é a batalha contra a COVID-19. Desde impressão 3D,<br />
a equipamentos que permitem a realização de testes e soluções que podem ajudar na gestão de<br />
tudo isto. No meio de todo o caos, há uma certeza: todos os esforços são necessários.<br />
S<br />
abe-se que várias empresas substituíram<br />
as suas produções por equipamentos<br />
de protecção destinados a ajudar os<br />
profissionais de saúde de todo o mundo no<br />
combate à pandemia COVID-19. Muitos<br />
sectores reinventaram por completo o seu<br />
modelo de negócio e alinharam-se para<br />
poderem dar resposta numa altura de grande<br />
procura. No caso da área da tecnologia,<br />
aconteceu o mesmo, utilizando-a como<br />
principal recurso para também desenvolver<br />
equipamentos de protecção ou apenas ajudar<br />
de alguma forma.<br />
Em Portugal, a comunidade tecnológica<br />
juntou-se para criar uma solução de forma<br />
a ajudar o país a lidar com o desafio desta<br />
pandemia: o Tech4Covid19. O projecto<br />
surgiu a partir de uma conversa informal<br />
entre fundadores de start-ups tecnológicas<br />
e envolve agora 120 empresas, entre elas<br />
AdClick, Deloitte, Farfetch, entre outras,<br />
e mais de 600 pessoas de áreas distintas,<br />
como ciber-segurança, saúde, manutenção,<br />
recursos humanos, consultoria, serviços<br />
na nuvem, comércio electrónico ou<br />
dispositivos médicos.
SCM Supply Chain Magazine 57<br />
O Tech4Covid19 já conta com 12<br />
projectos em desenvolvimento e um deles<br />
é o Trackcovid, que visa identificar locais e<br />
pessoas infectadas, ou com essa possibilidade,<br />
prevendo redes de contágio. Além disso,<br />
pretende ainda “facilitar videochamadas<br />
entre médicos e doentes; criar uma rede de<br />
suporte a médicos e enfermeiros deslocados<br />
ou a pessoas que simplesmente necessitam<br />
de ajuda para ir às compras ou à farmácia;<br />
ou disseminar informação de recrutamento e<br />
coordenação de profissionais de saúde”, refere<br />
o movimento ao jornal Público.<br />
Esta plataforma tem também como<br />
objectivo acelerar a compra de material<br />
hospitalar e lançar um crowdfunding para o<br />
adquirir, bem como “criar um sistema que<br />
permita à população verificar sintomas<br />
sem necessidade de ir ao médico e criar um<br />
chatbot para serem tiradas dúvidas dos apoios<br />
concedidos pelo Estado às empresas e às<br />
pessoas singulares”.<br />
Tendo já estabelecido contacto com<br />
profissionais de saúde e entidades como a<br />
Direcção Geral da Saúde (DGS), os Serviços<br />
Partilhados do Ministério da Saúde e as<br />
Administrações Regionais de Saúde, o projecto<br />
está a preparar-se para entrar em acção<br />
segundo as necessidades que o país enfrenta<br />
actualmente, sem correr o risco de criar<br />
obstáculos às operações já em curso.<br />
O Tech4Covid19 ressalva que este não é um<br />
projecto B2B ou B2C, mas sim H2H, ou seja,<br />
Human to Human.
58<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
O RECURSO À IMPRESSÃO 3D<br />
CRIAR UM SISTEMA QUE<br />
PERMITA À POPULAÇÃO<br />
VERIFICAR SINTOMAS SEM<br />
NECESSIDADE DE IR AO MÉDICO<br />
E CRIAR UM CHATBOT PARA<br />
SEREM TIRADAS DÚVIDAS<br />
DOS APOIOS CONCEDIDOS<br />
PELO ESTADO ÀS EMPRESAS<br />
E ÀS PESSOAS SINGULARES”,<br />
TECH4COVID19<br />
O TECH4COVID19 RESSALVA<br />
QUE ESTE NÃO É UM<br />
PROJECTO B2B OU B2C,<br />
MAS SIM H2H, OU SEJA,<br />
HUMAN TO HUMAN<br />
De que forma é que uma empresa de<br />
consultoria de engenharia poderia ajudar a<br />
combater o vírus? Fácil. A Fan 3D, normalmente,<br />
presta apoio à indústria na impressão 3D mas<br />
agora utilizam esse conhecimento, bem como<br />
as impressoras que têm à disposição, para criar<br />
viseiras de protecção.<br />
Eurico Assunção, responsável pela empresa,<br />
conta ao Observador que um colega do<br />
Centro Nacional de Saúde lhe confessou que<br />
havia falta de equipamento, e rapidamente<br />
foi verificar se havia alguma solução para<br />
impressão 3D. A 19 de Março já estavam a<br />
produzir as primeiras viseiras para o Hospital<br />
de Setúbal. Após isto, mais empresas quiseram<br />
ajudar a distribuí-las e em menos de uma<br />
semana “o projecto deixou de ser uma coisa só<br />
nossa [da equipa da Fan 3D]”, refere.<br />
As viseiras impressas estão a ter uma grande<br />
procura, visto que já estão presentes em vários<br />
hospitais, como o Garcia da Orta, o de Almada<br />
e da Guarda, o IPO do Porto e até no Centro de<br />
Saúde do Pinhal Novo.<br />
Também com recurso a impressão 3D, os<br />
