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30.05.2020 Views

provavelmente teríamos que reunir toda a humanidade, porque ninguém sai davida incólume.Algumas pessoas têm problemas piores que a maioria, é claro. Algumas setornam vítimas dos incidentes mais terríveis. Por mais que isso nos entristeça eperturbe, é preciso lembrar que, no final das contas, não muda nada em relação àequação de responsabilidade sobre nossa situação individual.Injustiça chiqueA falácia da responsabilidade/culpa permite que as pessoas transfiram a terceirosa responsabilidade pelos próprios problemas. Essa capacidade de aliviar aresponsabilidade através da culpa confere uma euforia temporária e umsentimento de retidão moral.Infelizmente, um dos efeitos colaterais da internet e das redes sociais foi tertornado mais fácil do que nunca empurrar a responsabilidade — até mesmo dasinfrações mais ínfimas — para outro grupo ou pessoa. Na verdade, esse tipo dejogo público de culpa/vergonha se tornou popular; em certos grupos, é atéatrativo, admirável. Nas redes sociais, o compartilhamento público de“injustiças” atrai muito mais atenção e reações emocionais que a maioria dosoutros eventos, recompensando com uma quantidade crescente de atenção esimpatia gratuita aqueles que se sentem perpetuamente vitimados.A “injustiça chique” está na moda em todos os cantos da sociedade hoje emdia, entre ricos e pobres. Na verdade, esta pode ser a primeira vez na história dahumanidade em que todos os grupos demográficos se sentem injustamentevitimados ao mesmo tempo. E todos aproveitam a euforia da indignação moralque vem junto.Neste momento, qualquer um que se sinta ofendido com qualquer coisa — sejao fato de que um livro sobre racismo entrou no currículo de uma faculdade, queárvores de Natal foram banidas do shopping local ou que os impostos sobrefundos de investimento tiveram um aumento de 0,5% — acha que está sofrendoalgum tipo de opressão e que, portanto, merece se sentir ultrajado e receberdeterminada quantidade de atenção.

O atual ambiente da mídia tanto encoraja quanto perpetua essas reações,porque, no final das contas, dá lucro. O escritor e comentarista Ryan Holiday serefere a isso como “pornografia do ultraje”: em vez de reportar histórias eproblemas reais, a mídia acha muito mais fácil (e lucrativo) encontrar algolevemente ofensivo, transmitir o caso para uma ampla audiência, criar a sensaçãode ultraje e depois transmiti-la de um jeito que também cause ultraje a outraparcela da população. Isso desencadeia um eco de asneiras que ricocheteia entredois lados imaginários e ao mesmo tempo distrai dos verdadeiros problemas einjustiças da sociedade. Não é de se estranhar que estejamos mais politicamentepolarizados do que nunca.O maior problema da injustiça chique é desviar a atenção das vítimas reais. Écomo uma overdose de alarmismo. Quanto mais gente se autoproclama vítimade pequenas infrações, mais difícil é enxergar quem realmente sofre.As pessoas se viciam em se sentir constantemente ofendidas porque isso lhestraz euforia: ser hipócrita e moralmente superior provoca bem-estar. Como disseo cartunista político Tim Kreider, em um editorial do The New York Times: “Oultraje é como várias outras coisas agradáveis que com o tempo nos devoram dedentro para fora. E é ainda mais insidioso que a maioria dos vícios, porquesequer o reconhecemos conscientemente como um prazer.”Parte do ônus de viver em uma sociedade livre e democrática é termos quelidar com opiniões e pessoas de que não necessariamente gostamos. É o preço ase pagar. Podemos até dizer que é o objetivo do sistema. Mas parece que cada vezmais gente está esquecendo isso.Devemos escolher nossas batalhas com cuidado, ao mesmo tempo em quetentamos simpatizar um pouco com o suposto inimigo. Devemos encarar asnotícias e a mídia com uma dose saudável de ceticismo e evitar ideiaspreconcebidas sobre os que não concordam conosco. Devemos priorizar valorescomo honestidade, fomento à transparência e à aceitação da dúvida em vez danecessidade de estar sempre certo, de se sentir bem e se vingar. Os três primeirosvalores são “democráticos” e mais difíceis de manter em meio ao ruído constantede um mundo conectado, mas nem por isso devemos negligenciar nossaresponsabilidade de cultivá-los. A estabilidade do sistema político talvez dependa

provavelmente teríamos que reunir toda a humanidade, porque ninguém sai da

vida incólume.

Algumas pessoas têm problemas piores que a maioria, é claro. Algumas se

tornam vítimas dos incidentes mais terríveis. Por mais que isso nos entristeça e

perturbe, é preciso lembrar que, no final das contas, não muda nada em relação à

equação de responsabilidade sobre nossa situação individual.

Injustiça chique

A falácia da responsabilidade/culpa permite que as pessoas transfiram a terceiros

a responsabilidade pelos próprios problemas. Essa capacidade de aliviar a

responsabilidade através da culpa confere uma euforia temporária e um

sentimento de retidão moral.

Infelizmente, um dos efeitos colaterais da internet e das redes sociais foi ter

tornado mais fácil do que nunca empurrar a responsabilidade — até mesmo das

infrações mais ínfimas — para outro grupo ou pessoa. Na verdade, esse tipo de

jogo público de culpa/vergonha se tornou popular; em certos grupos, é até

atrativo, admirável. Nas redes sociais, o compartilhamento público de

“injustiças” atrai muito mais atenção e reações emocionais que a maioria dos

outros eventos, recompensando com uma quantidade crescente de atenção e

simpatia gratuita aqueles que se sentem perpetuamente vitimados.

A “injustiça chique” está na moda em todos os cantos da sociedade hoje em

dia, entre ricos e pobres. Na verdade, esta pode ser a primeira vez na história da

humanidade em que todos os grupos demográficos se sentem injustamente

vitimados ao mesmo tempo. E todos aproveitam a euforia da indignação moral

que vem junto.

Neste momento, qualquer um que se sinta ofendido com qualquer coisa — seja

o fato de que um livro sobre racismo entrou no currículo de uma faculdade, que

árvores de Natal foram banidas do shopping local ou que os impostos sobre

fundos de investimento tiveram um aumento de 0,5% — acha que está sofrendo

algum tipo de opressão e que, portanto, merece se sentir ultrajado e receber

determinada quantidade de atenção.

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