Avante! N.º 2368 Concerto na Festa
Suplemento especial sobre o concerto da noite de sexta-feira na Festa do Avante! de 2019
Suplemento especial sobre o concerto da noite de sexta-feira na Festa do Avante! de 2019
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FESTA 13
14 FESTA 18 de Abril de 2019<br />
«... Onde emergimos da noite e do silêncio<br />
E livres habitamos a substância do tempo...»<br />
Ficha técnica<br />
Comemorar um aniversário é sempre uma celebração de<br />
vida e uma afirmação de confiança no futuro.<br />
É, desde logo, o resultado do decorrer de um período<br />
de tempo que <strong>na</strong>s civilizações ocidentais se acabou por<br />
convencio<strong>na</strong>r ser de 365 ciclos diários, um ano, segundo o nosso<br />
calendário. No dia em que esse período se completa celebra-se<br />
antes de tudo o mais a vida que o animou e que, por esse próprio<br />
decorrer, garante que continua. Um momento de presente em<br />
que confluem o passado e o futuro, que aquele se constitui como<br />
garantia deste.<br />
Por tudo isto, um aniversário, apesar da sua <strong>na</strong>turalidade<br />
– vale dizer, inevitabilidade! – ganha um significado<br />
próprio e profundo quando deixa de ser um<br />
dia como qualquer outro para, ao ser<br />
celebrado, assi<strong>na</strong>lar o apreço por quanto<br />
Produção<br />
Vasco Pearce de Azevedo<br />
Ruben de Carvalho<br />
Manuel Jorge Veloso<br />
Textos<br />
Redacção do <strong>Avante</strong>!<br />
e colaboradores<br />
Criação Gráfica<br />
José Araújo<br />
Produção Executiva<br />
Inês Mota<br />
Ângela Serrano<br />
Comissão de Espectáculos<br />
da <strong>Festa</strong> do <strong>Avante</strong>!<br />
Realização Vídeo<br />
Medialuso, Lda<br />
Ilumi<strong>na</strong>ção<br />
Pedro Leston<br />
Director de Palco<br />
Nuno Cruz<br />
Pianos<br />
Logística FR Pianos<br />
Agradecimentos<br />
Centro Cultural de Belém<br />
Escola Superior de Música<br />
de Lisboa<br />
Teatro Municipal São Luís<br />
N.<strong>º</strong> <strong>2368</strong><br />
Suplemento<br />
Director: Manuel Rodrigues<br />
R. Soeiro Pereira Gomes, 3 – Lisboa 1600-196<br />
Não pode ser vendido separadamente<br />
decorreu já e nesse já vivido assentar a perspectiva de novo ciclo<br />
que se abre.<br />
Quando um aniversário é celebrado colectivamente é claro que<br />
tudo isto respeita à sociedade que o celebra, o apreço aos anos<br />
de vida decorridos e a garantia de os prosseguir, do devir que se<br />
abre. Não é assim uma pura comemoração, um puro acto festivo<br />
– ou melhor, é-o mas não ape<strong>na</strong>s. É que o congregar nessa festa<br />
é um acto em que a sociedade se concretiza e se define, reflecte<br />
sobre o seu passado e define os contornos do que anseia<br />
prosseguir no tempo.<br />
Decorreram 45 anos desde que uma música de José Afonso<br />
entrou para a história como a primeira canção que<br />
integraria o cancioneiro revolucionário não por,<br />
como tantas outras, celebrar uma revolução, por<br />
desejá-la, mas por ser um instrumento<br />
intrínseco da própria revolução. Os passos<br />
alentejanos de «Grândola» que a criatividade<br />
de José Mário Branco fizera anunciar os<br />
versos e a voz de Zeca determi<strong>na</strong>ram o<br />
arrancar dos motores das Chaimites, o<br />
equipamento de soldados em todo o País para<br />
que essa madrugada não se limitasse ao <strong>na</strong>scer<br />
do sol (e é aliás uma velha moda alenteja<strong>na</strong> que<br />
alerta: “O sol é que alegra o dia/ Pela manhã quando<br />
<strong>na</strong>sce/Ai de nós o que seria/Se o sol um dia faltasse”.<br />
Se o sol não <strong>na</strong>scesse todos os dias que se completam para<br />
ditar aniversários!), mas também ao <strong>na</strong>scer da liberdade, dela<br />
fazendo <strong>na</strong>s definitivas palavras de Sophia de Mello Breyner:<br />
Esta é a madrugada que eu esperava<br />
O dia inicial inteiro e limpo<br />
Onde emergimos da noite e do silêncio<br />
E livres habitamos a substância do tempo.<br />
Celebramos 45 anos do 25 de Abril. Isto quer dizer que nos<br />
revemos neste quase meio século decorrido. E queremos dizer<br />
que o seu legado continuará a ser substância do tempo<br />
português.
