40AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAASeção Clínica Psicanalítica[...] Gilberto traz ao processo deanálise, quentura e aquecimento aosetting analítico, provocandoestagnação em minha escuta, o queme faz atentar que tal manifestaçãome exigia o máximo rigor ético etécnico, a fim de não me colocarcomo mais um objeto à repetição dapulsão frente ao desamparo [...]....................................................................................................................................................................................................REV. SARAVÁ SCIENCE, Nº 1, JUNHO, 2019.
41A erotomania como possível destino do desamparo: os desafios no manejotransferencial e contratransferencial na condução de um caso clínico.AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAMaria Cecília dos Santos AraújoO presente estudo explorará um caso clínico, que nospermitirá pensar o desamparo reeditado pelo pacienteatravés da erotomania ao analista, de modo que talmanifestação de amor pôde surgir na transferênciacomo escape ao vazio do ser e provocou efeitoscontratransferenciais importantes para minha reflexãoclínica e de condução a este tratamento.A princípio, ressalta-se o desamparo, na pósmodernidade,como produto de um tempo em que ohomem experimenta uma larga gama de mudanças nomodo de viver consigo mesmo e/ou com o mundo.Chaves. &, et al, (2016), apontam para novas estruturasde valores, em que as exigências e prioridades fogemàquelas de outrora, sendo os referenciais não maisdominados pelo campo da razão.A hipervalorização do estético, dos padrões impostospelo modo como se organiza o homemcontemporâneo, a fragilidade no campo afetivo e dosvínculos, fazem emergir novos modos de viver odesamparo (Rocha, Paravidini, Júnior, 2014), não sócomo condição inerente ao processo dedesenvolvimento do psiquismo humano, mas tambémenquanto operadores de situações traumáticas, nasquais certo excesso libidinal não é passível a ligaçõessimbólicas, como compreende Menezes (2012) a partirda noção freudiana acerca da dimensão do desamparo.Como efeito, os sujeitos parecem enfrentardificuldades em ocupar lugares que, por vezes, estãonos limites entre: o íntimo e o coletivo; entre aindependência/liberdade e a inerente dependência/necessidade do outro, sendo estes, pontos dereconhecimento fundantes de experiências quedemarcam lugares de existência no mundo, consigo ecom o outro. E na mesma medida em que necessita seamparar no outro, o homem contemporâneo se vêimpelido por ideais sociais, que buscam, de certamaneira, desconsiderar as nuances de uma inexorávelalteridade.Neste sentido, escutamos sujeitos que se organizampsiquicamente a partir de um não-investimento radicalpor parte de seus cuidadores, em tempos primevos deseu desenvolvimento, o que poderá se observar naexperiência clínica que em seguida será relatada ediscutida, a qual nomeia-se “Caso Gilberto”. Neste casoclínico, o desemparo experimentado pelo pacientereflete em modos singulares de investir as relaçõesobjetais, o que atravessa o vínculo terapêutico emsintomas ambivalentes de amor/paixão endereçados àanalista, assim como ódio e agressividade, implicandodesinvestimento no próprio eu, como ressalta Menezes(2012).Deste modo, pacientes que trazem em suas narrativas,elementos constitutivos que assim se assemelham como acima exposto, muitas vezes demandam no processoanalítico a necessidade de experimentar o sentimentode amor, embora que numa ambiência que lhespermitam desarmar-se das defesas que embasam asrelações de seu cotidiano e que resultam muitas vezesna incapacidade de amar.Contudo, é neste arrolamento de demandas quesolicitam com tamanho cuidado a implicação e areserva ao analista, que me deparo com os efeitoscontratransferenciais do processo. A preocupação emofertar ao desamparo continência, acolhimento eholding, sem esquecer da necessária reserva aossintomas erotomaníacos, torna-se uma dualidaderecorrente e desafiadora.Dessa maneira, o nosso tempo parece nos exigirpensar a clínica psicanalítica a partir dos novos modosde reedição do desamparo e seus possíveis destinos,tendo em vista que, neste contexto supracitado, seproduzem modos singulares de subjetivação, quechegam à nossa clínica e que muito refletem da cena....................................................................................................................................................................................................REV. SARAVÁ SCIENCE, Nº 1, JUNHO, 2019.