Chicos 58 - 22.09.2019
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<strong>Chicos</strong><br />
Num volteio pelo centro da cidade,<br />
convenci-me de que ninguém ainda havia se<br />
apercebido da importância desse fato histórico,<br />
poético, quase idílico. Nossa atenção para<br />
as questões culturais precisa sair do limbo;<br />
a flor de que necessitamos para compor melhor<br />
o nosso jardim ainda não brotou. Por<br />
outro lado, purgamos o nosso ócio nas esquinas,<br />
praças e cafés, dando conta do comportamento<br />
alheio, mascando infortúnios,<br />
indignando-nos com a mesmice pública,<br />
num flagrante e bestial processo de transferência<br />
psicológica coletiva que só mesmo<br />
Freud explica. Fico imaginando quão longe<br />
está a cidade que almejamos construir. Recorro<br />
a Guimarães Rosa: “Mais que momentos,<br />
precisamos de eternidades”.<br />
Retornei à capela ainda antes do sepultamento.<br />
Risquei num papel alguns versos da<br />
canção de Noel (Sou do sereno, poeta muito<br />
soturno / vou virar guarda noturno e você<br />
sabe por que / Mas você não sabe que enquanto<br />
você faz pano / faço junto do piano<br />
esses versos pra você.) e pedi a Cairu que os<br />
depositasse no ataúde, ao lado do corpo da<br />
mãe. Dei-me por realizado. Fina que levasse<br />
consigo aqueles versos que, em verdade,<br />
eram seus.<br />
Uma chuva, traspassada pelos raios de<br />
sol daquele primeiro de novembro de dois<br />
mil e quatro, parecia jorrar minúsculos cristais<br />
sobre a tarde. Breve estio, grave caminhada<br />
entre sepulturas. Dois trabalhadores<br />
municipais, abstraídos, deitaram na campa o<br />
esquife da “Beatriz” de Noel, numa cena patética,<br />
mas cheia de dignidade aos nossos<br />
olhos. Chorando feito uma criança, Cairu,<br />
“O Menino da sua Mãe”, agradeceu a nossa<br />
presença e acolhida em Cataguases.<br />
-Imagine!<br />
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