18 de Abril de 2019 FESTA 15<br />
Caminhos do Reportório Sinfónico<br />
Otema do concerto sinfónico<br />
da edição de 2019 da «<strong>Festa</strong><br />
do <strong>Avante</strong>!» propõe-nos um<br />
percurso entre duas fases contíguas<br />
da história da música, o ‘romantismo’<br />
e o ‘modernismo’.<br />
Começando pelo primeiro período<br />
referido – o ‘romantismo’ – serão<br />
apresentadas três obras, cobrindo<br />
a primeira metade do século XIX<br />
(de 1804 a 1850), todas elas de autores<br />
alemães, Beethoven, Mendelssohn<br />
e Schumann. O segundo período<br />
– dedicado ao ‘modernismo’ – será<br />
aflorado através de obras de dois autores<br />
de <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>lidades diferentes (um russo,<br />
Serguei Rachmaninoff, depois<br />
<strong>na</strong>turalizado norte-americano, e um<br />
francês, Maurice Ravel), com obras<br />
compostas em 1934 e 1919,<br />
respectivamente.<br />
De permeio, entre uma e outra fase<br />
histórica representadas no alinhamento<br />
do programa, o mundo viu surgir, em<br />
1848, o Manifesto do Partido Comunista,<br />
acompanhou o desenrolar da vida dos<br />
fundadores do comunismo científico –<br />
Karl Marx e Friedrich Engels – assistiu<br />
ao eclodir da primeira revolução<br />
socialista <strong>na</strong> Rússia, sob a liderança<br />
de V. I. Lénine e do partido bolchevique,<br />
e foi marcado pelo desenvolvimento<br />
crescente das lutas do proletariado<br />
a nível mundial, mobilizado sob<br />
a consig<strong>na</strong> «Proletários de todos<br />
os países, uni-vos!».
16 FESTA 18 de Abril de 2019<br />
s obras constantes do<br />
Aprograma e relacio<strong>na</strong>das<br />
ao modernismo situam-nos,<br />
historicamente, no período<br />
entre as grandes guerras<br />
do séc. XX – as primeira<br />
e segunda guerras mundiais –<br />
período marcado,<br />
tecnologicamente, pelo uso<br />
social do motor de combustão<br />
(impondo o paradigma<br />
energético da ‘segunda<br />
revolução industrial’, sendo<br />
o tempo de hoje marcado pelo<br />
Rapsódia sobre um tema de Paganini<br />
(Serguei Rachmaninoff, 1934)<br />
afirmar, nesse campo, de um<br />
novo paradigma – o da energia<br />
electromagnética).<br />
A Rapsódia sobre um tema de<br />
Paganini, de Rachmaninoff, foi<br />
composta em 1934, lembrando,<br />
segundo notas do próprio autor,<br />
um concerto para piano também<br />
composto <strong>na</strong> Suíça, tendo sido<br />
estreada em Baltimore (EUA),<br />
com o autor ao piano,<br />
acompanhado da orquestra de<br />
Filadélfia, sob direcção de<br />
Leopold Stokowski. Imbuída de<br />
Rachmaninoff (1878-1943), compositor, pianista<br />
e maestro russo, é considerado um dos últimos<br />
expoentes do estilo romântico <strong>na</strong> história<br />
da música ocidental, <strong>na</strong> sua transição para a fase<br />
seguinte, o modernismo. Nascido perto de Novgorod<br />
(noroeste da Rússia), mudou-se para S. Petesburgo,<br />
cidade onde viveu e estudou, antes de<br />
ir para Moscovo. Em 1909 apresenta-se como<br />
pianista nos EUA, granjeando popularidade. Após<br />
a Revolução de 1917, Rachmaninoff deixa a Rússia<br />
