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A Sutil Arte de Ligar o F_da-se - Mark Manson

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teve uma revelação alarmante: na infância, ela fora abusada sexualmente pelo

próprio pai. O surgimento dessa lembrança reprimida, à qual Meredith vivera

alheia até então, foi um choque para ela. Aos trinta e sete anos, ela confrontou o

pai e contou à família o que havia acontecido.

A família inteira ficou horrorizada. O pai não hesitou em negar

categoricamente. Alguns parentes ficaram do lado de Meredith; outros, do lado

do pai. A árvore genealógica rachou ao meio. E a dor que havia muito definia o

relacionamento de Meredith com o pai começou a se espalhar como bolor pelos

familiares. A revelação devastou a todos.

Em 1996, Meredith teve outra percepção chocante: o pai não tinha abusado

dela. (Pois é. Foi mal aí.) Meredith tinha inventado a lembrança, com a

contribuição do profissional de psicologia, ainda que bem-intencionado.

Consumida pela culpa, ela passou anos tentando se reconciliar com o pai e com

outros membros da família, vivendo entre constantes pedidos de desculpas e

explicações, até a morte dele. Mas era tarde demais. A família nunca mais foi a

mesma.

Meredith não está sozinha. Como consta em sua autobiografia, My Lie: A True

Story of False Memory, os anos 1980 testemunharam diversos casos de mulheres

que acusaram parentes de abuso sexual e se retrataram tempos depois. Na

mesma época, muitas pessoas também alegavam saber de cultos satânicos em que

se abusava de crianças, mas, apesar de investigações em várias cidades, a polícia

nunca encontrou evidências das práticas doidas que eram descritas pelos

acusadores. Por que de repente o pessoal cismou de inventar lembranças

horríveis de abusos e seitas? E por que nos anos 1980?

Já brincou de telefone sem fio quando era criança? É aquela brincadeira em

que uma pessoa diz uma coisa no ouvido da outra, depois a frase vai passando

por umas dez até que a última ouve uma frase que não tem nada a ver com a

original. É mais ou menos assim que nossa memória funciona.

Uma coisa acontece. Dias depois, nos lembramos da situação com algumas

inexatidões, como se nos tivesse sido sussurrada e mal compreendida. Se

contamos a alguém sobre o que aconteceu, precisamos preencher as lacunas no

roteiro com novos elementos, para que tudo faça sentido e ninguém ache que a

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