centros de pesquisa da HP em Espanha e nos<br />
Estados Unidos estão a conceber protectores<br />
faciais, ajustadores de máscaras, cotonetes<br />
nasais, abridores de portas de sistemas mãoslivres<br />
e peças para ventiladores para entregar a<br />
hospitais locais.<br />
Como se tem registado uma grande procura<br />
por equipamentos de protecção, a HP reuniu<br />
esforços com a comunidade global da indústria<br />
digital de forma a ajudar os profissionais de<br />
saúde. Estes centros de I&D estão a colaborar<br />
com parceiros de todo o mundo para aumentar<br />
a produção.<br />
A HP está ainda a preparar ficheiros de design<br />
validados das peças que, em breve, estarão
SCM Supply Chain Magazine 59<br />
disponíveis para download gratuito.<br />
A impressão 3D tem sido um recurso<br />
fortemente utilizado pelas empresas nesta<br />
altura de pandemia. A Airbus, em Espanha,<br />
também passou a produzir viseiras através<br />
desta tecnologia para entregar aos profissionais<br />
de saúde. Neste caso, são mais de 20<br />
impressoras que estão a funcionar, tendo<br />
originado centenas de material de protecção<br />
individual. A empresa utiliza um desenho<br />
patenteado para fabricar as armações das<br />
viseiras, e plásticos PLA.<br />
O Airbus Protospace Alemanha e o Airbus<br />
Composite Technology Centre (CTC), em<br />
conjunto com a network de impressão 3D<br />
A FAN 3D, NORMALMENTE,<br />
PRESTA APOIO À<br />
INDÚSTRIA NA IMPRESSÃO<br />
3D MAS AGORA UTILIZAM<br />
ESSE CONHECIMENTO, BEM<br />
COMO AS IMPRESSORAS<br />
QUE TÊM À DISPOSIÇÃO,<br />
PARA CRIAR VISEIRAS<br />
DE PROTECÇÃO
60<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
‘Mobility goes Additive’, estão também a<br />
trabalhar para este projecto, fazendo chegar o<br />
material a Madrid.<br />
Neste caso, a tecnologia foi utilizada para<br />
outro objectivo distinto. Na Alemanha, o<br />
consórcio da Bosch desenvolveu um teste<br />
rápido para detectar o COVID-19, fornecendo<br />
os resultados em duas horas e meia após a sua<br />
realização.<br />
Por norma, os pacientes necessitam de<br />
esperar entre dois e três dias para saber se<br />
testam positivo ou não, mas neste caso é<br />
bem mais rápido. O teste é realizado através<br />
de um dispositivo desenvolvido pela Bosch,<br />
denominado Vivalytic, e pode diagnosticar<br />
simultaneamente 10 agentes patógenos,<br />
correspondendo aos requisitos da OMS.<br />
Com um único aparelho, podem ser<br />
realizados 10 testes ao longo de 24 horas,<br />
o que significa que, com 100 dispositivos,<br />
todos os dias podem ser realizados<br />
1.000 testes.<br />
Segundo a empresa, é o primeiro<br />
procedimento totalmente automatizado que<br />
pode ser usado directamente em hospitais<br />
e consultórios médicos.<br />
No combate ao coronavírus, todos nós temos<br />
um papel a desempenhar, incluindo as várias<br />
áreas e sectores. A tecnologia encontrou a<br />
maneira perfeita de fazer proveito dos seus<br />
recursos para marcar a diferença, ajudando<br />
o sistema de saúde, bem como os profissionais<br />
que estão na linha da frente. Nesta fase,<br />
toda a ajuda é bem-vinda. •<br />
C<br />
M<br />
Y<br />
CM<br />
MY<br />
CY<br />
CMY<br />
K
SCM Supply Chain Magazine 61<br />
TECNOLOGIA<br />
COMO SE TEM<br />
REGISTADO UMA<br />
GRANDE PROCURA<br />
POR EQUIPAMENTOS<br />
DE PROTECÇÃO, A HP<br />
REUNIU ESFORÇOS<br />
COM A COMUNIDADE<br />
GLOBAL DA<br />
INDÚSTRIA DIGITAL<br />
DE FORMA A AJUDAR<br />
OS PROFISSIONAIS<br />
DE SAÚDE<br />
Supply Chain Anúncio ADV Supply Chain Management.pdf 1 07/05/<strong>2020</strong> 15:16:12<br />
APPLIED ONLINE | POST-GRADUATE<br />
SUPPLY CHAIN MANAGEMENT<br />
OUT. <strong>2020</strong><br />
%<br />
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rita.anjos@iscte-iul.pt<br />
Professor Catedrático de<br />
Operações e Logistica<br />
no ISCTE-IUL
62<br />
TRANSPORTE<br />
Transporte<br />
de mercadorias<br />
e o surto de COVID-19<br />
Texto: Fábio Santos<br />
TRANSPORTE DE<br />
MERCADORIAS<br />
ENFRENTA A<br />
PANDEMIA<br />
Com o crescimento sentido em diversos<br />
sectores, a necessidade de movimentar bens<br />
também aumentou exponencialmente.<br />
Desde a entrega de produtos de primeira e<br />
segunda necessidade para o retalho até ao<br />
destino final, o transporte tem um papel<br />
acrescido na logística, especialmente nesta<br />
altura em que as pessoas evitam sair de<br />
casa. Este foi um dos sectores importantes<br />
para o sucesso na retenção da pandemia,<br />
e que tiveram de adaptar novas normas de<br />
segurança.