rumo a Estocolmo e depois para os EUA, onde<br />
uma estética, por assim dizer,<br />
cosmopolita, lembra por vezes<br />
(e foi assim utilizada) a música<br />
para cinema (dirá mesmo<br />
o autor, sobre a 18ª variação:<br />
“esta é para o meu agente!”).<br />
Da Rapsódia (constituída por<br />
24 variações, executadas sem<br />
interrupção), seja pela matéria<br />
especificamente musical que<br />
servirá de tema (que Paganini<br />
utilizou no último dos seus 24<br />
caprichos para violino solo, op. 1,<br />
obra paradigmática do<br />
virtuosismo romântico), seja<br />
pela forma de desenvolvimento<br />
adoptada (as variações), seja<br />
ainda pelo virtuosismo<br />
demandado pela escrita<br />
pianística – ema<strong>na</strong> um traço<br />
simultaneamente romântico<br />
e moderno, conforme nos<br />
foquemos no tema e seu<br />
tratamento ou <strong>na</strong> moldura<br />
sinfónica que o acompanha.<br />
Surgirá, ainda, a dado momento<br />
como tema secundário, um<br />
cantochão religioso (Dies Irae).<br />
Sergei Vasilievich Rachmaninoff<br />
fez gravações para a <strong>na</strong>scente indústria fonográfica,<br />
primeiro para a Thomas Edison e depois<br />
para a Victor Talking Machine. Em 1931, funda juntamente<br />
com outros exilados russos, uma escola<br />
de música em Paris, que posteriormente adoptaria<br />
o nome Conservatoire Rachmaninoff. Uma<br />
das suas obras mais divulgadas – Rapsódia sobre<br />
um tema de Paganini – foi composta em 1934, <strong>na</strong><br />
Suíça. Em 1942 declara-se um melanoma maligno.<br />
Em 1943 assume a <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>lidade norte-america<strong>na</strong>.
18 de Abril de 2019 FESTA 17<br />
ncerra o programa da edição<br />
Edeste ano, La Valse, obra do<br />
compositor francês Maurice<br />
Ravel. São de Fer<strong>na</strong>ndo Lopes-<br />
-Graça — nome maior da música<br />
portuguesa, do qual assi<strong>na</strong>lamos<br />
nesta altura os 25 anos passados<br />
sobre o seu falecimento —<br />
as referências sobre Ravel que<br />
em seguida transcrevemos:<br />
«A arte de Ravel não é uma arte<br />
profunda, trágica, problemática.<br />
Seja. Mas haverá outra que<br />
“La Valse”<br />
(Maurice Ravel, 1919)<br />
se lhe avantaje em fantasia,<br />
e mesmo em fantasmagoria,<br />
em capricho, em humor? (...)<br />
Escute-se a Valsa, e diga-se,<br />
mais do que isso, mais do que<br />
romantismo orgiástico, se não<br />
há nela um certo demonismo,<br />
se nela não andam à solta<br />
ululantes as fúrias, se nela<br />
não assobiam os ventos da<br />
tempestade, se nela não há,<br />
enfim, um pouco do dramatismo<br />
e do problematismo que parece<br />
ou parecia estar ausente da arte<br />
do grande músico francês e que,<br />
quiçá, continuarão a descobrir-<br />
-se em outras obras, à maneira<br />
que sobre elas o tempo for<br />
dobrando os seus passos<br />
justiceiros? Ravel é um grande<br />
músico...» 1 , acrescentando:<br />
«O caso de Ravel é significativo:<br />
um dos mais combatidos<br />
pioneiros da música deste século<br />
[do séc. XX], tor<strong>na</strong>-se pouco<br />
a pouco, o mais popular, o mais<br />
popular dos músicos<br />
contemporâneos (...) [o que]<br />
