Inteligencia-emocional-Daniel-Goleman

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crianças em sua pele, quando estavam amontoadas eaterrorizadas, não parava de dar banho em sua Barbie. Outrabrincava de Barbie Viajante, em que a boneca viaja para umlugar qualquer e retorna em segurança, que é o objetivo dabrincadeira. A brincadeira preferida por outra menina se davanum cenário em que a boneca era metida num buraco esufocava.Enquanto adultos que passaram por um trauma arrasadorpodem sofrer um entorpecimento psíquico, bloqueando alembrança ou sensação da catástrofe, a psique das criançasmuitas vezes lida diferentemente com ele. A Dra. Terr acreditaque elas se tornam menos freqüentemente entorpecidas para otrauma porque recorrem à fantasia, às brincadeiras e aosdevaneios para lembrar e elaborar o sofrimento por quepassaram. Essas reencenações voluntárias do trauma impedem anecessidade de represá-lo em poderosas lembranças que podemdepois irromper como flashbacks. Se o trauma é menor, comoir ao dentista para fazer uma obturação, apenas uma ou duasvezes podem bastar. Mas se é arrasador, a criança precisa deincontáveis repetições, reencenando o drama muitas vezes, numritual sinistro e monótono.Uma das formas de chegar à imagem congelada naamígdala é através da arte, que é uma das formas de expressãodo inconsciente. O cérebro emocional é altamente sintonizadocom simbolismos e com o que Freud chamou de “processoprimário”: as mensagens da metáfora, história, mito, as artes.Esse recurso é muito utilizado no tratamento de criançastraumatizadas. Às vezes, a arte oferece à criança a oportunidadede falar do momento de horror sobre o qual não ousaria falarem outras circunstâncias.Spencer Eth, psiquiatra de Los Angeles especializado emtratar dessas crianças, fala de um menino de 5 anos que, juntocom a mãe, foi seqüestrado por um ex-namorado dela. Ohomem levou-os para um quarto de hotel, mandou o meninoficar debaixo de um cobertor enquanto espancava a mãe até amorte. O menino, compreensivelmente, relutava em falar comEth sobre o massacre que ouvira e vira de debaixo do cobertor.Por isso o psiquiatra pediu-lhe que desenhasse qualquer coisa.Eth lembra que o desenho era de um piloto de corridas comuns olhos impressionantemente grandes. Ele interpretou issocomo uma referência à ousadia do menino ao espiar oassassino. Essas referências ocultas à cena traumática quasesempre aparecem nos trabalhos artísticos de criançastraumatizadas; Eth utiliza o desenho no tratamento de criançascom esse tipo de problema, a jogada de abertura da terapia. Aspotentes lembranças que as preocupam invadem o desenho tal

