29.01.2020 Views

EY_livro

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Tributação Empresarial<br />

A “retroatividade tangível”<br />

na dedução dos intangíveis<br />

22<br />

ANTÓNIO NEVES<br />

Partner, Tax Services<br />

Uma das grandes<br />

alterações introduzidas<br />

pela Lei n.º 2/2014,<br />

de 16 de janeiro,<br />

então popularmente<br />

apelidada por “Reforma<br />

do IRC”, foi, sem<br />

dúvida, a possibilidade<br />

de deduzir,<br />

para efeitos fiscais,<br />

o valor de aquisição<br />

dos ativos intangíveis<br />

reconhecidos<br />

autonomamente<br />

na contabilidade.<br />

Esta alteração foi particularmente<br />

relevante no que concerne (i)<br />

aos elementos da propriedade<br />

industrial – tais como marcas,<br />

alvarás, processos de produção,<br />

modelos ou outros direitos assimilados<br />

– adquiridos a título<br />

oneroso e sem vigência temporal<br />

limitada (caso contrário, poderiam<br />

ser amortizados nos termos<br />

do Decreto-Regulamentar n.º<br />

25/2009, de 14 de setembro) e<br />

(ii) ao goodwill adquirido numa<br />

concentração de atividades empresariais<br />

(exceto se respeitante<br />

a partes de capital).<br />

Assim, no caso de se aplicável a<br />

dedução prevista no então aditado<br />

artigo 45.º-A do código do IRC,<br />

passou a ser aceite como como<br />

gasto fiscal, em partes iguais, durante<br />

os primeiros 20 períodos de<br />

tributação após o reconhecimento<br />

inicial, o custo de aquisição de<br />

tais ativos intangíveis.<br />

Desde logo, a dedução fiscal<br />

ficou limitada aos ativos intangíveis<br />

adquiridos em ou após<br />

1 de janeiro de 2014, tendo a<br />

mesma sido vedada no caso de<br />

ativos intangíveis adquiridos (i)<br />

no âmbito de operações de fusão,<br />

cisão ou entrada de ativos,<br />

quando seja aplicado o regime<br />

especial de neutralidade fiscal<br />

ou (ii) a entidades residentes em<br />

país, território ou região sujeitos<br />

a um regime fiscal claramente<br />

mais favorável constante de lista<br />

aprovada por portaria do membro<br />

do Governo responsável pela<br />

área das finanças.<br />

Ora, volvidos apenas 5 anos, o legislador<br />

pondera – através da redação<br />

constante da Proposta de<br />

Lei do Orçamento do Estado para<br />

2019 (“PLOE 2019”) – introduzir<br />

mais uma (e deveras importante)<br />

limitação à dedução do gasto<br />

de aquisição dos referidos ativos<br />

intangíveis. Efetivamente, encontra-se<br />

em discussão uma disposição<br />

que, se aprovada, não permitirá<br />

a dedução do gasto, para<br />

efeitos fiscais, quando os ativos<br />

intangíveis em causa sejam adquiridos<br />

a entidades com as<br />

quais existam relações especiais<br />

nos termos definidos para as regras<br />

de preços de transferência.<br />

Caso esta limitação venha a ser<br />

introduzida, operar-se-á uma<br />

discriminação relativamente às<br />

aquisições de ativos intangíveis<br />

entre entidades relacionadas, o<br />

que se afigura ser, à semelhança<br />

de muitas outras, uma norma<br />

anti abuso totalmente cega. Se,<br />

por um lado, as transações entre<br />

partes relacionadas devem<br />

respeitar as condições de mercado<br />

e de plena concorrência,<br />

sendo tributáveis os ganhos na<br />

alienação de ativos intangíveis<br />

(sem possibilidade de beneficiar<br />

do regime de reinvestimento do<br />

valor de realização, o que já se<br />

revela como uma desvantagem<br />

face a uma transação entre partes<br />

não relacionadas), por outro<br />

lado, tal norma inviabiliza a dedução<br />

fiscal na esfera da entidade<br />

adquirente (mais uma vez,<br />

resultando numa desvantagem<br />

face a uma transação entre partes<br />

não relacionadas).<br />

É verdade que várias foram as<br />

transações desta natureza efetuadas<br />

nos últimos quase 5 anos<br />

e que, em substância, apenas<br />

visaram o aproveitamento e<br />

refrescamento de prejuízos fiscais.<br />

Contudo, a Autoridade Tributária<br />

e Aduaneira (“AT”) tem<br />

outros mecanismos para atuar<br />

e efetuar as correções que se<br />

revelem aplicáveis, não sendo<br />

necessário, e muito menos desejável,<br />

uma norma completamente<br />

desproporcional e que<br />

coloca em causa uma dedução<br />

fiscal só pela simples razão das<br />

partes intervenientes serem entidades<br />

relacionadas, ignorando<br />

por completo a substância económica<br />

da transação.<br />

Refira-se que, em muitos casos,<br />

esta dedução tem funcionado<br />

como um importante incentivo<br />

para trazer para Portugal muitos<br />

ativos intangíveis que, de outra<br />

forma, continuariam a ser detidos<br />

por entidades estrangeiras<br />

que receberiam royalties das<br />

empresas portuguesas.<br />

Mas se a eventual introdução da<br />

mencionada limitação já é uma<br />

péssima notícia, o pior mesmo<br />

é não se encontrar previsto um

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!