não resultou da mínima<br />
concessão do compositor<br />
ao público. (...) Concessão,<br />
se houve, foi da parte do<br />
público, que não podia deixar<br />
de ser conquistado<br />
pela sedução, a claridade,<br />
a magnificência de uma arte<br />
a um tempo maliciosamente<br />
inteligente e recatadamente<br />
sensível»( 2 ).<br />
Maurice Ravel<br />
Ravel (1875-1937) <strong>na</strong>sceu em Ciboure (parte<br />
do País Basco francês) mudando-se logo<br />
para Paris. Tendo estudado com Gabriel Fauré<br />
e sendo influenciado pela música de Claude<br />
Debussy, a sua obra adquirirá um matiz impressionista.<br />
Sobre Ravel, dirá Lopes-Graça em<br />
crónica datada de 1939 (No 2<strong>º</strong> aniversário da<br />
morte de Ravel): «É um grande, um extraordinário<br />
músico (...) Foi um dos artistas que mais<br />
completa, integral e superiormente, o que mais<br />
é, se realizou (...) via-se sobretudo em Ravel<br />
um artista metódico, um engenheiro de sensações<br />
raras, um compositor meticuloso (...)<br />
Hoje, sem se desconhecer tudo isso, tende a ver-<br />
-se que não é ape<strong>na</strong>s isso a arte de Ravel. Clássica,<br />
sim, é ela, pelo equilíbrio dos seus elementos<br />
constitutivos, pela perfeição das suas formas,<br />
pelo domínio da matéria, pela inteligência<br />
orde<strong>na</strong>dora. Mas o seu classicismo (...) é um<br />
classicismo dinâmico, que tira a sua substância<br />
e a sua força das profundezas da vida e do<br />
homem...»( 1 ).<br />
( 1 ) F. Lopes-<br />
-Graça.<br />
Música<br />
e músicos<br />
modernos,<br />
Lisboa,<br />
Ed. Caminho,<br />
1986, pp. 87-89<br />
( 2 ) Idem, p. 185.
18 FESTA 18 de Abril de 2019<br />
‘romantismo’, fase da<br />
O história da música que<br />
sucede ao período ‘clássico’,<br />
tem como marco a 3ª sinfonia<br />
de Beethoven, composta em<br />
1804, <strong>na</strong> mesma altura em que<br />
o compositor elabora o seu<br />
‘triplo concerto para violino,<br />
violoncelo, piano e orquestra’.<br />
Fase marcada pelo subjectivismo<br />
e o egocentrismo do artista, por<br />
Triplo <strong>Concerto</strong>, 1.<strong>º</strong> and. (Ludwig v. Beethoven, 1803/05)<br />
um sentimentalismo exacerbado<br />
e pela presença constante da<br />
Natureza, como forma poética<br />
de se expressar estados de<br />
espírito.<br />
O ‘romantismo’ irá<br />
correlacio<strong>na</strong>r-se, <strong>na</strong> história<br />
económica e social, com a<br />
chamada ‘primeira revolução<br />
industrial’. A mecanização da<br />
indústria da tecelagem <strong>na</strong><br />
Inglaterra, prontamente notada<br />
por Engels, é ape<strong>na</strong>s uma das<br />
manifestações da transformação<br />
do processo produtivo, sob<br />
o paradigma da energia a vapor.<br />
A transformação das condições<br />
de vida – os camponeses<br />
espoliados das terras<br />
e empurrados para as cidades,<br />
o surgimento do proletariado,<br />
a poluição acrescida por força<br />
Ludwig v. Beethoven<br />
Compositor assiduamente apresentado no palco da <strong>Festa</strong><br />
do <strong>Avante</strong>! (dele ouvimos em 2018 o 4<strong>º</strong> and. da No<strong>na</strong> Sinfonia),<br />
