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A segurança jurídica<br />

dos regimes especiais<br />

Tributação Pessoal<br />

PAULO MENDONÇA<br />

Partner, Tax Services<br />

Recentemente<br />

reabriu-se a polémica<br />

à volta dos regimes<br />

dos residentes não<br />

habituais e dos vistos<br />

Gold. Portugal também<br />

tem a Comissão<br />

Europeia a rever o<br />

regime fiscal da Zona<br />

Franca da Madeira<br />

(ZFM) no âmbito de<br />

um procedimento por<br />

auxílios de Estado<br />

ilegais que, se correr<br />

mal, provavelmente a<br />

atingirá de forma letal.<br />

Poderíamos pensar que a existência<br />

destes regimes é uma<br />

invenção portuguesa, mas a verdade<br />

é que eles proliferam por<br />

toda a União Europeia. E têm<br />

um objetivo claro: permitir alguma<br />

vantagem competitiva que<br />

equilibre os pratos da balança<br />

no caso de países ou territórios<br />

que, por razões naturais ou<br />

conjunturais, são normalmente<br />

preteridos nas decisões de investimento<br />

que possibilitam a<br />

captação de capitais, a criação<br />

de emprego e, por fim, direta<br />

ou indiretamente, o aumento da<br />

receita fiscal. Quando um país<br />

que conseguiu implementar um<br />

desses regimes o perde, imediatamente<br />

outro país recebe todo<br />

o investimento perdido.<br />

E a existência destes regimes<br />

faz perder alguma receita fiscal<br />

ou de natureza semelhante?<br />

Obviamente que não. Se não<br />

existirem vistos Gold em Portugal,<br />

os candidatos escolherão<br />

Espanha, Chipre ou a Irlanda. O<br />

mesmo se aplicará no caso dos<br />

residentes não-habituais ou se<br />

se permitir que o regime da ZFM<br />

seja ainda mais fragilizado. Não<br />

se gera qualquer receita adicional.<br />

Na verdade, evaporam-se<br />

empregos, depósitos bancários<br />

e outras aplicações no nosso<br />

sistema financeiro e reduz-se a<br />

atividade imobiliária. Tudo efeitos<br />

negativos. Aliás, a existência<br />

destes regimes especiais induzem<br />

receitas adicionais que de<br />

outra forma não existiriam. Ou<br />

seja, estaremos sempre a trocar<br />

alguma coisa por nada.<br />

Será que Portugal se pode dar ao<br />

luxo de alterar ou mesmo terminar<br />

estes regimes antes do tempo?<br />

A resposta, do ponto de vista<br />

do bom senso, só pode ser negativa.<br />

O nosso país continua a<br />

ter um problema sério de credibilidade<br />

internacional por causa<br />

da falta de segurança jurídica e<br />

de estabilidade fiscal para os investidores<br />

estrangeiros. Quando<br />

se lança um regime direcionado<br />

a não residentes, que assenta<br />

numa perspetiva de estabilidade,<br />

tem que existir um consenso<br />

sério que o mesmo terá que<br />

ser mantido, pelo menos pelo<br />

prazo previsto no momento em<br />

que foi lançado. De outra forma,<br />

é melhor estarmos quietos. Só a<br />

possibilidade, que até pode nunca<br />

se concretizar, de tais regimes<br />

poderem ser alterados ou revogados,<br />

quando é mencionada<br />

por responsáveis políticos credíveis,<br />

gera efeitos irreparáveis e<br />

bastante adversos.<br />

E a pergunta é: se os resultados<br />

destes avanços e recuos são tão<br />

nocivos, porque é que continuam<br />

a acontecer? Não se tratará<br />

de um mistério propriamente<br />

dito. E será também porventura<br />

excessivo acusar os que os promovem<br />

de falta de bom senso.<br />

Mas talvez não andaremos muito<br />

longe da verdade se apontarmos<br />

para calculismos políticos de<br />

circunstância e de vistas curtas<br />

que, por muito bem que pareçam<br />

momentaneamente a certas<br />

franjas da população, são verdadeiramente<br />

nocivos para o país<br />

como um todo.<br />

Não se pretende defender neste<br />

texto a existência de sistemas<br />

distorcivos da concorrência, que<br />

encoragem negócios ilegais, fuga<br />

aos impostos ou a entrada no<br />

nosso teritório de criminosos.<br />

Nada disso. O processo de autorizações<br />

e de monitorização<br />

deve ser o mais rigoroso possível.<br />

O desleixo a este nível<br />

será fatal para a capacidade<br />

futura para defender a existência<br />

destes regimes num modelo<br />

de concorrência não distorciva.<br />

E, se falharmos nesta parte tão<br />

importante, só nos poderemos<br />

queixar de nós próprios.<br />

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