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RCIA - ED. 175 - FEVEREIRO 2020pdf

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Confissões

Já escrevi tantos artigos sobre os

mais vários assuntos nesses quase

60 anos que colaboro na imprensa,

que temo ser um tanto repetitivo e

até mesmo apontado como um cronista

chato — como alguns amigos

já me disseram que sou —, porque

as coisas que costumo escrever nem

sempre foram do agrado deles.

Mas fazer o quê? Não se consegue

contentar todo mundo. Aliás,

aqui entre nós, reconheço até que

têm alguma razão, pois confesso

que depois de publicados e novamente

lê-los no papel, tenho a impressão

que escrevi besteiras e aí

fico com raiva de mim mesmo. Não

que tenha ficado tão arrependido;

mas é que foram para o espaço e

não haveria mais volta para eventualmente

serem revistos ou transformados.

Então, talvez chato ou repetitivo,

para eles ou para alguns outros

queridos leitores e amadas leitores

que supostamente leram aquelas

coisas e que não me consideraram

tanto assim, consigo levar uma vantagem,

se assim pode ser considerada.

É que jamais poderão perceber

novamente as falhas, porque já

não mais fazem parte deste mundo.

A inevitável passagem do tempo

que não volta mais.

Além disso, há um detalhe muito

importante: tais escritos foram circunstanciais,

de ocasião e por isso

não teria mais sentido reescrevê-

-los. Perderam-se na história. Porém,

alguns outros, intemporais,

“filosóficos”, até que ainda poderiam

ler relidos, mesmo porque,

como já dissera Hegel, a História

costuma se repetir, “pelo menos

duas vezes”.

Já as crônicas, contudo, datadas

Luís Carlos

BEDRAN

Sociólogo e cronista da Revista Comércio,

Indústria e Agronegócio de Araraquara

no tempo, como a própria etimologia

diz, também ainda podem

ser relidas, principalmente entre os

jovens, mas tão somente por mera

curiosidade porque está havendo

uma espécie de retorno saudoso

de um passado, que, claro, nunca

existiu para as novas gerações.

Supõem, enganosamente, que outrora

era bem melhor a vida das

pessoas.

Uma das razões poderia ser

que a vida atual tem sido um tanto

confusa, pois lhes têm faltado referências

sólidas, valores estratificados

para que eles consigam superar

suas eternas inseguranças que

encontram no dia a dia, uma das

características da vida moderna. De

qualquer maneira serão superadas,

como as foram pelas antigas gerações.

Apesar disso, não posso deixar

de dizer, embora um tanto constrangido

ou mesmo envergonhado,

que não teria mais coragem para

expor novamente algumas opiniões

— não que seriam revolucionárias

ou chocantes — mas simplesmente

porque os tempos são outros, estranhos

tempos, em que qualquer pessoa

dá palpite sobre tudo o que é

possível e imaginável (o que é muito

bom, por sinal, o que tem sido

facilitado pela internet).

Porém nem sempre são ponderadas,

analisadas, medidas, o que

leva às maiores e intermináveis discussões

que nunca conseguem chegar

à conclusão alguma, tamanha

a velocidade dos contatos, geralmente

supérfluos. É de se louvar o

amplo conhecimento, coisa que no

passado era um privilégio de poucas

pessoas.

E também a indignação de alguns

internautas responsáveis que

não se conformam — com razão

até —, com o que tem ocorrido no

mundo, no País, na cidade, sugestionados

que têm sido pelas redes

sociais (ou antissociais), por aquilo

que se convencionou chamar “politicamente

correto” e não se sabe

bem o que é isso.

E não somente indignação,

mas também a preocupação das

pessoas de bem contra algumas

estranhas manifestações oficiais

ou extraoficiais dos governantes

da Nação sobre alguns temas que

nunca, mesmo desde os chamados

“anos de chumbo”, passando por

todos os governos, após a redemocratização,

sequer foram levados

em consideração.

Por isso este cronista travou-se,

autocensurou-se, porque tudo o

que gostaria de escrever com toda

aquela antiga autonomia sobre o livre

pensar que sempre teve, sentese

hoje psicologicamente tolhido

— não pelos editores dos jornais ou

da revista, que sempre lhes deram

ampla liberdade de manifestação

de pensamento nesses anos todos,

sem quaisquer censuras —, mas

pelas atuais circunstâncias pelas

quais o País está passando.

Dessa forma, ser “obrigado” a

contestar, a polemizar ou a debater

as ideias, as mais esdruxulas que

têm sido levantadas pelos usuários

das redes sociais pela internet, ou

a enfrentar tête-à-tête cidadãos que

se consideram entendidos sobre

tudo o que ocorre no mundo, baseados,

geralmente, no superficial

conhecimento que têm, não vale a

pena.

Por quê? Simplesmente porque,

pela passagem do tempo, pelo pouco

que lhe resta de aproveitamento

de vida, que espera ser bastante,

ou para divertir-se numa pescaria

com os amigos mentirosos, ou para

enganá-los no truco, ou para tomar

umas ou outras, ou para brincar

com os netinhos, ou principalmente

para ler um bom livro ou reler um

clássico, decididamentenão vale a

pena.

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