Revista Sarava Science, Ano 2, n 1, Jun 2019
revista saravá science – é uma publicação de responsabilidade do Percurso Livre em Psicanálise (PLP), Natal, RN, Brasil.
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Inconsciente
Pedro von Sohsten
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do objeto de estudo da psicanálise, o inconsciente, traz
problemáticas amplas, em sua contradição provocativa,
de um “propósito deliberado”, de saber que se “furta”,
que tem um mutismo de coisa, mas que ainda sim,
Freud não lhe deu as costas. E quando então, decide
encarar de frente este campo de construção do
conhecimento a partir do inconsciente, já nos apontava,
ainda em 1900, através da herança de Schiller, que
havia importantes ganhos numa certa frouxidão ante a
“vigilância nos portais da Razão” (p.118).
Sendo assim, neste texto marco de nascimento da
psicanálise, que é “A interpretação dos sonhos”, onde
Freud, aponta, com tônica decidida e assertiva, que seu
objeto de estudo é o inconsciente, vê-se que para tal,
foi preciso também algo de uma ruptura com o campo
discursivo da cientificidade. Mas como o campo de
conhecimento, oriundo do inconsciente, precisou criar
algumas torções – ou quem sabe intercessões – nos
trâmites do discurso científico vigente?
Para que avancemos um pouco, é preciso retroceder
na história do conhecimento através do engate teórico
de um grande pioneiro dos caminhos de produção dos
saberes: Sócrates.
Constatado como um exemplo de edificação de um
ideal de saber, através do elemento Racional, pode-se
acompanhar os enfáticos pensamentos de Nietzsche
(1872/2007), em “O nascimento da tragédia” que
aponta alguns contornos acerca da herança socrática
para os ditames da cientificidade, e nos enuncia:
(...) é Sócrates o protótipo do otimista teórico
que, na já assinalada fé na escrutabilidade da
natureza das coisas, atribui ao saber e ao
conhecimento a força de uma medicina
universal e percebe no erro o mal em si
mesmo. Penetrar nessas razões e separar da
aparência e do erro o verdadeiro
conhecimento, isso pareceu ser ao homem
socrático a mais nobre e mesmo a única
ocupação autenticamente humana: tal como
aquele mecanismo dos conceitos, juízos e
deduções foi considerado, desde Sócrates,
como a atividade suprema e o admirável dom
da natureza, superior a todas as outras
aptidões. (p.92).
É sob a égide dessa herança de Razão e Verdade que
se arraigou e se erigiu um quantum significativo das
construções de conhecimento da cientificidade ao
longo da história humana. É num campo de saber
universal – na dissociação do erro para o verdadeiro
conhecimento – que o legado de atividades supremas
pôde almejar as representações para o ser e para o
mundo, através das variadas construções promovidas
enquanto ciência.
Porém, cabe aqui questionar se, em tais ditames de
construção do conhecimento, derivada da vertente do
pensamento socrático, pode-se associar uma
contraposição, uma barreira ao des-conhecimento, que
dificultou a emergência do saber freudiano, a partir de
seu objeto de apreciação teórica?
Talvez seja possível apontar que o que Freud começa a
lançar mão em seus caminhos de produções acerca da
psyché – ao alinhavar suas produções nesse campo
inconsciente – segue numa contramão ante esse
elemento de Razão, para encontrar com a verdade.
Pode-se citar Maria Aparecida de P. Montenegro (2002)
que explicita:
Desse modo, Freud contribuiria com as
filosofias que supõem que toda possibilidade
de conhecimento – consequentemente, o
conhecimento de si e do mundo –, está
condicionada a uma confrontação com a
alteridade. Com efeito, à luz da psicanálise é
por meio de um outro que o sujeito não só se
reconhece enquanto tal, como também vem a
ter acesso aos motivos inconscientes de seus
próprios atos irracionais. (p.18).
É nesse lugar de alteridade, de estrangeiro à
conformidade dessa raiz racional do produzir científico,
porém não tão distante de tal intuito, que o
conhecimento psicanalítico pode ir calcando seu
espaço nos dizeres dos conhecimentos humanos e
sobre os humanos. E ainda acompanhado Montenegro
(2002) que evoca que: “Para o fundador da psicanálise,
a filo-sofia tradicionalmente esteve associada à
Psicologia Racional, cuja crença na identidade entre
psíquico e consciente ele pretende justamente abalar.”
(p.18).
Ou acompanhado as considerações do próprio Freud
(1915/2010) que em seu texto “O inconsciente” pode-se
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REV. SARAVÁ SCIENCE, Nº 1, JUNHO, 2019.