29.03.2020 Views

BIG_Data

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

PÉ DE ORELHA<br />

POR :<br />

José Theotónio<br />

CEO DO GRUPO PESTANA<br />

O MERCADO DE TRABALHO<br />

A robotização e a introdução de<br />

sistemas de IA nas organizações estão<br />

a transformar significativamente o<br />

mercado de trabalho: Três contributos<br />

Se por um se assiste a uma luta acesa pelo<br />

“talento” de colaboradores com competências<br />

tecnológicas e capacidades analíticas,<br />

há uma desvalorização do trabalho de<br />

equipas que exercem trabalhos rotineiros.<br />

Há um GAP salarial nas organizações<br />

que se agudiza e que tenderá a aumentar.<br />

Encontrar uma forma de minorar esta<br />

situação é crucial para a paz social e a não<br />

proliferação dos extremismos e populismos.<br />

Vários analistas explicam a vitória<br />

de Donald Trump com a evolução do<br />

rendimento das famílias votantes. Enquanto um núcleo restrito<br />

se apropriou da riqueza criada pelo crescimento económico, a<br />

classe média americana tem o seu rendimento a preços actuais<br />

estagnado ou mesmo em recessão há três décadas, e optou pelo<br />

voto de protesto.<br />

Também ao nível das profissões mais requisitadas há uma<br />

profunda alteração. Além das profissões relacionadas com a<br />

tecnologia e a capacidade analítica há escassez das ligadas à agricultura,<br />

sector hoteleiro e indústrias de mão-de-obra intensiva.<br />

Só que esta escassez tem razões diferentes. Enquanto para<br />

os primeiros, a explicação decorre da transformação digital<br />

dos mercados, os segundos escasseiam por serem trabalhos<br />

com exigência física e que, de uma forma geral, são menos bem<br />

pagos. E são menos bem pagos por duas razões principais. Por<br />

um lado, são sectores muito expostos à concorrência internacional,<br />

e com competitividade dependendo do preço final dos<br />

produtos; assim, porque o seu principal custo de produção é o<br />

trabalho, há uma rigidez no aumento dos salários para que não<br />

fiquem fora do mercado; vejam-se os nossos supermercados com<br />

frutos e legumes oriundos de países estrangeiros longínquos e,<br />

ainda assim, os mais baratos; ou o preço de pacotes turísticos<br />

intercontinentais mais baratos que os de destinos nacionais.<br />

Por outro lado, o custo do trabalho em Portugal por via da fiscalidade<br />

directa, IRS, e indirecta, segurança social, é irracional;<br />

um colaborador com um salário de mil euros mensais, custa à<br />

entidade patronal cerca de 18 mil euros por ano, mas no final<br />

do ano o seu rendimento líquido (o que fica para pagar as suas<br />

despesas) é pouco mais de 10 mil euros. O que equivale a dizer<br />

que a fiscalidade sobre o rendimento líquido do trabalho é cerca<br />

de 80%. Um absurdo. Este facto não se deve tanto ao IRS mas<br />

ao financiamento da Segurança Social via salários: 11% para os<br />

colaboradores e 23,5% para a entidade patronal.<br />

Sendo a criação de postos de trabalho uma das prioridades<br />

não faz sentido que a segurança social, com excepção da componente<br />

da reforma, esteja indexada aos salários. Luís Cabral<br />

um economista que muito prezo, depois de alertar para este<br />

assunto, apontava algumas ideias alternativas, sendo que uma<br />

delas me pareceu excelente – indexar o necessário financiamento<br />

da segurança social aos consumos não básicos.<br />

Finalmente um último aspecto, os chamados direitos adquiridos<br />

provocam uma grande inflexibilidade nos custos de uma<br />

organização. Ou seja, o salário e os benefícios raramente podem<br />

ser diminuídos. O que se verifica hoje é que os colaboradores<br />

atingem cada vez mais cedo o nível máximo de produtividade,<br />

seja pela maior adequação das capacidades tecnológicas, seja<br />

pela vitalidade física inerente à função. Quando há perda de<br />

produtividade o que assistimos é à redução dos colaboradores<br />

mais antigos, e com salários mais altos, substituindo-os por<br />

outros mais novos e salários menos onerosos.<br />

Porque não permitir que os salários sejam flexíveis ao longo<br />

de uma carreira? Que cresçam até ao nível de produtividade<br />

máximo e que em patamares estabelecidos se possam reduzir<br />

de forma a que as empresas mantenham esses colaboradores e<br />

não os procurem desligar; vide o sucedido na banca nas últimas<br />

décadas com milhares de profissionais válidos em regime de<br />

reforma ou pré-reforma.<br />

Em resumo três “Insigts”: atenuar o GAP salarial; desonerar<br />

a fiscalidade sobre os rendimentos líquidos do trabalho; flexibilizar<br />

as condições salariais ao longo da carreira profissional<br />

dos colaboradores.<br />

162 MARÇO 2020

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!