como invadem seus pensamentos. Além disso, o ato de desenharé em si terapêutico, iniciando o processo de controle do trauma.REAPRENDIZADO EMOCIONALE RECUPERAÇÃO DE UM TRAUMAIrene foi a um encontro romântico que acabou emtentativa de estupro. Embora ela houvesse resistido aoatacante, ele continuou a persegui-la: incomodando-acom telefonemas obscenos, ameaçando-a, telefonandono meio da noite, tocaiando-a e observando todos osseus movimentos. A certa altura, quando ela pediuajuda à polícia, os policiais consideraram que seuproblema não era caso de polícia, já que “nada de fatoacontecera”. Quando recorreu à terapia, Irene tinhasintomas de PTSD, desistira de toda vida social e sentiaseprisioneira em sua própria casa.O caso de Irene é citado pela Dra. Judith Lewis Herman,psiquiatra de Harvard cujo trabalho pioneiro traça as etapaspara a recuperação de um trauma. Ela vê três etapas: obteruma sensação de segurança, lembrar os detalhes do trauma elamentar a perda que ele trouxe e, finalmente, restabelecer umavida normal. Há uma lógica biológica na ordenação dessasetapas, como veremos: essa seqüência parece se refletir nocérebro emocional, que reaprende que a vida não precisa serencarada como uma emergência iminente.O primeiro passo, a reconquista do sentimento de segurança,tem por objetivo descobrir formas de acalmar os circuitosemocionais demasiado amedrontados e facilmente disparáveis,bastantes o suficiente para ensejar o reaprendizado.18 Muitasvezes isso começa com a ajuda aos pacientes para queentendam que seu nervosismo e pesadelos, hipervigilância epânicos fazem parte dos sintomas do PTSD. Ao entenderem essemecanismo, os próprios sintomas se tornam menos assustadores.Outro passo consiste em ajudar os pacientes a reconquistaralgum senso de controle sobre o que lhes acontece, umdesaprendizado direto da lição de impotência transmitida pelotrauma que sofreram. Irene, por exemplo, mobilizou a família eos amigos para formar um anteparo entre ela e seuperseguidor, e conseguiu fazer com que a polícia interviesse.A sensação de “insegurança” dos pacientes com PTSD vaialém do temor de estarem cercados por perigos ocultos; ainsegurança deles começa mais intimamente, com umsentimento de descontrole sobre o próprio corpo e as emoções.Isto é compreensível, em vista do gatilho sensível para o

como invadem seus pensamentos. Além disso, o ato de desenhar

é em si terapêutico, iniciando o processo de controle do trauma.

REAPRENDIZADO EMOCIONAL

E RECUPERAÇÃO DE UM TRAUMA

Irene foi a um encontro romântico que acabou em

tentativa de estupro. Embora ela houvesse resistido ao

atacante, ele continuou a persegui-la: incomodando-a

com telefonemas obscenos, ameaçando-a, telefonando

no meio da noite, tocaiando-a e observando todos os

seus movimentos. A certa altura, quando ela pediu

ajuda à polícia, os policiais consideraram que seu

problema não era caso de polícia, já que “nada de fato

acontecera”. Quando recorreu à terapia, Irene tinha

sintomas de PTSD, desistira de toda vida social e sentiase

prisioneira em sua própria casa.

O caso de Irene é citado pela Dra. Judith Lewis Herman,

psiquiatra de Harvard cujo trabalho pioneiro traça as etapas

para a recuperação de um trauma. Ela vê três etapas: obter

uma sensação de segurança, lembrar os detalhes do trauma e

lamentar a perda que ele trouxe e, finalmente, restabelecer uma

vida normal. Há uma lógica biológica na ordenação dessas

etapas, como veremos: essa seqüência parece se refletir no

cérebro emocional, que reaprende que a vida não precisa ser

encarada como uma emergência iminente.

O primeiro passo, a reconquista do sentimento de segurança,

tem por objetivo descobrir formas de acalmar os circuitos

emocionais demasiado amedrontados e facilmente disparáveis,

bastantes o suficiente para ensejar o reaprendizado.18 Muitas

vezes isso começa com a ajuda aos pacientes para que

entendam que seu nervosismo e pesadelos, hipervigilância e

pânicos fazem parte dos sintomas do PTSD. Ao entenderem esse

mecanismo, os próprios sintomas se tornam menos assustadores.

Outro passo consiste em ajudar os pacientes a reconquistar

algum senso de controle sobre o que lhes acontece, um

desaprendizado direto da lição de impotência transmitida pelo

trauma que sofreram. Irene, por exemplo, mobilizou a família e

os amigos para formar um anteparo entre ela e seu

perseguidor, e conseguiu fazer com que a polícia interviesse.

A sensação de “insegurança” dos pacientes com PTSD vai

além do temor de estarem cercados por perigos ocultos; a

insegurança deles começa mais intimamente, com um

sentimento de descontrole sobre o próprio corpo e as emoções.

Isto é compreensível, em vista do gatilho sensível para o

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