SCM Supply Chain Magazine 63<br />
pelos canais de venda de bens de primeira<br />
e segunda necessidade. Lojas virtuais de<br />
retalhistas sentiram uma subida repentina<br />
na procura por produtos, especialmente do<br />
sector alimentar, à qual não conseguiram<br />
responder com os meios de que dispunham, e<br />
isso resultou em dias e semanas de espera por<br />
encomendas.<br />
NOVAS OPORTUNIDADES<br />
PARA OS TRANSPORTES<br />
Desde que o surto de coronavírus foi<br />
considerado uma pandemia, e que foi<br />
declarado o estado de emergência a<br />
nível nacional, que o sector dos transportes<br />
tem enfrentado um grande aumento na sua<br />
actividade habitual. As pessoas precisaram de<br />
ficar confinadas nas suas casas e só deveriam<br />
sair em caso de maior necessidade, pelo que a<br />
reacção natural dos clientes foi o e-commerce,<br />
e então a actividade dos transportadores<br />
aumentou.<br />
A verdade é que ninguém esperava um<br />
aumento tão instantâneo, e começou logo<br />
Enquanto a Uber Eats aumentava os pedidos de<br />
comida em casa, por outro lado, a Uber tinha<br />
menos clientes para transportar, pois estes<br />
estavam em casa. A empresa criou um serviço<br />
para os retalhistas chamado Uber Drop-Off,<br />
de modo a conseguir reaproveitar os seus<br />
motoristas em prol das empresas que precisam<br />
de levar as suas encomendas até casa dos<br />
clientes em pouco tempo.<br />
Ao mesmo tempo, a Uber Eats também<br />
procurou adaptar-se a este momento e<br />
incluir no seu catálogo um novo conceito<br />
de transporte de pequenas mercearias, mais<br />
precisamente produtos de conveniência, serviço<br />
de que a concorrente Glovo já dispunha.<br />
Também a Bolt, antiga Taxify, lançou um<br />
serviço semelhante ao Uber Drop-Off, o Bolt<br />
Business Delivery, que tal como o serviço<br />
concorrente, também torna os motoristas da<br />
empresa em estafetas de entregas, estando<br />
este disponível para empresas de diversos<br />
sectores, como restaurantes, supermercados,<br />
farmácias, lojas de roupa ou de outro tipo de<br />
e-commerce, ficando ainda responsável por<br />
gerir as recolhas e entregas das encomendas de<br />
curta distância ou devolução de produtos.<br />
Os pedidos são feitos através de uma<br />
plataforma intuitiva, onde é possível adicionar
64<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
as entregas através de um documento CSV, ou<br />
manualmente através de um formulário, sendo<br />
possível escolher quando pretendem que o<br />
artigo seja recolhido, se de imediato ou nas<br />
48 horas seguintes. Também está disponível<br />
uma opção multi-entrega, em que o estafeta<br />
gere várias encomendas numa única viagem.<br />
Tanto o cliente como a empresa podem<br />
acompanhar o estado do envio através de um<br />
sistema de tracking de encomendas actualizado<br />
constantemente, onde também é visível o<br />
tempo estimado de chegada e o contacto do<br />
estafeta.<br />
Nesta época várias empresas do sector dos<br />
transportes também têm feito mais parcerias<br />
com empresas para entregarem as suas<br />
mercadorias, como o caso dos CTT com a<br />
Associação Nacional de Farmácia (ANF) para<br />
a distribuição de medicamentos à porta dos<br />
pacientes, como forma de evitar que as pessoas<br />
saiam de casa durante a pandemia para irem à<br />
farmácia.<br />
NOVAS MEDIDAS DE SEGURANÇA<br />
Com uma pandemia à solta, as empresas de<br />
transporte também tiveram de se adaptar e<br />
implementar diversas medidas de segurança<br />
de modo a poderem zelar pelo bem estar dos<br />
seus colaboradores e clientes. Entre as medidas<br />
mais comuns podiam-se ver a introdução de<br />
máscaras e luvas ao equipamento diário dos<br />
motoristas. Relativamente à entrega last mile,<br />
esta passou a ser feita a uma maior distância<br />
do cliente ou deixada à sua porta, e passou a<br />
ser o entregador o responsável por assinar a<br />
recepção, de modo a não haver sequer contacto<br />
entre os envolvidos.<br />
Apesar das medidas adoptadas, em muitos<br />
casos os transportadores foram impedidos<br />
de fazer os seus carregamentos dentro dos<br />
armazéns, passando este a ser um pouco mais<br />
dificultado. E mais ainda quando as fronteiras<br />
foram fechadas e foram criados grandes<br />
afunilamentos entre os países.<br />
No caso das matérias perigosas, em <strong>Abril</strong><br />
o sector do transporte de matérias perigosas<br />
também sofreu algumas alterações legislativas,<br />
promulgadas por Marcelo Rebelo de Sousa.<br />
Estas novas regras são para o transporte por via<br />
terrestre, rodoviária e ferroviária, aplicando-se<br />
“às operações de transporte de mercadorias<br />
perigosas, incluindo as operações de carga e<br />
de descarga, as transferências de um modo de<br />
transporte para outro e as paragens exigidas<br />
pelas condições do transporte, realizadas<br />
nas vias do domínio público, bem como em<br />
quaisquer outras vias abertas ao trânsito<br />
público, excluindo-se as operações realizadas<br />
unicamente dentro do perímetro de uma ou<br />
várias empresas sem utilização de vias abertas<br />
ao trânsito público”.<br />
Entre outros critérios que devem ser<br />
verificados no desempenho das funções do<br />
sector, fica estabelecido que os transportadores<br />
de mercadorias perigosas têm de receber<br />
formação profissional, a ser ministrada por<br />
entidades formadoras do Sistema Nacional<br />
de Qualificações e reconhecida pelo Instituto<br />
da Mobilidade e dos Transportes Terrestres<br />
(IMTT), ficando estas encarregues de informar<br />
previamente o IMTT de todas as acções de<br />
formação a realizar.<br />
“A FERROVIA É<br />
COMPROVADAMENTE O MEIO<br />
DE TRANSPORTE MAIS<br />
AMIGO DO AMBIENTE”<br />
Carlos Vasconcelos,<br />
presidente da Medway
SCM Supply Chain Magazine 65<br />
SERVIÇOS DE HIGIENIZAÇÃO<br />
DOS TRANSPORTES<br />
Modelos de negócio foram-se destacando ou<br />
surgindo, graças à necessidade de limpeza e<br />
de higienização dos veículos de transporte e<br />
seus condutores. Caso disso foi a Reta Serviços<br />
Técnicos, S.A., pertencente ao Grupo Luís<br />
Simões que passou a disponibilizar serviços<br />
de desinfecção e higienização para camiões,<br />
tractores, semi-reboques e autocarros.<br />
O serviço geral de lavagem de viaturas da<br />
Reta varia em função do tipo de veículo, tipo<br />