Beethoven (1770-1827) realiza a transição entre o classicismo<br />
e o romantismo. Um dos autores mais importantes<br />
da história da música ocidental, a sua vasta obra marcou as<br />
gerações seguintes. Sofreu de surdez progressiva, circunstância<br />
que o marcou.<br />
Diz em 1927 Romain Rolland, <strong>na</strong> sua monumental obra<br />
Beethoven – Períodos Criadores (traduzida ao português em<br />
1959 por F. Lopes-Graça): «Todo o ser de um Beethoven –a<br />
sua sensibilidade, a sua concepção do mundo, a forma da sua<br />
inteligência e da sua vontade, as suas leis de construção, a<br />
sua ideologia, bem como a substância do seu corpo e do seu<br />
Sinfonietta de Lisboa<br />
undada em 1995, a Sinfonietta de Lisboa<br />
F tem como base 29 instrumentistas de<br />
corda, podendo integrar sopros ou outros<br />
instrumentos de acordo com as exigências<br />
dos programas a executar. A sua direcção<br />
está a cargo de Vasco Pearce de Azevedo<br />
(Maestro Titular) e António Lourenço<br />
(Maestro Adjunto).<br />
A Sinfonietta de Lisboa realizou já<br />
numerosos concertos, tendo-se<br />
apresentado em Lisboa, no Centro Cultural<br />
de Belém e no Centro de Arte Moder<strong>na</strong> da<br />
Fundação Calouste Gulbenkian; no Porto,<br />
no Teatro Rivoli; e ainda em vários<br />
concelhos do país. Nestes concertos tem<br />
interpretado obras de diversos<br />
compositores desde o período barroco até<br />
ao séc. XX tendo acompanhado solistas tais<br />
como Andrea Bocelli, Placido Domingo,<br />
José Carreras, Jorge Moyano, Adriano<br />
Jordão, Peter Devries e Pedro Jóia entre<br />
outros.<br />
Desde 2004, a Sinfonietta de Lisboa tem<br />
realizado o concerto de abertura da <strong>Festa</strong><br />
do <strong>Avante</strong>!, tendo acompanhado os solistas<br />
Pedro Burmester, António Rosado, Mário<br />
Laginha e Miguel Borges Coelho, e ainda o<br />
Coral Lisboa Cantat.<br />
do uso do carvão como fonte<br />
de energia – instalará uma<br />
nostalgia idílica da vida no<br />
campo, a par da idealização<br />
das identidades <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is,<br />
com reflexo patente <strong>na</strong>s<br />
diversas artes. A burguesia era,<br />
até então, uma classe em<br />
ascensão, contrapondo-se<br />
ao poder da aristocracia em<br />
decadência.<br />
temperamento – tudo é representativo de uma idade da Europa»,<br />
citando também, ao abrir do 1<strong>º</strong> volume, palavras do compositor<br />
fixadas no seu Caderno de Conversação n.<strong>º</strong> 28 (de<br />
1823): «Não escrevo ape<strong>na</strong>s o que mais gostaria de escrever,<br />
mas sim por causa do dinheiro, de que tenho necessidade.<br />
Não quer isso de maneira nenhuma dizer que eu escreva só<br />
pelo dinheiro – logo que esta passe, espero enfim escrever<br />
o que para mim e para a arte é a mais alta coisa: o Fausto».<br />
Dirá, numa das suas últimas cartas, já no leito de morte «Tenho<br />
vontade de escrever ainda muito. Gostaria de compor agora<br />
a Décima Sinfonia, um Requiem e a música para o Fausto<br />
(...) o mais doloroso para mim, não escondo, é a suspensão<br />
completa da minha actividade» (op. cit, 3<strong>º</strong> vol. p. 283).
