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Chicos 58 - 22.09.2019

Chicos é uma publicação de literatura e ideias de Cataguases - MG - Brasil. Fale conosco em cataletras.chicos@gmail.com

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<strong>Chicos</strong><br />

Joaquim Branco<br />

Nasceu em Cataguases (MG), em 1940, poeta, Joaquim<br />

Branco herdou de seus conterrâneos da revista<br />

Verde, do final dos anos 20, o gosto pela experimentação<br />

e pela literatura de vanguarda. É autor de<br />

Concreções da fala (poesia 1969); Consumito ( poesia<br />

1975); Laser para lazer (Poesia 1984) Marginais do<br />

Pomba (Contos org. 1985) O caça-palavras (Poesia<br />

1997) Do pré ao pós-moderno Manual de literatura<br />

(1998); Ascânio, o poeta da Verde (org. 1998) , além<br />

de livros de crítica, literatura infantil.<br />

LECY DELFIM VIEIRA (1942-2008)<br />

“Fundarei o céu e a terra<br />

só para ter aonde ir.”<br />

Espanto e susto. Foi o que me acometeu.<br />

Também fiquei muito triste. Alguém me dissera:<br />

– Lecy morreu. Dito assim, seco, funcionou<br />

como um baque.<br />

Não importa quando, como, onde. Parecia que<br />

isso jamais iria acontecer. Sua presença, seus<br />

livros voltaram-me à mente. Em suas invenções<br />

de paródias ou ensaios de meninas, não era<br />

prevista a orfandade do rio e das meninas ao<br />

mesmo tempo.<br />

Imagino sua vida ao escrever ainda muito jovem<br />

o romance Paródias de um gigante líquido.<br />

Um título e tanto. Na época, peguei os manuscritos,<br />

li-os numa sentada. Um texto incrível.<br />

Naqueles idos de 1961, já senti ali a literatura<br />

pulsando célere, madura, imagens bem construídas,<br />

novas, o pensamento de uma autora no<br />

limite de sua pouca leitura e de sua muita densidade.<br />

Como me assustei.<br />

Nem tive tempo de olhar pro lado. Apresentoume,<br />

logo depois, os originais de Ensaios-<br />

Menina, não sem muita insistência de minha<br />

parte. Poemas de reflexão. Novo impacto. Ela<br />

não estava ali para brincar. As meninas, numeradas<br />

de 1 ao infinito, não terminariam nunca,<br />

e a narradora se dirigia a elas, uma a uma, como<br />

se fossem filhas ou espelhos de si mesma<br />

ou ambas as coisas. O diálogo textual com as<br />

meninas funcionava como num ringue de alteregos.<br />

Daria outro excelente livro.<br />

Tentei incorporá-la ao nosso grupo de rapazes<br />

que, na época, fazia o jornalzinho O Muro; publiquei<br />

alguns de seus textos, mas ela era impermeável<br />

à equipe. Tinha seu próprio mundo e<br />

mostrava-se arredia ao assédio.<br />

Mesmo assim, busquei editores, críticos no Rio,<br />

em Belo Horizonte e São Paulo, pois Lecy era a<br />

única do grupo que tinha livros prontos e eu<br />

sabia o que estava diante de mim. Nada. A sorte<br />

não estava a seu favor.<br />

O máximo que consegui foi o interesse do crítico<br />

Assis Brasil e depois de Walmir Ayala, que<br />

selecionou vários de seus poemas para a antologia<br />

Poetas novos do Brasil, em 1967. Ali foram<br />

editadas, pela primeira vez em livro, as<br />

‘meninas’, com apresentação de Francisco Inácio<br />

Peixoto, que dizia: ‘Herdeira do nada, senão<br />

dos caminhos de Cataguases, e de sua infância,<br />

explode em diálogos que, na verdade, são monólogo<br />

de obsedante desamparo: ‘Será que não<br />

há no mundo/ quem queira comigo ir,/ mesmo<br />

que não olhe meus olhos/ inda que vá por partir?’.<br />

Falamos ‘explode’ e não há de fato, outro<br />

verbo para exprimir o jeito que Lecy tem de<br />

dizer as coisas.”<br />

08

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