de conjunto, interior ou exterior e tamanho da<br />
caixa, sendo feita com recurso a um produto que<br />
reduz de forma eficaz os vírus e as bactérias que<br />
possam estar em suspensão no ar, indicado pela<br />
Direcção Geral da Saúde (DGS).<br />
Food Service Logistics<br />
O seu parceiro de negócio<br />
HAVI.COM
66<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
ADAPTAÇÃO À NOVA REALIDADE<br />
A Airbus também adaptou os seus voos<br />
comerciais para o transporte de mercadorias<br />
nesta altura em que aumentaram as<br />
necessidades de transporte. Ao remover os<br />
lugares da classe económica dos seus aviões da<br />
família A330 e A350, a empresa irá conseguir<br />
responder de uma forma diferente à escassez<br />
generalizada de capacidade de carga nos<br />
porões, aproveitando o espaço para colocar<br />
paletes nos trilhos dos assentos. Ao mesmo<br />
tempo, esta solução chamada Airbus Service<br />
Bulletin permite dar resposta às necessidades<br />
de voos humanitários transportarem<br />
equipamentos médicos e outros produtos de<br />
primeira necessidade, onde são mais precisos,<br />
tanto no período de pandemia como após, pois<br />
a empresa já anunciou que irá manter este<br />
serviço.<br />
Por sua vez, no transporte marítimo, a Ocean<br />
Network Express (ONE) investiu na expansão<br />
da sua frota de contentores refrigerados, para<br />
o transporte de perecíveis, um investimento<br />
em mais 5.000 unidades refrigeradas, algumas<br />
das quais com a tecnologia de Controlo de<br />
Atmosfera incluída. Segundo a empresa, este<br />
investimento deve-se ao aumento que o sector<br />
tem tido, tanto no último ano (7%), como<br />
recentemente devido às recentes necessidades<br />
de transporte deste tipo de produtos,<br />
apresentando como principais segmentos o das<br />
frutas frescas e das proteínas, e espera-se que<br />
este crescimento continue até ao final do ano.<br />
Para além disso, a ONE também está a<br />
trabalhar na aplicação da tecnologia IoT na sua<br />
frota de contentores frigoríficos, permitindo<br />
visibilidade em tempo real de informações<br />
críticas, como a temperatura e a humidade no<br />
interior do contentor, de forma a melhorar a<br />
sua oferta no transporte de perecíveis.<br />
TRANSPORTE FERROVIÁRIO<br />
VOLTA A SER UMA OPÇÃO<br />
Em Portugal, há já alguns anos que a<br />
movimentação de mercadorias através de via<br />
ferroviária não era uma solução muito utilizada,<br />
sendo que o nosso país era dos que menos<br />
utilizava esta via quando comparado com<br />
outros países da Europa. Segundo os dados da<br />
Autoridade da Mobilidade e dos Transportes<br />
(AMT), em 2018 este sector apresentou um<br />
aumento de 65% no transporte de contentores<br />
e de 39% no transporte de coque e produtos<br />
petrolíferos refinados. Enquanto isso, a Medway<br />
aumentou para 86% a sua quota-parte do<br />
transporte total de mercadorias.<br />
Por parte da empresa, Carlos Vasconcelos,<br />
presidente da Medway, destaca que o<br />
transporte ferroviário é o mais seguro para<br />
enfrentar a pandemia, argumentando que<br />
apenas um comboio pode transportar a<br />
mesma carga que 40 camiões, e que em vez<br />
de movimentarem 40 motoristas para esse<br />
trabalho é apenas necessária uma equipa de<br />
duas pessoas.<br />
A Medway anunciou recentemente um<br />
Certificado Anual de Transporte Sustentável,<br />
a disponibilizar aos clientes que optem pelo<br />
comboio para o transporte de mercadorias<br />
e pretendam receber este selo, que informa<br />
quanto as empresas evitaram em termos de<br />
emissões de CO2 ao longo do ano ao utilizarem<br />
este método, auxiliando-as ao mesmo tempo a<br />
cumprir as suas metas ambientais.<br />
Carlos Vasconcelos afirma ainda que “a<br />
ferrovia é comprovadamente o meio de<br />
transporte mais amigo do ambiente”, e de<br />
acordo com os dados apresentados pela<br />
empresa, um comboio da Medway emite em<br />
média cerca de 6.0 kg CO2 eq/km, enquanto
SCM Supply Chain Magazine 67<br />
que a mesma quantidade de mercadorias<br />
num transporte rodoviário representa uma<br />
emissão de cerca de 20.4 kg CO2 eq/km, o<br />
que corresponde a uma redução de 71% das<br />
emissões de CO2 eq/km do comboio quando<br />
comparado com o camião.<br />
A Dachser, por sua vez, utilizou a Nova Rota<br />
da Seda para o transporte de químicos da BASF<br />
entre a Alemanha e a China, apresentando-a<br />
como uma alternativa viável e económica<br />
à via marítima, e apresentando ainda como<br />
vantagem o transporte para regiões rurais,<br />
longe de portos. O transporte demorou 14 dias<br />
a chegar a Xian, metade do que demoraria<br />
por via marítima, e envolveu 42 contentores<br />
carregados, sendo a Dachser responsável<br />
por toda a logística associada ao transporte,<br />
desde a coordenação com o operador RTSB,<br />
formalidades aduaneiras, e distribuição por via<br />
terrestre da mercadoria na China.<br />
As dificuldades logísticas que apresenta são<br />
ao nível da largura da via-férrea, pois oscila<br />
ao longo do trajecto, e os 42 contentores têm<br />
de ser recolocados em novos comboios na<br />
Polónia e na fronteira entre o Cazaquistão e a<br />
China, mas a alemã não vê isso como entraves.<br />
Thomas Krüger, Managing Director da Dachser<br />
Air & Sea Logistics EMEA, comenta que este<br />
método é “mais rápido do que o transporte<br />
marítimo, mais económico do que o aéreo, fácil<br />
de programar e seguro”, sendo assim “uma<br />
excelente alternativa ao transporte aéreo e<br />
marítimo”. Este serviço também se encontra<br />
disponível para clientes portugueses. •
68<br />
TRANSPORTE<br />
A caminho do<br />
“novo normal”<br />
COVID-19: UMA AGENDA<br />
PARA A RECUPERAÇÃO<br />
Queda abrupta da actividade económica e, em consequência, no sector<br />
do transporte, cancelamento de entregas, incerteza e preocupação com<br />
o bem-estar e saúde de todos… perante esta pandemia, uma economia<br />
global, em que a rede de elos de todos os elementos de uma extensa<br />
cadeia conhece pressão de todos os lados, confrontamo-nos com um<br />
enorme desafio. A Fuelsave faz um breve apanhado do que sabemos e do<br />
que precisamos saber sobre o vírus e as exigências que o mesmo coloca ao<br />
sector do transporte e logística, concentrando-se nas lições já aprendidas<br />
e sugerindo caminhos para uma transição para o “novo normal”.
