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Chicos 58 - 22.09.2019

Chicos é uma publicação de literatura e ideias de Cataguases - MG - Brasil. Fale conosco em cataletras.chicos@gmail.com

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<strong>Chicos</strong><br />

A raça perdurou, apreciada por conquistadores,<br />

como Carlos Magno e Carlos V.<br />

Uma das vertentes foi levada à América por<br />

Cortez, e a prole se espalhou pelas pradarias.<br />

O general Custer os adorava, pois eram fortes<br />

e velozes. Os Cheyenne também, pelas<br />

mesmas razões. Quando as tribos lideradas<br />

por Crazy Horse trucidaram Custer e seu regimento<br />

em Little Bighorn, o único sobrevivente<br />

da cavalaria foi um equino chamado<br />

Comanche. O exército o aposentou com todas<br />

as honrarias. Nunca mais foi montado, e<br />

adorava beber cerveja. Seu funeral foi repleto<br />

de pompa e hoje Comanche está empalhado<br />

num museu.<br />

Destino menos feliz teve Hans, o cavalo<br />

esperto. Seu professor, o alemão Von Osten,<br />

dedicara-se a ensiná-lo a realizar operações<br />

aritméticas. Hans na verdade aprendera a ler<br />

a linguagem corporal do dono para saber<br />

quando tinha de parar de bater a pata ou inclinar<br />

a cabeça e assim dar a resposta esperada.<br />

Apesar do sucesso, o exército do império<br />

alemão, talvez por não prezar tanta esperteza<br />

num equino, acaba por alistar Hans para<br />

a I Guerra Mundial, e este morre em combate<br />

em 1916. Seu fim foi um pouco diferente<br />

do de Comanche, sua carne tendo sido consumida<br />

pela tropa faminta nas trincheiras.<br />

Hans talvez tenha sido o último descendente<br />

direto da linhagem de Bucéfalo, que chegou<br />

muito alterada a nossas paragens verdejantes.<br />

O alazão tupiniquim suspeita-se seja um<br />

cruzamento do cavalo imperial com a linhagem<br />

de Rocinante, o cavalo de Don Quixote,<br />

trazido por camponeses espanhóis para a Plata<br />

e depois cruzado com raças aculturadas<br />

pelos portugueses. Ainda assim, o pangaré<br />

traz o mesmo traço genético do seu nobre<br />

ancestral, de ter medo da própria sombra, e<br />

detestar ser montado, exceto por gente bélica.<br />

É muito apreciado pelos militares brasileiros,<br />

que apaziguam a fobia do quadrúpede<br />

instalando viseiras. Dado o terreno vastamente<br />

irregular do ambiente local, o cavalo<br />

exacerbou alguns dos traços do ancestral.<br />

Chucro, duro para galopar, não trota, relincha<br />

à bel prazer, dá coice à torto e a direito,<br />

morde, e adora empinar para derrubar seu<br />

cavaleiro. A fobia de sombra fez de sua<br />

mente um matagal de conspirações e paranoias.<br />

Parece até que viu a mula sem cabeça.<br />

Atesta-se que um expoente atual da raça,<br />

Roçonalbo, possui três rebentos que não<br />

fogem às características do progenitor. Juntos,<br />

se cooptados pelos quatro cavaleiros do<br />

apocalipse, não fariam feio: cumpririam a<br />

missão com louvor. Eles eram muitos cavalos,<br />

mas esta cavalgadura é nossa.<br />

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