Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Política Fiscal<br />
16<br />
caso da tributação das pessoas<br />
coletivas, a atribuição do direito<br />
de tributar à localização da sede<br />
(ou da direção efetiva) decorria<br />
igualmente de uma “compensação”<br />
pelo prejuízo que esse<br />
Estado havia suportado, permitindo<br />
a realização de investimentos<br />
das “suas” empresas<br />
em outras jurisdições o que,<br />
alegadamente, afetaria o crescimento<br />
económico no seu território<br />
(princípio da neutralidade<br />
na exportação de capitais, que<br />
prejudica atribuição do direito<br />
de tributar ao Estado da Fonte<br />
dos rendimentos).<br />
Todo este edifício formal, que<br />
assenta numa lógica estrita de<br />
soberania fiscal enclausurada,<br />
tem sido colocado em causa<br />
pelo movimento de globalização,<br />
recentemente acelerado<br />
pela digitalização da economia.<br />
As pessoas circulam livremente<br />
num mundo cada vez mais global,<br />
e as empresas (pessoas jurídicas<br />
eminentemente formais)<br />
estabelecem-se de forma ainda<br />
mais facilitada nas jurisdições<br />
que lhes são mais convenientes.<br />
Quanto a isto, a iniciativa BEPS,<br />
ao esticar de forma quase insuportável<br />
os vetustos conceitos<br />
tradicionais, não se traduz senão<br />
num mero paliativo temporário<br />
que culminará inevitavelmente<br />
numa recomposição dos modelos<br />
gerais de tributação internacional.<br />
E, neste contexto, o princípio do<br />
destino parece adquirir vantagem.<br />
Efetivamente, os argumentos<br />
que fundamentavam a hegemonia<br />
do princípio da origem<br />
deixaram de existir. A informação<br />
sobre a situação concreta<br />
dos contribuintes pode ser angariada<br />
e transmitida em rede<br />
para todas as Administrações<br />
Fiscais (o que já ocorre hoje de<br />
forma crescente) permitindo<br />
que qualquer jurisdição possa<br />
efetuar as ponderações personalizantes<br />
necessárias. Por sua<br />
vez, a luta contra o planeamento<br />
fiscal agressivo só terá sucesso<br />
quando as regras de definição<br />
do direito de tributar forem alteradas,<br />
privilegiando a atribuição<br />
desse direito à localização<br />
de variáveis mais imóveis para a<br />
formação do rendimento. Na lógica<br />
do princípio do destino, as<br />
decisões empresariais relativas<br />
às estratégias de investimento,<br />
de tipo de rendimento ou<br />
de estruturas de financiamento<br />
passariam a ser fiscalmente<br />
neutras.<br />
A proposta da Comissão Europeia<br />
relativa ao CC(C)TB, que assenta<br />
nos critérios de volume de<br />
ativos, trabalhadores e vendas<br />
é um primeiro indicador dessa<br />
nova tendência. A crescente aplicação<br />
do princípio da tributação<br />
territorial em jurisdições como<br />
Hong Kong (ou mesmo Portugal,<br />
no caso do regime dos residentes<br />
não habituais) é uma outra<br />
manifestação. No mesmo sentido,<br />
os novos impostos sobre as<br />
plataformas digitais assentam<br />
igualmente no princípio do destino,<br />
contornando de forma “bárbara”<br />
os modelos tradicionais de<br />
tributação do rendimento, originando<br />
duplas tributações económicas<br />
ineficientes.<br />
Ora, no limite, poderá dizer-se<br />
que, num mundo digital, onde<br />
a base de ativos é tendencialmente<br />
imaterial e a força laboral<br />
assente em modelos de colaboração<br />
relativamente informal,<br />
em parceria, ou em sociedade,<br />
a única variável que resta para<br />
a determinação do direito a tributar<br />
será o ato de venda (na<br />
lógica da oferta) ou o ato do<br />
consumo (na ótica da procura).<br />
E tal é intrinsecamente verdadeiro:<br />
todo o lucro, mesmo na<br />
perspetiva conceptual tradicional,<br />
tem subjacente um ato, que<br />
se consubstancia na transação<br />
em mercado. Ora, uma vez que<br />
o movimento de digitalização assenta<br />
essencialmente na “devolução<br />
do poder de mercado” ao<br />
consumidor, será na localização<br />
do cliente que o direito de tributar<br />
definitivamente se localizará.<br />
Ora, neste quadro, a convergência<br />
entre esta nova tributação do<br />
rendimento e o IVA é evidente e<br />
incontornável, tendo sido já elaboradas<br />
propostas de impostos<br />
sobre o rendimento das sociedades<br />
traduzidas na tributação<br />
do cash-flow na jurisdição de<br />
destino.<br />
Este modelo (ou um outro qualquer<br />
de base similar) terá a virtude<br />
de contribuir positivamente<br />
não só para a eficiência económica<br />
como para a redistribuição<br />
global, uma vez que permitirá<br />
que as nações mais populosas e,<br />
consequentemente, com maior<br />
necessidade de infraestruturação<br />
reforcem a sua base de tributação.