SCM Supply Chain Magazine 69<br />
As cadeias de abastecimento e logística<br />
enfrentam consideráveis dúvidas sobre<br />
os impactos presentes e futuros causados<br />
pela pandemia do Covid-19, que coloca à<br />
prova a capacidade de resposta de todos os<br />
seus intervenientes.<br />
As principais consultoras estão a indicar<br />
o reforço e aceleração dos investimentos<br />
em projectos de digitalização como<br />
elemento facilitador da recuperação póscrise.<br />
Defendem que o investimento nestas<br />
pode ajudar na optimização da eficiência<br />
operacional e a percorrer o caminho para a<br />
recuperação plena.<br />
Numa economia global, onde os diferentes<br />
elos da cadeia estão distribuídos em rede<br />
pelos diferentes continentes, o contexto<br />
actual apresenta-se como um enorme desafio<br />
para a economia europeia.<br />
A maior parte das grandes empresas tem as<br />
suas cadeias de abastecimento desenhadas e<br />
optimizadas para flutuações normais da oferta<br />
e da procura. Estes cenários optimizados não<br />
levam em conta contingências como a que<br />
estamos a viver actualmente, com quebras<br />
AS PRINCIPAIS CONSULTORAS<br />
ESTÃO A INDICAR O<br />
REFORÇO E ACELERAÇÃO<br />
DOS INVESTIMENTOS<br />
EM PROJECTOS DE<br />
DIGITALIZAÇÃO COMO<br />
ELEMENTO FACILITADOR<br />
DA RECUPERAÇÃO<br />
PÓS-CRISE<br />
abruptas de mais de 50% da procura em<br />
muitos sectores.<br />
Ainda assim, os líderes de cadeia de<br />
abastecimento na Europa estão a provar<br />
mais uma vez a sua capacidade de adaptação<br />
a contexto de negócio muito difíceis e<br />
desafiadores. O sector logístico está a<br />
evidenciar a sua resiliência, acentuando<br />
a forma como é decisivo para o sistema<br />
de abastecimento, mesmo numa situação<br />
inesperada de crise como esta.<br />
LIÇÕES IMPOSTAS<br />
PELA PANDEMIA<br />
No contexto europeu, a reacção de cada estado-<br />
-membro a esta situação, nomeadamente<br />
através da atribuição de incentivos e apoios<br />
à economia, pode mitigar os impactos da<br />
pandemia, mas nunca será suficiente para<br />
os evitar na totalidade.<br />
A queda da actividade económica parece<br />
incontornável, pelo menos, até ao final do<br />
segundo trimestre de <strong>2020</strong>, durante o qual<br />
se adivinha que as medidas de contenção e<br />
restrição ao movimento continuarão em vigor.<br />
Qual então a informação a analisar para melhor<br />
compreender as lições impostas por esta<br />
pandemia?<br />
A curto prazo é essencial tentar identificar de<br />
que forma, nos próximos meses, a procura vai<br />
sofrer alterações enquanto reacção às limitações<br />
a que os consumidores se vêem sujeitos, bem<br />
como às mudanças de prioridades destes (e.g.<br />
uma maior incerteza normalmente traduz-se<br />
num menor consumo de bens de luxo).<br />
Nomeadamente, apostando em parcerias<br />
e colaborações com outros stakeholders e<br />
clientes de relevo – todos estamos sujeitos a<br />
limitações nesta situação!
70<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
NOVO “NORMAL”…<br />
NOVAS ESTRATÉGIAS<br />
De forma a auxiliar as empresas a implementar<br />
novas estratégias e a definir mecanismos de<br />
adaptação à fase “pós-coronavírus”, a Fuelsave<br />
reuniu um conjunto de recomendações e<br />
sugestões accionáveis. A saber:<br />
» Criar uma página de Perguntas Frequentes<br />
(FAQ), facilmente acessível, de forma a<br />
mostrar transparência e tranquilizar os<br />
clientes, reduzindo o fluxo de chamadas<br />
recebidas por dúvidas relacionadas com o<br />
coronavírus;<br />
» Fornecer materiais aos colaboradores, como<br />
gel desinfectante, máscaras e luvas de<br />
protecção que garantam a sua segurança e a<br />
dos clientes;<br />
» Criar protocolos e ferramentas de apoio<br />
para os trabalhadores com o objectivo<br />
de fomentar o bem-estar da equipa,<br />
mantendo-a saudável, estável e produtiva;<br />
» Repensar práticas de trabalho, promovendo<br />
o trabalho remoto, quando compatível com<br />
a função a desempenhar; criar medidas de<br />
segurança que minimizem o risco durante<br />
a rotina de trabalho (ex: suspensão da<br />
necessidade de assinatura no acto da<br />
entrega de encomendas);
SCM Supply Chain Magazine 71<br />
» Estreitar relações com clientes de maior<br />
proximidade, mitigando determinados riscos<br />
da cadeia de distribuição através de uma<br />
maior abertura na partilha de informação<br />
sobre as tendências expectáveis para o<br />
futuro próximo;<br />
» Comunicar claramente aos trabalhadores<br />
os cuidados a ter para minimizar o risco de<br />
infecção;<br />
» Fomentar o espírito crítico entre os<br />
funcionários relativamente às notícias sobre<br />
o coronavírus (existem muitas notícias<br />
falsas que não traduzem de forma coerente<br />
o que se está efectivamente a passar,<br />
sendo essencial saber avaliar as mesmas e<br />
transmitir o seu conteúdo de forma simples<br />
e clara aos trabalhadores);<br />
» Analisar e perceber quais as<br />
vulnerabilidades principais e tomar acções<br />
preventivas que minimizem o impacto das<br />
mesmas;<br />
» Entrar em contacto directo com os seus<br />
clientes para aferir das mudanças recentes<br />
