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Política Fiscal<br />

dito ao consumo. Neste campo,<br />

no entanto, convém penitenciar,<br />

mas não liquidar, o pecador. Ora,<br />

nos Impostos Especiais sobre<br />

o Consumo, o Governo revelou<br />

uma cautela extrema. No caso<br />

do tabaco, continuou a sua trajetória<br />

natural de ajustamento.<br />

Porém, aqui devemos salientar o<br />

stand-still que, pela primeira vez<br />

desde a introdução deste imposto,<br />

ocorreu em sede de IABA. De<br />

facto, a tributação das bebidas<br />

alcoólicas encontrava-se já para<br />

lá do ponto ótimo de tributação.<br />

Tal significava que aumentos de<br />

tributação iriam erodir a capacidade<br />

de geração de receita do<br />

imposto. Neste quadro, e pela<br />

primeira vez, poderemos testar<br />

se o congelamento de imposto<br />

poderá potenciar um aumento<br />

efetivo de receita. Também na<br />

Proposta de Lei do Orçamento<br />

do Estado para 2019 existe campo<br />

para a investigação em economia<br />

comportamental.<br />

O Novo Contrato<br />

Social Fiscal<br />

Carlos Lobo<br />

Partner, Tax Services -<br />

Prof. Faculdade Direito<br />

Universidade Lisboa<br />

A digitalização, a<br />

globalização e os novos<br />

sistemas de disseminação<br />

de informação em rede<br />

alteraram significativamente<br />

os fundamentos tradicionais<br />

do contrato social.<br />

A vida em sociedade pressupõe<br />

um equilíbrio permanente entre<br />

as prestações estatais, traduzidas<br />

financeiramente na despesa<br />

pública geradora de utilidade<br />

social e as contribuições privadas,<br />

traduzidas financeiramente<br />

na receita fiscal, causadora de<br />

desutilidade privada. O elemento<br />

chave para o equilíbrio virtuoso<br />

desta equação é a concretização<br />

de um resultado positivo em<br />

sede de utilidade social global,<br />

ou seja, que as prestações públicas<br />

agregadas mais do que compensem<br />

os custos decorrentes<br />

da sua cobrança. Este modelo<br />

civilizacional remonta à Magna<br />

Carta, de 1215, e foi traduzido,<br />

em meados do século XVIII, no<br />

brocardo “no taxation without<br />

representation”, segundo o qual<br />

este jogo de equilíbrios necessita<br />

de ser legitimado e sufragado<br />

pelos alvos da pretensão impositiva<br />

pública, autorizando o<br />

exercício da mesma na ablação<br />

da esfera patrimonial privada.<br />

Os impostos são, portanto, o<br />

“preço da civilização”. E esse “preço”<br />

é determinado anualmente,<br />

por via parlamentar, através da<br />

votação dos representantes dos<br />

destinatários do encargo, que<br />

aprovam novos impostos, e autorizam<br />

o lançamento dos existentes<br />

por via da aprovação do Orçamento<br />

do Estado. Este modelo<br />

contratualista de intermediação<br />

(Hobbes, Locke e Rousseau) está<br />

a ser colocado em causa. Efetivamente,<br />

os novos modelos económico-sociais<br />

assentam precisamente<br />

na tendência inelutável<br />

para a desintermediação. Se essa<br />

realidade é claramente visível<br />

no setor privado, também se faz<br />

sentir na esfera pública. O movimento<br />

de descentralização é uma<br />

clara manifestação virtuosa desta<br />

tendência, visando a aproximar a<br />

decisão pública aos destinatários<br />

da mesma.<br />

Porém, existem outros exemplos<br />

não virtuosos. Relembramos que<br />

o imposto, como a própria denominação<br />

indica, traduz-se numa<br />

imposição ablativa de um ativo<br />

privado. Os mecanismos básicos<br />

de auto-defesa estarão sempre<br />

presentes. Assim, qualquer intenção<br />

populista assente num<br />

“ataque aos impostos” terá sempre<br />

um público ávido. A justificação<br />

para a pretensa ilegitimidade<br />

do imposto passará sempre pelo<br />

argumento da não perceção da<br />

utilidade da despesa pública realizada,<br />

usando o argumento opaco<br />

da “corrupção”, sempre enunciado<br />

mas nunca concretizado (o caso<br />

dos “coletes amarelos”), ou da<br />

aplicação do produto dos mesmos<br />

em benefício de um qualquer<br />

outro grupo não merecedor<br />

(movimentos secessionistas). Esta<br />

justificação assenta sempre no binómio<br />

enviesado nós versus eles,<br />

em que o grupo de reivindicação<br />

é constituído de forma aparentemente<br />

inorgânica, por via de redes<br />

sociais, aparentemente espontâneas,<br />

mas que são funcionalizadas<br />

no sentido da criação de um<br />

grupo injustiçado, que por alguma<br />

razão, é alegadamente mal tratado<br />

pelo grupo dominante.<br />

Este estado de coisas é um desafio<br />

aos modelos tradicionais<br />

de organização do Estado. Um<br />

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