18 de Abril de 2019 FESTA 19<br />
Abertura “Ruy Blas” (Félix Mendelssohn Bartholdy, 1839)<br />
<strong>na</strong>quele quadro de combate ideológico entre<br />
Éa burguesia e a aristocracia, que se enquadra<br />
a Abertura ‘Ruy Blas’, de Mendelssohn. Obra<br />
composta no ano seguinte ao surgimento<br />
do drama que lhe serve de epónimo: o perso<strong>na</strong>gem<br />
Ruy Blas, criado em 1838 pelo dramaturgo francês<br />
Victor Hugo, dará corpo à ideia do plebeu que<br />
corteja uma dama da aristocracia (no caso,<br />
a rainha de Espanha, A<strong>na</strong> Maria de Neuburgo,<br />
segunda mulher de Carlos II, último rei espanhol<br />
Félix Mendelssohn Bartholdy<br />
Félix Mendelssohn (1809-1847), compositor, pianista e<br />
maestro, figura marcante da primeira fase do romantismo<br />
alemão, dele ouvimos <strong>na</strong> <strong>Festa</strong> do <strong>Avante</strong>!, em 2018, Sonho<br />
de uma Noite de Verão. Considerado uma criança-prodígio,<br />
a sua primeira composição (um quarteto com piano)<br />
da linhagem de Habsburgo).<br />
E o plebeu Ruy Blas enga<strong>na</strong>rá a corte até se tor<strong>na</strong>r<br />
primeiro-ministro. Sendo depois denunciado,<br />
suicida-se (não sem que a rainha o perdoe,<br />
declarando o seu amor...).<br />
é composta aos 13 anos. Além da sua significativa produção,<br />
Mendelssohn marca, <strong>na</strong> história da música, a recuperação<br />
para apresentação pública da obra de J. S. Bach<br />
(nomeadamente, a Paixão Segundo Mateus, que arranjou<br />
e dirigiu em 1929, em Berlim).<br />
3.ª sinfonia “Re<strong>na</strong><strong>na</strong>”, 1.<strong>º</strong> and. (Robert Schumann, 1850)<br />
3ª sinfonia de Schumann foi<br />
Acomposta em Düsseldorf,<br />
numa altura em que o autor<br />
aceita o cargo de director<br />
municipal de música. Produzida<br />
dentro da estética romântica,<br />
evoca episódios da vida <strong>na</strong>s<br />
margens do Reno, donde se<br />
fixou a desig<strong>na</strong>ção posterior<br />
dada à obra: Sinfonia Re<strong>na</strong><strong>na</strong>.<br />
O 1<strong>º</strong> and. tem ‘animado’<br />
(Lebhaft) como indicação de<br />
carácter, sendo composto <strong>na</strong><br />
forma-so<strong>na</strong>ta. Inicia com um<br />
primeiro tema, extenso e de<br />
desenho rítmico curioso, num<br />
compasso ternário, com<br />
frequentes sugestões de binário,<br />
Robert Schumann<br />
Schumann (1810-1857) <strong>na</strong>sceu em Zwickau, no distrito<br />
da Saxônia (leste da Alemanha). Compositor, pianista, maestro,<br />
escritor e musicólogo, estudou direito (em Leipzig). No<br />
entanto, o seu precoce interesse pela música e o fascínio pelo<br />
virtuosismo de Paganini, marcaram o seu caminho como compositor.<br />
A técnica de J. S Bach, que estudou sob orientação<br />
de Friedrich Wieck (seu professor e futuro sogro), influenciou<br />
(processo desig<strong>na</strong>do por hemíola<br />
– termo que deriva do grego e<br />
significa “contendo um e meio”).<br />
Em 1828, Schumann assiste a<br />
um concerto de Paganini,<br />
violinista e compositor,<br />
paradigma do virtuosismo<br />
instrumental. O impacto de<br />
Paganini em Schumann e outros<br />
compositores é notável<br />
(basta para tal compulsar<br />
o seu catálogo, onde<br />
encontraremos vários “estudos<br />
após os caprichos de Paganini”,<br />
tendo inclusivamente<br />
elaborado uma versão para<br />
piano dos 24 Caprichos<br />
de Paganini).<br />
o seu pensamento musical, tendo, em colaboração com<br />
este último, fundado a revista Neue Zeitschrift Musik (Nova<br />
Revista de Música), jor<strong>na</strong>l que dirigiu durante uma década.<br />
Casado com a pianista e compositora Clara Schumann (a<br />
quem dedicará o seu <strong>Concerto</strong> para piano e orquestra op. 54),<br />
o compositor sofrerá de uma doença do foro mental que forçará<br />
a inter<strong>na</strong>mento <strong>na</strong> fase fi<strong>na</strong>l da sua vida.