nos padrões de consumo;<br />
» Determinar junto dos fornecedores qual o<br />
impacto expectável<br />
na disponibilidade de<br />
produtos, bem como<br />
os principais riscos que<br />
cada indústria enfrenta<br />
neste período.<br />
durante alguns meses. Como tal, é importante<br />
que as empresas criem mecanismos para lidar<br />
com o período de recuperação pós-coronavírus<br />
e definam estratégias para melhorar as suas<br />
operações e o ambiente de trabalho, de forma<br />
a emergir desta crise de forma sólida e mais<br />
preparadas para eventuais situações futuras. •<br />
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É ESSENCIAL TENTAR<br />
IDENTIFICAR DE QUE FORMA,<br />
NOS PRÓXIMOS MESES,<br />
A PROCURA VAI SOFRER<br />
ALTERAÇÕES ENQUANTO<br />
REACÇÃO ÀS LIMITAÇÕES A QUE<br />
OS CONSUMIDORES SE VÊEM<br />
SUJEITOS, BEM COMO<br />
ÀS MUDANÇAS DE<br />
PRIORIDADES DESTES<br />
As implicações e<br />
constrangimentos<br />
inerentes a esta pandemia<br />
não são algo que possa<br />
ser resolvido do dia para<br />
a noite. Este surto causou<br />
perturbações na forma de<br />
funcionar das empresas,<br />
que irão ter repercussões
72<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
Texto: Ana Paiva<br />
CARREIRA<br />
Covid-19 obriga<br />
ao trabalho remoto.<br />
O que muda?<br />
O DESAFIO DO TELETRABALHO<br />
São muitas as empresas que aderiram ao teletrabalho desde que a Covid-19 se instalou em<br />
Portugal. No entanto, deslocar as rotinas e tarefas do escritório para dentro de casa, requer<br />
uma grande adaptação por parte dos gestores, colaboradores e empresas. Para entender<br />
todas as partes, a Randstad e o Grupo Constant explicam-nos os desafios tanto para os<br />
gestores, como para os colaboradores no que diz respeito ao trabalho à distância, e empresas<br />
como Sogrape, Perrigo, Sonae e Montepio contam a sua experiência neste registo.
SCM Supply Chain Magazine 73<br />
À<br />
medida que a pandemia Covid-19 se<br />
alastra pelo país, muitos foram os<br />
sectores que se reinventaram e muitas<br />
das funções tiveram de se adaptar ao novo<br />
contexto. O teletrabalho foi implementado<br />
em cargos onde era possível realizá-lo e,<br />
assim, começou o desafio de, por um lado,<br />
gerir equipas à distância, e, por outro, ser<br />
gerido neste registo.<br />
De forma a garantir que todos estão a<br />
trabalhar para alcançar os mesmos objectivos<br />
é essencial alterar rotinas e agendar reuniões<br />
diárias e regulares com as equipas, indica<br />
Andrea Nunes, country manager do Grupo<br />
Constant. Aponta ainda mais duas dicas que<br />
podem ser úteis para os líderes, que passam<br />
pela comunicação frequente, pois acredita que<br />
é assim que se alimenta o espírito de equipa,<br />
e pela confiança nos colaboradores, ou seja,<br />
acreditar que cumprem os seus objectivos e que<br />
alcançam os resultados. No entanto, caso não<br />
aconteça, deve-se assinalar o incumprimento<br />
por parte do trabalhador uma vez que “smart<br />
working implica igualmente uma maior<br />
capacidade de auto-gestão”, salienta.<br />
Por sua vez, Inês Veloso, directora de<br />
marketing da Randstad, afirma que o gestor<br />
deve manter dois focos: “se por um lado, uma<br />
das grandes preocupações neste momento é<br />
garantir a continuidade das relações entre os<br />
elementos da equipa, o espírito e a cultura<br />
adoptada até então, por outro lado, olhar o<br />
indivíduo e a forma como cada um se está a<br />
adaptar a este novo contexto é igualmente<br />
importante”.<br />
No que diz respeito ao indivíduo, a<br />
responsável dá algumas dicas que podem ser<br />
úteis ao gestor, que passa por “perceber as<br />
motivações e o estado anímico de cada um” e,<br />
para isso, é importante realizar reuniões com<br />
cada colaborador de forma a criar espaços de<br />
partilha; dar autonomia e empowerment aos<br />
elementos das equipas, promovendo desafios<br />
e objectivos individuais; reforçar as metas<br />
estratégicas da organização e daquele grupo<br />
de trabalho em particular; e garantir uma boa<br />
comunicação.<br />
Perante a equipa, o gestor deve garantir que<br />
os valores e cultura da empresa se mantêm;<br />
reforçar as relações, entre-ajuda e trabalho<br />
de equipa, fazer entender a nova dinâmica de<br />
trabalho e as necessidades que isso requer;<br />
criar momentos rotineiros em conjunto de<br />
forma a promover a proximidade; realizar<br />
chamadas colectivas em vez de e-mails e<br />
continuar a celebrar os sucessos, de uma forma<br />
mais contida.<br />
Se por um lado, liderar uma equipa<br />
remotamente não é fácil, ser liderado também<br />
pode ser um desafio. Andrea Nunes recomenda<br />
a que os colaboradores definam os períodos<br />
de conexão e de desconexão para que a vida<br />
profissional e pessoal não sejam afectadas.<br />
Devem ainda manter a comunicação que não<br />
seja apenas profissional, pois para se sentirem<br />
motivados é importante reforçar a relação com<br />
os colegas e chefias. “Trabalhar em casa não é<br />
igual a trabalhar no escritório, é fundamental<br />
compreender as dificuldades de adaptação de<br />
TRABALHAR EM CASA NÃO<br />
É IGUAL A TRABALHAR NO<br />
ESCRITÓRIO, É FUNDAMENTAL<br />
