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O regresso de FKA TWIGS aos discos com MAGDALENE eleva
a artista à estratosfera. Os domínios multimédia das suas
canções a que nos habituou continuam, mas desta vez
a voz assume o verdadeiro eixo da sua existência. Como
se a sua voz interior ganhasse corpo e assumisse o controlo
do corpo. Após quatro anos, FKA TWIGS revela uma
mulher quebrada pela sua separação com o ator ROBERT
PAT TINSON e com os seus problemas de saúde. Mas revela
ao mesmo tempo, que ao invés de debilitada regressa luminosa
e poderosa.
O recurso a inúmeras formas que a tecnologia oferece e as
diferentes expressões de arte são exponenciadas com uma
abordagem muito mais intíma, sobretudo na composição
escrita das canções. O feminino da sua existência é explorado
até à medula. MAGDALENE não sendo uma ode à figura
cristã propriamente dita, toma-a como referência contrapondo-a
com a complexidade humana que a artista viveu.
A expressão artística encontra pontos em comum com a
islandesa BJÖRK, na sua exposição, através da expressividade
visual, mas também pelo recurso ao seu universo interior
como matéria prima para os seus discos. As emoções
estão à flor da pele. As feridas ainda estão abertas.
A sua voz purga a sua dor mais intíma.
Os arranjos musicais deambulam entre o orgânico e o sintético
das matrizes eletrónicas. O recurso ao piano, às flautas
e aos coros, juntamente com o exercício vocal mais musculado,
fazem das suas canções um processo de expiação e
ao mesmo tempo cria um forte elo com os ouvintes, como
tão bem o fazem os temas “Home with you” e “Fallen Alien”.
A abertura do disco “Thousand eyes” introduz a poderosa versatilidade
da sua voz, que cativa e que nos prende de alma
e coração, como um abraço apertado peito a peito, o qual
não se quer largar. “Mirrored Heart” vai mais longe, como se
fosse possível, e a simbiose perfeita entre o ouvinte e a
artista é finalmente completada.
A emotividade é dissecada até à sua pura essência em
“Daybed” e “Cellophone”, o single de apresentação do disco,
criando a ilusão de que não existe nada mais no universo
do que as suas palavras. A busca pela compreensão do seu
desamor torna-se na nossa busca, na nossa partilha. Urge
a vontade de ouvir e compreender o que a artista canta.
Urge a necessidade de mergulhar nas suas emoções.
A melancolia e a tristeza de “Sad Day” chega a ser enternecedor.
O tempo e o espaço são ditados pela história que
nos conta. Sem aviso prévio, estamos dentro dela, somos
inseparáveis dela. Será que a estamos a vivê-la ou a revivê-la?
É tão estranho que chega a ser assustador a nossa
identificação com aquelas palavras. As suas palavras ou
as nossas palavras?
A escolha da figura de Maria Madalena surge, como a artista
comentou numa entrevista, por se tratar de uma mulher
dotada de uma extraordinária complexidade. Questionou‐se
porque seria ela conhecida apenas pela sua profissão de
prostituta se possuía habilidades de curadeira? O mote serve
também para a artista questionar a sua própria sexualidade
e mediatismo enquanto artista. Qual Maria Madalena,
sentira-se absorvida pelo estrelato do namorado, ofuscada
e vitima de cyberbullying pelos fans de PAT TINSON. O sentido
da sua existência e o resgate da sua essência vemos
tão bem retratado, evidentemente, em “Mary Magdalene”.
O seu segundo disco marca uma evolução extraordinária
enquanto artista. A artista avant-garde arquiteta verdadeiras
pérolas musicais como NICOLAS JAAR, ARCA e SKRILLEX.
No sentido em que cruza os elementos analógicos com os
tecnológicos. A narrativa que atravessa o disco conta histórias
vindas de si ou de emoções comuns a toda a gente.
No entanto, perspetiva a importância do papel da mulher,
sobretudo extraindo a misoginia das relações e atribuindo
ao feminino o seu verdadeiro poder, celebrando a sua singularidade
e beleza interior.
texto por Carlos Alberto Oliveira
SOUNDSTATION