20 FESTA 18 de Abril de 2019<br />
Vasco Pearce<br />
de Azevedo<br />
V<br />
asco Pearce Azevedo inicia os seus<br />
estudos musicais <strong>na</strong> Academia<br />
dos Amadores de Música.<br />
Estuda no Instituto Gregoriano<br />
de Lisboa e <strong>na</strong> Escola Superior de<br />
Música de Lisboa (ESML), onde teve<br />
como professores, nomeadamente<br />
Christopher Bochmann e Constança<br />
Capdeville, obteve (1989)<br />
o Bacharelato em Composição,<br />
frequentando vários cursos de<br />
direcção de orquestra e coral em<br />
Portugal, Espanha, França e Bélgica.<br />
É desde 1995 Maestro Titular e<br />
Director Musical da Sinfonietta de<br />
Lisboa, orquestra com a qual tem<br />
realizado estreias absolutas de obras<br />
de Eurico Carrapatoso, Ber<strong>na</strong>rdo<br />
Sassetti, Sérgio Azevedo, Carlos<br />
Fer<strong>na</strong>ndes e Ivan Moody entre outros,<br />
actuando por todo o país,<br />
desig<strong>na</strong>damente em concertos<br />
de abertura da <strong>Festa</strong> do <strong>Avante</strong>!<br />
Terminou em Junho de 1995, <strong>na</strong><br />
qualidade de bolseiro da Comissão<br />
Fulbright e da Fundação Calouste<br />
Gulbenkian, o mestrado em direcção<br />
de orquestra e coro no College-<br />
-Conservatory of Music da<br />
Universidade de Cincin<strong>na</strong>ti (EUA).<br />
Conquista em 1997 o 3<strong>º</strong> Prémio no<br />
III<strong>º</strong> Concurso Inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l Maestro<br />
Pedro de Freitas Branco, e em 1996,<br />
uma Menção Honrosa no II° Concurso<br />
Inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l Fundação Oriente<br />
para Jovens Chefes de Orquestra.<br />
É licenciado em Engenharia<br />
Electrotécnica pelo IST, onde foi<br />
assistente leccio<strong>na</strong>ndo Álgebra<br />
e Análise Matemática.<br />
Trio Adamastor<br />
Constituído por Francisco Henriques<br />
no violino, Pedro Massarrão no<br />
violoncelo e José Pedro Ribeiro no<br />
piano, o Trio Adamastor surgiu em<br />
2016 como um dos grupos da classe<br />
de Música de Câmara do professor<br />
Paulo Pacheco <strong>na</strong> Escola Superior<br />
de Música.<br />
Para além de ter sido orientado desde<br />
o início pelo professor Paulo Pacheco,<br />
este Trio com piano teve também<br />
oportunidade de trabalhar com os<br />
professores Miguel Henriques, José<br />
Massarrão e Paulo Gaio Lima.<br />
Até à data presente, o Trio tem-se<br />
apresentado em várias salas do País<br />
das quais se destacam o Auditório<br />
Vian<strong>na</strong> da Mota, o Centro Cultural<br />
de Cascais e a Casa da Música,<br />
procurando sempre interpretar<br />
repertório com o máximo de<br />
abrangência tocando obras de<br />
compositores desde W. A. Mozart<br />
a autores contemporâneos como Arvo<br />
Pärt e Vasco Mendonça.<br />
Ganhou recentemente o primeiro<br />
prémio <strong>na</strong> categoria de Música de<br />
Câmara nível Superior do Prémio<br />
Jovens Músicos.<br />
António Rosado<br />
António Rosado tem uma carreira<br />
reconhecida <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l e<br />
inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>mente, corolário do seu<br />
talento e do gosto pela diversidade,<br />
expressos num extenso repertório<br />
pianístico que integra obras de<br />
compositores tão diferentes como<br />
Georges Gershwin, Aaron Copland,<br />
Albéniz ou Liszt. Esta versatilidade<br />
permitiu-lhe apresentar, pela primeira<br />
vez em Portugal, destacadas obras<br />
como as So<strong>na</strong>tas de Enescu ou<br />
paráfrases de Liszt, sendo o primeiro<br />
pianista português a realizar as integrais<br />
dos Prelúdios e também dos Estudos<br />
de Claude Debussy. No registo dos<br />
recitais pode incluir-se também a<br />
interpretação da integral das so<strong>na</strong>tas<br />
de Mozart.<br />
Actuou em palco, pela primeira vez,<br />
aos quatro anos de idade. Os estudos<br />
musicais iniciados com o pai tiveram<br />
continuidade no Conservatório Nacio<strong>na</strong>l<br />
de Música de Lisboa, onde terminou<br />
o curso Superior de Piano, com vinte<br />
valores. Aos dezasseis anos parte para<br />
Paris, e aí vem a ser discípulo de Aldo<br />
Ciccolini no Conservatório Superior de<br />
Música e nos cursos de aperfeiçoamento<br />
em Sie<strong>na</strong> e Biella (Itália).<br />
Em 1980, estreou-se em concerto com<br />
a Orchestre Natio<strong>na</strong>l de Toulouse, sob<br />
a direcção de Michel Plasson e desde<br />
essa data tem tocado com inúmeras<br />
orquestras inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is e notáveis<br />
maestros como: Georg Alexander<br />
Albrecht, Moshe<br />
Atzmon, Franco<br />
Caracciolo,<br />
Pierre Dervaux,<br />
Arthur Fagen,<br />
Léon Fleischer,<br />
Silva Pereira,<br />
Claudio Scimone, David Stahl, Marc<br />
Tardue e Ro<strong>na</strong>ld Zollman.<br />
Também <strong>na</strong> música de câmara tem<br />
actuado com prestigiados músicos<br />
como Aldo Ciccolini, Maurice Gendron,<br />
Margarita Zimermann, Gerardo Ribeiro<br />
ou Paulo Gaio Lima, com o qual<br />
apresentou a integral da obra de<br />
Beethoven para violoncelo e piano.<br />
Laureado pela Academia Inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l<br />
Maurice Ravel e pela Academia<br />
Inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l Perosi, António Rosado<br />
foi distinguido pelo Concurso<br />
Inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l Vian<strong>na</strong> da Motta e pelo<br />
Concurso Inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l Alfredo Casella<br />
de Nápoles. Estes prémios constituem<br />
o reconhecimento inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l do seu<br />
virtuosismo e o impulso para uma<br />
brilhante carreira, com a realização de<br />
recitais e concertos por todo o Mundo,<br />
e a participação em diversos festivais.<br />
Na década de 90, foi o pianista<br />
escolhido pela TF1 para a gravação<br />
e transmissão de três programas<br />
– música espanhola e portuguesa,<br />
Liszt e, por fim, um recital preenchido<br />
com Beethoven, Prokofiev, Wagner-Liszt.<br />
Em 2007, a França nomeou-o<br />
Chevalier des Arts et des Lettres.