COMPREENDER AS<br />
DIFICULDADES DE<br />
ADAPTAÇÃO DE CADA PESSOA<br />
Andrea Nunes, Grupo Constant
74<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
cada pessoa”, salienta. Para isso, sugere que os<br />
colaboradores criem uma lista diária das tarefas<br />
que devem completar, definam prioridades e<br />
acompanhem o seguimento de cada projecto.<br />
O QUE SENTEM AS EMPRESAS?<br />
O teletrabalho exigiu um grande esforço de<br />
adaptação por parte das empresas. Procurámos<br />
saber junto de algumas os desafios pelos quais<br />
estão a passar, o que foi necessário alterar para<br />
se ajustarem a esta nova dinâmica e quais os<br />
resultados que têm obtido.<br />
No caso da Sogrape, Dália Moreira, head of<br />
supply chain, considera que ter a sua equipa em<br />
teletrabalho tem sido um desafio “o facto de<br />
não podermos falar com os colegas fisicamente,<br />
exige uma maior articulação entre todos,<br />
exige que os objectivos estejam claros e que<br />
cada um perceba a interacção com os demais,<br />
não só da própria equipa, como também com<br />
outras áreas”. É necessário colocar a equipa<br />
a comunicar com todos os elos da cadeia, em<br />
particular com quem está no terreno, de forma<br />
a perceber como se sentem os colaboradores<br />
que estão mais expostos. Outro desafio que<br />
aponta é a preocupação só com o dia-a-dia,<br />
afirmando que têm de<br />
continuar a pensar nos<br />
projectos a médio/longo<br />
prazo e na melhoria<br />
contínua.<br />
A responsável refere o<br />
que tem sido feito neste<br />
regime, revelando que<br />
têm tentado simular o<br />
ambiente físico através<br />
de reuniões kaizen diárias<br />
por Skype, que contam<br />
com a participação e<br />
envolvimento de todos.<br />
Confessa ainda que o<br />
teletrabalho até tem<br />
sido benéfico para mudar<br />
alguns processos, como<br />
é o caso do suporte<br />
em papel. No entanto,<br />
aponta que uma das<br />
grandes desvantagens<br />
é a dificuldade dos<br />
colaboradores se<br />
desligarem do trabalho,<br />
pois é difícil gerir o tempo<br />
pessoal e o profissional,
SCM Supply Chain Magazine 75<br />
principalmente na área da supply chain,<br />
segundo Dália Moreira.<br />
Os desafios do teletrabalho acabam por<br />
ser transversais a praticamente todas as<br />
empresas. Rodolfo Gardalina, head of supply<br />
chain da Perrigo, refere que um dos maiores,<br />
em gerir uma equipa remotamente, é garantir<br />
ao máximo a presença humana no dia-a-dia.<br />
Aponta ainda um outro desafio, relacionado<br />
com o anterior, que passa pela “tendência<br />
de compensar esse distanciamento com uma<br />
presença exagerada, podendo entrar em<br />
micromanagement e num controlo de horários<br />
excessivos”.<br />
Para se adaptarem à nova realidade,<br />
criaram uma rotina diária através de vídeo-<br />
-chamada onde abordam temas e experiências<br />
não relacionadas com trabalho, tentando<br />
“SE POR UM LADO, UMA DAS<br />
GRANDES PREOCUPAÇÕES<br />
NESTE MOMENTO É<br />
GARANTIR A CONTINUIDADE<br />
DAS RELAÇÕES ENTRE OS<br />
ELEMENTOS DA EQUIPA,<br />
O ESPÍRITO E A CULTURA<br />
ADOPTADA ATÉ ENTÃO,<br />
POR OUTRO LADO, OLHAR O<br />
INDIVÍDUO E A FORMA COMO<br />
CADA UM SE ESTÁ A ADAPTAR<br />
A ESTE NOVO CONTEXTO É<br />
IGUALMENTE IMPORTANTE”<br />
Inês Veloso, Randstad<br />
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76<br />
ABRIL <strong>2020</strong><br />
“O FACTO DE NÃO PODERMOS FALAR COM OS COLEGAS<br />
FISICAMENTE, EXIGE UMA MAIOR ARTICULAÇÃO ENTRE<br />
TODOS, EXIGE QUE OS OBJECTIVOS ESTEJAM CLAROS<br />
E QUE CADA UM PERCEBA A INTERACÇÃO<br />
COM OS DEMAIS, NÃO SÓ DA PRÓPRIA EQUIPA,<br />
COMO TAMBÉM COM OUTRAS ÁREAS”<br />
Dália Moreira, Sogrape
SCM Supply Chain Magazine 77<br />
aproximar os membros da equipa. A verdade<br />
é que têm registado bons resultados, tanto<br />
na equipa como na empresa. O responsável<br />
afirma que “os estímulos ao negócio inerentes<br />
à situação actual têm sido diversos, afectando<br />
directamente a supply chain, e a equipa<br />
tem reagido adequadamente, conseguindo<br />
gerir os desafios com foco na solução dando<br />
visibilidade a toda a cadeia”.<br />
Pedro Melo, director de supply chain<br />
& logistics da Sonae SR, explica que na<br />
empresa se perdeu a componente de contacto<br />
humano e o acompanhamento, muitas vezes<br />
informal. Contudo, afirma que “a gestão de<br />
uma equipa, se assenta na confiança, na<br />
delegação, na colaboração e na comunicação,<br />
não é particularmente afectada pela situação<br />
actual”, e que limitações impostas até<br />
potenciam algumas destas vertentes. Refere,<br />
porém, que o maior desafio é manter uma<br />
organização forte que permite elevados níveis<br />
de eficiência nas tarefas a desempenhar e<br />
utilizar momentos de menor ocupação para<br />
realizar outras que foram, outrora, adiadas.<br />
Acrescenta que “manter um planeamento e<br />
uma comunicação próxima e frequente serão<br />
os factores decisivos”.<br />
Dado o facto que a empresa opera em vários<br />
países, já se tinha apostado em soluções<br />
de mobilidade para os colaboradores, pelo<br />
que, esta flexibilidade facilitou o processo<br />
de adaptação, segundo o responsável. Foi a<br />
nível pessoal que se registaram as grandes<br />
mudanças, no que diz respeito à gestão diária<br />
de conciliação do trabalho com a vida pessoal.<br />
Por sua vez, a equipa de procurement do<br />
Montepio, liderada por Cláudia Monteiro,<br />
directora de compras, também teve de se<br />
adaptar ao teletrabalho, substituindo agora<br />
o “primeiro café da manhã” pelo “ ‘bom dia,<br />
equipa’ via Skype”. A partilha de opiniões,<br />
discussões de casos em negociação e a<br />
reunião de ponto de situação diária acontece<br />
através da plataforma Microsoft Teams.<br />
No final, este cenário não se mostrou uma<br />
barreira para alcançar os objectivos a que se<br />
propuseram “já fechámos negociações sem as<br />
tradicionais reuniões presenciais, lançámos<br />
consultas ao mercado, realizámos reuniões<br />
de esclarecimentos de propostas, alterámos<br />
métodos de trabalho, desenvolvemos novos<br />
procedimentos, fortalecemos mecanismos<br />
de controlo e confirmámos quais dos nossos<br />
fornecedores são efectivamente nossos<br />
parceiros”, conta a responsável.<br />
O que a pandemia trouxe para junto desta<br />
equipa foi a possibilidade de as aproximar,<br />
dando espaço para conhecer o íntimo de<br />
cada colaborador e perceber dinâmicas<br />
familiares, que dão melhor a conhecer os<br />
profissionais que pensavam que conheciam.<br />
Cláudia Monteiro termina dizendo que “os<br />
resultados continuam a atingir-se, quando<br />
o comprometimento já existia. Foi apenas<br />
necessário adaptar e avançar”. •
78<br />
O MUNDO É REDONDO, por Cláudia Brito<br />
The Diet Myth, Tim Spector,<br />
Weidenfeld & Nicolson, 2015 edition<br />
Comer correctamente, dormir bem e fazer exercício adequado podem fazer toda a diferença entre a vida e a<br />
morte duma pessoa, ao fortalecerem o seu sistema imunitário. Enquanto não há uma vacina, e os tratamentos<br />
são muito experimentais, a única barreira eficaz entre nós e um vírus novo, altamente contagioso e mortífero,<br />
é a nossa imunidade natural. Assim, uma dieta correcta não é tanto aquela que nos faz ficar magros como a<br />
que nos faz ser saudáveis, embora muitas vezes as duas coisas andem de mãos dadas.<br />
O que é comer correctamente? Por incrível que<br />
pareça, dado que comemos desde os primórdios<br />
da nossa existência, esta é uma pergunta para<br />
a qual não há uma resposta consensual.<br />
A razão principal, diz Tim Spector, baseado<br />
em investigação científica, sólida apesar de<br />
por vezes controversa, é que somos muito<br />
mais diferentes uns dos outros do que os<br />
nossos genes indicam. A mesma comida tem<br />
efeitos diferentes até em gémeos idênticos<br />
(que são virtualmente clones) porque o<br />
seu microbioma ou microbiota individual<br />
(população de micróbios existente no intestino),<br />
reconhecidamente um novo órgão do corpo,<br />
forma-se desde o nascimento e varia de pessoa<br />
para pessoa. Diferenças no microbioma podem<br />
explicar porque algumas pessoas se dão bem<br />
com algumas dietas, as quais são desastrosas<br />
para outras.<br />
O microbioma evoluiu connosco ao longo de<br />
milhões de anos, alinhando cuidadosamente<br />
os seus genes com os nossos, para evitar<br />
sobreposições desnecessárias. Dado a sua<br />
capacidade de replicação exponencial, os<br />
micróbios podem adaptar-se mais rapidamente a<br />
novas dietas. Contudo, dietas restritivas de certos<br />
alimentos, assim como os antibióticos, reduzem<br />
a diversidade do microbioma e levam a uma<br />
saúde mais frágil. Há quinze mil anos, os nossos<br />
antepassados consumiam cento e cinquenta<br />
ingredientes diferentes numa semana, enquanto<br />
que a maioria de nós agora consome menos de<br />
vinte itens alimentares (sobretudo milho, soja,<br />
trigo e carne).<br />
Em relação aos mitos propriamente ditos, um<br />
dos mais difundidos é que a epidemia da obesidade<br />
se deve a comermos demais e nos exercitamos<br />
de menos. Uma caloria é uma caloria, certo? Na<br />
realidade, testes experimentais demonstraram que<br />
o mesmo número de calorias de “fast-food” e de<br />
alimentos integrais, fruta e vegetais têm efeitos<br />
muito diferentes em termos energéticos no nosso<br />
organismo. Isto porque o excesso de peso se deve<br />
maioritariamente a um microbioma desequilibrado<br />
e pouco diverso.<br />
Tim Spector dá-nos ainda a boa notícia de que<br />
(em moderação!) o vinho tinto, o alho, o chocolate,<br />
o azeite extra virgem e as algas marinhas são<br />
benéficas para nós, por conterem polifenóis. Estes<br />
alimentam os micróbios “bons” que limpam o nosso<br />
organismo de compostos tóxicos e inflamatórios,<br />
afastam os micróbios “maus” e produzem antioxidantes<br />
e anti-cancerígenos. Como disse o pai<br />
da medicina, Hipócrates, há vinte e cinco séculos:<br />
“Que o teu alimento seja o teu remédio e o que o<br />
teu remédio seja o teu alimento”.<br />
Tim Spector é professor de Epidemiologia Genética no<br />
King’s College em Londres. É especialista em estudos<br />
de gémeos, genética, epigenética, microbioma e dieta.<br />
Dedicou este livro “à sua família e a outros micróbios”.
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